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Document 62019CJ0431

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Décima Secção) de 17 de dezembro de 2020.
    Inpost Paczkomaty sp. z o.o. e Inpost S.A. contra Comissão Europeia.
    Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Artigo 106.o, n.o 2, TFUE — Serviços de interesse económico geral (SIEG) — Enquadramento da União Europeia — Aplicação aos auxílios de Estado sob a forma de compensações de serviço público — Setor postal — Diretiva 97/67/CE — Artigo 7.o — Compensação do custo líquido resultante das obrigações de serviço universal — Decisão que declara o auxílio compatível com o mercado interno.
    Processos apensos C-431/19 P e C-432/19 P.

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2020:1051

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

    17 de dezembro de 2020 ( *1 )

    «Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Artigo 106.o, n.o 2, TFUE — Serviços de interesse económico geral (SIEG) — Enquadramento da União Europeia — Aplicação aos auxílios de Estado sob a forma de compensações de serviço público — Setor postal — Diretiva 97/67/CE — Artigo 7.o — Compensação do custo líquido resultante das obrigações de serviço universal — Decisão que declara o auxílio compatível com o mercado interno»

    Nos processos apensos C‑431/19 P e C‑432/19 P,

    que têm por objeto dois recursos de um acórdão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interpostos em 5 de junho de 2019,

    Inpost Paczkomaty sp. z o.o., com sede em Cracóvia (Polónia), representada por M. Doktór, radca prawny,

    recorrente no processo C‑431/19 P,

    e

    Inpost S.A., com sede em Cracóvia (Polónia), representada por W. Knopkiewicz, radca prawny,

    recorrente no processo C‑432/19 P,

    sendo as outras partes no processo:

    Comissão Europeia, representada por D. Recchia, K. Blanck e K. Herrmann, na qualidade de agentes,

    recorrida em primeira instância,

    República da Polónia, representada por B. Majczyna, na qualidade de agente,

    interveniente em primeira instância,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

    composto por: M. Ilešič, presidente de secção, C. Lycourgos (relator) e I. Jarukaitis, juízes,

    advogado‑geral: E. Tanchev,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    Com os seus recursos, a Inpost Paczkomaty sp. z o.o. e a Inpost S.A. pedem a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 19 de março de 2019, Inpost Paczkomaty e Inpost/Comissão (T‑282/16 e T‑283/16, a seguir «acórdão recorrido, EU:T:2019:168), que negou provimento aos seus recursos de anulação da Decisão C(2015) 8236 final da Comissão, de 26 de novembro de 2015, através da qual não levantou objeções à medida notificada pelas autoridades polacas relativa ao auxílio concedido à Poczta Polska sob a forma de compensação do custo líquido resultante de essa sociedade cumprir as suas obrigações de serviço postal universal pelo período compreendido entre 1 de janeiro de 2013 e 31 de dezembro de 2015 (a seguir «decisão controvertida»).

    Quadro jurídico

    Direito da União

    Diretiva Postal

    2

    Sob o título «Financiamento do serviço universal», o artigo 7.o da Diretiva 97/67/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de dezembro de 1997, relativa às regras comuns para o desenvolvimento do mercado interno dos serviços postais comunitários e a melhoria da qualidade de serviço (JO 1998, L 15, p. 14), conforme alterada pela Diretiva 2008/6/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de fevereiro de 2008 (JO 2008, L 52, p. 3, e retificação no JO 2015, L 225, p. 49) (a seguir «Diretiva Postal»), dispõe:

    «1.   Os Estados‑Membros não concedem nem mantêm em vigor direitos exclusivos ou especiais para o estabelecimento e a prestação de serviços postais. Os Estados‑Membros podem financiar a prestação do serviço universal de acordo com um ou mais dos meios previstos nos n.os 2, 3 e 4 ou com outros meios compatíveis com o Tratado.

    2.   Os Estados‑Membros podem assegurar a prestação do serviço universal através da adjudicação desse serviço de acordo com as regras e a regulamentação aplicáveis aos contratos públicos, incluindo, como previsto na Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais[,] o diálogo concorrencial e os procedimentos diretamente negociados, com ou sem publicação de anúncio de concurso [(JO 2004, L 134, p. 114)].

    3.   Caso um Estado‑Membro determine que as obrigações do serviço universal previstas na presente diretiva implicam um custo líquido, calculado de acordo com o anexo I, e representam um encargo financeiro não razoável para o prestador ou os prestadores do serviço universal, pode estabelecer:

    a)

    Um mecanismo para compensar a empresa ou empresas em causa através de fundos públicos; ou

    b)

    Um mecanismo para partilhar o custo líquido das obrigações do serviço universal entre os prestadores de serviços e/ou os utilizadores.

    4.   Quando o custo líquido é partilhado nos termos da alínea b) do n.o 3, os Estados‑Membros podem criar um fundo de compensação que pode ser financiado por taxas aplicáveis aos prestadores de serviço e/ou aos utilizadores e que é gerido para esse efeito por um organismo independente do beneficiário ou beneficiários. Os Estados‑Membros podem subordinar a concessão de autorizações aos prestadores de serviços, ao abrigo do n.o 2 do artigo 9.o, à obrigação de uma contribuição financeira para esse fundo ou ao cumprimento das obrigações do serviço universal. As obrigações de serviço universal do prestador ou prestadores de serviço universal estabelecidas no artigo 3.o podem beneficiar desta forma de financiamento.

    5.   Os Estados‑Membros devem assegurar que, aquando da criação do fundo de compensação e da fixação do nível das contribuições financeiras referidas nos n.os 3 e 4, sejam respeitados os princípios da transparência, da não discriminação e da proporcionalidade. As decisões tomadas ao abrigo dos n.os 3 e 4 devem basear‑se em critérios objetivos e verificáveis e ser publicadas.»

    3

    Segundo o artigo 8.o dessa diretiva, o artigo 7.o não prejudica o direito de os Estados‑Membros organizarem a colocação de marcos e caixas de correio na via pública, a emissão de selos postais e o serviço de correio registado utilizado em procedimentos judiciais ou administrativos, em conformidade com a respetiva legislação nacional.

    Enquadramento SIEG

    4

    A Comunicação da Comissão Europeia, intitulada «Enquadramento da União Europeia aplicável aos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público (2011)» (JO 2012, C 8, p. 15, a seguir «Enquadramento SIEG»), dispõe, no ponto 14 da secção 2.2, com a epígrafe «Verdadeiro serviço de interesse económico geral a que se refere o artigo 106.o [TFUE]»:

    «Para efeitos de aplicação dos princípios enunciados na presente comunicação, os Estados‑Membros devem demonstrar que ponderaram de forma adequada as necessidades do serviço público, através de uma consulta pública ou de outros instrumentos úteis, a fim de ter em conta os interesses dos utilizadores e prestadores. Esta regra não se aplica quando é evidente que uma nova consulta não proporcionará qualquer valor acrescentado significativo em relação a uma consulta recentemente realizada.»

    5

    Sob a secção 2.6, com a epígrafe «Observância das regras da União em matéria de contratos públicos», o ponto 19 do Enquadramento SIEG dispõe:

    «Os auxílios só serão considerados compatíveis com o mercado interno com base no artigo 106.o, n.o 2, [TFUE] quando as autoridades responsáveis, ao atribuírem a prestação do serviço à empresa em causa, tiverem cumprido ou se se tiverem comprometido a cumprir as regras da União aplicáveis em matéria de contratos públicos. Tal inclui quaisquer requisitos em matéria de transparência, igualdade de tratamento e não discriminação diretamente resultantes do Tratado e, quando aplicável, do direito secundário da União. Considera‑se que os auxílios que não cumprem tais regras e requisitos afetam o desenvolvimento do comércio numa medida contrária aos interesses da União, na aceção do artigo 106.o, n.o 2, do Tratado.»

    6

    Sob a secção 2.8, com a epígrafe «Montante da compensação», o ponto 25 desse enquadramento precisa:

    «Ao abrigo da metodologia dos custos líquidos evitados, os custos líquidos necessários ou que se prevê que sejam necessários para cumprir a obrigação de serviço público, são calculados como a diferença entre os custos líquidos para o prestador do serviço quando executa a obrigação de serviço público e o custo ou lucro líquidos do mesmo prestador que opera sem essa obrigação. Deve ser atribuída a devida atenção à determinação correta dos custos que o prestador do serviço evitaria e das receitas que não receberia na ausência da obrigação de serviço público. No quadro do cálculo do custo líquido, devem ser avaliados os benefícios, incluindo os imateriais, tanto quanto possível, para o prestador do SIEG.»

    7

    Sob a secção 2.9, com a epígrafe «Requisitos adicionais que podem ser necessários para garantir que o desenvolvimento das trocas comerciais não seja afetado de maneira contrária aos interesses da União», os pontos 51, 52 e 56 desse enquadramento dispõem:

    «51. Os requisitos estabelecidos nas secções 2.1 a 2.8 são normalmente suficientes para garantir que o auxílio não falseia a concorrência numa medida contrária aos interesses da União.

    52. É possível, contudo, que, em certas circunstâncias excecionais, continuem por resolver graves distorções da concorrência no mercado interno e que os auxílios afetem as trocas comerciais numa medida contrária aos interesses da União.

    […]

    56. Outra situação em que pode ser necessária uma avaliação mais aprofundada é quando o Estado‑Membro atribui a um prestador de serviço público, sem um procedimento de seleção concorrencial, a missão de prestar um SIEG num mercado não reservado, onde já estão a ser prestados serviços muito semelhantes ou seja de prever que tais serviços venham a ser prestados num futuro próximo, na ausência do SIEG. Tais efeitos adversos no desenvolvimento do comércio podem ser mais acentuados quando o SIEG é oferecido a uma tarifa inferior aos custos de qualquer prestador real ou potencial, provocando assim o encerramento do mercado. A Comissão, embora respeitando plenamente a vasta margem discricionária dos Estados‑Membros quanto à definição do SIEG, pode assim exigir alterações, por exemplo, na atribuição do auxílio, se puder ser razoavelmente demonstrado que é possível prestar o mesmo SIEG em condições equivalentes para os utilizadores, de uma forma que induza menos distorções e a um custo inferior para o Estado.»

    8

    O ponto 60 do Enquadramento SIEG indica, sob a secção 2.10, com a epígrafe «Transparência»:

    «Por cada compensação de SIEG abrangida pelo âmbito da presente comunicação, o Estado‑Membro em causa deve publicar as seguintes informações na Internet ou noutro suporte adequado:

    a)

    Os resultados da consulta pública ou de outros instrumentos adequados mencionados no ponto 14;

    b)

    O teor e a duração das obrigações de serviço público;

    c)

    A empresa e, se for caso disso, o território em causa;

    d)

    os montantes de auxílio concedidos anualmente à empresa.»

    Direito polaco

    9

    Na Polónia, a Diretiva Postal foi transposta pela ustawa Prawo pocztowe (Lei Postal), de 23 de novembro de 2012 (Dz. U. de 2012, posição 1529) (a seguir «Lei Postal»). Nos termos do artigo 3.o, ponto 30, da Lei Postal, nesse Estado‑Membro, os serviços abrangidos pelo serviço universal são os que incluem a remessa de cartas e de encomendas postais, bem como o correio para cegos, que não são efetuados pelo operador designado no âmbito das suas obrigações do serviço universal.

    10

    Resulta dos artigos 45.o e 46.o dessa lei que, em termos de serviço postal universal, o encaminhamento e a distribuição de cartas e de encomendas postais devem ser assegurados em todos os dias úteis e, no mínimo, cinco dias por semana. O peso dos envios postais em causa não pode ultrapassar 2000 gramas, podendo, contudo, o das encomendas ascender a 10000 gramas.

    Antecedentes do litígio

    11

    A Poczta Polska (a seguir «PP») é uma sociedade anónima polaca cujo único acionista é a Fazenda Pública da República da Polónia. À época dos factos em causa, a sua atividade abrangia essencialmente os serviços postais universais e de transporte de encomendas, serviços esses de que era, então, o principal operador na Polónia.

    12

    Com base no artigo 178.o, n.o 1, da Lei Postal, a execução da reforma dos serviços postais polacos foi confiada, num primeiro momento, e por um período de três anos a contar de 1 de janeiro de 2013, à PP, que foi assim encarregada de assumir as obrigações de prestadora do serviço postal universal em todo o território polaco.

    13

    As autoridades polacas notificaram então a Comissão, em 10 de junho de 2014, de um regime de auxílio relativo, por um lado, a um mecanismo de repartição do custo líquido das obrigações de serviço universal e, por outro, da instituição de um fundo de compensação, complementar à instituição desse mecanismo.

    14

    O fundo de compensação era financiado em parte pelas contribuições que os operadores postais em causa eram obrigados a pagar ao referido fundo e em parte pelo orçamento do Estado.

    15

    Em especial, a obrigação de contribuição prevista no artigo 108.o, n.o 2, da Lei Postal visava os operadores postais que prestavam serviços universais equivalentes, cujos rendimentos anuais auferidos a esse título deviam ser, no entanto, superiores a 1 milhão de zlótis polacos (PLN) (cerca de 218603 euros). Em todos os casos, o montante devido por cada operador em causa não podia ultrapassar anualmente o limite máximo de 2 % do montante dos rendimentos provenientes das suas prestações de serviço universal.

    16

    Inicialmente previsto para abranger o período compreendido entre 2013 e 2026, esse mecanismo acabou por ser limitado, por ofício enviado pelas autoridades competentes polacas à Comissão em 5 de janeiro de 2015, ao período compreendido entre 2013 e 2015 (a seguir «regime nacional de compensação» ou «medida em causa»).

    17

    As recorrentes, que fazem parte do grupo polaco Integer.pl S.A., eram obrigadas a contribuir para o financiamento do fundo de compensação.

    18

    Em 26 de novembro de 2015, a Comissão adotou, nos termos do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho, de 13 de julho de 2015, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o [TFUE] (JO 2015, L 248, p. 9), a decisão controvertida, na qual decidiu não levantar objeções ao regime nacional de compensação, por se tratar de um auxílio de Estado compatível com o mercado interno. Segundo a Comissão, de acordo com os critérios estabelecidos nas secções 2.1 a 2.8 do Enquadramento SIEG, a medida em causa não é suscetível de afetar as trocas comerciais numa medida contrária aos interesses da União. Além disso, os princípios do funcionamento do fundo de compensação não implicavam quaisquer graves distorções da concorrência, não impondo, portanto, quaisquer condições adicionais para garantir que o desenvolvimento das trocas comerciais não seria afetado de maneira incompatível com os interesses da União.

    Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

    19

    Por petições entradas na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de maio de 2016, as recorrentes interpuseram dois recursos de anulação da decisão controvertida.

    20

    Por Decisões de 28 de outubro de 2016, o presidente da Terceira Secção do Tribunal Geral admitiu a intervenção da República da Polónia em apoio do pedido da Comissão.

    21

    Por Decisão do presidente da Terceira Secção do Tribunal Geral de 14 de novembro de 2016, ambos os recursos foram apensados para efeitos de fases escrita e oral do processo e de decisão que ponha termo à instância.

    22

    As recorrentes invocavam sete fundamentos de recurso, relativos, em substância, os três primeiros, a violações do artigo 106.o, n.o 2, TFUE, na medida em que o Enquadramento SIEG e o artigo 7.o da Diretiva Postal não foram respeitados, o quarto, à violação dos artigos 7.o e 8.o dessa diretiva, o quinto, à violação dos artigos 102.o e 106.o, n.o 1, TFUE, o sexto, à violação dos artigos 16.o e 17.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e, o sétimo, à violação do dever de fundamentação.

    23

    O Tribunal Geral, no acórdão recorrido, julgou improcedentes todos esses fundamentos e, por conseguinte, negou integralmente provimento aos recursos.

    Pedidos das partes

    24

    As recorrentes pedem que o Tribunal de Justiça se digne:

    anular o acórdão recorrido;

    anular a decisão controvertida; e

    condenar a Comissão nas despesas dos presentes recursos e nas despesas dos processos em primeira instância.

    25

    A Comissão e o Governo polaco pedem que o Tribunal de Justiça negue provimento aos presentes recursos e condene as recorrentes nas despesas.

    Quanto aos presentes recursos

    26

    Nos presentes recursos, as recorrentes invocam quatro fundamentos que, em substância, se sobrepõem aos cinco primeiros fundamentos dos seus recursos de anulação. Esses fundamentos dos recursos de segunda instância são relativos à violação do artigo 106.o, n.o 2, TFUE, por não terem sido respeitados vários requisitos do Enquadramento SIEG (primeiro a terceiro fundamentos), à violação dos princípios do Tratado FUE relativos à adjudicação de contratos públicos (primeiro fundamento) e à violação do artigo 7.o da Diretiva Postal (primeiro, terceiro e quarto fundamentos).

    Quanto ao primeiro fundamento

    Argumentos das partes

    27

    Com o primeiro fundamento, as recorrentes alegam, por um lado, violação do artigo 106.o, n.o 2, TFUE, por ter o Tribunal Geral entendido erradamente que os requisitos do ponto 19 do Enquadramento SIEG tinham sido respeitados e, por outro, violação dos princípios da não discriminação, da igualdade de tratamento e da transparência na celebração de contratos públicos e interpretação errada do artigo 7.o, n.o 2, da Diretiva Postal.

    28

    Consideram que, mesmo quando um Estado‑Membro designa o prestador do serviço universal por via legislativa, fora dos processos de adjudicação dos contratos públicos, os processos de adoção e de publicação da lei devem ser apreciados à luz do respeito dos requisitos de transparência, de não discriminação e de igualdade de tratamento. Afirmam que, no caso, as autoridades nacionais induziram em erro os operadores em causa ao indicarem uma taxa de participação no fundo de compensação inferior em 100 % à taxa que acabou por ser introduzida, privando assim esses operadores de qualquer lucro e dando origem a perdas. Entendem que esse modo de designação do prestador do serviço universal vai contra o requisito de transparência.

    29

    As recorrentes precisam, na réplica, que o primeiro fundamento é admissível na medida em que indicaram expressamente que o Tribunal Geral concluiu erradamente que o simples facto de adotar e publicar o ato jurídico com base no qual a PP prestou o serviço universal basta para concluir que foram preenchidos os requisitos que decorrem do ponto 19 do Enquadramento SIEG.

    30

    A Comissão e o Governo polaco consideram que o primeiro fundamento é inadmissível. O mesmo Governo acrescenta que, de qualquer forma, esse fundamento é improcedente.

    Apreciação do Tribunal de Justiça

    31

    De acordo com jurisprudência constante, resulta do artigo 256.o, n.o 1, segundo parágrafo, TFUE, do artigo 58.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e dos artigos 168.o, n.o 1, alínea d), e 169.o, n.o 2, do seu Regulamento de Processo que um recurso de decisão do Tribunal Geral deve indicar de modo preciso os elementos contestados da decisão cuja anulação se pede, bem como os argumentos jurídicos em que se apoia especificamente esse pedido. Um recurso de uma decisão do Tribunal Geral desprovido dessas características não é suscetível de ser objeto de uma apreciação jurídica que permita ao Tribunal de Justiça exercer a missão que lhe incumbe no domínio em causa e efetuar a sua fiscalização da legalidade [Acórdão de 1 de fevereiro de 2018, Panalpina World Transport (Holding) e o./Comissão, C‑271/16 P, não publicado, EU:C:2018:59, n.o 17 e jurisprudência aí referida].

    32

    Ora, no primeiro fundamento, as recorrentes limitam‑se, em substância, a indicar os requisitos que entendem resultar do ponto 19 do Enquadramento SIEG no que respeita ao respeito dos princípios da não discriminação, da igualdade de tratamento e da transparência, sem contudo identificarem de forma precisa o erro de direito de que alegadamente padece o acórdão recorrido.

    33

    Neste contexto, refira‑se que, contrariamente ao que alegam na réplica, as lacunas referidas no número anterior do presente acórdão não são preenchidas pela simples afirmação de que o Tribunal Geral concluiu erradamente que o simples facto de adotar e publicar o ato jurídico com base no qual a PP prestou o serviço universal é suficiente para concluir que os requisitos decorrentes do ponto 19 do Enquadramento SIEG estão preenchidos.

    34

    Por outro lado, as recorrentes não fornecem qualquer indicação no que respeita à alegada violação do artigo 7.o, n.o 2, da Diretiva Postal.

    35

    Daqui resulta que o primeiro fundamento é inadmissível.

    Quanto ao segundo fundamento

    Argumentos das partes

    36

    No segundo fundamento, as recorrentes alegam, em substância, que o Tribunal Geral violou o artigo 106.o, n.o 2, TFUE, ao considerar erradamente que os requisitos dos pontos 14 e 60 do Enquadramento SIEG tinham sido respeitados.

    37

    Com a primeira parte do segundo fundamento, contestam os n.os 46 a 48 e 51 do acórdão recorrido e sustentam que, para respeitar os requisitos do ponto 14 do Enquadramento SIEG, não basta organizar uma consulta pública, sendo igualmente necessário provar que esta permitiu tomar devidamente em consideração as necessidades em matéria de serviço público em causa ou que a aplicação de outro meio adequado permitiu ter em conta os interesses dos utilizadores finais e dos prestadores.

    38

    Ora, no caso, não existe nenhum documento ou prova que ateste a resposta do Governo polaco à observação formulada pelas recorrentes na consulta pública de setembro de 2010, no que respeita à sua crítica relativa à taxa de contribuição de 1 %, que prova, nomeadamente, o caráter infundado dessa observação.

    39

    Mesmo que o Tribunal Geral não tenha retirado as conclusões adequadas, as razões indicadas no n.o 137 do acórdão recorrido mostram a que ponto essa consulta pública teve caráter ilusório e não tomou devidamente em consideração as necessidades dos utilizadores ou dos prestadores. Com efeito, o aumento da taxa de contribuição de 1 % para 2 % teve por efeito privar os operadores alternativos obrigados a contribuir para o financiamento do custo líquido da quase totalidade dos lucros realizados, impor ao prestador do serviço universal a obrigação de cobrir 95 % da totalidade do custo líquido, bem como reduzir ao mínimo a contribuição do Tesouro Público e repercutir efetivamente a totalidade do financiamento no mercado, apesar do caráter misto do fundo de compensação (participação dos operadores e do orçamento do Estado).

    40

    As recorrentes contestam ainda a afirmação do Tribunal Geral, no n.o 48 do acórdão recorrido, de que, dado que os operadores se puderam pronunciar sobre a taxa de contribuição de 1 %, não era necessário, de facto, renovar a consulta relativa à taxa de contribuição alterada de 2 %. Com efeito, entendem ser evidente que o montante da taxa, mais ou menos elevada, é importante para as observações e posições formuladas na consulta pública, tendo em conta, nomeadamente, o facto de a sua apreciação dever ser correlacionada com a rentabilidade da atividade em causa. Ora, na sua opinião, a posição do Tribunal Geral equivale a esvaziar de qualquer utilidade a consulta pública, uma vez que as posições dos operadores consultados podem ser completamente ignoradas e essa consulta pode conduzir a uma decisão nos antípodas das posições expressas na mesma, como se verificou no caso presente.

    41

    Com a segunda parte do segundo fundamento, relativa aos requisitos que decorrem do ponto 60 do Enquadramento SIEG, as recorrentes alegam, por um lado, que, contrariamente ao que afirma o Tribunal Geral, no n.o 54 do acórdão recorrido, resulta claramente desse ponto 60 que os resultados da consulta pública devem ser publicados separadamente. Em todo o caso, o Governo polaco não publicou esses resultados nem separadamente nem em conjunto com a publicação da Lei Postal.

    42

    Por outro lado, decorre claramente dos pontos 14 a 16 do Enquadramento SIEG que, para cumprir as suas obrigações, o Governo polaco devia ter publicado não só o mandato que confere a prestação do serviço universal à PP, a saber, a Lei Postal, precisando as obrigações de serviço público e os métodos de cálculo da compensação, mas também os resultados da consulta pública.

    43

    O Governo polaco considera que a primeira parte do segundo fundamento é inadmissível na medida em que as questões de saber se era necessária ou não uma nova consulta, se as sociedades recorrentes podiam utilmente apresentar as suas observações e quais eram as motivações das autoridades polacas são questões de natureza factual. A Comissão e esse Governo consideram, por outro lado, que este segundo fundamento e a terceira parte do terceiro fundamento devem ser julgados improcedentes.

    Apreciação do Tribunal de Justiça

    44

    Quanto à primeira parte do segundo fundamento, relativa a uma violação do ponto 14 do Enquadramento SIEG, as recorrentes alegam, em substância, que, para dar cumprimento a esse ponto 14, não basta organizar uma consulta pública, sendo igualmente necessário provar que esta permitiu tomar em consideração os interesses dos utilizadores finais e dos prestadores. Ora, na sua opinião, numa situação em que o montante da taxa de compensação duplicou face ao montante discutido na consulta pública, a posição do Tribunal Geral de que não era necessário renovar a consulta equivaleria a esvaziar de qualquer utilidade essa consulta.

    45

    Refira‑se, a título preliminar, que, como acertadamente refere o Tribunal Geral no n.o 44 do acórdão recorrido, a Comissão, no exercício do seu poder de apreciação ao abrigo do artigo 106.o, n.o 2, TFUE, pode adotar regras de conduta para estabelecer critérios com base nos quais pretende avaliar a compatibilidade com o mercado interno de medidas relacionadas com a gestão de SIEG, projetadas pelos Estados‑Membros. Ao adotar tais regras de conduta, como é o caso do Enquadramento SIEG, e ao anunciar, através da sua publicação, que as aplicará no futuro aos casos a que dizem respeito, a Comissão autolimita‑se no exercício desse poder de apreciação e não pode, em princípio, desrespeitar essas regras sob pena de poder ser sancionada, sendo caso disso, por violação de princípios gerais do direito, tais como o princípio da igualdade de tratamento ou da proteção da confiança legítima (v., por analogia, Acórdãos de 8 de março de 2016, Grécia/Comissão, C‑431/14 P, EU:C:2016:145, n.os 68 e 69, e de 19 de julho de 2016, Kotnik e o., C‑526/14, EU:C:2016:570, n.os 39 e 40).

    46

    A esse respeito, há que lembrar que, segundo o ponto 14 do Enquadramento SIEG, «[p]ara efeitos de aplicação dos princípios enunciados n[o] presente [enquadramento], os Estados‑Membros devem demonstrar que ponderaram de forma adequada as necessidades do serviço público, através de uma consulta pública ou de outros instrumentos úteis, a fim de ter em conta os interesses dos utilizadores e prestadores. Esta regra não se aplica nos casos em que for evidente que uma nova consulta não proporciona qualquer valor acrescentado a uma recente consulta».

    47

    Há que referir, portanto, que o Tribunal Geral afirmou acertadamente, no n.o 46 do acórdão recorrido, que resulta claramente do texto dessa disposição que não é obrigatória a organização de consulta pública, processo esse que constitui apenas um dos instrumentos úteis a que o Estado‑Membro pode recorrer para ponderar as necessidades do serviço público em causa e ter em conta os interesses dos utilizadores e prestadores do serviço.

    48

    Além disso, nos n.os 47 e 48 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral referiu que, na medida em que, na consulta pública de setembro de 2010, as recorrentes puderam utilmente apresentar as suas observações a respeito das condições relativas ao funcionamento do fundo de compensação, tendo podido, nomeadamente, manifestar o seu desacordo sobre uma taxa inferior à taxa que acabou por ser fixada, alegando que já a consideravam excessiva, uma nova consulta não teria trazido, quanto a este ponto, «nenhum valor acrescentado significativo», na aceção do ponto 14 do Enquadramento SIEG.

    49

    Ora, há que observar que, ao fazê‑lo, o Tribunal Geral aplicou o ponto 14 do Enquadramento SIEG sem cometer qualquer erro de direito, na medida em que examinou a questão de saber se, tendo em conta os elementos relevantes do processo que lhe foi submetido e, em particular, tendo em conta a consulta pública de setembro de 2010, era evidente que uma nova consulta pública não apresentaria um valor acrescentado significativo tal como previsto no segundo período desse ponto 14. Além disso, as recorrentes de nenhum modo alegam que o Tribunal Geral tenha utilizado, a esse respeito, um critério jurídico diferente do exigido no referido ponto14.

    50

    Nestas condições, há que referir que o facto de as recorrentes alegarem, em substância, como resulta dos n.os 39 e 40 do presente acórdão, que um aumento da taxa de compensação em 100 %, entre a taxa que foi discutida na consulta pública de setembro de 2010 e a que acabou por ser adotada na decisão controvertida pelas autoridades polacas competentes, significa que uma nova consulta pública teria necessariamente um valor acrescentado significativo equivale a pedir ao Tribunal de Justiça que fiscalize uma apreciação de facto feita pelo Tribunal Geral.

    51

    Ora, como resulta de jurisprudência constante, o Tribunal de Justiça não tem competência para fiscalizar essa apreciação em segunda instância, sem prejuízo dos casos de desvirtuação que, no caso em apreço, não foi alegada (v., neste sentido, Acórdão de 28 de novembro de 2019, LS Cable & System/Comissão, C‑596/18 P, não publicado, EU:C:2019:1025, n.o 24 e jurisprudência aí referida).

    52

    Por conseguinte, a primeira parte do segundo fundamento deve ser julgada improcedente.

    53

    Quanto à segunda parte desse segundo fundamento, as recorrentes acusam o Tribunal Geral de ter violado, no n.o 54 do acórdão recorrido, os requisitos que decorrem do ponto 60 do Enquadramento SIEG. Assim, por um lado, resulta claramente desse ponto 60 que, ao contrário do que decidiu o Tribunal Geral, os resultados da consulta pública devem ser publicados separadamente. Por outro lado, o Tribunal Geral considerou erradamente que o Governo polaco cumpriu a sua obrigação de publicar os resultados da consulta pública ao publicar a Lei Postal.

    54

    Segundo o ponto 60, alínea a), do Enquadramento SIEG, por cada compensação de SIEG abrangida pelo Enquadramento SIEG, o Estado‑Membro em causa deve publicar na Internet ou noutro suporte adequado referido no ponto 14 desse enquadramento, nomeadamente, os resultados da consulta pública.

    55

    No n.o 54 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral referiu, desde logo, que, no considerando 158 da decisão controvertida, a Comissão concluiu, sem qualquer erro de facto, que a Lei Postal tinha sido publicada. Seguidamente, considerou que não decorre do ponto 60 do Enquadramento SIEG uma obrigação de o Estado‑Membro publicar separadamente os resultados das consultas públicas. Por último, inferiu do facto de, segundo as considerações feitas nos n.os 46 a 50 do acórdão recorrido, a Comissão poder validamente entender que os requisitos em matéria de transparência previstos no ponto 14 do Enquadramento SIEG tinham sido respeitados que a sua conclusão correspondente, constante do considerando 160 da decisão controvertida, não padecia de qualquer erro.

    56

    Refira‑se, a esse respeito, que resulta da redação do ponto 60, alínea a), do Enquadramento SIEG que, contrariamente ao que alegam as recorrentes, os Estados‑Membros não são obrigados a publicar separadamente os resultados da consulta pública, podendo esses resultados figurar, por exemplo, no ato pelo qual um Estado‑Membro confia a responsabilidade da gestão do SIEG à empresa em causa.

    57

    No entanto, o facto de a Lei Postal, que é pacífico conter elementos essenciais relativos às modalidades de cálculo da compensação e ao seu montante, ter sido publicada não implica necessariamente que a República da Polónia tenha cumprido a obrigação, prevista no ponto 60, alínea a), do Enquadramento SIEG, de publicar os resultados da consulta pública, no caso, a de setembro de 2010.

    58

    A esse respeito, o Governo polaco alega que essa obrigação foi efetivamente cumprida na medida em que o conceito de «resultados da consulta pública», na aceção desse ponto 60, alínea a), corresponde, de facto, à decisão de conceder uma compensação específica segundo modalidades determinadas e que, por conseguinte, a publicação destes últimos elementos, que figuram na Lei Postal, significa que os referidos resultados também foram publicados.

    59

    Refira‑se, porém, que, tendo em conta a redação clara do ponto 60, alínea a), do Enquadramento SIEG, tal interpretação da obrigação de publicação dos resultados da consulta pública, na aceção desse ponto, não pode ser acolhida. A esse respeito, há que precisar que, quando um Estado‑Membro decide cumprir a obrigação de publicação dos resultados da consulta pública através da publicação do ato pelo qual é confiada a gestão de um SIEG, é necessário, para não esvaziar de efeito útil essa obrigação, que essa publicação faça uma referência expressa, com suficiente grau de pormenor, aos resultados da consulta pública efetuada no âmbito do procedimento que levou à adoção desse ato.

    60

    Daí resulta que a afirmação do Tribunal Geral no primeiro período do n.o 54 do acórdão recorrido, segundo a qual a Comissão constatou, sem erro de facto, que a Lei Postal «tinha sido publicada», não basta para justificar a conclusão de que o Governo polaco tinha cumprido a obrigação de publicação dos resultados da consulta pública de setembro de 2010, na aceção do ponto 60, alínea a), do Enquadramento SIEG.

    61

    O mesmo se diga da afirmação do Tribunal Geral que figura no último período do n.o 54 do acórdão recorrido, segundo a qual o facto de a Comissão ter podido validamente considerar que as exigências de transparência, referidas no ponto 14 do Enquadramento SIEG, tinham sido respeitadas permite concluir que esta não cometeu qualquer erro quando afirmou que o requisito de transparência tinha sido cumprido.

    62

    Com efeito, os requisitos que decorrem do referido ponto 14, relativos à prova da consideração das necessidades em matéria de serviço público em causa através de uma consulta pública ou de outros meios adequados, não podem ser equiparados ao requisito de transparência, previsto no ponto 60, alínea a), do Enquadramento SIEG, que diz especificamente respeito à publicação dos resultados da consulta pública. Por conseguinte, o facto de um Estado‑Membro ter cumprido os requisitos do ponto 14 do Enquadramento SIEG não implica necessariamente que tenha igualmente cumprido a obrigação de transparência, na aceção do ponto 60, alínea a), desse enquadramento.

    63

    Resulta destas considerações que o Tribunal Geral, no n.o 54 do acórdão recorrido, cometeu vários erros de direito no que respeita à interpretação dos requisitos que decorrem do ponto 60 do Enquadramento SIEG.

    64

    Resulta, contudo, da jurisprudência do Tribunal de Justiça que um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral não é suscetível de invalidar o acórdão recorrido se a sua parte decisória se revelar assente noutros fundamentos de direito (Acórdãos de 21 de setembro de 2017, Easy Sanitary Solutions e EUIPO/Group Nivelles, C‑361/15 P e C‑405/15 P, EU:C:2017:720, n.o 73 e jurisprudência aí referida).

    65

    No caso, resulta do considerando 122 da decisão controvertida que a Comissão considerou que a República da Polónia não tinha de provar que, em conformidade com as exigências do ponto 14 do Enquadramento SIEG, tinha tomado devidamente em consideração as necessidades em matéria de serviço público, efetuando uma consulta pública ou por outros meios adequados, uma vez que as obrigações de serviço público atribuídas à PP correspondiam às exigências em matéria de serviços postais universais decorrentes da Diretiva Postal. A Comissão observou ainda, no referido considerando 122, que, em todo o caso, fora organizada uma consulta pública sobre a Lei Postal e sobre os regulamentos de execução dessa lei. A esse respeito, a utilização dos termos em língua inglesa «in any event» demonstra que essa observação da Comissão é efetuada por acréscimo.

    66

    Ora, no n.o 50 do acórdão recorrido, não impugnado em segunda instância pelas recorrentes, o Tribunal Geral confirmou a referida apreciação da Comissão que consta do considerando 122 da decisão controvertida, no sentido de que, tendo as autoridades polacas dado cumprimento às exigências decorrentes da Diretiva Postal, já não tinham de cumprir as obrigações previstas no ponto 14 do Enquadramento SIEG.

    67

    Daí resulta que os erros cometidos pelo Tribunal Geral e declarados no n.o 63 do presente acórdão, no que respeita à interpretação dos requisitos que decorrem do ponto 60 do Enquadramento SIEG, em especial o de publicação dos resultados da consulta pública prevista no referido ponto 14 desse enquadramento, na aceção desse ponto 60, alínea a), não são suscetíveis de afetar a conclusão do Tribunal Geral quanto à negação de provimento aos recursos de primeira instância das recorrentes.

    68

    Resulta destas considerações que a segunda parte do segundo fundamento não pode ser acolhida, improcedendo integralmente esse fundamento.

    Quanto ao terceiro fundamento

    Argumentos das partes

    69

    O terceiro fundamento, que se articula em quatro partes, é relativo, por um lado, à violação do artigo 106.o, n.o 2, TFUE, por ter o Tribunal Geral considerado erradamente que as exigências do ponto 52 do Enquadramento SIEG tinham sido respeitadas, e, por outro, à violação do artigo 7.o, n.os 1 e 3 a 5, da Diretiva Postal.

    70

    Quanto à primeira parte deste fundamento, as recorrentes contestam os n.os 84 a 86 do acórdão recorrido e alegam, em substância, o caráter discriminatório do fundo de compensação e a transposição incorreta do artigo 7.o, n.os 3 e 4, da Diretiva Postal efetuada pelo Governo polaco.

    71

    A posição do Tribunal Geral não é coerente, ao considerar que os serviços de correio não constituíam serviços equivalentes aos serviços universais, apesar de ter considerado ser esse o caso, do ponto de vista dos consumidores, dos serviços abrangidos pelo serviço universal.

    72

    Em primeiro lugar, as recorrentes afirmam que, no que respeita às modalidades de prestação desses serviços, à sua tarifação e a outros requisitos legais, não existe nenhuma convergência entre o serviço universal e os serviços abrangidos pelo serviço universal. Entendem que esses dois tipos de serviços são fundamentalmente diferentes.

    73

    Afirmam que, desde logo, o serviço universal deve ser prestado de modo uniforme e segundo uma repartição determinada das estações de correios e com base numa taxa específica de encaminhamento dos envios postais. Ora, os prestadores de serviços abrangidos pelo serviço universal não estão sujeitos a nenhuma dessas restrições.

    74

    Em seguida, o serviço universal deve ser efetuado a preços acessíveis validados pela autoridade nacional de regulação dos serviços postais, ao passo que os prestadores de serviços abrangidos pelo serviço universal têm a liberdade de fixar os preços desses serviços. Ora, a Comissão utilizou uma percentagem uniforme para esses dois tipos de serviços apesar de os resultados contabilísticos da PP a título da prestação desses tipos de serviços serem muito diferentes. Esses resultados demonstram o caráter errado das conclusões do Tribunal Geral relativas a um tratamento idêntico do serviço universal e dos serviços abrangidos pelo serviço universal devido às suas características alegadamente semelhantes.

    75

    Por último, o serviço universal exige que o operador garanta o levantamento da caixa de correio destinada a recolher o correio enviado e a distribuição do correio pelo menos uma vez por dia útil e não menos de cinco dias por semana, exceto nos dias feriados e de forma a permitir ao remetente obter um aviso de receção de correio registado. Ora, a legislação nacional não impõe essa exigência aos serviços abrangidos pelo serviço universal, podendo a referida exigência resultar das obrigações contratuais do operador, sem ser, no entanto, uma característica constitutiva desses serviços.

    76

    Em segundo lugar, as recorrentes alegam o caráter inexato e contrário aos princípios matemáticos da afirmação do Tribunal Geral feita no n.o 85 do acórdão recorrido pelo facto de a percentagem paga pela PP ao fundo de compensação não poder em caso algum ser superior à contribuição dos outros operadores postais.

    77

    Em terceiro lugar, quanto ao n.o 86 do acórdão recorrido, lembram que o serviço universal é prestado no interesse geral em condições de quase monopólio, ao passo que os serviços abrangidos pelo serviço universal constituem um segmento de mercado liberalizado caracterizado por uma forte concorrência.

    78

    No âmbito da segunda parte do terceiro fundamento, alegam que o Tribunal Geral violou o artigo 7.o, n.o 5, da Diretiva Postal devido ao caráter desproporcionado do fundo de compensação.

    79

    Em primeiro lugar, na apreciação dos recursos de primeira instância, o Tribunal Geral ignorou completamente a questão relativa à divergência entre o custo médio ponderado do capital (CMPC), adotado para calcular o financiamento do custo líquido, fixado em 10,82 %, e a taxa de rentabilidade dos serviços equivalentes em que a Comissão se baseou para determinar o caráter proporcionado da contribuição de 2 % dos rendimentos. Na medida em que o custo mínimo do capital foi fixado em 10,82 % para o segmento do mercado dos serviços postais, seria manifestamente contraditório considerar, como fez a Comissão, e depois o Tribunal Geral, que uma taxa de rentabilidade de 5,5 % para os serviços equivalentes permite adotar uma taxa de contribuição de 2 %, enquanto taxa que não constitui um fator de expulsão do mercado dos concorrentes eficazes nem um fator que os dissuade de nele entrarem.

    80

    Em segundo lugar, as recorrentes consideram que as conclusões do Tribunal Geral não são corroboradas pela prova no caso presente. Por um lado, mesmo admitindo que a Comissão não dispunha de outros dados para além do relativo à taxa de rentabilidade da PP, as conclusões que retirou são, em todo o caso, inexatas.

    81

    Por outro lado, a Comissão deveria ter previsto que o ano de 2013 era o primeiro ano da liberalização do mercado dos serviços postais e que, por conseguinte, o aumento da concorrência no mercado dos serviços abrangidos pelo serviço universal seria acompanhado de uma diminuição da rentabilidade.

    82

    Além disso, as recorrentes contestam a posição do Tribunal Geral segundo a qual só o ano de 2013, que constitui efetivamente o único ano em que as recorrentes atingiram a taxa de rentabilidade prevista pela Comissão, é relevante para a presente lide, pois, ao adotar a decisão controvertida, a Comissão não podia saber se o custo líquido também não ocorreria em 2015.

    83

    Por último, a instituição do fundo de compensação exige igualmente a introdução de um mecanismo de proteção contra vantagens excessivas. Com efeito, o fundo de compensação deve tomar em consideração os lucros realizados pelo operador designado nos anos seguintes, nomeadamente quando o prestador não foi designado por concurso, bem como a situação específica do mercado durante a fase inicial da sua liberalização.

    84

    Na terceira parte do terceiro fundamento, as recorrentes alegam que o Tribunal Geral violou o artigo 7.o, n.o 5, da Diretiva Postal ao não reconhecer a falta de transparência do processo de criação do fundo de compensação. A esse respeito, entendem que o Tribunal Geral invocou erradamente o Acórdão de 12 de dezembro de 2014, Crown Equipment (Suzhou) e Crown Gabelstapler/Conselho (T‑643/11, EU:T:2014:1076).

    85

    Recordam que alegaram no Tribunal Geral que a forma final do fundo e a participação máxima no financiamento (2 % dos rendimentos) não tinham sido objeto de procedimento consultivo e que os interessados não tinham podido formular as suas observações. Assim, é efetivamente a jurisprudência resultante do Acórdão de 1 de outubro de 2009, Foshan Shunde Yongjian Housewares & Hardware/Conselho (C‑141/08 P, EU:C:2009:598), que é relevante para o caso presente, pois não se pode excluir a possibilidade de o Governo alterar a sua posição se os interessados tivessem podido exprimir a sua opinião quanto à duplicação da taxa máxima de participação no financiamento.

    86

    Quanto à quarta parte do terceiro fundamento, as recorrentes alegam que o Tribunal Geral, nos n.os 153 a 156 do acórdão recorrido, violou o artigo 7.o, n.o 3, da Diretiva Postal por não ter respeitado o requisito relativo ao encargo financeiro não razoável.

    87

    Desde logo, as recorrentes consideram que, contrariamente aos Acórdãos de 6 de outubro de 2010, Comissão/Bélgica (C‑222/08, EU:C:2010:583), e de 6 de outubro de 2010, Base e o. (C‑389/08, EU:C:2010:584), a regulamentação nacional dispõe que, quando o custo líquido gera perdas, o montante destas constitui automaticamente um encargo não razoável para a PP. Entendem que essa presunção significa que nem o montante das perdas nem as características específicas da PP, tais como a qualidade do seu equipamento, a sua situação económica e financeira ou a sua quota de mercado, devem ser examinados no respeitante ao requisito relativo ao encargo não razoável.

    88

    Afirmam que, tendo em conta a ampla convergência das regulamentações da União relativas ao financiamento do serviço universal no mercado das telecomunicações e do mercado dos serviços postais, a posição do Tribunal de Justiça expressa nos acórdãos acima referidos deve ser tida em conta no caso presente. A esse respeito, o método seguido pela regulamentação nacional para financiar o custo líquido do serviço universal é incompatível com o modelo de financiamento previsto na Diretiva Postal.

    89

    Entendem que a posição das recorrentes quanto à forma de calcular o encargo não razoável do operador designado é ainda confirmada pelo Relatório do grupo dos reguladores europeus no domínio dos serviços postais de 2012, intitulado «Net Cost Calculation and Evaluation of a Reference Scenario» (Cálculo do custo líquido e avaliação do cenário de referência), bem como pela doutrina.

    90

    Em seguida, alegam uma violação do princípio da interpretação uniforme do direito da União, pelo facto de, na Polónia, os tribunais nacionais que decidem os recursos das decisões da autoridade nacional reguladora relativos ao mercado postal não tomarem em consideração os pedidos de decisão prejudicial submetidos ao Tribunal de Justiça durante o processo.

    91

    Por último, a regulamentação nacional tem caráter insuficiente porque, em princípio, no âmbito do procedimento de fiscalização, a decisão quanto ao mérito não é examinada.

    92

    As recorrentes indicam, na réplica, que, no âmbito da primeira, segunda e quarta partes do terceiro fundamento, identificaram expressamente os fundamentos do acórdão recorrido e que também apresentaram argumentos não destinados a pôr em causa os factos, mas sim a qualificação jurídica errada que o Tribunal Geral deu aos serviços abrangidos pelo serviço universal, e a demonstrar que o Tribunal Geral fez uma aplicação errada do direito da União no que respeita à violação do artigo 7.o, n.os 1 e 3 a 5, da Diretiva Postal.

    93

    A Comissão considera que a primeira, segunda e quarta partes do terceiro fundamento são inadmissíveis e que, de qualquer forma, esse fundamento, no seu conjunto, é improcedente. Por seu turno, o Governo polaco considera que o fundamento é integralmente inadmissível e, em todo o caso, improcedente.

    Apreciação do Tribunal de Justiça

    94

    No âmbito da primeira parte do terceiro fundamento, as recorrentes contestam, em substância, os n.os 84 a 86 do acórdão recorrido e alegam o caráter discriminatório do fundo de compensação e a transposição incorreta do artigo 7.o, n.os 3 e 4, da Diretiva Postal efetuada pelo Governo polaco.

    95

    Refira‑se, em primeiro lugar, que os argumentos apresentados pelas recorrentes, e resumidos nos n.os 70 a 77 do presente acórdão, em apoio da primeira parte deste fundamento, visam, em substância, pôr em causa a apreciação dos factos pelo Tribunal Geral, que figura nos n.os 84 e 85 do acórdão recorrido, quanto ao caráter permutável dos serviços postais universais e dos serviços postais equivalentes, bem como às consequências a retirar do método de cálculo do montante da contribuição a cargo da PP.

    96

    Ora, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que só o Tribunal Geral tem competência para apurar e apreciar os factos relevantes e apreciar a prova. A apreciação dos factos e da prova não constitui, portanto, exceto no caso da sua desvirtuação, uma questão de direito sujeita, como tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça em segunda instância [Acórdão de 13 de fevereiro de 2020, Grécia/Comissão (Pastagens permanentes), C‑252/18 P, EU:C:2020:95, n.o 59 e jurisprudência aí referida].

    97

    No caso, há que observar que as recorrentes não alegam nenhuma desvirtuação dos factos ou da prova examinados pelo Tribunal Geral.

    98

    Em segundo lugar, quanto à alegação relativa ao n.o 86 do acórdão recorrido, as recorrentes não indicam com suficiente clareza o erro de direito cometido pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido, o que, à luz da jurisprudência referida no n.o 31 do presente acórdão, impede o Tribunal de Justiça de exercer a sua fiscalização da legalidade da apreciação efetuada pelo Tribunal Geral.

    99

    Daí resulta que a primeira parte do terceiro fundamento é, no seu conjunto, inadmissível e deve ser julgada improcedente.

    100

    A segunda parte do terceiro fundamento é relativa a uma alegada violação do artigo 7.o, n.o 5, da Diretiva Postal devido ao caráter desproporcionado do fundo de compensação. Ora, tal como no que respeita a uma parte da argumentação relativa à primeira parte desse fundamento, a que dá suporte a esta segunda parte visa, no essencial, pôr em causa uma apreciação de facto feita pelo Tribunal Geral quanto ao exame da proporcionalidade do fundo de compensação, à luz das provas que lhe foram apresentadas, sem alegar qualquer desvirtuação a esse respeito.

    101

    Por consequência, a segunda parte do terceiro fundamento é igualmente inadmissível e deve, por conseguinte, ser julgada improcedente.

    102

    Com a terceira parte do terceiro fundamento, as recorrentes alegam, em substância, que o Tribunal Geral violou o artigo 7.o, n.o 5, da Diretiva Postal ao não reconhecer a falta de transparência do processo de criação do fundo de compensação.

    103

    A esse respeito, há que lembrar que, como resulta dos n.os 45 a 52 do presente acórdão, relativos à análise da primeira parte do segundo fundamento, o Tribunal Geral não cometeu qualquer erro de direito ao concluir, nos n.os 47 e 48 do acórdão recorrido, que as recorrentes tiveram a possibilidade de apresentar utilmente as suas observações e que uma nova consulta não teria fornecido «nenhum valor acrescentado significativo», na aceção do ponto 14 do Enquadramento SIEG, em relação à consulta pública de setembro de 2010.

    104

    Nestas condições, e sem que o Tribunal de Justiça tenha necessidade de se pronunciar sobre a admissibilidade da terceira parte do terceiro fundamento, há que observar que, na medida em que, nessa parte, as recorrentes não alegam nem demonstram que a obrigação de respeitar o princípio da transparência, prevista no artigo 7.o, n.o 5, da Diretiva Postal, exigiria, no caso, uma consulta às partes interessadas mais ampla do que a que decorre do ponto 14 do Enquadramento SIEG, os fundamentos expostos nos n.os 45 a 51 do presente acórdão são suficientes para declarar improcedente essa parte do fundamento.

    105

    A quarta parte do terceiro fundamento é relativa ao facto de, nos n.os 153 a 156 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral ter violado o artigo 7.o, n.o 3, da Diretiva Postal por não ter sido respeitado o requisito relativo ao encargo financeiro não razoável.

    106

    Refira‑se, como fazem a Comissão e o Governo polaco, que, apesar de as recorrentes reproduzirem e indicarem os números contestados do acórdão recorrido, essa quarta parte deve ser julgada inadmissível.

    107

    Com efeito, no que respeita à parte da argumentação apresentada pelas recorrentes no âmbito da referida quarta parte, resumida nos n.os 87 a 89 e 91 do presente acórdão, refira‑se que, com essa argumentação, se limitam, em substância, a impugnar o conteúdo da decisão controvertida e o conteúdo da Lei Postal, sem nunca visarem, de forma circunstanciada, a apreciação efetuada pelo Tribunal Geral nem indicarem em que medida este cometeu um erro de direito.

    108

    Ora, o Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de que os argumentos de um recurso que não criticam o acórdão do Tribunal Geral num pedido de anulação de uma decisão, mas sim a decisão cuja anulação foi pedida no Tribunal Geral, são manifestamente inadmissíveis (Despacho de 27 de setembro de 2012, Brighton Collectibles/IHMI e Felmar, C‑624/11 P, não publicado, EU:C:2012:598, n.o 35).

    109

    Quanto ao argumento relativo à violação do princípio da interpretação uniforme do direito da União, resumido no n.o 90 do presente acórdão, basta observar que as recorrentes não identificaram de forma precisa o erro de direito que alegadamente fere o acórdão recorrido.

    110

    De qualquer forma, há que salientar que a quarta parte do terceiro fundamento é igualmente improcedente.

    111

    As recorrentes contestam, em substância, o método utilizado pelas autoridades polacas, confirmado pela Comissão, de que, quando o custo líquido da prestação dos serviços universais gera perdas para o prestador desses serviços, o montante dessas perdas constitui um encargo financeiro não razoável para esse prestador, na aceção do artigo 7.o, n.o 3, da Diretiva Postal. Em particular, as recorrentes consideram que o exame do requisito relativo ao «encargo financeiro não razoável» deve corresponder ao exigido pelo Tribunal de Justiça, nomeadamente nos Acórdãos de 6 de outubro de 2010, Comissão/Bélgica (C‑222/08, EU:C:2010:583, n.os 49 e 50), e de 6 de outubro de 2010, Base e o. (C‑389/08, EU:C:2010:584, n.os 42 e 43), relativos ao domínio comparável do serviço universal das comunicações eletrónicas, que entendem implicar que se analise a situação específica da empresa em causa com base num conjunto de elementos, tais como, nomeadamente, a qualidade do seu equipamento, a sua situação económica e financeira ou a sua quota de mercado.

    112

    A este respeito, há que lembrar, primeiro, que, no n.o 153 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou, em substância, que, em conformidade com o artigo 7.o, n.o 3, da Diretiva Postal, a Lei Postal exige que a autoridade nacional competente determine se as obrigações de serviço universal constituem um encargo financeiro não razoável para o prestador designado. Segundo o Tribunal Geral, é o que sucede no caso presente, na medida em que resulta do considerando 16 da decisão controvertida que compete ao regulador postal polaco efetuar esse exame, segundo a Lei Postal que transpôs a referida Diretiva Postal.

    113

    Ora, as recorrentes não impugnaram essa afirmação do Tribunal Geral no que respeita à obrigação de esse regulador postal verificar se as obrigações de serviço universal constituem, na aceção do artigo 7.o, n.o 3, da Diretiva Postal, um encargo financeiro não razoável para o prestador designado.

    114

    Em segundo lugar, no n.o 156 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral referiu que a medida em causa não confere qualquer direito automático a compensação pelo custo líquido das obrigações do serviço universal da PP, na medida em que, como resulta dos considerandos 16, 84 a 87 e 144 da decisão controvertida, só existe esse direito se as prestações de serviço universal conduzirem a perdas contabilísticas. Nesse n.o 156, o Tribunal Geral acrescenta que esse direito à compensação corresponde ao menor dos montantes relativos quer às perdas contabilísticas resultantes das prestações de serviço universal quer ao custo líquido das obrigações de serviço universal, o que implica, como salientou a Comissão no considerando 144 da decisão controvertida, que a medida em causa é mais restritiva do que o Enquadramento SIEG, uma vez que este permitiu potencialmente uma compensação total do custo líquido das obrigações de serviço universal.

    115

    Ora, admitindo que a jurisprudência resultante dos Acórdãos de 6 de outubro de 2010, Comissão/Bélgica (C‑222/08, EU:C:2010:583), e de 6 de outubro de 2010, Base e o. (C‑389/08, EU:C:2010:584), seja aplicável no âmbito da interpretação da Diretiva Postal, refira‑se, por um lado, que a declaração, no n.o 156 do acórdão recorrido, de que o direito a compensação só é conferido se as prestações de serviços universais comportarem perdas contabilísticas para a empresa encarregada de prestar esses serviços, permite considerar que está preenchido o critério utilizado pelo Tribunal de Justiça no âmbito dessa jurisprudência, isto é, que esse encargo apresenta, para essa empresa, um caráter «excessivo na perspetiva da sua capacidade para o suportar».

    116

    Por outro lado, há que observar que resulta do ponto 25 do Enquadramento SIEG, a que se refere o considerando 144 da decisão controvertida, evocado pelo Tribunal Geral no n.o 156 do acórdão recorrido, que o montante da compensação pode igualmente ser calculado pelo método do «custo líquido evitado», que consiste em calcular o custo líquido necessário, efetivo ou esperado, para executar as obrigações de serviço público, e que corresponde à diferença entre o custo líquido suportado pelo prestador quando este executa essas obrigações e o custo ou o ganho líquido do mesmo prestador quando não as executa. Assim, em face da redação desse ponto 25, tal método de cálculo poderia conduzir, em princípio, a uma compensação pelo custo das obrigações de serviço universal, mesmo sem perdas financeiras por parte do prestador das obrigações de serviço público.

    117

    Ora, as recorrentes não impugnaram que, como acertadamente refere o Tribunal Geral no n.o 156 do acórdão recorrido, esse método de cálculo do direito a compensação é menos restritivo do que o aplicado pela República da Polónia no âmbito da Lei Postal e examinado pela Comissão na decisão controvertida.

    118

    A esse respeito, acresce que o Enquadramento comunitário dos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público (JO 2005, C 297, p. 4) aplicável à data dos factos relevantes no âmbito dos processos que deram origem aos Acórdãos de 6 de outubro de 2010, Comissão/Bélgica (C‑222/08, EU:C:2010:583), e de 6 de outubro de 2010, Base e o. (C‑389/08, EU:C:2010:584), invocados pelas recorrentes, não previa esse método relativo ao «custo líquido evitado», o que confirma que essa jurisprudência não é, seja como for, decisiva para examinar o mérito da apreciação do Tribunal Geral nos presentes recursos.

    119

    Resulta do exposto que a quarta parte do terceiro fundamento deve ser julgada inadmissível e, em todo o caso, improcedente.

    120

    Por conseguinte, na medida em que nenhuma das partes do terceiro fundamento foi acolhida, há que julgar este terceiro fundamento integralmente improcedente.

    Quanto ao quarto fundamento

    Argumentos das partes

    121

    Com o seu quarto fundamento, que visa o n.o 167 do acórdão recorrido, as recorrentes alegam que o Tribunal Geral violou o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva Postal ao aceitar o financiamento do custo do serviço universal por um certo número de direitos exclusivos e especiais conferidos à PP.

    122

    Sublinham que os direitos exclusivos e especiais, diferentes dos previstos no artigo 8.o da Diretiva Postal, de que a PP continuava a beneficiar, foram expressamente enunciados nos considerandos 52 a 56 da decisão controvertida e que a sua existência não constituía um elemento controvertido. Entendem que não era necessário, portanto, para verificar a existência desses serviços, aduzir argumentos suscetíveis de demonstrar que não estavam abrangidos pela categoria dos direitos a que se refere esse artigo 8.o Para o efeito, teria bastado analisar esse artigo, o que o Tribunal Geral não fez. Acrescentam que alguns desses direitos exclusivos e especiais não têm qualquer relação funcional com o serviço universal.

    123

    Na réplica, afirmam ter demonstrado que, contrariamente ao que o Tribunal Geral declarou, resulta das denúncias que apresentaram à Comissão que os direitos exclusivos concedidos à PP não eram admissíveis à luz da regulamentação setorial relativa ao serviço universal. Além disso, aplicando a jurisprudência relevante, o Tribunal Geral teria considerado que se justificava examinar, nomeadamente, as regras de financiamento setorial do serviço universal. A este respeito, lembram que a questão dos direitos exclusivos está funcionalmente ligada ao auxílio em causa concedido à PP.

    124

    A Comissão e o Governo polaco consideram que o quarto fundamento é inadmissível e, de qualquer forma, improcedente.

    Apreciação do Tribunal de Justiça

    125

    No n.o 167 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral observou que as recorrentes não apresentaram nenhum argumento suscetível de demonstrar que os direitos concedidos à PP, conforme precisados nos considerandos 51 a 56 da decisão controvertida, não estavam abrangidos pela exceção expressamente prevista no artigo 8.o da Diretiva Postal e, portanto, suscetível de demonstrar o erro constituído pela alegada violação desta diretiva.

    126

    A este respeito, no âmbito do seu quarto fundamento, as recorrentes alegam, em substância, que os direitos exclusivos e especiais concedidos à PP eram mencionados na decisão controvertida e que a sua existência não constituía um elemento controvertido, o que implicava que não era necessário apresentar argumentos suscetíveis de demonstrar que não estavam abrangidos pela categoria dos direitos visados no referido artigo 8.o da Diretiva Postal.

    127

    Ora, por um lado, há que observar que, ao fazê‑lo, as recorrentes, sem invocarem qualquer desvirtuação da sua argumentação no Tribunal Geral, não alegam qualquer violação dos princípios gerais de direito nem das regras processuais aplicáveis em matéria de ónus e administração da prova.

    128

    Por outro lado, o argumento de que os direitos conferidos à PP constituíam direitos exclusivos e especiais sujeitos à proibição prevista no artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva Postal, e que, por conseguinte, não estavam abrangidos pela exceção do artigo 8.o desta diretiva, não colhe.

    129

    Com efeito, segundo o primeiro período do artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva Postal, os Estados‑Membros não concedem nem mantêm em vigor direitos exclusivos ou especiais para a criação ou prestação de serviços postais. A esse respeito, o artigo 8.o dessa diretiva constitui uma exceção às disposições do artigo 7.o dessa diretiva, pois dispõe que estas não violam o direito de os Estados‑Membros organizarem, em conformidade com a sua legislação nacional, a colocação de marcos do correio na via pública, a emissão de selos postais e o serviço de correio registado utilizado no âmbito de processos judiciais ou administrativos.

    130

    Resulta, assim, da articulação entre as disposições do artigo 7.o, n.o 1, e do artigo 8.o da Diretiva Postal que a existência de direitos exclusivos ou especiais, abrangidos, em princípio, pela proibição prevista no referido artigo 7.o, n.o 1, não implica necessariamente que tais direitos não possam pertencer às diferentes categorias de serviços, visados no artigo 8.o da referida diretiva, que essa proibição não prejudica.

    131

    Por conseguinte, há que concluir pela improcedência do quarto fundamento.

    132

    Resulta de todas estas considerações que, na medida em que nenhum dos fundamentos foi julgado procedente, há que negar provimento aos presentes recursos.

    Quanto às despesas

    133

    Nos termos do disposto no artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, se o recurso da decisão do Tribunal Geral for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decide sobre as despesas.

    134

    O artigo 138.o, n.o 1, deste regulamento, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo regulamento, prevê que a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

    135

    Tendo a Inpost Paczkomaty e a Inpost sido vencidas e tendo a Comissão e o Governo polaco pedido a sua condenação nas despesas, há que condenar essas sociedades nas despesas dos presentes recursos.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) decide:

     

    1)

    Nega‑se provimento aos recursos.

     

    2)

    A Inpost Paczkomaty sp. z o.o. e a Inpost S.A. são condenadas nas despesas.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: polaco.

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