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Document 62018TJ0163

    Acórdão do Tribunal Geral (Nona Secção alargada) de 12 de fevereiro de 2020 (Excertos).
    Gabriel Amisi Kumba contra Conselho da União Europeia.
    Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas adotadas tendo em conta a situação na República Democrática do Congo — Congelamento de fundos — Prorrogação da inclusão do nome do recorrente na lista das pessoas visadas — Dever de fundamentação — Direitos de defesa — Dever de o Conselho comunicar os novos elementos que justificam a renovação das medidas restritivas — Erro de direito — Erro manifesto de apreciação — Direito de propriedade — Proporcionalidade — Presunção de inocência — Exceção de ilegalidade.
    Processo T-163/18.

    ECLI identifier: ECLI:EU:T:2020:57

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Nona Secção alargada)

    12 de fevereiro de 2020 ( *1 )

    «Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas adotadas tendo em conta a situação na República Democrática do Congo — Congelamento de fundos — Prorrogação da inclusão do nome do recorrente na lista das pessoas visadas — Dever de fundamentação — Direitos de defesa — Dever de o Conselho comunicar os novos elementos que justificam a renovação das medidas restritivas — Erro de direito — Erro manifesto de apreciação — Direito de propriedade — Proporcionalidade — Presunção de inocência — Exceção de ilegalidade»

    No processo T‑163/18,

    Gabriel Amisi Kumba, residente em Quinxassa (República Democrática do Congo), representado por T. Bontinck, P. De Wolf, M. Forgeois e A. Guillerme, advogados,

    recorrente,

    contra

    Conselho da União Europeia, representado por J.‑P. Hix, H. Marcos Fraile e S. Van Overmeire, na qualidade de agentes,

    recorrido,

    que tem por objeto um pedido baseado no artigo 263.o TFUE e destinado à anulação da Decisão (PESC) 2017/2282 do Conselho, de 11 de dezembro de 2017, que altera a Decisão 2010/788/PESC que impõe medidas restritivas contra a República Democrática do Congo (JO 2017, L 328, p. 19), na parte em que diz respeito ao recorrente,

    O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção alargada),

    composto por: S. Gervasoni, presidente, L. Madise, R. da Silva Passos (relator), K. Kowalik‑Bańczyk e C. Mac Eochaidh, juízes,

    secretário: L. Ramette, administrador,

    vistos os autos e após a audiência de 4 de julho de 2019,

    profere o presente

    Acórdão ( 1 ) ( 2 )

    Antecedentes do litígio

    1

    O recorrente, Gabriel Amisi Kumba, é um cidadão da República Democrática do Congo.

    2

    O presente processo inscreve‑se no âmbito das medidas restritivas impostas pelo Conselho da União Europeia com vista à instauração de uma paz duradoura na República Democrática do Congo e ao exercício de pressões sobre as pessoas e entidades que atuem em violação do embargo ao armamento imposto a esse Estado.

    3

    Em 18 de julho de 2005, o Conselho adotou, com fundamento nos artigos 60.o, 301.o e 308.o CE, o Regulamento (CE) n.o 1183/2005, que institui certas medidas restritivas específicas contra as pessoas que atuem em violação do embargo ao armamento imposto à República Democrática do Congo (JO 2005, L 193, p. 1).

    4

    Em 20 de dezembro de 2010, o Conselho adotou, com fundamento no artigo 29.o TUE, a Decisão 2010/788/PESC que impõe medidas restritivas contra a República Democrática do Congo e que revoga a Posição Comum 2008/369/PESC (JO 2010, L 336, p. 30).

    5

    Em 12 de dezembro de 2016, o Conselho adotou, com fundamento no artigo 215.o TFUE, o Regulamento (UE) 2016/2230, que altera o Regulamento n.o 1183/2005 (JO 2016, L 336 I, p. 1).

    6

    Na mesma data, o Conselho adotou, com fundamento no artigo 29.o TUE, a Decisão (PESC) 2016/2231, que altera a Decisão 2010/788 (JO 2016, L 336 I, p. 7).

    7

    Os considerandos 2 a 4 da Decisão 2016/2231 têm a seguinte redação:

    «(2)

    Em 17 de outubro de 2016, o Conselho adotou conclusões em que exprimia a sua profunda preocupação com a situação política na República Democrática do Congo (RDC). Em especial, condenou veementemente os atos de extrema violência que tiveram lugar em 19 e 20 de setembro, em Quinxassa, verificando que esses atos agravaram ainda mais a situação de impasse no país devido à não convocação das eleições presidenciais dentro do prazo constitucional de 20 de dezembro de 2016.

    (3)

    O Conselho salientou que, a fim de assegurar um clima propício à realização do diálogo e das eleições, o Governo da RDC deve assumir um compromisso claro de velar pelo respeito dos direitos humanos e do Estado de direito e cessar qualquer instrumentalização da justiça. Convidou ainda todas as partes interessadas a rejeitarem o uso da violência.

    (4)

    O Conselho indicou igualmente que estava preparado para utilizar todos os meios à sua disposição, incluindo o recurso a medidas restritivas contra todos aqueles que sejam responsáveis por graves violações dos direitos humanos, incitem à violência ou entravem uma saída da crise de forma consensual, pacífica e respeitadora da aspiração do povo da RDC a eleger os seus representantes.»

    8

    O artigo 3.o, n.o 2, da Decisão 2010/788, conforme alterado pela Decisão 2016/2231, prevê o seguinte:

    «São impostas as medidas restritivas estabelecidas no artigo 4.o, n.o 1, e no artigo 5.o, n.os 1 e 2, contra as pessoas e entidades:

    a)

    Que entravem uma solução consensual e pacífica para a realização de eleições na [República Democrática do Congo], nomeadamente através de atos de violência, repressão ou incitação à violência ou que comprometam o Estado de direito;

    b)

    Envolvidas no planeamento, na direção ou na prática de atos que constituam violações ou abusos graves dos direitos humanos na [República Democrática do Congo];

    c)

    Associadas às pessoas e entidades a que se referem as alíneas a) e b);

    que constam da lista do anexo II.»

    9

    Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, da Decisão 2010/788, conforme alterado pela Decisão 2016/2231, «[o]s Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para impedir a entrada ou o trânsito pelo seu território das pessoas a que se refere o artigo 3.o».

    10

    O artigo 5.o, n.os 1, 2 e 5, da Decisão 2010/788, conforme alterado pela Decisão 2016/2231, prevê o seguinte:

    «1.   São congelados todos os fundos, outros ativos financeiros e recursos económicos pertencentes ou controlados, direta ou indiretamente, pelas pessoas ou entidades a que se refere o artigo 3.o, ou detidos por entidades pertencentes ou controladas, direta ou indiretamente, por essas pessoas ou entidades ou por pessoas ou entidades que atuem em seu nome ou sob a sua direção, identificadas nos anexos I e II.

    2.   É proibido colocar, direta ou indiretamente, fundos, ativos financeiros ou recursos económicos à disposição das pessoas ou entidades a que se refere o n.o 1, ou disponibilizá‑los em seu proveito.

    […]

    5.   No que respeita às pessoas e entidades a que se refere o artigo 3.o, n.o 2, a autoridade competente de um Estado‑Membro pode autorizar o desbloqueamento de determinados fundos ou recursos económicos congelados, ou a disponibilização de determinados fundos ou recursos económicos, nas condições que considere adequadas, após ter determinado que os fundos ou recursos económicos em causa:

    a)

    São necessários para satisfazer as necessidades básicas das pessoas e entidades, e dos familiares dependentes das pessoas singulares em causa, incluindo os pagamentos de géneros alimentícios, rendas ou empréstimos hipotecários, medicamentos e tratamentos médicos, impostos, apólices de seguro e serviços públicos;

    b)

    Se destinam exclusivamente ao pagamento de honorários profissionais razoáveis e ao reembolso de despesas incorridas associadas à prestação de serviços jurídicos;

    […]

    d)

    São necessários para cobrir despesas extraordinárias, desde que a autoridade competente tenha notificado às autoridades competentes dos outros Estados‑Membros e à Comissão, os motivos por que considera que deve ser concedida uma autorização específica, pelo menos duas semanas antes da autorização.»

    11

    O artigo 6.o, n.o 2, da Decisão 2010/788, conforme alterado pela Decisão 2016/2231, prevê o seguinte:

    «2.   O Conselho, deliberando sob proposta de um Estado‑Membro ou do Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, estabelece e altera a lista constante do anexo II.»

    12

    O artigo 7.o, n.os 2 e 3, da Decisão 2010/788, conforme alterado pela Decisão 2016/2231, prevê o seguinte:

    «2.   O Conselho comunica a decisão a que se refere o artigo 6.o, n.o 2, incluindo os motivos para a inclusão na lista, à pessoa ou entidade em causa, quer diretamente, se o endereço for conhecido, quer através da publicação de um aviso, dando‑lhe a oportunidade de apresentar as suas observações.

    3.   Caso sejam apresentadas observações ou novos elementos de prova, o Conselho reaprecia a sua decisão e informa em conformidade a pessoa ou entidade em causa.»

    13

    Nos termos do artigo 9.o, n.o 2, da Decisão 2010/788, conforme alterado pela Decisão 2016/2231, «[a]s medidas a que se refere o artigo 3.o, n.o 2, são aplicáveis até 12 de dezembro de 2017» e «[p]odem ser prorrogadas, ou alteradas conforme adequado, caso o Conselho considere que os seus objetivos não foram atingidos».

    14

    Em relação ao Regulamento n.o 1183/2005, o artigo 2.o‑B, n.o 1, deste último, conforme alterado pelo Regulamento 2016/2230, prevê o seguinte:

    «1.   O anexo I‑A inclui as pessoas singulares ou coletivas, entidades ou organismos designados pelo Conselho por qualquer dos seguintes motivos:

    […]

    b)

    Estarem envolvidos no planeamento, na direção ou na prática de atos que constituam violações ou abusos graves dos direitos humanos na [República Democrática do Congo].»

    15

    O nome do recorrente foi acrescentado pela Decisão 2016/2231 à lista de pessoas e entidades do anexo II da Decisão 2010/788 (a seguir «lista controvertida») e pelo Regulamento 2016/2230 à lista de pessoas e entidades do anexo I‑A do Regulamento n.o 1183/2005.

    16

    No anexo II da Decisão 2010/788, conforme alterado pela Decisão 2016/2231, e no anexo I‑A do Regulamento n.o 1183/2005, conforme alterado pelo Regulamento 2016/2230, o Conselho justificou a adoção de medidas restritivas contra o recorrente com base nos seguintes fundamentos:

    «Comandante da 1.a zona de defesa do Exército Congolês (FARDC) cujas forças participaram no uso desproporcionado da força e na repressão violenta em setembro de 2016 em Quinxassa. Nessa qualidade, Gabriel Amisi Kumba esteve, pois, envolvido no planeamento, na direção ou na prática de atos que constituem violações graves dos direitos humanos na [República Democrática do Congo].»

    17

    Em 13 de dezembro de 2016, o Conselho publicou no Jornal Oficial da União Europeia um aviso à atenção das pessoas e entidades sujeitas às medidas restritivas previstas na Decisão 2010/788, com a redação que lhe foi dada pela Decisão 2016/2231, e no Regulamento n.o 1183/2005, com a redação que lhe foi dada pelo Regulamento 2016/2230, que impõem medidas restritivas contra a República Democrática do Congo (JO 2016, C 463, p. 2). Nesse aviso, esclarecia‑se nomeadamente que as pessoas em causa podiam enviar ao Conselho, antes de 1 de outubro de 2017, um requerimento acompanhado de documentação justificativa, para que seja reapreciada a decisão de as incluir na lista controvertida e na lista das pessoas e entidades que constam do anexo I‑A do Regulamento n.o 1183/2005, juntando‑lhe documentos justificativos. O referido aviso indicava também que as observações recebidas seriam tidas em conta para efeitos da reapreciação posterior do Conselho, nos termos do artigo 9.o da Decisão 2010/788.

    18

    Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de março de 2017, o recorrente interpôs um recurso com vista, em substância, à anulação do Regulamento 2016/2230, na parte em que esse ato lhe dizia respeito. Esse recurso foi registado com o número de processo T‑141/17.

    19

    Em 29 de maio de 2017, o Conselho adotou, com fundamento no artigo 31.o, n.o 2, TUE e no artigo 6.o, n.o 2, da Decisão 2010/788, a Decisão de Execução (PESC) 2017/905, que dá execução à Decisão 2010/788 (JO 2017, L 138 I, p. 6). Na mesma data, o Conselho adotou o Regulamento de Execução (UE) 2017/904, que dá execução ao artigo 9.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1183/2005 (JO 2017, L 138 I, p. 1). Com esses atos, os nomes de outras pessoas singulares foram acrescentados, respetivamente, à lista controvertida e à lista que consta do anexo I‑A do Regulamento n.o 1183/2005.

    20

    Em 11 de dezembro de 2017, no termo do processus de reapreciação das medidas controvertidas, o Conselho adotou, com fundamento no artigo 29.o TUE, a Decisão (PESC) 2017/2282, que altera a Decisão 2010/788 (JO 2017, L 328, p. 19, a seguir «decisão impugnada»). O artigo 1.o desta decisão substituiu, assim, o texto do artigo 9.o, n.o 2, da Decisão 2010/788 pelo texto seguinte:

    «As medidas a que se refere o artigo 3.o, n.o 2, são aplicáveis até 12 de dezembro de 2018. Podem ser prorrogadas, ou alteradas conforme adequado, caso o Conselho considere que os seus objetivos não foram atingidos.»

    21

    Na sequência da desistência do recorrente, o processo T‑141/17, mencionado no n.o 18, supra, foi cancelado no registo do Tribunal Geral por Despacho de 7 de dezembro de 2018.

    Tramitação do processo e pedidos das partes

    22

    Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de março de 2018, o recorrente interpôs o presente recurso.

    23

    Por Decisão de 12 de outubro de 2018, o presidente da Nona Secção do Tribunal Geral decidiu apensar o presente processo aos processos T‑164/18, Kampete/Conselho, T‑165/18, Kahimbi Kasagwe/Conselho, T‑166/18, Luyoyo/Conselho, T‑167/18, Kanyama/Conselho, T‑168/18, Numbi/Conselho, e T‑169/18, Kibelisa Ngambasai/Conselho, para efeitos da fase escrita e da eventual fase oral do processo.

    24

    Por proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral decidiu dar início à fase oral do processo. Em 15 de maio de 2019, o Tribunal Geral remeteu o processo à Nona Secção Alargada.

    25

    As partes foram ouvidas nas suas alegações e nas suas respostas às questões orais colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 4 de julho de 2019.

    26

    O recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

    anular a decisão impugnada, na parte em que este ato lhe diz respeito;

    condenar o Conselho nas despesas.

    27

    O Conselho conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

    negar provimento ao recurso;

    a título subsidiário, em caso de anulação da decisão impugnada, manter os seus efeitos em relação ao recorrente até ao termo do prazo de recurso do acórdão do Tribunal Geral ou, se for interposto recurso nesse prazo, até lhe ser negado provimento;

    condenar o recorrente nas despesas.

    Questão de direito

    28

    Em apoio do seu pedido de anulação da decisão impugnada, o recorrente invoca quatro fundamentos, relativos, o primeiro, à violação do dever de fundamentação e do direito de ser ouvido, o segundo, a um erro de direito e a um erro manifesto de apreciação, o terceiro, a uma violação do direito ao respeito da vida privada e familiar, do direito de propriedade e do princípio da proporcionalidade e, o quarto, à ilegalidade do artigo 3.o, n.o 2, alínea b), da Decisão 2010/788 e do artigo 2.o‑B, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1183/2005.

    Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do dever de fundamentação e do direito de ser ouvido

    29

    O primeiro fundamento divide‑se em duas partes, relativas, respetivamente, a primeira, a uma violação do dever de fundamentação, e a segunda, a uma violação do direito de ser ouvido.

    Quanto à primeira parte do primeiro fundamento

    30

    Na primeira parte do primeiro fundamento, o recorrente alega que o Conselho violou o dever de fundamentação de um ato lesivo previsto no artigo 296.o TFUE. O recorrente alega que a fundamentação da decisão impugnada é especialmente sucinta, uma vez que o Conselho não formula nenhuma acusação precisa nem nenhum facto específico e identificável que permitam, sem dúvida séria, atribuir‑lhe as acusações formuladas a seu respeito na referida fundamentação. Segundo o recorrente, a decisão impugnada baseia‑se, assim, em meras afirmações presumíveis, impossíveis de verificar e que o colocam na obrigação de apresentar provas negativas da inexistência dos factos gerais que lhe são imputados, o que implica uma inversão do ónus da prova.

    31

    O Conselho contesta estes argumentos.

    32

    A este respeito, antes de mais, há que recordar que o dever de fundamentar um ato lesivo, tal como previsto no artigo 296.o, segundo parágrafo, TFUE, tem por objetivo, por um lado, fornecer ao interessado uma indicação suficiente para saber se o ato é fundado ou se enferma eventualmente de um vício que permita impugnar a sua validade no Tribunal da União e, por outro, permitir a este último exercer a sua fiscalização da legalidade desse ato. O dever de fundamentação assim instituído constitui um princípio essencial do direito da União, que apenas admite derrogações com base em considerações imperativas. Por conseguinte, a fundamentação deve, em princípio, ser comunicada ao interessado ao mesmo tempo que o ato lesivo, não podendo a sua falta ser sanada pelo facto de o interessado tomar conhecimento dos fundamentos do ato no decurso do processo perante o juiz da União (Acórdão de 7 de dezembro de 2011, HTTS/Conselho, T‑562/10, EU:T:2011:716, n.o 32).

    33

    Depois, a fundamentação deve ser adaptada à natureza do ato em causa e ao contexto em que o mesmo foi adotado. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas direta e individualmente afetadas pelo ato podem ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que o caráter suficiente de uma fundamentação deve ser apreciado tendo em conta não só o seu teor, mas também o seu contexto e o conjunto das regras jurídicas que regulam a matéria em causa. Em especial, um ato lesivo está suficientemente fundamentado quando tiver sido adotado num contexto conhecido do interessado, que lhe permita compreender o alcance da medida adotada a seu respeito (Acórdãos de 15 de novembro de 2012, Conselho/Bamba, C‑417/11 P, EU:C:2012:718, n.o 54; e de 14 de outubro de 2009, Bank Melli Iran/Conselho, T‑390/08, EU:T:2009:401, n.o 82).

    34

    A obrigação de fundamentação à qual o Conselho está sujeito diz respeito, por um lado, à indicação da base jurídica da medida adotada e, por outro, às circunstâncias que permitem considerar que um ou outro dos critérios de inclusão está preenchido no caso dos interessados (Acórdão de 18 de setembro de 2014, Central Bank of Iran/Conselho, T‑262/12, não publicado, EU:T:2014:777, n.o 86).

    35

    Por conseguinte, há que examinar se a fundamentação do ato recorrido contém referências explícitas ao critério de inclusão controvertido e se, sendo caso disso, essa fundamentação pode ser considerada suficiente para permitir ao recorrente verificar o mérito do ato impugnado e defender‑se perante o Tribunal Geral, e a este último exercer a sua fiscalização (v., neste sentido, Acórdão de 18 de setembro de 2014, Central Bank of Iran/Conselho, T‑262/12, não publicado, EU:T:2014:777, n.o 88).

    36

    Por último, a fundamentação de um ato do Conselho que impõe uma medida restritiva não deve apenas identificar a base jurídica dessa medida, mas também as razões específicas e concretas pelas quais o Conselho considera, no exercício do seu poder discricionário de apreciação, que o interessado deve ser objeto dessa medida (Acórdãos de 15 de novembro de 2012, Conselho/Bamba, C‑417/11 P, EU:C:2012:718, n.o 52; e de 25 de março de 2015, Central Bank of Iran/Conselho, T‑563/12, EU:T:2015:187, n.o 55).

    37

    No caso em apreço, importa sublinhar que a decisão impugnada tem por objeto prorrogar a inclusão do nome do recorrente na lista controvertida, mantendo os fundamentos acolhidos pelo Conselho, aquando da inclusão inicial do seu nome, na Decisão 2016/2231, que alterou a Decisão 2010/788.

    38

    Segundo o recorrente, tais fundamentos são especialmente sucintos, uma vez que o Conselho não formula nenhuma censura específica que permita atribuir‑lhe as acusações formuladas a seu respeito nos referidos fundamentos.

    39

    A este respeito, importa recordar que o artigo 3.o, n.o 2, alínea b), da Decisão 2010/788, inserido nesta última pela Decisão 2016/2231, estabelece que o anexo II inclui as pessoas e entidades que foram consideradas pelo Conselho como «[e]nvolvidas no planeamento, na direção ou na prática de atos que constituam violações ou abusos graves dos direitos humanos na [República Democrática do Congo]».

    40

    Importa igualmente recordar que a fundamentação adotada pelo Conselho para a inclusão do nome do recorrente na lista controvertida, reproduzida no n.o 16, supra, visa a sua qualidade de comandante da 1.a zona de defesa das Forças Armadas da República Democrática do Congo (FARDC) e da participação destas últimas no uso desproporcionado da força e na repressão violenta que foram ordenadas em setembro de 2016 em Quinxassa (República Democrática do Congo).

    41

    Essa fundamentação identifica os elementos específicos e concretos, que incidem tanto sobre as funções profissionais exercidas pelo recorrente como sobre o tipo de ato referido, e mostra que o recorrente esteve implicado em graves violações dos direitos humanos na República Democrática do Congo. Com efeito, permite compreender as razões que levaram o Conselho a adotar medidas restritivas contra o recorrente devido à sua alegada responsabilidade, pelas suas funções de comandante da 1.a zona de defesa das FARDC, no uso desproporcionado da força e na repressão violenta que foram ordenadas em setembro de 2016 em Quinxassa.

    42

    Como o Conselho alega com razão, a fundamentação da inclusão do nome do recorrente na lista controvertida, prorrogada pela decisão impugnada, expõe as razões específicas e concretas pelas quais os critérios de inclusão lhe eram aplicáveis e, nomeadamente, por um lado, menciona uma base jurídica claramente identificada e que remete para os critérios de inclusão e, por outro, assenta em fundamentos relativos às atividades do recorrente que lhe permitem compreender as razões que justificaram a inclusão do seu nome na lista controvertida. Acresce que o contexto da adoção da decisão impugnada era conhecido do recorrente, uma vez que contestou, em substância, no Tribunal Geral, a legalidade da primeira inclusão do seu nome, como foi recordado nos n.os 18 e 21, supra, e que os fundamentos dessa inclusão não foram alterados pela decisão impugnada.

    43

    Por conseguinte, o recorrente não podia razoavelmente ignorar que, quando, através da decisão recorrida, o Conselho confirmou os motivos da inclusão inicial do seu nome na lista controvertida, decidida na Decisão 2016/2231, referiu‑se ao facto de que, atendendo às suas funções de comandante da 1.a zona de defesa das FARDC, dispunha do poder de facto de influenciar de forma direta os comportamentos dos militares das FARDC, que tinha estado implicados no uso desproporcionado da força e na repressão violenta que foram ordenados em setembro de 2016 em Quinxassa.

    44

    Tendo em atenção os fundamentos da inclusão do seu nome na lista controvertida, o recorrente estava em condições de contestar utilmente o mérito das medidas restritivas adotadas contra si. Era‑lhe possível, portanto, contestar a realidade dos factos em que se baseia a decisão recorrida, nomeadamente negando a sua qualidade de comandante das FARDC ou a sua responsabilidade no uso desproporcionado da força e na repressão violenta que implicaram as FARDC em setembro de 2016 em Quinxassa, ou contestando a existência de tais acontecimentos, ou ainda refutando o facto de ter estado envolvido no planeamento, na direção ou na prática de atos que constituam violações ou abusos graves dos direitos humanos na República Democrática do Congo. Foi, aliás, o que fez, em substância, no âmbito da segunda parte do segundo fundamento, relativa a um erro manifesto de apreciação.

    45

    Daqui decorre que a fundamentação da decisão impugnada era suficiente para permitir ao recorrente contestar a sua validade e ao Tribunal Geral exercer a sua fiscalização da legalidade. Por conseguinte, a primeira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

    Quanto à segunda parte do primeiro fundamento

    46

    Com a segunda parte do primeiro fundamento, o recorrente alega que o Conselho violou o seu direito de ser ouvido. Considera que, embora seja verdade que o efeito surpresa necessário a uma medida de congelamento de fundos implica que o Conselho não seja obrigado a proceder a uma audição antes da inclusão inicial do nome de uma pessoa ou de uma entidade numa lista que impõe medidas restritivas, não é menos verdade que, como no caso em apreço, no âmbito de uma reapreciação dessa decisão de inclusão inicial, o referido efeito já não tem razão de ser e o princípio do contraditório deve ser respeitado tanto no que se refere à comunicação dos fundamentos previamente à decisão de manutenção na lista controvertida, como ao direito de ser ouvido. Acrescenta que pediu uma audição ao Conselho, mas que, à data da interposição do presente recurso, este não se tinha pronunciado sobre esse pedido.

    47

    Na réplica, por um lado, o recorrente alega que nunca foi ouvido pelo Secretariado conjunto das Nações Unidas para os Direitos do Homem (BCNUDH) aquando da elaboração dos diversos relatórios utilizados pelo Conselho para sustentar a decisão impugnada, o que não respeita os critérios estabelecidos na jurisprudência e demonstra que devia ter sido ouvido antes da adoção da decisão impugnada, tanto mais que forneceu ao Conselho, em 21 de fevereiro de 2018, elementos suscetíveis de pôr em causa o mérito dos fundamentos acolhidos. Por outro lado, o recorrente alega que, em relação à decisão inicial de inclusão do seu nome na lista controvertida, o Conselho considerou novos elementos de prova a seu respeito com vista à adoção da decisão impugnada.

    48

    O Conselho contesta estes argumentos sublinhando que a decisão impugnada assenta nos mesmos fundamentos que os que serviram de base à inclusão inicial do nome do recorrente na lista controvertida, nos termos da Decisão 2016/2231. Daqui resulta que não estava obrigado a ouvir o recorrente antes de adotar a decisão impugnada.

    49

    A este respeito, importa recordar que o artigo 41.o, n.o 2, alínea a), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») prevê que qualquer pessoa tem o direito a ser ouvida antes de a seu respeito ser tomada qualquer medida individual que a afete desfavoravelmente.

    50

    Segundo a jurisprudência, no âmbito de um procedimento de adoção da decisão de inscrição ou de manutenção do nome de uma pessoa na lista que figura no anexo de um ato que adota medidas restritivas, o respeito dos direitos de defesa e do direito a uma proteção jurisdicional efetiva exige que a autoridade competente da União comunique à pessoa interessada os elementos de que dispõe contra a referida pessoa para basear a sua decisão, para que esta pessoa possa defender os seus direitos nas melhores condições possíveis e decidir com pleno conhecimento de causa se é útil recorrer ao juiz da União. Além disso, quando desta comunicação, a autoridade competente da União deve permitir que esta pessoa dê utilmente a conhecer o seu ponto de vista sobre os motivos contra ela invocados (Acórdãos de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.os 111 e 112; e de 12 de dezembro de 2006, Organisation des Modjahedines du peuple d’Iran/Conselho, T‑228/02, EU:T:2006:384, n.o 93).

    51

    Em relação a um primeiro ato pelo qual os fundos de uma pessoa ou de uma entidade são congelados, o Conselho não tem de comunicar previamente à pessoa ou à entidade em causa os motivos nos quais se baseia para justificar a inclusão inicial do seu nome na lista de pessoas e entidades cujos fundos são congelados. Com efeito, para uma medida desse tipo não comprometer a sua eficácia, deve, pela sua própria natureza, poder beneficiar do efeito surpresa e ser aplicada imediatamente. Nesse caso, é suficiente, em princípio, que a instituição comunique as razões à pessoa ou entidade em causa e lhe conceda o direito a ser ouvida simultaneamente com ou imediatamente após a adoção da decisão de congelamento de fundos (Acórdão de 21 de dezembro de 2011, França/People’s Mojahedin Organization of Iran, C‑27/09 P, EU:C:2011:853, n.o 61).

    52

    Em contrapartida, no caso de uma decisão subsequente de congelamento de fundos pela qual o nome de uma pessoa ou de uma entidade que já figura na lista de pessoas e entidades cujos fundos são congelados é aí mantido, não é necessário esse efeito surpresa para assegurar a eficácia da medida, pelo que a adoção dessa decisão deve, em princípio, ser precedida de uma comunicação dos elementos que lhe são imputados, bem como da oportunidade concedida à pessoa ou à entidade em causa de ser ouvida (Acórdão de 21 de dezembro de 2011, França/People’s Mojahedin Organization of Iran, C‑27/09 P, EU:C:2011:853, n.o 62).

    53

    A este propósito, o Tribunal de Justiça salientou que o elemento de proteção proporcionado pela exigência de notificação dos elementos de acusação e pelo direito de apresentar observações antes da adoção de atos que mantêm o nome de uma pessoa ou de uma entidade numa lista de pessoas ou entidades abrangidas por medidas restritivas era fundamental e essencial aos direitos de defesa. Muito mais quando as medidas restritivas em questão têm uma incidência importante nos direitos e liberdades das pessoas e dos grupos visados (Acórdão de 21 de dezembro de 2011, França/People’s Mojahedin Organization of Iran, C‑27/09 P, EU:C:2011:853, n.o 64).

    54

    Este direito de ser ouvido antes da adoção desses atos impõe‑se quando o Conselho teve em conta, na decisão de manutenção da inscrição do seu nome nessa lista, novos elementos contra essa pessoa, isto é, elementos que não figuravam na decisão inicial de inscrição do seu nome nessa lista (v., neste sentido, Acórdãos de 18 de junho de 2015, Ipatau/Conselho, C‑535/14 P, EU:C:2015:407, n.o 26 e jurisprudência referida; e de 7 de abril de 2016, Central Bank of Iran/Conselho, C‑266/15 P, EU:C:2016:208, n.o 33).

    55

    No caso em apreço, efetivamente, como sublinha o Conselho, a manutenção da inclusão do nome do recorrente na lista controvertida, decidida na decisão impugnada, baseou‑se nos mesmos fundamentos que justificaram a adoção do ato inicial que impõe as medidas restritivas em questão.

    56

    Todavia, esta circunstância não pode, por si só, implicar que o Conselho não era obrigado a respeitar os direitos de defesa do recorrente e, em especial, a proporcionar‑lhe a possibilidade de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre os elementos de facto com base nos quais adotou a decisão impugnada, que mantém a inclusão do seu nome na lista controvertida.

    57

    Com efeito, a existência de uma violação dos direitos de defesa deve ser apreciada em função das circunstâncias específicas de cada caso concreto, nomeadamente, da natureza do ato em causa, do contexto em que foi adotado e das normas jurídicas que regem a matéria em causa (v. Acórdão de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.o 102 e jurisprudência referida).

    58

    A este respeito, importa sublinhar que as medidas restritivas têm natureza cautelar e, por definição, provisória, cuja validade é sempre subordinada à perpetuação das circunstâncias de facto e de direito que antecederam a sua aprovação, bem como à necessidade da sua manutenção tendo em vista a realização do objetivo que lhe é associado (v., neste sentido, Acórdão de 21 de março de 2014, Yusef/Comissão, T‑306/10, EU:T:2014:141, n.os 62 e 63). É neste sentido que o artigo 9.o, n.o 2, da Decisão 2010/788, conforme alterado pela Decisão 2016/2231, prevê que as medidas restritivas contra a República Democrática do Congo são aplicáveis até 12 de dezembro de 2017 e podem ser «prorrogadas, ou alteradas conforme adequado, caso o Conselho considere que os seus objetivos não foram atingidos».

    59

    Daqui resulta que, na reapreciação periódica dessas medidas restritivas, compete ao Conselho proceder a uma apreciação atualizada da situação e elaborar um balanço do impacto dessas medidas, a fim de determinar se as mesmas permitiram alcançar os objetivos visados pela inclusão inicial dos nomes das pessoas e entidades em causa na lista controvertida ou se continua a ser possível retirar a mesma conclusão relativamente às referidas pessoas e entidades.

    60

    A este respeito, no Acórdão de 27 de setembro de 2018, Ezz e o./Conselho (T‑288/15, EU:T:2018:619, n.o 316 e jurisprudência referida), o Tribunal Geral declarou que o respeito dos direitos de defesa implicava que o Conselho comunicasse aos recorrentes, antes de adotar uma decisão de renovação das medidas restritivas a seu respeito, os elementos pelos quais tinha procedido, no momento da reapreciação periódica das medidas em causa, a uma reatualização das informações que tinham justificado a inclusão inicial do seu nome na lista das pessoas objeto dessas medidas restritivas.

    61

    Assim, no caso em apreço, em relação ao objetivo inicial visado pelas medidas restritivas contra a República Democrática do Congo, a saber, no essencial, assegurar um clima propício à realização de eleições e pôr fim às violações dos direitos humanos (v. n.o 7, supra), há que considerar que o Conselho tinha, aquando do exame periódico das medidas restritivas impostas ao recorrente, de lhe comunicar, sendo caso disso, os elementos novos pelos quais tinha reatualizado as informações relativas não só à sua situação pessoal, mas também à situação politica e de segurança na República Democrática do Congo.

    62

    Ora, resulta dos documentos dos autos que o Conselho, como confirmou na audiência em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral, adotou a decisão impugnada tendo em conta, além das informações de que já dispunha aquando da inclusão inicial do nome do recorrente na lista controvertida, as informações contidas no documento interno de 23 de outubro de 2017 com a referência COREU CFSP/1492/17. Em primeiro lugar, esse documento de 23 de outubro de 2017 mencionava a falta, nessa data, de publicação de um calendário eleitoral e o anúncio pela Comissão eleitoral nacional independente, em 11 de outubro de 2017, da necessidade de pelo menos 504 dias para organizar eleições. Em segundo lugar, no mesmo documento, era indicado que a Missão das Nações Unidas na República Democrática do Congo (Monusco) tinha relatado, por um lado, uma degradação da situação de segurança em numerosas zonas da República Democrática do Congo e, por outro, um aumento da instabilidade regional após a partida de civis que fugiram das zonas de conflito. Em terceiro lugar, o citado documento referia que as liberdades de reunião, de opinião e de expressão continuavam a ser reprimidas, como testemunhavam a proibição de manifestações contra a falta de publicação de um calendário eleitoral e, em agosto de 2017, o bloqueio dos meios de comunicação social após o anúncio de uma greve geral.

    63

    Do mesmo modo, resulta das conclusões do Conselho de 11 de dezembro de 2017 que este último tinha conhecimento, no momento da adoção da decisão impugnada, de outro elemento de atualização, a saber, o anúncio de um calendário eleitoral que, em 5 de novembro de 2017, fixou a data das eleições presidenciais em 23 de dezembro de 2018. Todavia, tal anúncio não impediu o Conselho de considerar que o statu quo persistia na República Democrática do Congo.

    64

    Por conseguinte, embora, com a decisão impugnada, o Conselho tenha reconduzido as medidas restritivas contra o recorrente por motivos idênticos aos considerados, para a inclusão inicial do seu nome na lista controvertida, na Decisão 2016/2231, os elementos de atualização referidos nos n.os 62 e 63, supra, constituem elementos novos que foram tidos em conta pelo Conselho aquando da adoção da decisão impugnada. Consequentemente, o Conselho deveria ter recolhido as observações do recorrente sobre esses elementos antes da adoção dessa decisão, em conformidade com o que foi enunciado no n.o 61, supra. Ora, está provado que isso não sucedeu.

    65

    A este respeito, é irrelevante o facto de, por um lado, a inclusão inicial do nome do recorrente na lista controvertida ter sido seguida da publicação no Jornal Oficial de um aviso às pessoas afetadas pelas referidas medidas, nos termos do qual essas pessoas eram convidadas a apresentar ao Conselho, antes de 1 de outubro de 2017, um pedido de reapreciação, e de, por outro, o recorrente não ter feito uso dessa possibilidade. Com efeito, o Conselho não pode ser exonerado da obrigação que lhe compete de respeitar os direitos de defesa pelo facto de uma pessoa que é objeto de medidas restritivas ter a possibilidade de pedir que tais medidas deixem de lhe ser aplicadas.

    66

    De resto, não resulta dos documentos dos autos que o recorrente podia prever que o Conselho concluiria pelo statu quo relativo à situação na República Democrática do Congo tendo em conta os elementos descritos nos n.os 62 e 63, supra, relativos à falta de publicação de um calendário eleitoral, à deterioração da segurança e à perpetuação da repressão de liberdades públicas em numerosas regiões do país, elementos sobre os quais o recorrente não pôde transmitir as suas observações antes da adoção da decisão impugnada. A este respeito importa recordar que as medidas restritivas têm caráter provisório (v. n.o 58, supra), o qual é garantido pelas próprias disposições da decisão impugnada (v. n.o 20, supra).

    67

    Nestas circunstâncias, há que considerar que a decisão impugnada foi adotada no termo de um processo no decurso do qual os direitos de defesa do recorrente não foram respeitados.

    68

    No entanto, não se pode deduzir de tudo o que precede que a falta de comunicação pelo Conselho ao recorrente dos elementos novos mencionados no documento interno de 23 de outubro de 2017, com a referência COREU CFSP/1492/17, e nas conclusões do Conselho de 11 de dezembro de 2017, bem como a circunstância de o recorrente não ter podido transmitir as suas observações sobre esses elementos antes de o Conselho adotar a decisão impugnada, acarreta a anulação desta última.

    69

    Com efeito, compete ao juiz da União verificar, quando em presença de uma irregularidade que afeta os direitos de defesa, se, em função das circunstâncias de facto e de direito específicas do caso em apreço, o processo em causa teria podido conduzir a um resultado diferente na medida em que o recorrente teria podido assegurar melhor a sua defesa se essa irregularidade não existisse (v., neste sentido, Acórdãos de 1 de outubro de 2009, Foshan Shunde Yongjian Housewares & Hardware/Conselho, C‑141/08 P, EU:C:2009:598, n.os 81, 88, 92, 94 e 107; e de 27 de setembro de 2018, Ezz e o./Conselho, T‑288/15, EU:T:2018:619, n.o 325 e jurisprudência referida).

    70

    Ora, no caso em apreço não há nenhum elemento dos autos que permita supor que, se tivessem sido comunicados ao recorrente os elementos novos pelos quais o Conselho atualizou a sua apreciação da situação política e de segurança na República Democrática do Congo, as medidas restritivas em causa poderiam não ter sido mantidas a seu respeito.

    71

    A este propósito, há que salientar que o recorrente não forneceu indícios precisos que indiquem que, se tivesse podido, antes da adoção da decisão impugnada, apresentar as suas observações sobre os elementos novos descritos nos n.os 62 e 63, supra, teria podido pôr em causa o seu conteúdo ou a sua pertinência com vista à prorrogação da inclusão do seu nome na lista controvertida.

    72

    Aliás, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral na audiência, o recorrente não contestou, enquanto tal, a existência de um statu quo na República Democrática do Congo entre o momento da inclusão inicial do seu nome na lista controvertida, decidida em 13 de dezembro de 2016, e a adoção da decisão impugnada, que mantém as medidas restritivas em causa.

    73

    Nestas condições, não se pode considerar que, mesmo que tivessem sido comunicados ao recorrente os elementos mencionados nos n.os 62 e 63, supra, previamente à adoção da decisão impugnada, o desfecho do processo teria podido ser diferente. Também o facto de o Conselho ter tido em conta determinados elementos novos quando renovou as medidas restritivas em relação ao recorrente não é suscetível de tornar ilegal a decisão impugnada.

    74

    Por outro lado, na medida em que o recorrente alega, em apoio da segunda parte do primeiro fundamento, a circunstância de não ter sido ouvido pelo BCNUDH no âmbito da elaboração, por este último, de relatórios invocados pelo Conselho em apoio da decisão impugnada, basta salientar que os órgãos jurisdicionais da União não são competentes para fiscalizar a conformidade dos inquéritos conduzidos pelos órgãos da Organização das Nações Unidas (ONU) com os direitos fundamentais (v., neste sentido, Acórdão de 20 de julho de 2017, Badica e Kardiam/Conselho, T‑619/15, EU:T:2017:532, n.o 65).

    75

    Por último, o argumento do recorrente de que o Conselho devia ter procedido à sua audição deve ser afastado, dado que nem a regulamentação em causa nem o princípio geral do respeito dos direitos de defesa lhe conferem o direito a uma audição formal (v., por analogia, Acórdão de 6 de setembro de 2013, Bank Melli Iran/Conselho, T‑35/10 e T‑7/11, EU:T:2013:397, n.o 105 e jurisprudência referida).

    76

    Tendo em conta tudo o que exposto, há que julgar improcedente a segunda parte do primeiro fundamento e, por conseguinte, este fundamento na sua totalidade.

    Quanto ao segundo fundamento, relativo a um erro de direito e a um erro manifesto de apreciação

    77

    Com o segundo fundamento, o recorrente alega que o Conselho cometeu erros quando concluiu que tinha estado «envolvido no planeamento, na direção ou na prática de atos que constituam violações graves dos direitos humanos na República Democrática do Congo».

    78

    O presente fundamento divide‑se em duas partes. Com a primeira parte, o recorrente alega, no essencial, que o Conselho cometeu um erro de direito quando manteve a inclusão do seu nome na lista controvertida devido a factos que, no momento da adoção da decisão impugnada, tinham cessado. Com a segunda parte, o recorrente contesta a apreciação feita pelo Conselho sobre as suas funções e as suas missões, bem como a presença de elementos factuais suficientemente precisos e concretos em apoio da manutenção da inclusão do seu nome na lista controvertida.

    Quanto à primeira parte do segundo fundamento

    79

    Com a primeira parte do segundo fundamento, o recorrente alega que os factos considerados pelo Conselho, nos fundamentos da inclusão do seu nome na lista controvertida, se enquadram num período temporal ultrapassado. Com efeito, resulta do emprego do particípio presente no artigo 3.o, n.o 2, da Decisão 2010/788, conforme alterado pela Decisão 2016/2231, que os factos imputados às pessoas ou entidades objeto de medidas restritivas devem perdurar no momento da sua renovação. Ora, a falta de implicação atual do recorrente nos factos que lhe eram imputados, na data da adoção da decisão impugnada, torna obsoletas as medidas restritivas em questão.

    80

    O recorrente acrescenta que, ao manter estas medidas por factos que já não eram atuais, o Conselho tinha adotado, na realidade, uma sanção penal dissimulada, quando as medidas restritivas têm apenas alcance cautelar, cujo objetivo é levar os seus destinatários a alterar o seu comportamento.

    81

    A este respeito, importa sublinhar que, como foi recordado no n.o 8, supra, o artigo 3.o, n.o 2, alínea b), da Decisão 2010/788, conforme alterado pela Decisão 2016/2231, prevê a imposição de medidas restritivas contra pessoas e entidades que estejam «[e]nvolvidas no planeamento, na direção ou na prática de atos que constituam violações ou abusos graves dos direitos humanos na [República Democrática do Congo]». Foi com este fundamento que o nome do recorrente foi inicialmente incluído na lista controvertida, pela Decisão 2016/2231, com o fundamento de que, enquanto comandante da 1.a zona de defesa das FARDC, estava implicado na participação destas últimas no uso desproporcionado da força e na repressão violenta que foram ordenados em setembro de 2016 em Quinxassa (v. n.o 16, supra). Com a decisão impugnada, o Conselho prorrogou as medidas restritivas contra o recorrente até 12 de dezembro de 2018, conservando de forma idêntica os motivos da inclusão inicial do seu nome na lista controvertida (v. n.o 20, supra).

    82

    Ora, em primeiro lugar, não se pode considerar que o emprego, no artigo 3.o, n.o 2, alínea b), da Decisão 2010/788, conforme alterado pela Decisão 2016/2231, do particípio presente na definição dos critérios de inclusão na lista controvertida implica que os factos na origem da inclusão do nome de uma pessoa ou de uma entidade nessa lista devem perdurar no momento em que a inclusão ou a sua manutenção são decididas. Com efeito, já foi declarado que, em matéria de inclusão numa lista de nomes de pessoas e entidades visadas por medidas restritivas, o particípio presente remete para o sentido geral próprio das definições legais, e não para um dado período temporal (v., neste sentido, Acórdão de 23 de outubro de 2008, People’s Mojahedin Organization of Iran/Conselho, T‑256/07, EU:T:2008:461, n.o 108).

    83

    Em segundo lugar, o facto de os motivos de inclusão do nome do recorrente na lista controvertida se referirem a factos ocorridos antes da adoção da decisão impugnada e que estavam terminados nessa data não implica necessariamente que as medidas restritivas mantidas a seu respeito por essa decisão eram obsoletas. Manifestamente, na medida em que o Conselho decidiu referir‑se, nos fundamentos de inclusão do nome do recorrente na lista controvertida, a situações concretas que implicavam as forças armadas que ele comandava, só podiam estar em causa atuações no passado. Essa referência, portanto, não pode ser considerada irrelevante pela simples razão de os comportamentos em causa pertencerem a um passado mais ou menos afastado (v., neste sentido, Acórdão de 22 de abril de 2015, Tomana e o./Conselho e Comissão, T‑190/12, EU:T:2015:222, n.o 236).

    84

    Esta interpretação é corroborada pelo artigo 9.o, n.o 2, segundo período, da Decisão 2010/788, conforme alterado pela decisão impugnada, segundo a qual as medidas restritivas em causa podem ser prorrogadas, ou alteradas conforme adequado, caso o Conselho considere que os seus objetivos não foram atingidos. Sob pena de privar esta disposição do seu efeito útil, há que considerar que permite a manutenção na lista controvertida dos nomes de pessoas e de entidades que não cometeram qualquer nova violação dos direitos humanos durante o período anterior à reapreciação, se essa manutenção se mantiver justificada tendo em conta todas as circunstâncias pertinentes e, nomeadamente, tendo em conta que os objetivos visados pelas medidas restritivas não foram alcançados (v., por analogia, Acórdão de 23 de outubro de 2008, People’s Mojahedin Organization of Iran/Conselho, T‑256/07, EU:T:2008:461, n.o 108).

    85

    Consequentemente, contrariamente ao que o recorrente alega, os fundamentos para a inclusão do seu nome na lista controvertida não conferem às medidas restritivas que lhe foram aplicadas e, que foram prolongadas pela decisão impugnada, uma natureza penal.

    86

    Assim sendo, a primeira parte do segundo fundamento deve ser julgada improcedente.

    [omissis]

     

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção alargada)

    decide:

     

    1)

    É negado provimento ao recurso.

     

    2)

    Gabriel Amisi Kumba é condenado no pagamento das despesas.

     

    Gervasoni

    Madise

    da Silva Passos

    Kowalik‑Bańczyk

    Mac Eochaidh

    Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 12 de fevereiro de 2020.

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: francês.

    ( 1 ) Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal Geral considera útil.

    ( 2 ) Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal Geral considera útil. No que se refere aos pontos omitidos, remete‑se para o acórdão do Tribunal Geral de,... […]. (T‑..., EU:..).

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