EUR-Lex Access to European Union law

Back to EUR-Lex homepage

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 62019CJ0451

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 5 de maio de 2022.
Subdelegación del Gobierno en Toledo contra XU e QP.
Pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Tribunal Superior de Justicia de Castilla-La Mancha.
Reenvio prejudicial — Artigo 20.o TFUE — Cidadania da União Europeia — Cidadão da União que nunca exerceu a sua liberdade de circulação — Pedido de cartão de residência de um membro da sua família, nacional de um país terceiro — Indeferimento — Obrigação de o cidadão da União dispor de recursos suficientes — Obrigação de os cônjuges viverem juntos — Filho menor, cidadão da União — Legislação e prática nacionais — Gozo efetivo do essencial dos direitos conferidos aos cidadãos da União — Privação.
Processos apensos C-451/19 e C-532/19.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2022:354

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

5 de maio de 2022 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Artigo 20.o TFUE — Cidadania da União Europeia — Cidadão da União que nunca exerceu a sua liberdade de circulação — Pedido de cartão de residência de um membro da sua família, nacional de um país terceiro — Indeferimento — Obrigação de o cidadão da União dispor de recursos suficientes — Obrigação de os cônjuges viverem juntos — Filho menor, cidadão da União — Legislação e prática nacionais — Gozo efetivo do essencial dos direitos conferidos aos cidadãos da União — Privação»

Nos processos apensos C‑451/19 e C‑532/19,

que têm por objeto dois pedidos de decisão prejudicial apresentados, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Tribunal Superior de Justicia de Castilla‑La Mancha (Tribunal Superior de Justiça de Castela‑Mancha, Espanha), por Decisões de 29 de abril de 2019 e de 17 de junho de 2019, que deram entrada no Tribunal de Justiça respetivamente em 12 de junho de 2019 e em 11 de julho de 2019, nos processos

Subdelegación del Gobierno en Toledo

contra

XU (C‑451/19),

QP (C‑532/19),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: C. Lycourgos (relator), presidente de secção, S. Rodin, J.‑C. Bonichot, L. S. Rossi e o. Spineanu‑Matei, juízes,

advogado‑geral: P. Pikamäe,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação do Governo espanhol, inicialmente por J. Ruiz Sánchez e S. Jiménez García, e em seguida por M. J. Ruiz Sánchez, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por J. Baquero Cruz e E. Montaguti, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 13 de janeiro de 2022,

profere o presente

Acórdão

1

Os pedidos de decisão prejudicial têm por objeto a interpretação do artigo 20.o TFUE.

2

Estes pedidos foram apresentados no âmbito de dois litígios que opõem a Subdelegación del Gobierno en Toledo (Subdelegação do Governo em Toledo, Espanha) (a seguir «Subdelegação») respetivamente a XU e a QP, a respeito do indeferimento, pela Subdelegação, dos pedidos de obtenção, a favor de XU e de QP, de um cartão de residência na qualidade de membro da família de um cidadão da União.

Quadro jurídico

Direito da União

3

O artigo 2.o da Diretiva 2003/86/CE do Conselho, de 22 de setembro de 2003, relativa ao direito ao reagrupamento familiar (JO 2003, L 251, p. 12), dispõe:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[…]

c)

“Requerente do reagrupamento”: o nacional de um país terceiro com residência legal num Estado‑Membro e que requer, ou cujos familiares requerem, o reagrupamento familiar para se reunificarem;

[…]»

4

O artigo 3.o desta diretiva prevê:

«1.   A presente diretiva é aplicável quando o requerente do reagrupamento for titular de uma autorização de residência emitida por um Estado‑Membro por prazo de validade igual ou superior a um ano e com uma perspetiva fundamentada de obter um direito de residência permanente, se os membros da sua família forem nacionais de um país terceiro, independentemente do estatuto que tiverem.

[…]

3.   A presente diretiva não é aplicável aos familiares de cidadãos da União.

[…]»

5

Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, da referida diretiva:

«Em conformidade com a presente diretiva e sob reserva do cumprimento das condições previstas no capítulo IV, bem como no artigo 16.o, os Estados‑Membros devem permitir a entrada e residência dos seguintes familiares:

[…]

c)

Os filhos menores, incluindo os filhos adotados, do requerente do agrupamento, à guarda e a cargo do requerente. Os Estados‑Membros podem autorizar o reagrupamento dos filhos cuja guarda seja partilhada, desde que o outro titular do direito de guarda tenha dado o seu acordo;

[…]»

Direito espanhol

6

O artigo 32.o da Constituição prevê:

«1.   O homem e a mulher têm o direito de se casar em plena igualdade jurídica.

2.   A lei regula as formas de casamento, a idade e a capacidade para se casar, os direitos e deveres dos cônjuges, as causas de separação e de dissolução e os seus efeitos.»

7

O artigo 68.o do Código Civil dispõe:

«Os cônjuges devem viver juntos, devem-se fidelidade e assistência mútua. Além disso, devem partilhar as responsabilidades domésticas, bem como os cuidados aos ascendentes e descendentes e às outras pessoas a seu cargo.»

8

O artigo 70.o desse código prevê:

«Os cônjuges estabelecem de comum acordo o lugar do domicílio conjugal e, em caso de desacordo, a questão é decidida pelo juiz, que tem em conta o interesse da família.»

9

O artigo 110.o do referido código enuncia:

«O pai e a mãe, mesmo que não exerçam a autoridade parental, são obrigados a ocupar‑se dos seus filhos menores e a prover‑lhes alimentos.»

10

O artigo 154.o do Código Civil tem a seguinte redação:

«Os menores não emancipados estão sujeitos à autoridade parental dos progenitores.

[…]»

11

O artigo 1.o do Real Decreto 240/2007, sobre entrada, libre circulación y residencia en España de ciudadanos de los Estados miembros de la Unión europea y de otros Estados parte en el Acuerdo sobre el Espacio Económico Europeu (Decreto Real 240/2007, Relativo à Entrada, à Liberdade de Circulação e à Residência em Espanha de Cidadãos dos Estados‑Membros da União Europeia e de outros Estados Partes no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu), de 16 de fevereiro de 2017 (BOE n.o 51, de 28 de fevereiro de 2007), na sua versão aplicável aos litígios nos processos principais, dispõe:

«1.   O presente decreto real regula as condições para o exercício dos direitos de entrada e de saída, de livre circulação, de residência, de residência permanente e de trabalho em Espanha por parte dos nacionais de outros Estados‑Membros da União Europeia e de outros Estados partes no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, bem como os limites aos referidos direitos por razões de ordem pública, de segurança pública ou de saúde pública.

2.   O conteúdo do presente decreto real não prejudica as disposições das leis especiais e dos tratados internacionais nos quais [o Reino de Espanha] seja parte).»

12

O artigo 2.o deste decreto real prevê:

«O presente decreto real é igualmente aplicável, nos termos por este previstos, aos membros da família de um nacional de outro Estado‑Membro da União Europeia ou de outro Estado parte no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, seja qual for a sua nacionalidade, quando os acompanhem ou a eles se reúnam, e que a seguir se enumeram:

a)

O cônjuge, desde que não tenha havido acordo ou declaração de nulidade do casamento, divórcio ou separação judicial.

[…]

c)

Os seus descendentes diretos, bem como os do seu cônjuge ou do parceiro registado, com idade superior a 21 anos ou que ultrapassem essa idade e que estejam a seu cargo ou sejam incapazes, desde que não tenha havido acordo ou declaração de nulidade do casamento, divórcio ou separação judicial ou que o registo da parceria não tenha sido anulado;

[…]»

13

Nos termos do artigo 7.o do referido decreto real:

«1.   Qualquer cidadão da União ou nacional de outro Estado parte no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu tem o direito de residir no território do Estado espanhol por um período superior a três meses, desde que:

[…]

b)

Disponha, para si próprio e para os membros da sua família, de recursos suficientes a fim de não se tornar um encargo para a segurança social de Espanha durante o período de residência, e de um seguro de doença que cubra todos os riscos em Espanha; ou

[…]

d)

Seja membro da família que acompanha um cidadão da União ou de outro Estado parte no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, ou que a este se reúna, e que preencha as condições a que se referem as alíneas a), b) ou c).

2.   O direito de residência previsto no n.o 1 é extensivo aos membros da família de um cidadão da União que não tenham a nacionalidade de um Estado‑Membro quando acompanhem o cidadão da União ou de outro Estado parte no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, ou a ele se reúnam em Espanha, desde que esse cidadão preencha as condições a que se referem as alíneas a), b) ou c) do n.o 1.

[…]

7.   No que respeita aos meios de subsistência suficientes, não podendo um montante fixo ser estabelecido, há que ter em conta a situação pessoal dos nacionais do Estado‑Membro da União Europeia ou do outro Estado parte no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu. De qualquer modo, esse montante não pode ser superior ao nível de recursos financeiros abaixo do qual os espanhóis recebem assistência social ou ao montante da pensão mínima de segurança social.»

14

O artigo 8.o, n.o 1, do mesmo decreto real enuncia:

«Os membros da família de um nacional de um Estado‑Membro da União Europeia ou de outro Estado parte no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu especificados no artigo 2.o do presente decreto real, que não sejam nacionais de um desses Estados, podem, quando acompanhem este último ou a ele se reúnam, residir em Espanha por um período superior a três meses e estão sujeitos à obrigação de pedir e de obter um “cartão de residência de membro da família de um cidadão da União”.»

Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

Processo C‑451/19

15

XU, de nacionalidade venezuelana, nasceu em 19 de setembro de 2001, na Venezuela. A mãe de XU, nacional venezuelana, é titular de uma Tarjeta de Residencia Comunitaria (Cartão de Residência Comunitário) e vive com o seu filho em Espanha desde 2004.

16

Em 20 de janeiro de 2011, um juiz de família da Venezuela atribuiu‑lhe a guarda exclusiva.

17

Em 6 de setembro de 2014, a mãe de XU contraiu matrimónio, em El Viso de San Juan (Espanha), com um nacional espanhol que nunca exerceu a sua liberdade de circulação na União.

18

Os cônjuges vivem juntos em El Viso de San Juan, desde 12 de dezembro de 2008. Em 24 de julho de 2009, nasceu, da união daqueles, uma criança, de nacionalidade espanhola.

19

Em 28 de setembro de 2015, o padrasto de XU apresentou um pedido de obtenção, a favor de XU, de um cartão de residência temporária de membro da família de um cidadão da União Europeia, em conformidade com o artigo 2.o, alínea c), do Decreto Real 240/2007.

20

Esse pedido foi indeferido com o fundamento de que o padrasto de XU não tinha demonstrado que dispunha, como exige o artigo 7.o do Decreto Real 240/2007, de recursos suficientes para ele próprio e para os membros da sua família. Apenas a situação económica do padrasto de XU foi tida em conta.

21

Em 28 de janeiro de 2016, a Subdelegação confirmou o indeferimento do pedido apresentado pelo padrasto de XU. O padrasto interpôs recurso dessa decisão de indeferimento no Juzgado de lo Contencioso‑Administrativo n.o 1 de Toledo (Tribunal do Contencioso Administrativo n.o 1 de Toledo, Espanha).

22

Este órgão jurisdicional concedeu provimento a esse recurso considerando que o artigo 7.o do Decreto Real 240/2007 não era aplicável no caso em apreço, uma vez que o padrasto de XU nunca exerceu a sua liberdade de circulação na União.

23

A Subdelegação interpôs recurso da sentença proferida pelo referido órgão jurisdicional para o órgão jurisdicional de reenvio.

24

Esse órgão jurisdicional sublinha que o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha) declarou, num Acórdão de 1 de junho de 2010, que o Decreto Real 240/2007 se aplica aos nacionais espanhóis, quer estes tenham ou não exercido a sua liberdade de circulação no território da União, bem como aos membros da sua família, nacionais de países terceiros.

25

Interroga‑se sobre a questão de saber se o artigo 20.o TFUE não se opõe à prática espanhola que impõe ao nacional espanhol que nunca exerceu a sua liberdade de circulação no interior da União e que pretende obter uma autorização de residência para o filho, nacional de um país terceiro, de sua mulher, ela própria nacional de um país terceiro e que tem a sua guarda exclusiva, a apresentar a prova de que dispõe de recursos financeiros suficientes para si próprio e para os membros da sua família, a fim de não se tornar um encargo para o sistema de segurança social, e de um seguro que cubra os riscos de saúde. Salienta, mais concretamente, que esta exigência sistemática, sem possibilidade de adaptação a situações específicas, pode ser contrária a esse artigo 20.o se levar a que esse nacional espanhol tenha de abandonar o território da União.

26

Ora, o órgão jurisdicional de reenvio considera que poderia ser esse o caso, tendo em conta a regulamentação espanhola aplicável ao casamento. Com efeito, sublinha que o direito a uma vida em comum deriva do conteúdo mínimo do artigo 32.o da Constituição. Além disso, os artigos 68.o e 70.o do Código Civil preveem que os cônjuges têm a obrigação de viver juntos, devem fidelidade e assistência um ao outro e que estabelecem de comum acordo o lugar do domicílio conjugal. A obrigação de os cônjuges viverem juntos, por força do direito espanhol, distingue‑se de uma simples decisão de oportunidade ou de comodidade.

27

Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, poderia não ser possível cumprir estas obrigações se a residência legal do filho menor do cônjuge do cidadão espanhol, quando estes são nacionais de países terceiros, dependesse de critérios económicos. Recusar conceder o direito de residência a XU impõe ao seu padrasto que abandone o território da União com a sua mulher, como o único meio de cumprir a obrigação de coabitação dos cônjuges prevista pelo direito nacional. Para chegar a esta conclusão, não seria necessário que fosse judicialmente possível obrigar os cônjuges a viverem juntos.

28

Por outro lado, a saída de XU e da sua mãe do território da União obrigaria, não só o cônjuge desta, mas também o filho menor, cidadão espanhol nascido da união destes, de facto, a deixarem o território da União considerado no seu todo, para que, em conformidade com os artigos 110.o e 154.o do Código Civil, os progenitores pudessem exercer conjuntamente a sua autoridade parental sobre o filho e cumprir a sua obrigação de alimentos.

29

Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio considera que, de qualquer modo, o artigo 20.o TFUE é violado pela prática espanhola que consiste em recusar automaticamente o reagrupamento familiar de um nacional de um país terceiro com um nacional espanhol que nunca tenha exercido a sua liberdade de circulação, com o único fundamento de que este último não dispõe de recursos suficientes, sem que as autoridades tenham examinado se existe, entre este cidadão da União e o nacional do país terceiro, uma relação de dependência de natureza tal que, em caso de recusa de concessão a este último de um direito de residência derivado, o referido cidadão da União se veria, de facto, forçado a deixar o território da União, considerado no seu todo.

30

O órgão jurisdicional de reenvio considera que a Subdelegação recusou a XU o cartão de residência unicamente pelo facto de o marido da sua mãe não dispor de recursos suficientes, sem examinar as circunstâncias particulares do casamento em questão, que demonstram uma integração profissional e uma forte integração em Espanha de todos os membros da família, em particular de XU, que reside há muito tempo em território espanhol, onde está plenamente escolarizado.

31

Nestas circunstâncias, o Tribunal Superior de Justicia de Castilla‑La Mancha (Tribunal Superior de Justiça de Castela‑Mancha, Espanha) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

A exigência de que o cidadão espanhol, que não exerceu o seu direito de circulação, preencha os requisitos do artigo 7.o[, n.o 1,] do [Decreto Real] 240/2007, como condição necessária para o reconhecimento do direito de residência do filho menor do seu cônjuge, ambos cidadãos de um país terceiro, em conformidade com o artigo 7.o, n.o 2, desse [Decreto Real], pode constituir, no caso de esses requisitos não estarem preenchidos, uma violação do artigo 20.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia se, em consequência da recusa desse direito, o cidadão espanhol for obrigado a abandonar o território da União, considerado no seu todo? Para analisar esta situação, há que ter em conta que o artigo 68.o do Código Civil Espanhol estabelece a obrigação de os cônjuges viverem juntos.

2)

De qualquer forma e caso não se verifique o acima exposto, viola o artigo 20.o TFUE, nos termos já referidos, a prática do Estado espanhol que consiste na aplicação automática da regulamentação contida no [artigo 7.o do Decreto Real] 240/2007, que recusa a autorização de residência ao cidadão de um país terceiro, filho menor do cônjuge, também ele nacional de um país terceiro, de um cidadão da União que nunca exerceu a liberdade de circulação (os quais, por sua vez, têm um filho espanhol menor e que também nunca exerceu a liberdade de circulação), única e exclusivamente por não cumprir os requisitos previstos nessa disposição, sem ter sido analisado, concreta e individualmente, se entre esse cidadão da União e o nacional de um país terceiro existe uma relação de dependência tal que, seja por que razão for e tendo em conta as circunstâncias, determine que, se for recusado um direito de residência a um cidadão de um país terceiro, o cidadão da União não possa separar se do membro da família de que depende e tenha de abandonar o território da União? Por maioria de razão, é também o caso quando o cidadão espanhol e o seu cônjuge, nacional de um país terceiro, são, por sua vez, pais de um filho menor espanhol que também poderia ser obrigado a abandonar o território espanhol acompanhando os seus pais? Para analisar esta situação, há que ter em conta a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, designadamente [o] Acórdão de 8 de maio de 2018, [K.A. e o. (Reagrupamento familiar na Bélgica) (C‑82/16, EU:C:2018:308)].»

Processo C‑532/19

32

Em 25 de setembro de 2015, QP, cidadão peruano, contraiu matrimónio com uma nacional espanhola que nunca exerceu a sua liberdade de circulação na União. QP e o seu cônjuge são os progenitores de uma menina, de nacionalidade espanhola, nascida em 11 de agosto de 2012.

33

Em 2 de outubro de 2015, QP apresentou um pedido de obtenção de um cartão de residência de membro da família de um cidadão da União, anexando a esse pedido, designadamente, o contrato de trabalho por tempo indeterminado de sua mulher, bem como diversos recibos de salário.

34

Durante a instrução do processo, a Subdelegação recordou a existência de três condenações penais adotadas contra QP, datadas de 7 de setembro, 25 de outubro e 16 de novembro de 2010, a primeira e a terceira por condução de um veículo sem carta de condução bem como a segunda por condução em estado de embriaguez, e convidou‑o a apresentar as suas observações, o que aquele fez.

35

Em 14 de dezembro de 2015, o pedido de QP foi indeferido pela Subdelegação por não estarem preenchidos os requisitos estabelecidos pelo Decreto Real 240/2007, uma vez que o interessado tinha um registo criminal em Espanha e que a sua mulher não dispunha, para ela própria e para os membros da sua família, de recursos financeiros suficientes. Apenas os rendimentos da mulher de QP foram tidos em conta pela Subdelegação.

36

Em 1 de fevereiro de 2016, a Subdelegação confirmou o indeferimento do pedido apresentado por QP. Este último interpôs recurso dessa decisão no Juzgado de lo Contencioso‑Administrativo n.o 2 de Toledo (Tribunal do Contencioso Administrativo n.o 2 de Toledo, Espanha), que concedeu provimento ao seu recurso.

37

A Subdelegação interpôs recurso da sentença proferida por este órgão jurisdicional para o órgão jurisdicional de reenvio.

38

Esse órgão jurisdicional sublinha que recusar conceder um direito de residência a QP obrigaria a sua mulher a abandonar o território da União, uma vez que se trata da única maneira de tornar efetivos o direito e a obrigação de vida em comum fixados pelo direito espanhol.

39

Por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio considera que a Subdelegação indeferiu o pedido de QP com o fundamento de que a sua mulher não dispunha de recursos suficientes, sem examinar as circunstâncias particulares do casamento em causa. Em seu entender, o Estado espanhol baseia‑se exclusivamente e automaticamente na insuficiência dos meios de subsistência próprios do nacional espanhol para recusar conceder ao nacional de um país terceiro um cartão de residência enquanto membro da família de um cidadão da União, o que, enquanto tal, poderia ser considerado uma prática contrária ao artigo 20.o TFUE.

40

Nestas circunstâncias, o Tribunal Superior de Justicia de Castilla‑La Mancha (Tribunal Superior de Justiça de Castela‑Mancha) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

A exigência de o cidadão espanhol, que não exerceu o seu direito de circulação, preencher os requisitos do artigo 7.o[, n.o 1,] do [Decreto Real] 240/2007, como condição necessária para o reconhecimento do direito de residência do seu cônjuge, cidadão de um país terceiro, em conformidade com o artigo 7.o[, n.o 2,] desse [decreto real], pode constituir, no caso de esses requisitos não estarem preenchidos, uma violação do artigo 20.o [TFUE] se, em consequência da recusa desse direito, o cidadão espanhol for obrigado a abandonar o território da União, considerado no seu todo? Para analisar esta situação, há que ter em conta que o artigo 68.o do Código Civil Espanhol estabelece a obrigação de os cônjuges viverem juntos.

2)

Em todo o caso e independentemente do acima exposto, viola o artigo 20.o [TFUE], nos termos já referidos, a prática do Estado espanhol que consiste na aplicação automática da regulamentação contida no artigo 7.o do [Decreto Real] 240/2007, que recusa a autorização de residência ao membro da família de um cidadão da União que nunca exerceu a liberdade de circulação, por este não cumprir os requisitos previstos nessa disposição, sem se ter analisado, concreta e individualmente, se entre esse cidadão da União e o nacional de um país terceiro existe uma relação de dependência tal que, seja por que razão for e tendo em conta as circunstâncias, determine que, se for recusado um direito de residência a um cidadão de um país terceiro, o cidadão da União não possa separar‑se do membro da família que dele depende e tiver de abandonar o território da União? Para analisar esta situação, há que ter em conta a jurisprudência do Tribunal de Justiça, designadamente [o] Acórdão de 8 de maio de 2018, [K.A. e o. (Reagrupamento familiar na Bélgica) (C‑82/16, EU:C:2018:308)].»

41

Por Decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 16 de abril de 2020, os processos C‑451/19 e C‑532/19 foram apensados para efeitos da tramitação processual.

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à segunda questão em cada um dos processos C‑451/19 e C‑532/19

42

Com a sua segunda questão em cada um dos processos C‑451/19 e C‑532/19, que há que examinar em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 20.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que um Estado‑Membro indefira um pedido de reagrupamento familiar, apresentado em benefício de um nacional de um país terceiro, membro da família de um cidadão da União que possui a nacionalidade desse Estado‑Membro e que nunca exerceu a sua liberdade de circulação, unicamente com o fundamento de que esse cidadão da União não dispõe, para si e para esse membro da sua família, de recursos suficientes a fim de não se tornar uma sobrecarga para o regime de segurança social nacional, sem que tenha sido examinado se existe uma relação de dependência entre o referido cidadão da União e o referido membro da sua família de uma natureza tal que, em caso de recusa de concessão de um direito de residência derivado a este último, o cidadão da União seria forçado a deixar o território da União considerado no seu todo e seria, assim, privado do gozo efetivo do essencial dos direitos conferidos pelo seu estatuto de cidadão da União Europeia.

43

Em primeiro lugar, importa sublinhar que o direito da União não se aplica, em princípio, a um pedido de reagrupamento familiar de um nacional de um país terceiro com um membro da sua família, nacional de um Estado‑Membro que nunca exerceu a sua liberdade de circulação, e que, por conseguinte, não se opõe, em princípio, a uma legislação de um Estado‑Membro por força da qual esse reagrupamento familiar está subordinado a uma condição de recursos suficientes como o descrito no número anterior [Acórdão de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 33].

44

Importa, porém, salientar, em segundo lugar, que a imposição sistemática, sem nenhuma exceção, dessa condição é suscetível de violar o direito de residência derivado que deve ser reconhecido, em situações muito particulares, ao abrigo do artigo 20.o TFUE, ao nacional de um país terceiro, membro da família de um cidadão da União [Acórdão de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 34].

45

Há, com efeito, situações muito particulares nas quais, apesar de o direito secundário relativo ao direito de residência dos nacionais de países terceiros não ser aplicável e de o cidadão da União em questão não ter feito uso da sua liberdade de circulação, um direito de residência deve, porém, ser conferido a um nacional de um país terceiro, membro da família desse cidadão, sob pena de violar o efeito útil da cidadania da União, se, como consequência da recusa de tal direito, o referido cidadão se visse, de facto, forçado a deixar o território da União considerado no seu todo, privando‑o, assim, do gozo efetivo do essencial dos direitos conferidos pelo seu estatuto de cidadão da União [Acórdãos de 8 de março de 2011, Ruiz Zambrano, C‑34/09, EU:C:2011:124, n.os 42 a 44, e de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 39].

46

Porém, a recusa de conferir o direito de residência a um nacional de país terceiro só é suscetível de pôr em causa o efeito útil da cidadania da União se existir, entre esse nacional de país terceiro e o cidadão da União, membro da sua família, uma relação de dependência tal que levasse a que este último se visse forçado a acompanhar o nacional de país terceiro em causa e a deixar o território da União considerado no seu todo [Acórdãos de 8 de maio de 2018, K.A. e o. (Reagrupamento familiar na Bélgica), C‑82/16, EU:C:2018:308, n.o 52, e de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 40].

47

Daqui resulta que o nacional de um país terceiro só pode aspirar à concessão de um direito de residência derivado, ao abrigo do artigo 20.o TFUE, se, na falta de concessão desse direito de residência, tanto este último como o cidadão da União, membro da sua família, se virem forçados a deixar o território da União. Por conseguinte, a concessão de tal direito de residência derivado só pode ser equacionada quando o nacional de um país terceiro, membro da família de um cidadão da União, não preencha as condições impostas para obter, com fundamento noutras disposições, designadamente por força da legislação nacional aplicável ao reagrupamento familiar, um direito de residência no Estado‑Membro do qual esse cidadão é nacional [Acórdão de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 41].

48

No entanto, uma vez que tenha sido determinado que nenhum direito de residência ao abrigo do direito nacional ou do direito derivado da União, pode ser concedido ao nacional de um país terceiro, membro da família de um cidadão da União, o facto de existir entre esse nacional e esse cidadão da União uma relação de dependência tal que levaria a forçar o referido cidadão da União a deixar o território da União no seu todo, em caso de saída forçada, para fora do referido território, do membro da sua família, nacional de país terceiro, tem como consequência que o artigo 20.o TFUE obriga, em princípio, o Estado‑Membro em questão a reconhecer um direito de residência derivado a este último [Acórdão de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 42].

49

Em terceiro lugar, embora seja verdade que o Tribunal de Justiça já admitiu que o direito de residência derivado que decorre do artigo 20.o TFUE não é absoluto e que os Estados‑Membros podem recusar concedê‑lo em certas circunstâncias particulares, não é menos verdade que também declarou que o artigo 20.o TFUE não permite aos Estados‑Membros instaurar uma exceção ao direito de residência derivado que este artigo consagra que estaria ligada à exigência segundo a qual o cidadão da União em questão deve dispor de recursos suficientes. Com efeito, recusar ao nacional de um país terceiro, membro da família de um cidadão da União, um direito de residência derivado no território do Estado‑Membro do qual esse cidadão é nacional unicamente com o fundamento de este último não dispõe de recursos suficientes, apesar de existir, entre o referido cidadão e esse nacional de um país terceiro, uma relação de dependência conforme descrita no n.o 46 do presente acórdão, constituiria uma violação do gozo efetivo do essencial dos direitos que decorrem do estatuto de cidadão da União que seria desproporcionada tendo em conta o objetivo prosseguido por essa condição relativa aos recursos, a saber, preservar as finanças públicas do Estado‑Membro em questão [Acórdão de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.os 44 e 46 a 48].

50

Daqui resulta que, quando exista uma relação de dependência, na aceção do n.o 46 do presente acórdão, entre um cidadão da União e o nacional de um país terceiro, membro da sua família, o artigo 20.o TFUE opõe‑se a que um Estado‑Membro preveja uma exceção ao direito de residência derivado que este artigo reconhece a esse nacional de um país terceiro, unicamente com o fundamento de que o referido cidadão da União não dispõe de recursos suficientes [Acórdão de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 49].

51

Por conseguinte, a obrigação imposta ao cidadão da União de dispor de recursos suficientes para ele próprio e para o membro da sua família, nacional de um país terceiro, é suscetível de comprometer o efeito útil do artigo 20.o TFUE se levar a que esse nacional deva deixar o território da União considerado no seu todo, e a que, em razão da existência de uma relação de dependência entre o referido nacional e esse cidadão da União, este último seja, de facto, forçado a acompanhá‑lo e, por conseguinte, a deixar, também ele, o território da União [Acórdão de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 50].

52

Em último lugar, importa recordar, tendo em conta os factos no processo principal C‑532/19, que o artigo 20.o TFUE não afeta a possibilidade de os Estados‑Membros invocarem uma exceção ao direito de residência derivado, que decorre deste artigo, ligada à manutenção da ordem pública e à salvaguarda da segurança pública [Acórdãos de 13 de setembro de 2016, Rendón Marín, C‑165/14, EU:C:2016:675, n.o 81, e de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 44].

53

Todavia, uma recusa do direito de residência, assente nesse motivo, não pode ser baseada unicamente nos antecedentes penais do interessado. Essa recusa pode apenas decorrer, se for o caso, de uma apreciação concreta de todas as circunstâncias pertinentes do caso em apreço, à luz do princípio da proporcionalidade, dos direitos fundamentais cujo respeito o Tribunal de Justiça assegura e, se for o caso, do interesse superior do filho do nacional de um país terceiro em questão [v., neste sentido, Acórdãos de 13 de setembro de 2016, Rendón Marín, C‑165/14, EU:C:2016:675, n.o 85, e de 8 de maio de 2018, K.A. e o. (Reagrupamento familiar na Bélgica), C‑82/16, EU:C:2018:308, n.o 93]. Assim, podem, designadamente, ser tomados em consideração pela autoridade nacional competente a gravidade das infrações cometidas e o grau de severidade dessas condenações, bem como o prazo entre a data da sua prolação e a data em que essa autoridade se pronuncia. Quando a relação de dependência entre esse nacional de um país terceiro e um cidadão da União menor decorre do facto de o primeiro ser o progenitor do segundo, há que ter igualmente em conta a idade dessa criança e o seu estado de saúde, assim como a sua situação familiar e económica (Acórdãos de 13 de setembro de 2016, CS, C‑304/14, EU:C:2016:674, n.o 42, e de 13 de setembro de 2016, Rendón Marín, C‑165/14, EU:C:2016:675, n.o 86).

54

Atendendo às considerações precedentes, há que responder à segunda questão em cada um dos processos C‑451/19 e C‑532/19 que o artigo 20.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que um Estado‑Membro indefira um pedido de reagrupamento familiar apresentado em benefício de um nacional de um país terceiro, membro da família de um cidadão da União que possui a nacionalidade desse Estado‑Membro e que nunca exerceu a sua liberdade de circulação, unicamente com o fundamento de que esse cidadão da União não dispõe, para si e para esse membro da sua família, de recursos suficientes a fim de não se tornar um encargo para o sistema nacional de segurança social, sem que tenha sido examinado se existe uma relação de dependência entre o referido cidadão da União e o referido membro da sua família de uma natureza tal que, em caso de recusa de concessão de um direito de residência derivado a este último, o cidadão da União seria forçado a deixar o território da União considerado no seu todo e seria, assim, privado do gozo efetivo do essencial dos direitos conferidos pelo seu estatuto de cidadão da União.

Quanto à primeira questão no processo C‑532/19

55

Com a sua primeira questão no processo C‑532/19, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 20.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que existe uma relação de dependência, suscetível de justificar a concessão de um direito de residência derivado ao abrigo deste artigo, unicamente pelo facto de o nacional de um Estado‑Membro, maior de idade e que nunca tenha exercido a sua liberdade de circulação, e o seu cônjuge, maior de idade e nacional de um país terceiro, deverem viver juntos, por força das obrigações decorrentes do casamento segundo o direito do Estado‑Membro de que o cidadão da União é nacional e no qual esse casamento foi contraído.

56

Em primeiro lugar, há que recordar que, diferentemente dos menores de idade e, por maioria de razão, se estes forem crianças de tenra idade, um adulto está, em princípio, em condições de levar uma existência independente dos membros da sua família. Daqui decorre que o reconhecimento, entre dois adultos, membros de uma mesma família, de uma relação de dependência suscetível de criar um direito de residência derivado ao abrigo do artigo 20.o TFUE só pode ser ponderada em casos excecionais, nos quais, tendo em conta todas as circunstâncias pertinentes, a pessoa em causa não poderia, de modo nenhum, ser separada do membro da sua família de que depende [Acórdãos de 8 de maio de 2018, K.A. e o. (Reagrupamento familiar na Bélgica), C‑82/16, EU:C:2018:308, n.o 65, e de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 56].

57

Decorre igualmente da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o simples facto de poder parecer desejável a um nacional de um Estado‑Membro, por razões económicas ou a fim de manter a unidade familiar no território da União, que membros da sua família, que não têm a nacionalidade de um Estado‑Membro possam residir com ele no território da União não basta, por si só, para considerar que o cidadão da União seria forçado a deixar o território da União se esse direito não for concedido [Acórdãos de 15 de novembro de 2011, Dereci e o., C‑256/11, EU:C:2011:734, n.o 68, e de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 57].

58

Assim, a existência de um vínculo familiar, seja este de natureza biológica ou jurídica, entre o cidadão da União e o membro da sua família, nacional de país terceiro, não é suficiente para justificar que seja reconhecido, ao abrigo do artigo 20.o TFUE, um direito de residência derivado a esse membro da família no território do Estado‑Membro do qual o cidadão da União é nacional [Acórdãos de 8 de maio de 2018, K.A. e o. (Reagrupamento familiar na Bélgica), C‑82/16, EU:C:2018:308, n.o 75, e de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 58].

59

O Tribunal de Justiça também declarou que um princípio de direito internacional, reafirmado no artigo 3.o do Protocolo n.o 4 da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950, que o direito da União não pode ser suposto ignorar nas relações entre os Estados‑Membros, se opõe a que um Estado‑Membro recuse aos seus próprios nacionais o direito de entrarem no seu território e de aí residirem a qualquer título (Acórdão de 4 de dezembro de 1974, van Duyn, 41/74, EU:C:1974:133, n.o 22). Sendo um direito de residência incondicional assim reconhecido aos nacionais de um Estado‑Membro no território deste último, um Estado‑Membro não pode impor legalmente a um dos seus nacionais que deixe o seu território a fim, designadamente, de respeitar as obrigações que decorram do seu casamento, sem violar tal princípio de direito internacional [Acórdão de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 60].

60

Por conseguinte, mesmo que, como indica o órgão jurisdicional de reenvio a respeito do direito espanhol, as regras de um Estado‑Membro relativas ao casamento imponham ao nacional desse Estado‑Membro e ao seu cônjuge que vivam juntos, essa obrigação jamais pode, porém, forçar juridicamente esse nacional a deixar o território da União, quando não tenha sido concedido ao seu cônjuge, nacional de um país terceiro, não um título de residência no território do referido Estado‑Membro. Tendo em conta as considerações precedentes, essa obrigação legal imposta aos cônjuges de viverem juntos não basta, por si só, para demonstrar que existe, entre eles, uma relação de dependência de natureza tal que imporia a esse cidadão da União, em caso de saída forçada do seu cônjuge para fora do território da União, a acompanhá‑lo e, portanto, a deixar, também, ele o território da União [Acórdão de 27 de fevereiro de 2020, Subdelegación del Gobierno en Ciudad Real (Cônjuge de um cidadão da União), C‑836/18, EU:C:2020:119, n.o 61].

61

De qualquer modo, resulta da decisão de reenvio que a obrigação imposta aos cônjuges de viverem juntos, que decorre do direito espanhol, não é executória pela via judicial.

62

Dito isto, importa salientar, em segundo lugar, que resulta igualmente do pedido de decisão prejudicial no processo C‑532/19 que o cidadão da União e o seu cônjuge, nacional de um país terceiro, são os progenitores de um nacional espanhol menor de idade que nunca exerceu a sua liberdade de circulação na União.

63

Ora, em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, no âmbito do processo de cooperação entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça instituído pelo artigo 267.o TFUE, cabe a este dar ao órgão jurisdicional nacional uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido, extraindo, se for o caso, do conjunto dos elementos fornecidos por esse órgão jurisdicional, designadamente da fundamentação da decisão de reenvio, os elementos do direito da União que requerem interpretação tendo em conta o objeto do litígio no processo principal (Acórdão de 22 de abril de 2021, Profi Credit Slovakia, C‑485/19, EU:C:2021:313, n.os 49 e 50 e jurisprudência referida).

64

Por conseguinte, importa ainda examinar se o artigo 20.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que uma relação de dependência, suscetível de justificar a concessão de um direito de residência derivado a um nacional de um país terceiro, é suscetível de existir quando esse nacional e o seu cônjuge, nacional de um Estado‑Membro que nunca exerceu a sua liberdade de circulação, são os progenitores de um menor, nacional do mesmo Estado‑Membro e que também não tenham exercido a sua liberdade de circulação.

65

A este respeito, cabe recordar que o Tribunal de Justiça já declarou como elementos pertinentes, a fim de determinar se a recusa em reconhecer o direito de residência derivado ao progenitor, nacional de um país terceiro, de uma criança r, cidadã da União, implica, para esta, a privação do gozo efetivo do essencial dos direitos conferidos pelo seu estatuto forçando essa criança, de facto, a acompanhar o seu progenitor e, portanto, a deixar o território da União considerado no seu todo, a questão da guarda da criança e a questão de saber se o encargo legal, financeiro ou afetivo dessa criança é assumido pelo progenitor nacional de um país terceiro [Acórdãos de 10 de maio de 2017, Chavez‑Vilchez e o., C‑133/15, EU:C:2017:354, n.o 68, e de 8 de maio de 2018, K. A. e o. (Reagrupamento familiar na Bélgica), C‑82/16, EU:C:2018:308, n.o 70].

66

Mais particularmente, para apreciar o risco de que a criança em questão, cidadã da União, seja forçada a deixar o território da União se fosse recusada ao seu progenitor, nacional de país terceiro, a concessão de um direito de residência derivado no Estado‑Membro em questão, há que determinar se esse progenitor assume a guarda efetiva da criança e se existe uma relação de dependência efetiva entre eles. No âmbito dessa apreciação, as autoridades competentes devem ter em conta o direito ao respeito da vida familiar, como enunciado no artigo 7.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), uma vez que este artigo deve ser lido em conjugação com a obrigação de tomar em consideração o interesse superior da criança, reconhecido no artigo 24.o, n.o 2, da Carta, com o qual se confunde o direito de essa criança manter regularmente relações pessoais e contactos diretos com ambos os progenitores, como consagrado no artigo 24.o, n.o 3, da Carta [v., neste sentido, Acórdãos de 1 de julho de 2010, Povse, C‑211/10 PPU, EU:C:2010:400, n.o 64, e de 8 de maio de 2018, K.A. e o. (Reagrupamento familiar na Bélgica), C‑82/16, EU:C:2018:308, n.o 71 e jurisprudência referida].

67

A circunstância de o outro progenitor, cidadão da União, ser realmente capaz de assumir sozinho o encargo quotidiano e efetivo da criança, e de estar pronto a fazê‑lo, constitui um elemento pertinente, mas não é, por si só, suficiente para se poder concluir que não existe, entre o progenitor nacional de país terceiro e a criança, uma relação de dependência tal que este último seria forçado a deixar o território da União se um direito de residência fosse recusado a esse nacional de um país terceiro. Com efeito, tal conclusão deve assentar na tomada em conta, no interesse superior da criança em causa, de todas as circunstâncias do caso em apreço, nomeadamente, da sua idade, do seu desenvolvimento físico e emocional, do grau da sua relação afetiva tanto com o progenitor cidadão da União como com o progenitor nacional de um país terceiro e do risco que a separação deste último acarretaria para o equilíbrio dessa criança [Acórdãos de 10 de maio de 2017, Chavez‑Vilchez e o., C‑133/15, EU:C:2017:354, n.o 72, e de 8 de maio de 2018, K.A. e o. (Reagrupamento familiar na Bélgica), C‑82/16, EU:C:2018:308, n.o 72].

68

Assim, o facto de o progenitor, nacional de um país terceiro, coabitar com o menor, cidadão da União, é um dos elementos pertinentes a tomar em consideração para determinar a existência de uma relação de dependência entre eles, sem, no entanto, dela ser uma condição necessária [Acórdão de 8 de maio de 2018, K.A. e o. (Reagrupamento familiar na Bélgica), C‑82/16, EU:C:2018:308, n.o 73 e jurisprudência referida].

69

Além disso, tendo em conta, nomeadamente, o que foi salientado nos n.os 65 a 67 do presente acórdão, quando o cidadão da União menor de idade coabita de modo estável com os seus dois progenitores e que, portanto, a guarda dessa criança bem como o encargo legal, afetivo e financeiro desta são partilhados quotidianamente por esses dois progenitores, pode presumir‑se, de maneira ilidível, que existe uma relação de dependência entre esse cidadão da União menor de idade e o seu progenitor, nacional de um país terceiro, independentemente do facto de, como foi sublinhado no n.o 59 do presente acórdão, o outro progenitor dessa criança dispor, enquanto nacional do Estado‑Membro no território do qual está estabelecida essa família, de um direito incondicional de permanecer no território desse Estado‑Membro.

70

Resulta de todas as considerações precedentes que há que responder à primeira questão no processo C‑532/19 que o artigo 20.o TFUE deve ser interpretado no sentido, por um lado, de que uma relação de dependência, suscetível de justificar a concessão de um direito de residência derivado ao abrigo deste artigo, não existe unicamente pelo facto de o nacional de um Estado‑Membro, maior de idade e que nunca exerceu a sua liberdade de circulação, e o seu cônjuge, maior de idade e nacional de um país terceiro, deverem viver juntos, por força das obrigações decorrentes do casamento segundo o direito do Estado‑Membro de que o cidadão da União é nacional e no qual o casamento foi contraído e, por outro, de que, quando o cidadão da União é menor, a apreciação da existência de uma relação de dependência suscetível de justificar a concessão ao progenitor dessa criança, nacional de um país terceiro, de um direito de residência derivado ao abrigo do referido artigo deve basear‑se na tomada em consideração, no interesse superior da criança, de todas as circunstâncias do caso concreto. Quando esse progenitor coabita de modo estável com o outro progenitor, cidadão da União, desse menor, essa relação de dependência é presumida de maneira ilidível.

Quanto à primeira questão no processo C‑451/19

71

Com a sua primeira questão no processo C‑451/19, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 20.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que uma relação de dependência, suscetível de justificar a concessão de um direito de residência derivado, ao abrigo deste artigo, em benefício do filho menor, nacional de um país terceiro, do cônjuge, ele próprio nacional de um país terceiro, de um cidadão da União que nunca exerceu a sua liberdade de circulação, existe quando esse cidadão da União e o seu cônjuge devem viver juntos, por força das obrigações decorrentes do casamento segundo o direito do Estado‑Membro de que o cidadão da União é nacional e no qual esse casamento foi contraído.

72

A título preliminar, importa precisar que, ainda que, desde a adoção da decisão de reenvio, XU tenha atingido a maioridade, o direito eventual de este último beneficiar de um título de residência, ao abrigo do artigo 20.o TFUE, em todo o caso para o período durante o qual ainda era menor, poderia ter consequências que vão além dessa própria concessão, tais como uma indemnização em razão da perda de prestações sociais, ou mesmo, sendo o caso, o direito a obter outro título de residência com fundamento numa residência regular no território espanhol (v., por analogia, Acórdão de 13 de setembro de 2016, Rendón Marín, C‑165/14, EU:C:2016:675, n.o 30). Por conseguinte, o facto de XU ser agora maior de idade não é pertinente para responder à primeira questão no processo C‑451/19.

73

Feita esta clarificação, importa, em primeiro lugar, salientar que, na medida em que, como foi recordado no n.o 47 do presente acórdão, o direito de residência derivado suscetível de ser concedido a um nacional de um país terceiro ao abrigo do artigo 20.o TFUE tem caráter subsidiário, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio examinar se XU não podia beneficiar, ao abrigo de outra disposição do direito da União, de um direito de residência no território espanhol.

74

A fim de dar a esse órgão jurisdicional uma resposta útil, há que salientar, antes de mais, que, como resulta do pedido de decisão prejudicial, XU é o filho de uma nacional de um país terceiro, que dispõe de um título de residência no território espanhol e que, à data em que o pedido de título de residência a favor de XU foi indeferido, este último era menor.

75

Tendo em conta estes elementos, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio examinar se XU não podia beneficiar, nessa data, de um direito de residência no território espanhol ao abrigo do artigo 4.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2003/86.

76

Em seguida, importa sublinhar que, contrariamente ao que o Governo espanhol alega no Tribunal de Justiça, a simples circunstância de a mãe de XU ter casado com um nacional espanhol e de ter dado à luz um filho de nacionalidade espanhola não é suscetível de excluir que um direito de residência tenha podido dever ser reconhecido a XU por força da Diretiva 2003/86.

77

Com efeito, como salientou o advogado‑geral nos n.os 100 a 108 das suas conclusões, embora seja verdade que o artigo 3.o, n.o 3, dessa diretiva prevê que não é aplicável aos familiares de cidadãos da União, não é menos verdade que, tendo em conta o objetivo prosseguido pela referida diretiva, que é favorecer o reagrupamento familiar, e a proteção que visa conceder aos nacionais de países terceiros, nomeadamente aos menores, a aplicabilidade da mesma diretiva a favor de um menor nacional de um país terceiro não pode ser excluída unicamente pelo facto de o seu progenitor, nacional de um país terceiro, ser igualmente o progenitor de um cidadão da União, nascido de uma união com um nacional de um Estado‑Membro (v., por analogia, Acórdão de 6 de dezembro de 2012, O e o., C‑356/11 e C‑357/11, EU:C:2012:776, n.o 69).

78

Por último, importa precisar que, embora, como parece ser o caso em apreço, nenhum pedido de reagrupamento familiar tenha, ao abrigo da Diretiva 2003/86, sido apresentado no Estado‑Membro em causa, nos termos, continua a ser possível às autoridades desse Estado‑Membro, uma vez que lhes é submetido um pedido para que um nacional de um país terceiro obtenha um direito de residência derivado, ao abrigo do artigo 20.o TFUE, de conceder um título de residência a esse nacional com fundamento nessa diretiva, se se afigurar que o referido nacional preenche as condições para beneficiar do direito ao reagrupamento familiar consagrado pela referida diretiva.

79

Em segundo lugar, na hipótese de XU não dispor de nenhum título de residência ao abrigo de uma disposição de direito derivado da União ou de direito nacional, há que examinar se o artigo 20.o TFUE é suscetível de permitir a concessão de um direito de residência derivado a favor desse nacional de um país terceiro.

80

A este respeito, importa salientar que, como foi demonstrado no n.o 70 do presente acórdão, a simples circunstância de que, por força do direito espanhol, a mãe de XU e o seu cônjuge deverem coabitar não pode constituir uma relação de dependência entre eles, na aceção do artigo 20.o TFUE. Tal circunstância não pode, por conseguinte, justificar que XU obtenha um direito de residência ao abrigo deste artigo.

81

Não obstante, a mãe de XU é igualmente mãe de um cidadão da União menor que nunca exerceu a sua liberdade de circulação. Nestas condições, há ainda que examinar, ao abrigo do artigo 20.o TFUE, se, à data em que o pedido de concessão de um título de residência a XU foi indeferido, a partida forçada deste último teria sido suscetível de impor, de facto, à sua mãe que deixasse o território da União considerado no seu todo, em razão do vínculo de dependência que teria existido entre eles e, em caso afirmativo, se a partida da mãe de XU teria igualmente obrigado, de facto, o seu filho menor, cidadão da União, a deixar o território da União considerado no seu todo, em razão da relação de dependência existente entre esse cidadão da União e a sua mãe.

82

Nesta perspetiva, importa salientar, em primeiro lugar, que, à data em que o pedido de concessão de um título de residência a XU foi indeferido, não é impossível que a saída forçada de XU do território espanhol teria forçado, de facto, a sua mãe a deixar o território da União considerado no seu todo. Com efeito, nessa data, XU ainda era menor e a sua mãe tinha a sua guarda exclusiva, pelo que não se pode excluir que existia, na referida data, uma relação de dependência entre estes dois nacionais de países terceiros.

83

A este respeito, quando, como no caso em apreço, há que examinar, a título excecional, se existe uma relação de dependência entre nacionais de países terceiros para efeitos da aplicação do artigo 20.o TFUE, essa apreciação deve ser realizada tendo em conta, mutatis mutandis, os critérios enunciados nos n.os 65 a 69 do presente acórdão, entendendo‑se, contudo, que, no caso de ser o filho menor, nacional de um país terceiro, que é objeto de uma recusa de título de residência no território de um Estado‑Membro e que, portanto, corre o risco de ser legalmente forçado a deixar o território da União considerado no seu todo, há que examinar se o seu progenitor, ao residir com ele nesse Estado‑Membro, seria, de facto, forçado a acompanhá‑lo. Por analogia com o que foi exposto no n.o 67 do presente acórdão, a circunstância de o seu outro progenitor poder efetivamente tomar a seu cargo esse menor, de um ponto de vista legal, financeiro e afetivo, incluindo no seu país de origem, constitui, a este respeito, um elemento pertinente, embora não seja, enquanto tal, suficiente para concluir que o progenitor residente no território do referido Estado‑Membro não seria forçado, de facto, a deixar o território da União.

84

Em segundo lugar, admitindo que a mãe de XU teria sido forçada, de facto, a deixar o território da União considerado no seu conjunto, a fim de acompanhar XU, essa partida poderia igualmente ter obrigado o seu filho menor, cidadão da União, a deixar esse território. Teria sido esse o caso se uma relação de dependência entre esse cidadão e a sua mãe devesse ter sido constatada, com base nos critérios recordados nos n.os 65 a 69 do presente acórdão.

85

Por conseguinte, na data em que o pedido de concessão de um título de residência a XU foi indeferido, a partida forçada deste último do território espanhol teria podido, na prática, forçar não só a sua mãe, nacional de um país terceiro, mas igualmente o outro filho desta, cidadão da União, a deixar o território da União considerado no seu todo. Cabe, porém, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar esta hipótese. Se esta se verificar, a fim de impedir que esse cidadão da União seja privado pela sua partida do gozo do essencial dos direitos que lhe são conferidos pelo seu estatuto, um direito de residência derivado devia ter sido reconhecido ao seu meio‑irmão, XU, ao abrigo do artigo 20.o TFUE.

86

Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à primeira questão no processo C‑451/19 que o artigo 20.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que uma relação de dependência, suscetível de justificar a concessão de um direito de residência derivado ao abrigo deste artigo em beneficio do filho menor, nacional de um país terceiro, do cônjuge, ele próprio nacional de um país terceiro, de um cidadão da União que nunca exerceu a sua liberdade de circulação existe quando da união entre esse cidadão da União e o seu cônjuge tenha nascido um filho, cidadão da União que nunca exerceu a sua liberdade de circulação, e este último fosse forçado a deixar o território da União, considerado no seu todo, se o filho menor, nacional de um país terceiro, fosse forçado a deixar o território do Estado‑Membro em questão.

Quanto às despesas

87

Revestindo o processo, quanto às partes nas causas principais, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

 

1)

O artigo 20.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que um Estado Membro indefira um pedido de reagrupamento familiar, apresentado em benefício de um nacional de um país terceiro, membro da família de um cidadão da União que possui a nacionalidade desse Estado Membro e que nunca exerceu a sua liberdade de circulação, unicamente com o fundamento de que esse cidadão da União não dispõe, para si e para esse membro da sua família, de recursos suficientes a fim de não se tornar um encargo para o sistema nacional de segurança social nacional, sem que tenha sido examinado se existe uma relação de dependência entre o referido cidadão da União e o referido membro da sua família de uma natureza tal que, em caso de recusa de concessão de um direito de residência derivado a este último, o cidadão da União seria forçado a deixar o território da União Europeia considerado no seu todo e seria, assim, privado do gozo efetivo do essencial dos direitos conferidos pelo seu estatuto de cidadão da União.

 

2)

O artigo 20.o TFUE deve ser interpretado no sentido, por um lado, de que uma relação de dependência, suscetível de justificar a concessão de um direito de residência derivado ao abrigo deste artigo, não existe unicamente pelo facto de o nacional de um Estado Membro, maior de idade e que nunca exerceu a sua liberdade de circulação, e o seu cônjuge, maior de idade e nacional de um país terceiro, deverem viver juntos, por força das obrigações decorrentes do casamento segundo o direito do Estado‑Membro de que o cidadão da União é nacional e no qual o casamento foi contraído e, por outro, de que, quando o cidadão da União é menor, a apreciação da existência de uma relação de dependência suscetível de justificar a concessão ao progenitor dessa criança, nacional de um país terceiro, de um direito de residência derivado ao abrigo do referido artigo, deve basear‑se na tomada em consideração, no interesse superior da criança, de todas as circunstâncias do caso concreto. Quando esse progenitor coabita de modo estável com o outro progenitor, cidadão da União, desse menor, essa relação de dependência é presumida de maneira ilidível.

 

3)

O artigo 20.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que uma relação de dependência, suscetível de justificar a concessão de um direito de residência derivado ao abrigo deste artigo em benefício do filho menor, nacional de um país terceiro, do cônjuge, ele próprio nacional de um país terceiro, de um cidadão da União que nunca exerceu a sua liberdade de circulação existe quando da união entre esse cidadão da União e o seu cônjuge tenha nascido um filho, cidadão da União que nunca exerceu a sua liberdade de circulação, e este último fosse forçado a deixar o território da União, considerado no seu todo, se o filho menor, nacional de um país terceiro, fosse forçado a deixar o território do Estado‑Membro em questão.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.

Top