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Document 62019CJ0475

Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 17 de dezembro de 2020.
República Federal da Alemanha contra Comissão Europeia.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Aproximação das legislações — Regulamento (UE) n.o 305/2011 — Condições harmonizadas para a comercialização dos produtos de construção — Normas e regulamentações técnicas harmonizadas — Normas harmonizadas EN 14342:2013, EN 14904:2006, EN 13341:2005 + A1:2011 e EN 12285‑2:2005 — Recurso de anulação.
Processos apensos C-475/19 P e C-688/19 P.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2020:1036

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

17 de dezembro de 2020 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Aproximação das legislações — Regulamento (UE) n.o 305/2011 — Condições harmonizadas para a comercialização dos produtos de construção — Normas e regulamentações técnicas harmonizadas — Normas harmonizadas EN 14342:2013, EN 14904:2006, EN 13341:2005 + A1:2011 e EN 12285‑2:2005 — Recurso de anulação»

Nos processos apensos C‑475/19 P e C‑688/19 P,

que têm por objeto dois recursos de acórdãos do Tribunal Geral ao abrigo do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interpostos em 20 de junho e 18 de setembro de 2019,

República Federal da Alemanha, representada por J. Möller e R. Kanitz, na qualidade de agentes, assistidos por M. Kottmann, M. Winkelmüller e F. van Schewick, Rechtsanwälte,

recorrente (C‑475/19 P e C‑688/19 P),

sendo as outras partes no processo:

Comissão Europeia, representada por C. Hermes, M. Huttunen e A. Sipos, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância (C‑475/19 P e C‑688/19 P),

República da Finlândia, representada por S. Hartikainen e A. Laine, na qualidade de agentes,

interveniente em primeira instância (C‑475/19 P),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: J.‑C. Bonichot, presidente de secção, L. Bay Larsen, C. Toader (relatora), M. Safjan e N. Jääskinen, juízes,

advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Com o presente recurso no processo C‑475/19 P, a República Federal da Alemanha pede a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 10 de abril de 2019, Alemanha/Comissão (T‑229/17, não publicado, a seguir «primeiro acórdão recorrido», EU:T:2019:236), pelo qual este negou provimento ao seu recurso que tinha por objeto a anulação, em primeiro lugar, da Decisão (UE) 2017/133 da Comissão, de 25 de janeiro de 2017, relativa à manutenção com restrição no Jornal Oficial da União Europeia da referência da norma harmonizada EN 14342:2013 «Madeira para pavimentos: Características, avaliação da conformidade e marcação», em conformidade com o Regulamento (UE) n.o 305/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2017, L 21, p. 113), em segundo lugar, da Decisão (UE) 2017/145 da Comissão, de 25 de janeiro de 2017, relativa à manutenção com restrição no Jornal Oficial da União Europeia da referência da norma harmonizada EN 14904:2006 «Superfícies para áreas de desporto — Superfícies interiores para utilização polidesportiva: Especificações» em conformidade com o Regulamento (UE) n.o 305/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2017, L 22, p. 62) (a seguir, conjuntamente, «primeiras decisões controvertidas»), em terceiro lugar, da Comunicação da Comissão, de 10 de março de 2017, no âmbito da aplicação do Regulamento (UE) n.o 305/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2011, que estabelece condições harmonizadas para a comercialização dos produtos de construção e que revoga a Diretiva 89/106/CEE do Conselho (JO 2017, C 76, p. 32; a seguir «comunicação de “aplicação”»), na parte em que diz respeito às normas harmonizadas EN 14342:2013 e EN 14904:2006, em quarto lugar, da Comunicação da Comissão, de 11 de agosto de 2017, no âmbito da aplicação do Regulamento (UE) n.o 305/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece condições harmonizadas para a comercialização dos produtos de construção e que revoga a Diretiva 89/106/CEE do Conselho (JO 2017, C 267, p. 16), na parte em que diz respeito às normas harmonizadas EN 14342:2013 e EN 14904:2006, em quinto lugar, da Comunicação da Comissão, de 15 de dezembro de 2017, no âmbito da aplicação do Regulamento (UE) n.o 305/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece condições harmonizadas para a comercialização dos produtos de construção e que revoga a Diretiva 89/106/CEE do Conselho (JO 2017, C 435, p. 41), na parte em que diz respeito às normas harmonizadas EN 14342:2013 e EN 14904:2006, e, em sexto lugar, da Comunicação da Comissão, de 9 de março de 2018, no âmbito da aplicação do Regulamento (UE) n.o 305/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece condições harmonizadas para a comercialização dos produtos de construção e que revoga a Diretiva 89/106/CEE do Conselho (JO 2018, C 92, p. 139), na parte em que diz respeito às normas harmonizadas EN 14342:2013 e EN 14904:2006 (a seguir, conjuntamente, «três outras comunicações controvertidas»).

2

Com o presente recurso no processo C‑688/19 P, a República Federal da Alemanha pede a anulação do Acórdão do Tribunal Geral de 9 de julho de 2019, Alemanha/Comissão (T‑53/18, não publicado, a seguir «segundo acórdão recorrido», EU:T:2019:490), pelo qual este negou provimento ao seu recurso que tinha por objeto a anulação, em primeiro lugar, da Decisão (UE) 2017/1995 da Comissão, de 6 de novembro de 2017, que mantém, no Jornal Oficial da União Europeia, a referência da norma harmonizada EN 13341:2005 + A1:2011 sobre reservatórios termoplásticos estáticos para armazenagem acima do solo de óleos de aquecimento doméstico, querosene e combustíveis de motores diesel em conformidade com o Regulamento (UE) n.o 305/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2017, L 288, p. 36), e, em segundo lugar, da Decisão (UE) 2017/1996 da Comissão, de 6 de novembro de 2017, que mantém, no Jornal Oficial da União Europeia, a referência da norma harmonizada EN 12285‑2:2005 relativa a reservatórios de aço produzidos em oficina em conformidade com o Regulamento (UE) n.o 305/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2017, L 288, p. 39) (a seguir, conjuntamente, «segundas decisões controvertidas»).

Quadro jurídico

3

Os considerandos 1 a 3 do Regulamento (UE) n.o 305/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2011, que estabelece condições harmonizadas para a comercialização dos produtos de construção e que revoga a Diretiva 89/106/CEE do Conselho (JO 2011, L 88, p. 5), enunciam:

«(1)

A legislação dos Estados‑Membros exige que as obras de construção civil sejam concebidas e realizadas de modo a não comprometer a segurança de pessoas, animais domésticos ou bens, e a não degradar o ambiente.

(2)

Essa legislação tem influência direta sobre os requisitos aplicáveis aos produtos de construção. Por conseguinte, tais requisitos refletem‑se nas normas nacionais aplicáveis aos produtos, nas aprovações técnicas nacionais e noutras especificações e disposições técnicas nacionais relacionadas com os produtos de construção. Devido à sua disparidade, esses requisitos entravam as trocas comerciais no interior da União.

(3)

O presente regulamento não deverá afetar o direito que os Estados‑Membros têm de especificar os requisitos que consideram necessários para assegurar a proteção da saúde, do ambiente e dos trabalhadores quando estes utilizam produtos de construção.»

4

Segundo o artigo 1.o deste regulamento, sob a epígrafe «Objeto»:

«O presente regulamento fixa as condições de colocação ou disponibilização de produtos de construção no mercado, estabelecendo regras harmonizadas sobre a forma de expressar o desempenho dos produtos de construção correspondente às suas características essenciais e sobre a utilização da marcação CE nesses produtos.»

5

O artigo 2.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Definições», enuncia:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

[…]

4)

“Características essenciais”, as características do produto de construção correspondentes […] aos requisitos básicos das obras de construção;

[…]»

6

O artigo 3.o do Regulamento n.o 305/2011, sob a epígrafe «Requisitos básicos das obras de construção e características essenciais dos produtos de construção», dispõe, nos seus n.os 1 e 2:

«1.   Os requisitos básicos das obras de construção estabelecidos no anexo I constituem a base para a preparação dos mandatos de normalização e das especificações técnicas harmonizadas.

2.   As características essenciais dos produtos de construção são estabelecidas nas especificações técnicas harmonizadas em função dos requisitos básicos das obras de construção.»

7

O artigo 8.o desse regulamento, sob a epígrafe «Princípios gerais e utilização da marcação CE», dispõe, no seu n.o 4:

«Os Estados‑Membros não podem proibir nem dificultar, no seu território ou sob a sua responsabilidade, a disponibilização no mercado ou a utilização de produtos de construção que ostentem a marcação CE se os desempenhos declarados corresponderem aos requisitos de utilização nesse Estado‑Membro.»

8

O artigo 17.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Normas harmonizadas», enuncia:

«1.   As normas harmonizadas são estabelecidas pelos organismos europeus de normalização constantes do anexo I da Diretiva 98/34/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas (JO 1998, L 204, p. 37),] com base em pedidos (a seguir designados “mandatos”) emanados da Comissão nos termos do artigo 6.o dessa diretiva, após terem consultado o Comité Permanente da Construção a que se refere o artigo 64.o do presente regulamento (a seguir designado “Comité Permanente da Construção”).

[…]

3.   As normas harmonizadas fornecem os métodos e critérios de avaliação do desempenho dos produtos de construção relativamente às suas características essenciais.

Caso tal seja previsto no respetivo mandato, as normas harmonizadas devem referir uma utilização prevista dos produtos por elas abrangidos.

As normas harmonizadas devem prever, se for caso disso e sem pôr em risco o rigor, a fiabilidade ou a estabilidade dos resultados, métodos menos onerosos do que os ensaios para a avaliação do desempenho dos produtos de construção em função das suas características essenciais.

[…]

5.   A Comissão avalia a conformidade das normas harmonizadas estabelecidas pelos organismos europeus de normalização com os mandatos correspondentes.

A Comissão publica no Jornal Oficial da União Europeia a lista de referências das normas harmonizadas que estão em conformidade com os mandatos correspondentes.

Para cada norma harmonizada constante da lista, deve ser indicado o seguinte:

a)

As referências das eventuais especificações técnicas harmonizadas substituídas;

b)

A data do início do período de coexistência;

c)

A data do fim do período de coexistência.

A Comissão publica todas as atualizações da lista.

A partir da data do início do período de coexistência, é possível utilizar uma norma harmonizada para fazer uma declaração de desempenho para um produto de construção por ela abrangido. Os organismos nacionais de normalização têm a obrigação de transpor as normas harmonizadas de acordo com a Diretiva 98/34/CE.

Sem prejuízo dos artigos 36.o a 38.o, a partir da data do fim do período de coexistência, as normas harmonizadas são os únicos meios utilizados para fazer a declaração de desempenho dos produtos de construção por elas abrangidos.

No fim do período de coexistência, as normas nacionais incompatíveis devem ser eliminadas, devendo os Estados‑Membros pôr termo à validade de todas as disposições nacionais incompatíveis.»

9

O artigo 18.o do Regulamento n.o 305/2011, sob a epígrafe «Objeções formais contra as normas harmonizadas», prevê:

«1.   Caso um Estado‑Membro ou a Comissão considerem que uma norma harmonizada não satisfaz inteiramente os requisitos estabelecidos no mandato correspondente, o Estado‑Membro em causa ou a Comissão, após consulta do Comité Permanente da Construção, submetem o assunto à apreciação do Comité criado ao abrigo do artigo 5.o da Diretiva 98/34/CE, apresentando as suas razões. O Comité deve dar parecer o mais depressa possível, após consulta dos organismos europeus de normalização relevantes.

2.   Em função do parecer do Comité criado ao abrigo do artigo 5.o da Diretiva 98/34/CE, a Comissão toma a decisão de publicar, não publicar, publicar com restrições, manter, manter com restrições ou suprimir as referências à norma harmonizada em questão no Jornal Oficial da União Europeia.

3.   A Comissão informa o organismo europeu de normalização da sua decisão e, se necessário, solicita a revisão da norma harmonizada em causa.»

10

O artigo 19.o desse regulamento, sob a epígrafe «Documento de Avaliação Europeu», enuncia, no seu n.o 1:

«Na sequência de um pedido de Avaliação Técnica Europeia apresentado por um fabricante, é elaborado e aprovado pela organização dos [organismos de avaliação técnica] um Documento de Avaliação Europeu para qualquer produto de construção não abrangido parcial ou totalmente por normas harmonizadas, para o qual o desempenho relativamente às suas características essenciais não possa ser integralmente avaliado de acordo com uma norma harmonizada existente, devido, nomeadamente, a uma das seguintes razões:

[…]

b)

O método de avaliação previsto na norma harmonizada não se adequa pelo menos a uma das características essenciais do produto; ou

c)

A norma harmonizada não prevê nenhum método de avaliação aplicável pelo menos a uma das características essenciais do produto.»

11

O anexo I do referido regulamento especifica os «requisitos básicos das obras de construção». O ponto 3 desse anexo, sob a epígrafe «Higiene, saúde e ambiente», dispõe:

«As obras de construção devem ser concebidas e realizadas de modo a não causarem, durante o seu ciclo de vida, danos à higiene, à saúde e à segurança dos trabalhadores, dos ocupantes e dos vizinhos, e a não exercerem um impacto excessivamente importante, durante todo o seu ciclo de vida, na qualidade ambiental nem no clima durante a sua construção, utilização ou demolição, em consequência, nomeadamente, de:

[…]

b)

Emissão de substâncias perigosas, de compostos orgânicos voláteis (COV), de gases com efeito de estufa ou de partículas perigosas para o ar interior ou exterior;

[…]»

12

A Diretiva 98/34 foi substituída pelo Regulamento (UE) n.o 1025/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012, relativo à normalização europeia, que altera as Diretivas 89/686/CEE e 93/15/CEE do Conselho e as Diretivas 94/9/CE, 94/25/CE, 95/16/CE, 97/23/CE, 98/34/CE, 2004/22/CE, 2007/23/CE, 2009/23/CE e 2009/105/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e revoga a Decisão 87/95/CEE do Conselho e a Decisão n.o 1673/2006/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2012, L 316, p. 12).

13

O Comité instituído no artigo 5.o da Diretiva 98/34 foi substituído pelo previsto no artigo 22.o do Regulamento n.o 1025/2012, na sua versão inicial.

Antecedentes dos litígios

Processo C‑475/19 P

14

Os antecedentes do litígio estão resumidos nos n.os 5 a 13 do primeiro acórdão recorrido nos seguintes termos:

«5

Em 12 de novembro de 1997, a Comissão Europeia atribuiu ao Comité Europeu de Normalização [(CEN)] um mandato com a referência M/119 para a elaboração de normas harmonizadas para os revestimentos de superfície. Essas normas deviam incluir uma série de características essenciais, como a reação ao fogo, a impermeabilidade à água, a resistência à quebra, a emissão de amianto, de formaldeído, o teor em pentaclorofenol. O mandato M/119 foi emitido sob a égide da Diretiva [89/106/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros no que respeita aos produtos de construção (JO 1989, L 40, p 12)] e alterado pelo mandato M/137, de 25 de julho de 2000, bem como pelo mandato M/119 rev.1, de 22 de junho de 2010, para incluir a emissão de uma série de outras substâncias perigosas como os compostos orgânicos voláteis (COV).

6

Entre essas normas, a norma harmonizada EN 14342:2013 “Madeira para pavimentos: Características, avaliação da conformidade e marcação” continha métodos e critérios de avaliação do desempenho relativos a uma série de características essenciais. No que respeita à emanação de outras substâncias perigosas como os COV, a cláusula 4.4 da norma harmonizada EN 14342:2013 dispunha o seguinte:

“As regulamentações nacionais sobre as substâncias perigosas podem exigir uma verificação e uma declaração da emanação de outras substâncias perigosas, e por vezes do seu teor, além das tratadas nos outros artigos, quando os produtos de construção a que se refere a presente norma forem colocados nesses mercados.

Na falta de métodos de ensaio europeus harmonizados, há que verificar e declarar a emanação/teor tendo em conta as disposições nacionais aplicáveis no local de utilização […]”

7

A norma harmonizada EN 14904:2006 “Superfícies para áreas de desporto — Superfícies interiores para utilização polidesportiva: Especificações” era igualmente relativa a uma série de características essenciais como o desgaste, a durabilidade, a reação ao fogo, a emissão de formaldeído, o teor em pentaclorofenol. Quanto às outras substâncias perigosas, a nota 1 do anexo ZA.1 da referida norma harmonizada enunciava:

“Além dos eventuais artigos específicos relativos às substâncias perigosas constantes da presente norma, podem existir outros requisitos aplicáveis aos produtos contidos nessa norma. A fim de dar cumprimento às disposições da diretiva europeia sobre os produtos de construção, é necessário que estes requisitos sejam igualmente respeitados onde e quando são aplicáveis.”

8

Em 21 de agosto de 2015, a República Federal da Alemanha suscitou, ao abrigo do artigo 18.o do Regulamento n.o 305/2011, objeções formais à Comissão contra as normas harmonizadas EN 14342:2013 e EN 14904:2006.

9

A República Federal da Alemanha alegou que as duas normas controvertidas não satisfaziam inteiramente o mandato conferido pela Comissão e que as características essenciais dos produtos de construção não tinham sido estabelecidas em conformidade com o artigo 3.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011. Indicou que essas duas normas violavam o artigo 17.o, n.o 3, do Regulamento n.o 305/2011 e o mandato M/119, uma vez que não continham procedimentos de avaliação harmonizados relativos à emanação de outras substâncias perigosas como os COV.

10

Em seguida, a República Federal da Alemanha pediu que, enquanto se aguardavam métodos de verificação harmonizados sobre a emanação de outras substâncias perigosas e sobre a emissão ou o teor das referidas substâncias, as referências às normas fossem suprimidas do Jornal Oficial da União Europeia ou, a título subsidiário, que fossem publicadas com uma reserva, de modo a que as cláusulas controvertidas das normas relativas à emanação de outras substâncias perigosas fossem consideradas não harmonizadas e que os Estados‑Membros fossem autorizados a adotar disposições nacionais sobre os métodos de verificação, para que os requisitos básicos aplicáveis às obras de construção em matéria de saúde fossem respeitados.

11

Em 25 de janeiro de 2017, a Comissão adotou [as primeiras decisões controvertidas].

12

O artigo 1.o da Decisão 2017/133 dispõe:

“A referência da norma harmonizada EN 14342:2013 ‘Madeira para pavimentos: Características, avaliação da conformidade e marcação’ deve ser mantida com uma restrição.

A Comissão deve aditar a seguinte restrição à lista de referências de normas harmonizadas publicada no Jornal Oficial da União Europeia: ‘A cláusula 4.4 da norma EN 14342:2013 é excluída do âmbito da referência publicada.’”

13

O artigo 1.o da Decisão 2017/145 dispõe:

“A referência à norma harmonizada EN 14904:2006 ‘Superfícies para áreas de desporto — Superfícies interiores para utilização polidesportiva: Especificação’ deve ser mantida com restrição.

A Comissão deve aditar a seguinte restrição à lista de referências de normas harmonizadas publicada no Jornal Oficial da União Europeia: ‘A nota 1 do anexo ZA.1 da norma EN 14904:2006 é excluída do âmbito da referência publicada.’”»

15

Em 10 de março de 2017, a Comissão publicou a comunicação de «aplicação», que retomava a lista do conjunto das normas harmonizadas no domínio do Regulamento n.o 305/2011. Relativamente às duas normas EN 14342:2013 e EN 14904:2006, essa comunicação expunha, em substância, as restrições já enunciadas nas primeiras decisões controvertidas.

16

Em 11 de agosto de 2017, 15 de dezembro de 2017 e 9 de março de 2018, a Comissão publicou as três outras comunicações controvertidas.

Processo C‑688/19 P

17

Os antecedentes do litígio estão resumidos nos n.os 1 a 12 do segundo acórdão recorrido nos seguintes termos:

«1

Em 26 de fevereiro de 1999, a [Comissão] concedeu ao [CEN] um mandato com a referência M/131 para a elaboração de normas harmonizadas para tubos, reservatórios e acessórios não destinados a entrar em contacto com água para consumo humano. Essas normas deviam incluir uma série de características essenciais, como a resistência mecânica e a estabilidade, a resistência ao esmagamento, a capacidade de suporte de carga e a impermeabilidade.

2

Em 2004, o CEN adotou a norma harmonizada EN 12285‑2:2005 relativa aos reservatórios de aço. No que respeita à característica de desempenho “resistência mecânica e estabilidade” invocada no mandato M/131, esta é tratada nos quadros da secção ZA., os quais preveem que os produtos devem respeitar, para a espessura das paredes, os requisitos da cláusula 4.3.6.1 e do quadro 3 da norma harmonizada. Esta cláusula e esse quadro indicam as espessuras mínimas de paredes que devem ser respeitadas pelos reservatórios em causa.

3

Em 2005 e 2010, o CEN adotou a norma harmonizada EN 13341:2005 + A1:2011 relativa aos reservatórios termoplásticos estáticos. Esta norma continha métodos e critérios de avaliação do desempenho de uma série de características essenciais. No que respeita à característica de desempenho “resistência mecânica e estabilidade” invocada no mandato M/131, esta é tratada nos quadros da secção ZA.1 do anexo ZA, os quais preveem que os produtos devem respeitar os requisitos das tabelas 4 a 6 da norma harmonizada relativos à espessura das paredes. Essas tabelas 4 a 6 indicam as espessuras mínimas de paredes que devem ser respeitadas pelos reservatórios em causa.

4

As normas harmonizadas não contêm requisitos ou métodos de avaliação específicos no caso de esses reservatórios serem utilizados em zonas sísmicas ou inundáveis. Do mesmo modo, não contêm requisitos relativos à ancoragem no solo dos reservatórios destinados à construção.

5

O mesmo se diga das características de desempenho “resistência ao esmagamento” e “capacidade de suporte de carga” para as quais as referidas normas harmonizadas não comportam nenhum método ou critério de avaliação dos referidos desempenhos.

6

Em 21 de agosto de 2015, em conformidade com o artigo 18.o do Regulamento [n.o 305/2011], a República Federal da Alemanha levantou objeções formais junto da Comissão contra as normas harmonizadas EN 13341:2005 + A1:2011 e EN 12285‑2:2005.

7

A República Federal da Alemanha considerou que as duas normas controvertidas não satisfaziam inteiramente o mandato M/131 conferido pela Comissão e que as características essenciais dos produtos de construção não tinham sido estabelecidas em conformidade com o artigo 3.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011. Indicou que estas duas normas violavam o artigo 17.o, n.o 3, do Regulamento n.o 305/2011 e o mandato M/131, uma vez que não continham métodos de determinação dos desempenhos no que respeita à resistência mecânica e à estabilidade, à resistência ao esmagamento e à capacidade de suporte de carga e, nomeadamente, em caso de utilização dos referidos produtos em zonas sísmicas ou inundáveis.

8

Em seguida, a República Federal da Alemanha pediu, relativamente às normas harmonizadas EN 13341:2005 + A1:2011 e EN 12285‑2:2005, que, enquanto se aguardavam métodos de verificação harmonizados sobre a resistência mecânica e a estabilidade, a resistência ao esmagamento e a capacidade de suporte de carga em caso de utilização em zonas sísmicas ou inundáveis, as referências das normas fossem publicadas com restrição no Jornal Oficial da União Europeia ou, a título subsidiário, que fossem suprimidas do Jornal Oficial da União Europeia em relação aos reservatórios termoplásticos estáticos e aos reservatórios de aço produzidos em oficina.

9

Após consulta do Comité Permanente da Construção instituído no artigo 64.o do Regulamento n.o 305/2011, a Comissão submeteu a questão ao Comité previsto no artigo 22.o do Regulamento [n.o 1025/2012]. Este último Comité emitiu um parecer sobre as objeções formais.

10

Em 6 de novembro de 2017, a Comissão adotou [as segundas decisões controvertidas].

11

O artigo 1.o da Decisão 2017/1995 dispõe:

“A referência da norma harmonizada EN 13341:2005 + A1:2011 ‘Reservatórios termoplásticos estáticos para armazenagem acima do solo de óleos de aquecimento doméstico, querosene e combustíveis de motores diesel — Moldado de sopro em polietileno, moldado rotacional em polietileno e poliamida 6 por reservatórios de polimerização iónica: — Requisitos e métodos de ensaio’ deve ser mantida no Jornal Oficial da União Europeia.”

12

O artigo 1.o da Decisão 2017/1996 dispõe:

“A referência da norma harmonizada EN 12285‑2:2005 ‘Reservatórios de aço produzidos em oficina — Parte 2: […] Reservatórios cilíndricos, horizontais, de parede simples ou dupla, para armazenamento, acima do terreno, de líquidos inflamáveis e não inflamáveis, poluentes da água’ deve ser mantida no Jornal Oficial da União Europeia.”»

Recursos no Tribunal Geral e acórdãos recorridos

Processo T‑229/17

18

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 19 de abril de 2017, a República Federal da Alemanha interpôs recurso de anulação, por um lado, das primeiras decisões controvertidas e, por outro, da comunicação de «aplicação».

19

Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 4 de agosto de 2017, a República da Finlândia pediu para intervir em apoio dos pedidos da República Federal da Alemanha. Por decisão de 1 de setembro de 2017, o presidente da Primeira Secção do Tribunal Geral admitiu essa intervenção.

20

Em conformidade com o artigo 86.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a República Federal da Alemanha apresentou três articulados de adaptação na Secretaria do Tribunal Geral em 9 de outubro de 2017, em 2 de março de 2018 e em 20 de maio de 2018, pedindo a anulação das três outras comunicações controvertidas.

21

A República Federal da Alemanha invocou três fundamentos de recurso relativos, em substância, o primeiro, à violação das formalidades essenciais que decorrem do artigo 18.o do Regulamento n.o 305/2011, o segundo, à violação do dever de fundamentação e, o terceiro, à violação de disposições materiais do referido regulamento.

22

No primeiro acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou o recurso parcialmente inadmissível, quanto à comunicação de «aplicação» e às três outras comunicações controvertidas, e em parte improcedente, no que respeita às primeiras decisões controvertidas.

Processo T‑53/18

23

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 31 de janeiro de 2018, a República Federal da Alemanha interpôs recurso de anulação das segundas decisões controvertidas.

24

A República Federal da Alemanha invocou dois fundamentos de recurso, relativos, em substância, o primeiro, à violação do dever de fundamentação e, o segundo, à violação de disposições materiais do Regulamento n.o 305/2011.

25

No segundo acórdão recorrido, o Tribunal Geral negou provimento ao recurso na sua totalidade.

Tramitação dos processos no Tribunal de Justiça e pedidos das partes

26

Com o seu recurso no processo C‑475/19 P, a República Federal da Alemanha pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o primeiro acórdão recorrido;

anular as primeiras decisões controvertidas;

anular a comunicação de «aplicação» e as outras três comunicações controvertidas;

a título subsidiário, remeter o processo ao Tribunal Geral no que respeita aos pedidos de anulação das primeiras decisões controvertidas, da comunicação de «aplicação» e das três outras comunicações controvertidas;

condenar a Comissão nas despesas.

27

A República da Finlândia pede ao Tribunal de Justiça que julgue procedentes os pedidos do recurso interposto pela República Federal da Alemanha no processo C‑475/19 P.

28

Com o seu recurso no processo C‑688/19 P, a República Federal da Alemanha pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o segundo acórdão recorrido;

anular as segundas decisões controvertidas;

a título subsidiário, remeter o processo ao Tribunal Geral no que respeita aos pedidos de anulação das segundas decisões controvertidas;

condenar a Comissão nas despesas.

29

A Comissão pede que o Tribunal de Justiça se digne:

negar provimento aos recursos na sua totalidade;

condenar a recorrente nas despesas.

30

Por Decisão do presidente da Primeira Secção de 15 de setembro de 2020, os processos C‑475/19 e C‑688/19 P foram apensados para efeitos do acórdão.

Quanto aos presentes recursos

Quanto à exceção de inadmissibilidade

Argumentos das partes

31

A Comissão invoca a inadmissibilidade dos presentes recursos no sentido de que estes se limitam a repetir os argumentos apresentados no Tribunal Geral e não identificam os pontos contestados dos acórdãos recorridos.

32

A República Federal da Alemanha pede que essa exceção seja julgada improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

33

Resulta do artigo 168.o, n.o 1, alínea d), e do artigo 169.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça que um recurso de uma decisão do Tribunal Geral deve identificar com precisão os pontos da fundamentação contestados do acórdão cuja anulação é pedida e indicar de modo preciso os argumentos jurídicos que sustentam especificamente esse pedido, sob pena de inadmissibilidade do recurso ou do fundamento em causa. Assim, não respeita as exigências de fundamentação resultantes dessas disposições um recurso que se limita a repetir ou a reproduzir textualmente os fundamentos e os argumentos já alegados no Tribunal Geral. Todavia, as questões de direito examinadas em primeira instância podem ser de novo discutidas em sede de recurso, desde que o recorrente conteste a interpretação ou a aplicação do direito da União feita pelo Tribunal Geral [Despacho de 5 de setembro de 2019, Iceland Foods/EUIPO, C‑162/19 P, não publicado, EU:C:2019:686, n.o 5 (tomada de posição do advogado‑geral, n.o 6 e jurisprudência referida)].

34

No caso vertente, os recursos, considerados no seu conjunto, identificam com precisão suficiente os pontos contestados dos acórdãos recorridos e os fundamentos pelos quais, segundo a recorrente, enfermam de erros de direito, e, portanto, não se limitam a uma simples repetição ou reprodução dos argumentos alegados no Tribunal Geral, como sugeriu a Comissão, o que permite, por conseguinte, que o Tribunal de Justiça efetue a sua fiscalização de legalidade.

35

Tendo a recorrente, deste modo, cumprido os requisitos de fundamentação recordados no n.o 33 do presente acórdão, a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão deve ser julgada improcedente.

Quanto ao mérito

36

A República Federal da Alemanha invoca três fundamentos de recurso no processo C‑475/19 P. O primeiro fundamento é relativo à violação do artigo 263.o, primeiro parágrafo, TFUE, uma vez que, em substância, no primeiro acórdão recorrido, o Tribunal Geral ignorou o facto de a comunicação de «aplicação» e as três outras comunicações controvertidas produzirem efeitos jurídicos distintos dos produzidos pelas primeiras decisões controvertidas. Com o seu segundo fundamento, sustenta que esse acórdão viola o artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011, em conjugação com o artigo 17.o, n.o 5, desse regulamento, uma vez que estas disposições não só habilitavam mas também obrigavam a Comissão a adotar uma das medidas propostas pela República Federal da Alemanha. O terceiro fundamento é relativo à violação do artigo 18.o, n.o 2, do referido regulamento, em conjugação com o artigo 3.o, n.os 1 e 2, e o artigo 17.o, n.o 3, do mesmo regulamento, uma vez que estas disposições obrigavam a Comissão a examinar se as normas visadas pelas primeiras decisões controvertidas comprometiam o cumprimento dos requisitos básicos aplicáveis às obras de construção.

37

A República da Finlândia interveio em apoio do segundo e terceiro fundamentos no processo C‑475/19 P.

38

No processo C‑688/19 P, a República Federal da Alemanha invoca dois fundamentos de recurso. O primeiro fundamento é relativo à violação do artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011, em conjugação com o artigo 17.o, n.o 5, desse regulamento, uma vez que o Tribunal Geral ignorou que essas disposições não só habilitavam mas também obrigavam a Comissão a tomar uma das medidas sugeridas pela República Federal da Alemanha. Com o seu segundo fundamento, sustenta que o segundo acórdão recorrido viola o artigo 18.o, n.o 2, do referido regulamento, em conjugação com o artigo 3.o, n.os 1 e 2, e com o artigo 17.o, n.o 3, desse mesmo regulamento, uma vez que o Tribunal Geral ignorou o facto de essas disposições obrigarem a Comissão a verificar se as normas visadas pelas segundas decisões controvertidas comprometiam o cumprimento dos requisitos básicos aplicáveis às obras de construção.

Quanto ao primeiro fundamento no processo C‑475/19 P, relativo ao caráter alegadamente jurídico das comunicações controvertidas

– Argumentos das partes

39

O primeiro fundamento da República Federal da Alemanha é composto de duas partes.

40

Na primeira parte, a recorrente alega que, contrariamente ao que o Tribunal Geral declarou, a comunicação de «aplicação» e as três outras comunicações controvertidas produzem efeitos jurídicos obrigatórios. Com efeito, segundo o artigo 17.o, n.o 5, do Regulamento n.o 305/2011, a publicação da lista de referências das normas harmonizadas no Jornal Oficial da União Europeia pela Comissão teria por efeito permitir a utilização de uma norma harmonizada a partir da data de início do período de coexistência e tornar obrigatória essa utilização a partir da data do fim do período de coexistência, a fim de fazer uma declaração para um produto de construção por ela abrangido. Por conseguinte, o Tribunal Geral declarou, erradamente, que essas comunicações eram desprovidas de efeitos jurídicos novos em relação aos das primeiras decisões controvertidas.

41

Na segunda parte, a recorrente acusa o Tribunal Geral de ter concluído que ela devia demonstrar que as referidas comunicações tinham afetado os seus interesses ou alterado de forma caracterizada a sua situação jurídica, quando um Estado‑Membro não tem de demonstrar que o ato produz efeitos jurídicos que lhe dizem pessoalmente respeito ou que afetam os seus interesses.

42

A Comissão pede que este fundamento seja julgado improcedente, considerado nas suas duas partes.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

43

Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, importa salientar que, como resulta, em substância, dos n.os 42, 43 e 64 do primeiro acórdão recorrido, as primeiras decisões controvertidas produziram efeitos jurídicos em relação à recorrente, tanto por o seu pedido principal ter sido julgado improcedente como por o seu pedido subsidiário ter sido parcialmente deferido. Foi o deferimento parcial deste pedido que levou a Comissão a adotar, para efeitos de aplicação, as quatro comunicações controvertidas.

44

Por conseguinte, e como decidiu com razão o Tribunal Geral no n.o 49 do primeiro acórdão recorrido, as comunicações adotadas pela Comissão no âmbito da aplicação do Regulamento n.o 305/2011, dado que apenas dizem respeito a atualizações da lista de todas as referências das normas harmonizadas, na sequência da aceitação parcial de uma reserva formulada por um Estado‑Membro com base no artigo 18.o, n.o 1, desse regulamento, limitam‑se, na realidade, relativamente às normas harmonizadas em causa, a referir‑se‑lhes, sem produzir outros efeitos de direito além dos já produzidos em relação a esse Estado‑Membro pelas decisões adotadas por essa instituição com base no artigo 18.o, n.o 2, do referido regulamento.

45

Uma vez que, como resulta dos n.os 43 a 45 do primeiro acórdão recorrido, resulta do objeto, do conteúdo e do contexto da comunicação de «aplicação» e das três outras comunicações controvertidas e, portanto, de uma análise circunstanciada das mesmas, que estas visavam, em substância, retomar as restrições já enunciadas nas primeiras decisões controvertidas, o Tribunal Geral tinha fundamento para considerar que as referidas comunicações não podiam produzir efeitos jurídicos autónomos.

46

Daqui resulta que esta parte do fundamento não pode proceder.

47

Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, esta não pode deixar de ser afastada por inoperante, dado que só poderia proceder se se tivesse concluído que as comunicações adotadas pela Comissão no âmbito da aplicação do Regulamento n.o 305/2011 produziam efeitos jurídicos autónomos.

48

Nestas condições, há que julgar o primeiro fundamento no processo C‑475/19 P improcedente.

Quanto ao segundo e terceiro fundamentos no processo C‑475/19 P e ao primeiro e segundo fundamentos no processo C‑688/19 P, relativos à interpretação do artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011

– Argumentos das partes

49

A República Federal da Alemanha sustenta, em substância, no segundo fundamento no processo C‑475/19 P e no primeiro fundamento no processo C‑688/19 P, que o Tribunal Geral violou o artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011. Há que salientar que, no que respeita ao segundo fundamento no processo C‑475/19 P e ao primeiro fundamento no processo C‑688/19 P, estes, que incluem, cada um, três partes, estão formulados de maneira comparável.

50

Na primeira e segunda partes, a recorrente recorda que a Comissão tem o direito de formular uma reserva relativamente a uma determinada norma harmonizada, como, aliás, a recorrente lhe sugeriu que fizesse no presente caso. Assim, a Comissão tem não só a possibilidade mas também a obrigação de atribuir apenas parcialmente os efeitos jurídicos previstos nesse regulamento, no que respeita a uma norma que não satisfaz inteiramente os requisitos estabelecidos no mandato correspondente, como resulta claramente da redação do artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011.

51

Assim, decorre do artigo 17.o, n.o 5, segundo parágrafo, desse regulamento que, aquando da publicação das normas harmonizadas em conformidade com os mandatos recebidos, a Comissão deve limitar‑se a publicar as referências das normas que estão inteiramente em conformidade com esses mandatos.

52

Por outro lado, uma vez que o procedimento previsto no artigo 18.o do Regulamento n.o 305/2011 está em concordância com o procedimento previsto no artigo 17.o, n.o 5, segundo parágrafo, desse regulamento, o que esta última disposição proíbe não pode ser autorizado pelo artigo 18.o, n.o 2, do referido regulamento.

53

Na terceira parte, a recorrente critica o «amplo poder de apreciação» que o Tribunal Geral concedeu, no primeiro e segundo acórdãos recorridos, à Comissão. Com efeito, como declarou o Tribunal de Justiça no n.o 43 do seu Acórdão de 27 de outubro de 2016, James Elliott Construction (C‑613/14, EU:C:2016:821), embora a elaboração de uma norma harmonizada esteja confiada a um organismo de direito privado, constitui, não obstante, uma medida de aplicação necessária e estritamente enquadrada por requisitos essenciais definidos no direito da União, realizada por iniciativa e sob a direção e o controlo da Comissão. Neste contexto, cabe à Comissão cumprir a sua missão de verificação dos aspetos formais e materiais.

54

No que respeita ao terceiro fundamento no processo C‑475/19 P e ao segundo fundamento no processo C‑688/19 P, também estes estão formulados de maneira comparável.

55

Segundo a recorrente, o Tribunal Geral ignorou o facto de, por força do artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011, em conjugação com o artigo 3.o, n.os 1 e 2, e o artigo 17.o, n.o 3, desse regulamento, a Comissão estar obrigada a examinar se as normas harmonizadas permitem aos Estados‑Membros velar pelo cumprimento dos requisitos básicos aplicáveis às obras de construção. Com efeito, as normas harmonizadas devem permitir avaliar o desempenho de um produto de construção correspondente às características que lhe são essenciais para satisfazer os requisitos básicos aplicáveis às obras de construção.

56

Intervindo em apoio do segundo e terceiro fundamentos do recurso no processo C‑475/19 P, a República da Finlândia alega, em substância, que o Tribunal Geral não teve em conta o facto de a Comissão estar obrigada, em aplicação do Regulamento n.o 305/2011, a verificar se uma norma harmonizada está apta a cumprir os requisitos básicos aplicáveis às obras de construção, no que respeita a todos os elementos exigidos pelo mandato em que se baseia essa norma. Assim, se uma norma se vir a revelar incompleta de qualquer forma, a Comissão é obrigada a reconhecer que, uma vez que a referida norma não abrange os critérios de avaliação dos requisitos básicos previstos pelo mandato, os Estados‑Membros conservam a possibilidade de instituir requisitos nacionais no que respeita a essas características essenciais.

57

A Comissão conclui pela improcedência do segundo e terceiro fundamentos no processo C‑475/19 P, bem como do primeiro e segundo fundamentos no processo C‑688/19 P.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

58

Em primeiro lugar, resulta da redação do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 305/2011 que o procedimento de objeções formais é iniciado caso um Estado‑Membro ou a Comissão considerem que uma norma harmonizada não satisfaz «inteiramente» os requisitos estabelecidos no mandato correspondente, o que abrange tanto a hipótese de essa norma estar incompleta à luz desse mandato como a de o infringir em certos pontos.

59

Por força desta mesma disposição, quando é formulada uma objeção, cabe à Comissão, após consulta do Comité Permanente da Construção e do Comité criado ao abrigo do artigo 22.o do Regulamento n.o 1025/2012, apreciar se a norma satisfaz, pelo menos em parte, os requisitos estabelecidos no mandato. Se for este o caso, a Comissão está então obrigada a decidir se essa norma ou a sua parte que satisfaz esses requisitos deve ser publicada ou conservada no Jornal Oficial da União Europeia, total ou parcialmente, ou se deve ser suprimida do mesmo.

60

Em contrapartida, o artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011 não prevê que essa instituição possa acompanhar a referência de uma norma harmonizada de reservas como as desejadas pela recorrente, além de uma publicação ou uma manutenção parcial.

61

É verdade que o termo «parcialmente», que consta, nomeadamente, das versões em língua francesa ou italiana do artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011, corresponde, nalgumas versões linguísticas desta disposição, como as versões em língua alemã, inglesa, espanhola e polaca, à expressão «com reservas» ou «com restrições». Todavia, a Comissão, no âmbito do procedimento previsto no artigo 18.o desse regulamento, não pode permitir que os Estados‑Membros, através de uma reserva, completem o conteúdo de uma norma não inteiramente harmonizada, sob pena de esta usurpar as competências reconhecidas tanto no artigo 17.o como no artigo 18.o, n.o 3, do referido regulamento aos organismos de normalização europeus, únicos habilitados a determinar ou a rever o conteúdo da norma à luz do mandato conferido.

62

Ainda a este respeito, a não publicação, a publicação ou a manutenção, total ou parcial, bem como a supressão das referências a uma norma harmonizada total ou parcialmente em conformidade com o mandato correspondente continuam a ser uma faculdade concedida à Comissão, em função do parecer do Comité previsto no artigo 22.o do Regulamento n.o 1025/2012, e não uma obrigação que impende sobre esta instituição.

63

No caso em apreço, por um lado, no n.o 94 do primeiro acórdão recorrido, o Tribunal Geral decidiu corretamente que o argumento da recorrente segundo o qual a Comissão não avaliou a conformidade das normas harmonizadas em causa com o mandato correspondente carecia de fundamento de facto, uma vez que, nos considerandos 9, 11, 14 e 15 das primeiras decisões controvertidas, esta instituição tinha admitido, no que respeita às cláusulas em questão, que faltavam os critérios e os métodos necessários para a avaliação do desempenho de outras substâncias perigosas, pelo que essas cláusulas, não sendo aplicáveis, deviam ser expressamente excluídas do alcance das referências das normas harmonizadas em causa. Ao fazê‑lo, nas primeiras decisões controvertidas, a Comissão fez uso da faculdade que lhe é reconhecida de manter apenas parcialmente as referências às normas harmonizadas.

64

Por outro lado, nos n.os 42 e 44 do segundo acórdão recorrido, o Tribunal Geral salientou, com razão, que, embora «as normas harmonizadas em causa não correspondam inteiramente ao mandato correspondente e [embora] as características de desempenho como a resistência ao esmagamento, a capacidade de suporte de carga e a impermeabilidade não são incluídas nos métodos e critérios de avaliação do desempenho das normas harmonizadas em causa», esta circunstância não podia ter o efeito de «implicar a anulação das [segundas] decisões [controvertidas], uma vez que, do referido mandato, não consta nenhuma indicação relativa ao estabelecimento dos critérios de desempenho relativos à instalação ou à utilização dos reservatórios em zonas sísmicas ou inundáveis».

65

Em segundo lugar, importa recordar que, como resulta dos considerandos 1 e 2 do Regulamento n.o 305/2011, embora a legislação dos Estados‑Membros exija que as «obras de construção civil» sejam concebidas e realizadas de modo que não comprometam a segurança de pessoas, animais domésticos ou bens, e que não degradem o ambiente, essa legislação exerce influência direta sobre os requisitos aplicáveis aos «produtos de construção» que, por sua vez, e devido à sua disparidade, entravam as trocas comerciais no interior da União.

66

A fim de facilitar a sua livre circulação, o Regulamento n.o 305/2011 tem assim por objeto, como dispõe o seu artigo 1.o, fixar as condições de colocação ou disponibilização de «produtos de construção» no mercado, estabelecendo regras harmonizadas tanto sobre a forma de expressar o desempenho desses produtos, correspondente às suas características essenciais, como sobre a utilização da marcação CE nesses produtos.

67

Em conformidade com o artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 305/2011, os Estados‑Membros não podem proibir nem dificultar, no seu território ou sob a sua responsabilidade, a disponibilização no mercado ou a utilização de «produtos de construção» que ostentem a marcação CE «se os desempenhos declarados corresponderem aos requisitos de utilização nesse Estado‑Membro».

68

Neste âmbito, a faculdade de os Estados‑Membros adotarem disposições nacionais para regulamentar os seus próprios métodos de avaliação dos «produtos de construção» quanto aos aspetos não abrangidos por uma norma harmonizada pode limitar, a despeito do objetivo do Regulamento n.o 305/2011, a livre circulação dos produtos de construção correspondentes à norma harmonizada, uma vez que os fabricantes de «produtos de construção» correm o risco de ser confrontados com procedimentos e critérios nacionais divergentes a ponto de o acesso efetivo dos seus produtos ao mercado poder ser dificultado. Se um «produto de construção» não estiver abrangido ou não estiver totalmente abrangido por normas harmonizadas, de modo que o desempenho relativamente às suas características essenciais não possa ser integralmente avaliado de acordo com uma norma harmonizada existente, cabe, sendo caso disso, ao fabricante fazer um pedido de Avaliação Técnica Europeia, em conformidade com o artigo 19.o do referido regulamento.

69

Todavia, como recorda o seu considerando 3, o Regulamento n.o 305/2011 não deve afetar o direito que os Estados‑Membros têm de especificar os requisitos que consideram necessários para assegurar a proteção da saúde, do ambiente e dos trabalhadores quando estes utilizam produtos de construção.

70

Daqui resulta que um Estado‑Membro pode impor legislação específica relativa à instalação e à utilização dos «produtos de construção», desde que essa legislação não contenha requisitos que se afastem das normas harmonizadas no que respeita à avaliação dos referidos produtos ou à utilização da marcação CE nos mesmos.

71

No caso em apreço, o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito ao declarar, no n.o 102 do primeiro acórdão recorrido, que a Comissão não podia adotar uma reserva que especificasse que os Estados‑Membros estavam autorizados a aplicar as suas disposições nacionais sobre os métodos de ensaio e as verificações no que respeita à emanação de outras substâncias perigosas.

72

Por outro lado, o Tribunal Geral considerou corretamente, nos n.os 51 e 55 do segundo acórdão recorrido, que a utilização dos reservatórios em zonas sísmicas ou inundáveis não estava abrangida pelo âmbito de aplicação das normas harmonizadas em causa, de modo que não era possível completá‑las, no âmbito do procedimento do artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011, com uma limitação neste ponto.

73

Como foi salientado no n.o 70 do presente acórdão, é, no entanto, permitido que os Estados‑Membros imponham legislação específica respeitante à instalação e à utilização de «produtos de construção», desde que a referida legislação não contenha requisitos que se afastem das normas harmonizadas derivadas do Regulamento n.o 305/2011.

74

Em terceiro lugar, embora as normas harmonizadas estejam, ao abrigo das disposições conjugadas do artigo 2.o, ponto 4, do artigo 3.o, n.os 1 e 2, e do artigo 17.o, n.o 3, do Regulamento n.o 305/2011, relacionadas com as características essenciais dos «produtos de construção» e com os requisitos básicos aplicáveis às «obras de construção», não deixa de ser verdade que este regulamento visa harmonizar não os requisitos aplicáveis a essas obras, mas unicamente as modalidades da avaliação e da declaração do desempenho dos «produtos de construção». Uma vez que os métodos e os critérios de avaliação dos desempenhos dos «produtos de construção» definidos nas normas harmonizadas apenas permitem garantir que os desempenhos dos referidos produtos cumprem as características essenciais correspondentes aos requisitos básicos aplicáveis às «obras de construção», o objeto dessas normas não é o de garantir, por si mesmas, o cumprimento dos requisitos básicos.

75

No caso em apreço, há que observar que, no primeiro acórdão recorrido, o Tribunal Geral fez uma correta aplicação destes princípios ao considerar, no n.o 95 desse acórdão, que, por um lado, o objetivo das normas harmonizadas não é o de assegurar o cumprimento dos requisitos básicos aplicáveis às «obras de construção», que são fixados pelos Estados‑Membros, mas que, por outro, estão obrigados a utilizar, nas suas disposições relativas aos «produtos de construção» que garantem o cumprimento dos requisitos básicos, as normas harmonizadas relativamente à avaliação do desempenho dos referidos produtos, a fim de garantir a livre circulação desses produtos.

76

Do mesmo modo, no n.o 96 desse mesmo acórdão, o Tribunal Geral considerou, com razão, que não cabe à Comissão verificar se as normas harmonizadas em causa garantem o respeito dos requisitos básicos aplicáveis às «obras de construção» no que respeita à emanação de outras substâncias perigosas, dado que as normas harmonizadas têm por objetivo permitir a avaliação do desempenho dos «produtos de construção».

77

Quanto ao segundo acórdão recorrido, o Tribunal Geral precisou, no n.o 49 do mesmo, que o pedido de inscrição de uma reserva no âmbito de aplicação das referências das normas harmonizadas em causa não podia, de qualquer forma, ser deferido com base no artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 305/2011, uma vez que «tend[ia] a acrescentar às referidas normas um requisito suplementar respeitante à instalação ou utilização dos reservatórios em zonas sísmicas ou inundáveis», quando essa possibilidade de acrescento não é prevista pela referida disposição.

78

Foi, portanto, com razão que o Tribunal Geral fiscalizou a conformidade das normas em causa com os mandatos correspondentes e expôs as razões pelas quais a Comissão não tinha a obrigação de verificar o cumprimento dos requisitos básicos.

79

Em quarto e último lugar, há que observar que, no n.o 105 do primeiro acórdão recorrido e no n.o 58 do segundo acórdão recorrido, o Tribunal Geral se limitou a sublinhar que a Comissão não tinha cometido um erro manifesto de apreciação.

80

Daqui resulta que o segundo e terceiro fundamentos no processo C‑475/19 P, bem como o primeiro e segundo fundamentos no processo C‑688/19 P, devem ser julgados improcedentes.

81

Atendendo ao conjunto das considerações que precedem, há que negar provimento aos recursos na sua totalidade.

Quanto às despesas

82

Nos termos do disposto no artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso for julgado improcedente, ou for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas. Segundo o artigo 138.o, n.o 1, do referido regulamento de processo, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, desse mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

83

No caso em apreço, tendo a República Federal da Alemanha ficado vencida e tendo a Comissão pedido a sua condenação nas despesas, há que condená‑la nas despesas da Comissão relativas aos presentes recursos e aos processos no Tribunal Geral.

84

Em conformidade com o artigo 140.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo, os Estados‑Membros e as instituições que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas.

85

A República da Finlândia, interveniente no âmbito do recurso no Tribunal Geral e tendo participado no processo no Tribunal de Justiça, suportará as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) decide:

 

1)

É negado provimento aos recursos.

 

2)

A República Federal da Alemanha suporta, além das suas próprias despesas, as efetuadas pela Comissão Europeia no âmbito dos presentes recursos e dos processos no Tribunal Geral da União Europeia.

 

3)

A República da Finlândia suporta as suas próprias despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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