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Document 62018CJ0823

Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 25 de novembro de 2020.
Comissão Europeia contra GEA Group AG.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Acordos, decisões e práticas concertadas — Mercados europeus dos estabilizadores térmicos à base de estanho, óleo de soja epoxidado e dos ésteres — Fixação dos preços, repartição dos mercados e troca de informações comerciais sensíveis — Aplicação do limite máximo de 10 % do volume de negócios a uma das entidades que constituem a empresa — Anulação da decisão que altera a coima fixada na decisão inicial de declaração da infração — Coimas — Conceito de “empresa” — Responsabilidade solidária pelo pagamento da coima — Princípio da igualdade de tratamento — Data de exigibilidade da coima em caso de alteração.
Processo C-823/18 P.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2020:955

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

25 de novembro de 2020 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Acordos, decisões e práticas concertadas — Mercados europeus dos estabilizadores térmicos à base de estanho, óleo de soja epoxidado e dos ésteres — Fixação dos preços, repartição dos mercados e troca de informações comerciais sensíveis — Aplicação do limite máximo de 10 % do volume de negócios a uma das entidades que constituem a empresa — Anulação da decisão que altera a coima fixada na decisão inicial de declaração da infração — Coimas — Conceito de “empresa” — Responsabilidade solidária pelo pagamento da coima — Princípio da igualdade de tratamento — Data de exigibilidade da coima em caso de alteração»

No processo C‑823/18 P,

que tem por objeto um recurso de um acórdão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 27 de dezembro de 2018,

Comissão Europeia, representada inicialmente por T. Christoforou, P. Rossi e V. Bottka e, em seguida, por P. Rossi e V. Bottka, na qualidade de agentes,

recorrente,

sendo a outra parte no processo:

GEA Group AG, com sede em Düsseldorf (Alemanha), representada por C. Wagner e I. du Mont, Rechtsanwälte,

demandante em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: A. Arabadjiev (relator), presidente de secção, K. Lenaerts, presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Segunda Secção, A. Kumin, T. von Danwitz e P. G. Xuereb, juízes,

advogado‑geral: G. Pitruzzella,

secretário: M. Longar, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 5 de fevereiro de 2020,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 4 de junho de 2020,

profere o presente

Acórdão

1

Com o presente recurso, a Comissão Europeia pede a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 18 de outubro de 2018, GEA Group/Comissão (T‑640/16, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2018:700), pelo qual anulou a Decisão C(2016) 3920 final da Comissão, de 29 de junho de 2016, que altera a Decisão C(2009) 8682 final da Comissão, de 11 de novembro de 2009, relativa a um procedimento de aplicação do artigo 81.o [CE] e do artigo 53.o do Acordo EEE (processo COMP/38589 — Estabilizadores térmicos) (a seguir «decisão controvertida»).

I. Quadro jurídico

2

O artigo 23.o, n.os 2 e 3, do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.o e 82.o [CE] (JO 2003, L 1, p. 1), dispõe:

«2.   A Comissão pode, mediante decisão, aplicar coimas às empresas e associações de empresas sempre que, deliberadamente ou por negligência:

a)

Cometam uma infração ao disposto nos artigos 81.o ou 82.o do Tratado; ou

b)

Não respeitem uma decisão tomada nos termos do artigo 8.o que ordene medidas provisórias; ou

c)

Não respeitem um compromisso tornado obrigatório por decisão tomada nos termos do artigo 9.o

A coima aplicada a cada uma das empresas ou associações de empresas que tenha participado na infração não deve exceder 10 % do respetivo volume de negócios total realizado durante o exercício precedente.

Quando a infração cometida por uma associação se referir às atividades dos seus membros, a coima não deve exceder 10 % da soma do volume de negócios total de cada membro ativo no mercado cujas atividades forem afetadas pela infração da associação.

3.   Quando se determinar o montante da coima, deve tomar‑se em consideração a gravidade e a duração da infração.»

3

Nos termos do artigo 25.o, n.o 5, desse regulamento:

«O prazo de prescrição recomeça a ser contado a partir de cada interrupção. Todavia, a prescrição produz efeitos o mais tardar no dia em que um prazo igual ao dobro do prazo de prescrição chegar ao seu termo sem que a Comissão tenha aplicado uma coima ou uma sanção pecuniária compulsória. Este prazo é prorrogado pelo período durante o qual a prescrição tiver sido suspensa nos termos do n.o 6.»

II. Antecedentes do litígio e decisão controvertida

4

Os antecedentes do litígio foram expostos nos n.os 1 a 23 do acórdão recorrido e podem resumir‑se da seguinte forma.

5

A GEA Group AG (a seguir «GEA») resultou da fusão, em 2005, da Metallgesellschaft AG (a seguir «MG») com outra sociedade. A MG era a sociedade holding que, antes de 2000, detinha, diretamente ou através de filiais, a Chemson Gesellschaft für Polymer‑Additive mbH (a seguir «OCG») e a Polymer‑Additive Produktions‑ und Vertriebs GmbH (a seguir «OCA»).

6

Em 17 de maio de 2000, a MG cedeu a OCG, que passou a denominar‑se Aachener Chemische Werke Gesellschaft für glastechnische Produkte und Verfahren mbH (a seguir «ACW»).

7

Após a dissolução da OCA em maio de 2000, as atividades desta sociedade foram retomadas por uma sociedade denominada, a partir de 30 de agosto de 2000, Chemson Polymer‑Additive AG (a seguir «CPA»), que à data da prolação do acórdão recorrido já não pertencia ao grupo de que a GEA era a sociedade holding.

A. Decisão de 2009

8

Com a sua Decisão C(2009) 8682 final, de 11 de novembro de 2009, relativa a um procedimento de aplicação do artigo 81.o [CE] e do artigo 53.o do Acordo EEE (processo COMP/38589 — Estabilizadores térmicos) (a seguir «Decisão de 2009»), a Comissão considerou que determinadas empresas tinham violado o artigo 81.o CE e o artigo 53.o do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, de 2 de maio de 1992 (JO 1994, L 1, p. 3; a seguir «Acordo EEE»), ao participarem em dois conjuntos de acordos e de práticas concertadas anticoncorrenciais que abrangem o território do Espaço Económico Europeu e respeitantes, por um lado, ao setor dos estabilizadores térmicos à base de estanho e, por outro, ao setor dos estabilizadores térmicos à base de óleo de soja epoxidado e de ésteres (a seguir «setor ESBO/ésteres»).

9

No seu artigo 1.o, n.o 2, alínea k), da Decisão de 2009, a Comissão considerou a GEA responsável pelas infrações cometidas no mercado do setor ESBO/ésteres entre 11 de setembro de 1991 e 17 de maio de 2000.

10

A sua responsabilidade foi declarada para a totalidade do período da infração, na qualidade de sucessora da MG, para as infrações cometidas, entre 11 de setembro de 1991 e 17 de maio de 2000, pela OCG e, entre 13 de março de 1997 e 17 de maio de 2000, pela OCA.

11

Por outro lado, na qualidade de sucessora da OCG, a ACW foi punida, por um lado, pela infração cometida pela OCG durante a totalidade do período da infração, ou seja, entre 11 de setembro de 1991 e 17 de maio de 2000 e, por outro, pela infração cometida pela OCA entre 30 de setembro de 1999 e 17 de maio de 2000, embora as quotas desta última fossem detidas a 100 % pela OCG.

12

Na qualidade de sucessora da OCA, a CPA foi punida, por um lado, pela infração cometida pela OCA entre 13 de março de 1997 e 17 de maio de 2000 e, por outro, pela infração cometida pela OCG entre 30 de setembro de 1995 e 30 de setembro de 1999, embora o capital desta última fosse detido a 100 % pela OCA.

13

Nos termos do artigo 2.o da Decisão 2008/2009:

«[…]

Pela(s) infração(ões) no [setor ESBO/ésteres] são aplicadas as seguintes coimas:

[…]

31) A [GEA], a [ACW] e a [CPA] são […] solidariamente responsáveis pelo montante de 1913971 [euros];

32) A [GEA] e a [ACW] são […] solidariamente responsáveis pelo montante de 1432229 [euros];

As coimas serão pagas em euros no prazo de três meses a contar da data de notificação da presente decisão […]»

14

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 28 de janeiro de 2010, a GEA interpôs recurso de anulação da Decisão de 2009.

15

Por Acórdão de 15 de julho de 2015, GEA Group/Comissão (T‑45/10, não publicado, EU:T:215:507), o Tribunal Geral negou provimento a esse recurso. Este acórdão não foi objeto de recurso para o Tribunal de Justiça.

B. Decisão de 2010

16

Em 15 de dezembro de 2009, a ACW chamou a atenção da Comissão para o facto de a coima que lhe tinha sido aplicada na Decisão de 2009 ultrapassar o limite máximo autorizado de 10 % do seu volume de negócios, nos termos do artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003.

17

Nessas circunstâncias, a Comissão aprovou, em 8 de fevereiro de 2010, a Decisão C(2010) 727 final, que altera a Decisão de 2009 (a seguir «Decisão de 2010»).

18

Na Decisão de 2010, a Comissão considerou que a coima aplicada à ACW solidariamente com, por um lado, a GEA e a CPA e, por outro, a GEA, ultrapassava o limite máximo de 10 % do seu volume de negócios, pelo que se impunha alterar a Decisão de 2009.

19

A Comissão precisou igualmente que o montante da coima aplicada à GEA e à CPA se mantinha inalterado, mas que o montante da coima aplicada à ACW devia ser reduzido e que a Decisão de 2010 não afetava os outros destinatários da Decisão de 2009.

20

O artigo 1.o da Decisão de 2010 alterou o artigo 2.o, segundo parágrafo, da Decisão de 2009 nos seguintes termos:

«O artigo 2.o, [segundo parágrafo, ponto] 31), passa a ter a seguinte redação:

“31.a) A [GEA], a [ACW] e a [CPA] são [solidariamente] responsáveis pelo montante de 1 086 129 [euros];

31.b) A [GEA] e a [CPA] são [solidariamente] responsáveis pelo montante de 827842 [euros]”.

O artigo 2.o, [segundo parágrafo, ponto] 32), passa a ter a seguinte redação:

“32) A [GEA] é responsável pelo montante de 1432229 [euros].”»

21

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 20 de abril de 2010, a GEA interpôs recurso de anulação da Decisão de 2010 e pediu ao Tribunal Geral, a título subsidiário, que alterasse o montante da coima que lhe tinha sido aplicada.

22

Por Acórdão de 15 de julho de 2015, GEA Goup/Comissão (T‑189/10, EU:T:2015:504), o Tribunal Geral anulou a Decisão de 2010, na parte que dizia respeito à GEA. O Tribunal Geral declarou que a Comissão tinha violado os direitos de defesa desta sociedade ao adotar essa decisão sem a ter ouvido previamente. Este acórdão não foi objeto de recurso para o Tribunal de Justiça.

C. Decisão controvertida

23

Em 29 de junho de 2016, a Comissão adotou a decisão controvertida.

24

O artigo 1.o dessa decisão retomou integralmente os termos, reproduzidos no n.o 20 do presente acórdão, do artigo 1.o da Decisão de 2010, que alterava o artigo 2.o, segundo parágrafo, da Decisão de 2009.

25

O artigo 2.o da decisão controvertida fixou a data de exigibilidade das coimas em 10 de maio de 2010.

III. Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

26

Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de setembro de 2016, a GEA interpôs recurso de anulação da decisão controvertida.

27

A GEA alegou cinco fundamentos de recurso, relativos, o primeiro, a uma violação das regras de prescrição, o segundo, a uma violação do artigo 266.o TFUE e dos direitos de defesa, o terceiro, a uma violação do artigo 23.o, n.os 2 e 3, do Regulamento n.o 1/2003, o quarto, a uma violação do princípio da igualdade de tratamento e o quinto, que comporta duas partes, a abuso de poder e falta de fundamentação.

28

No acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou procedente o quarto fundamento e a primeira parte do quinto e, considerando que não era necessário examinar os outros fundamentos do recurso, anulou a decisão controvertida.

IV. Pedidos das partes

29

A Comissão pede ao Tribunal de Justiça que se digne:

anular o acórdão recorrido e

condenar a GEA nas despesas suportadas tanto no Tribunal Geral como no Tribunal de Justiça.

30

A GEA pede que o Tribunal de Justiça se digne:

negar provimento ao recurso; e

condenar a Comissão nas despesas.

V. Quanto ao recurso

31

Em apoio do seu recurso, a Comissão invoca dois fundamentos, relativos, o primeiro, à aplicação errada do princípio da igualdade de tratamento, do conceito de empresa e das regras da responsabilidade solidária, bem como à violação do dever de fundamentação, e, o segundo, a uma violação das regras de fixação da data de exigibilidade das coimas em matéria de direito da concorrência e a uma violação do dever de fundamentação.

A. Quanto à admissibilidade

1.   Argumentos das partes

32

A GEA considera inadmissível o recurso da Comissão.

33

A este respeito, a GEA alega, em primeiro lugar, que a Comissão não tem nenhum interesse em interpor o recurso porque a Decisão de 2009 já não constitui uma base jurídica que permita pedir o pagamento da coima.

34

Em segundo lugar, a GEA considera que a Comissão não tem nenhum interesse em interpor recurso porque a decisão controvertida não é válida. Com efeito, o prazo de prescrição para a fixação de uma coima expirou antes da adoção dessa decisão, uma vez que decorreram mais de dez anos, nos termos do artigo 25.o, n.o 5, do Regulamento n.o 1/2003, independentemente da questão de saber se esse prazo foi interrompido ou não.

35

A Comissão responde que tem interesse em interpor recurso do acórdão recorrido, uma vez que, em primeiro lugar, foi vencida no Tribunal Geral e, em segundo lugar, ao alegar que esta instituição não tem nenhum interesse em interpor esse recurso devido a uma alegada ultrapassagem do prazo de prescrição para a aplicação de uma coima, a GEA contesta a validade da decisão controvertida. Ora, segundo a Comissão, tal fundamento não foi suscitado perante o Tribunal Geral nem examinado por este. Daqui resulta que não há que examiná‑lo.

2.   Apreciação do Tribunal de Justiça

36

Nos termos do artigo 56.o, terceiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, com exceção dos casos relativos a litígios entre a União Europeia e os seus agentes, os recursos de decisões do Tribunal Geral podem ser interpostos pelos Estados‑Membros e instituições da União que não intervieram no litígio perante o Tribunal Geral. Tenham ou não sido partes no litígio em primeira instância, as Instituições da União não têm de fazer prova do seu interesse para poder interpor recurso de um acórdão do Tribunal Geral (Acórdão de 8 de julho de 1999, Comissão/Anic Partecipazioni, C‑49/92 P, EU:C:1999:356, n.o 171).

37

Com efeito, a Comissão é livre para apreciar da oportunidade de interpor recurso de uma decisão do Tribunal Geral e não cabe ao Tribunal de Justiça controlar as opções desta a esse respeito (v., neste sentido, Acórdão de 8 de julho de 1999, Comissão/Anic Partecipazioni, C‑49/92 P, EU:C:1999:356, n.o 172).

38

Assim, basta declarar que as objeções da GEA relativas a uma alegada falta de interesse por parte da Comissão são infundadas, pelo que há que considerar que o recurso é admissível.

B. Quanto ao mérito

1.   Quanto ao primeiro fundamento

39

O primeiro fundamento é composto por duas partes. Na primeira parte deste fundamento, a Comissão acusa o Tribunal Geral de ter cometido um erro na aplicação do princípio da igualdade de tratamento, do conceito de empresa e das regras da responsabilidade solidária, ao considerar que poderia ter determinado diferentemente a parte da coima por cujo pagamento a GEA e a ACW continuavam solidariamente responsáveis. A segunda parte do referido fundamento, que importa examinar em primeiro lugar, é relativa à violação do dever de fundamentação.

a)   Quanto à segunda parte do primeiro fundamento

1) Argumentos das partes

40

Com a segunda parte do seu primeiro fundamento, a Comissão sustenta que a constatação, no n.o 111 do acórdão recorrido, segundo a qual violou o princípio da igualdade de tratamento assenta numa fundamentação contraditória desenvolvida nos n.os 108 a 110 do referido acórdão e, nomeadamente, na consideração vaga, que consta do n.o 108 do mesmo acórdão, de que «a Comissão teria certamente podido determinar de maneira diferente a parte da coima [por] cujo pagamento a ACW e a [GEA] continuavam solidariamente responsáveis».

41

A GEA contesta esta argumentação.

2) Apreciação do Tribunal de Justiça

42

Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o dever de fundamentar os acórdãos, que incumbe ao Tribunal Geral por força dos artigos 36.o e 53.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, não o obriga a apresentar uma exposição que acompanhe exaustiva e individualmente todos os passos do raciocínio articulado pelas partes no litígio. A fundamentação pode, portanto, ser implícita, na condição de permitir aos interessados conhecerem os fundamentos em que o Tribunal Geral se baseia e ao Tribunal de Justiça dispor de elementos suficientes para exercer a sua fiscalização no âmbito de um recurso (Acórdão de 14 de setembro de 2016, Trafilerie Meridionali/Comissão, C‑519/15 P, EU:C:2016:682, n.o 41).

43

No caso em apreço, basta observar que o raciocínio exposto pelo Tribunal Geral nos n.os 106 a 111 do acórdão recorrido é suscetível de permitir tanto à Comissão conhecer as razões pelas quais o Tribunal Geral acolheu o quarto fundamento invocado pela GEA em primeira instância como ao Tribunal de Justiça dispor de elementos suficientes para exercer a sua fiscalização jurisdicional.

44

Com efeito, resulta inequivocamente destes pontos que, segundo o Tribunal Geral, a Comissão deveria, num primeiro momento, ter determinado a proporção existente entre a parte da coima pela qual a ACW era solidariamente responsável com a GEA e a CPA, e a parte pela qual era solidariamente responsável unicamente com a GEA e, num segundo momento, ter repartido a redução do montante da coima da ACW entre as duas relações de solidariedade aplicando a mesma proporção.

45

Atendendo ao exposto, há que julgar improcedente a segunda parte do primeiro fundamento.

b)   Quanto à primeira parte do primeiro fundamento

1) Argumentos das partes

46

Com a primeira parte do seu primeiro fundamento, a Comissão considera que o Tribunal Geral considerou erradamente, no n.o 108 do acórdão recorrido, que poderia ter determinado diferentemente a parte da coima a cujo pagamento a GEA e a ACW continuavam solidariamente obrigadas, a fim de limitar a parte da coima de que a GEA podia ser única devedora. Segundo a Comissão, o Tribunal Geral, nos n.os 106 a 111 do acórdão recorrido, cometeu um erro na aplicação do princípio da igualdade de tratamento, ignorando a jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre o conceito de empresa e sobre a responsabilidade solidária, bem como sobre as consequências de uma redução de coima concedida a uma filial numa empresa económica única.

47

Segundo a Comissão, a responsabilidade solidária é apenas uma manifestação do conceito de empresa e não pode ser dele dissociada.

48

A este respeito, esta instituição alega que, contrariamente ao que o Tribunal Geral declarou no n.o 55 do acórdão recorrido, a GEA, a ACW e a CPA formavam no período de duração da infração em causa uma única e mesma empresa à qual aplicou uma única coima e que, neste contexto, o artigo 2.o, segundo parágrafo, pontos 31 e 32, da Decisão de 2009, por um lado, e o artigo 2.o, segundo parágrafo, pontos 31.a), 31.b), e 32, da Decisão de 2009, conforme alterada pela decisão controvertida, por outro, são a expressão de diferentes montantes máximos da coima pelos quais cada uma das entidades jurídicas que integram a empresa podia ser considerada conjunta e solidariamente responsável.

49

A Comissão precisa que, uma vez que a GEA, a ACW e a CPA formavam uma única e mesma empresa, não havia que apreciar a igualdade de tratamento entre estas três sociedades.

50

A Comissão considera que, apesar de as sociedades em causa fazerem parte da mesma empresa, o Tribunal Geral procedeu, nos n.os 106 a 111 do acórdão recorrido, a uma separação artificial entre dois grupos de entidades solidariamente responsáveis, pelo que esse órgão jurisdicional aplicou uma teoria análoga à teoria da repartição interna da responsabilidade solidária, abordagem que é proibida, em seu entender, em conformidade com os ensinamentos do Acórdão de 10 de abril de 2014, Comissão e o./Siemens Österreich e o. (C‑231/11 P a C‑233/11 P, EU:C:2014:256).

51

Nestas condições, a Comissão considera que nada justifica excluir uma ou outra das sociedades pertencentes a uma única e mesma empresa da responsabilidade solidária pelo pagamento de uma qualquer parte da coima que lhes é aplicada, e que essas sociedades partilham normalmente as partes comuns de uma coima aplicada até aos limites individuais de cada uma delas.

52

A Comissão alega que o montante máximo da coima a cujo pagamento cada sociedade que compõe a empresa na aceção do artigo 81.o CE estava solidariamente obrigada não corresponde a um período específico de participação na infração em causa.

53

Por último, no que respeita ao facto de a coima aplicada à ACW ter sido reduzida para o limite de 10 % do seu volume de negócios, aplicável a esta sociedade, resulta do Acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão (C‑50/12 P, EU:C:2013:771), que a responsabilidade da GEA não deve ser afetada pela redução concedida à sua antiga filial ACW, uma vez que, à data da adoção da Decisão de 2009, esta última sociedade e a GEA já não formavam uma mesma empresa.

54

A GEA contrapõe, antes de mais, que o Tribunal Geral considerou, corretamente, que a Comissão violou, sem qualquer justificação objetiva, o princípio da igualdade de tratamento. Ao contrário do que a Comissão afirma, esse princípio é aplicável não apenas a empresas diferentes mas também nas relações entre sociedades que fazem parte da mesma empresa.

55

Em seguida, a GEA considera que a Comissão fixou não uma única coima, mas duas coimas distintas para dois grupos de entidades distintas, conjunta e solidariamente responsáveis entre si em cada grupo, e por dois períodos de infração diferentes. Por um lado, o artigo 2.o, segundo parágrafo, ponto 31, da Decisão de 2009 refere‑se ao período de 30 de setembro de 1995 a 17 de maio de 2000 e, por outro, o artigo 2.o, segundo parágrafo, ponto 32, desta decisão remete para o período de 11 de setembro de 1991 a 29 de setembro de 1995. Essa repartição seria consequência do facto de a CPA não ter participado na infração em causa durante este último período.

56

Além disso, a GEA considera que o Tribunal Geral não aplicou por analogia a teoria da repartição interna da responsabilidade solidária, contrariamente ao que alega a Comissão. O acórdão recorrido diz respeito não à responsabilidade de um ponto de vista interno, mas sim à medida em que as sociedades do «grupo GEA» são «externamente» responsáveis perante a Comissão.

57

Por último, no que respeita aos efeitos da aplicação do limite de 10 % do volume de negócios a favor da ACW, a GEA alega que, contrariamente ao que sustenta a Comissão, o Acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão (C‑50/12 P, EU:C:2013:771), não pode ser interpretado no sentido de que uma antiga sociedade‑mãe não deve ser afetada pela aplicação à sua antiga filial do limite de 10 % do seu volume de negócios.

2) Apreciação do Tribunal de Justiça

58

A título liminar, deve recordar‑se que o princípio da igualdade de tratamento constitui um princípio geral do direito da União, consagrado nos artigos 20.o e 21.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Esse princípio exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de modo igual, a menos que esse tratamento seja objetivamente justificado (Acórdão de 24 de setembro de 2020, Prysmian e Prysmian Cavi e Sistemi/Comissão, C‑601/18 P, EU:C:2020:751, n.o 101 e jurisprudência aí referida). A Comissão é obrigada a respeitar este princípio quando exerce o poder, de que dispõe por força do artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, de aplicar uma coima a empresas que cometeram uma infração às regras do direito da concorrência da União e determina o respetivo montante (v., neste sentido, Acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão, C‑50/12 P, EU:C:2013:771, n.o 63 e jurisprudência aí referida).

59

Posto isto, quando várias pessoas jurídicas podem ser pessoalmente responsabilizadas pela participação numa infração às normas do direito da concorrência da União, pelo facto de pertencerem a uma única empresa à qual essa infração pode ser imputada, a Comissão dispõe, por força do artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, do poder de lhes aplicar solidariamente uma coima (Acórdão de 10 de abril de 2014, Areva e o./Comissão, C‑247/11 P e C‑253/11 P, EU:C:2014:257, n.o 120).

60

Todavia, quando decide exercer o poder punitivo, a Comissão não pode determinar livremente a relação externa da solidariedade e, em especial, o montante da coima cujo pagamento integral pode exigir de cada um dos codevedores solidários (Acórdão de 10 de abril de 2014, Areva e o./Comissão, C‑247/11 P e C‑253/11 P, EU:C:2014:257, n.o 121).

61

Com efeito, uma vez que, no direito da União, o conceito de solidariedade no pagamento da coima mais não é do que uma manifestação de um efeito de pleno direito do conceito de empresa, a determinação do montante da coima a cujo pagamento integral cada um dos codevedores solidários pode ser obrigado pela Comissão resulta da aplicação, num caso concreto, desse conceito de empresa (Acórdão de 10 de abril de 2014, Areva e o./Comissão, C‑247/11 P e C‑253/11 P, EU:C:2014:257, n.o 122).

62

A este respeito, a opção dos autores dos Tratados foi utilizar o conceito de empresa para designar o autor de uma infração ao direito da concorrência, passível de ser punido nos termos dos artigos 81.o e 82.o CE, e não outros conceitos como os de sociedade ou de pessoa coletiva (Acórdão de 10 de 2014, Areva e o./Comissão, C‑247/11 P e C‑253/11 P, EU:C:2014:257, n.o 123).

63

De resto, foi esse mesmo conceito de empresa que o legislador da União adotou no artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 para definir a entidade à qual a Comissão pode aplicar uma coima para punir uma infração às normas do direito da concorrência da União (Acórdão de 10 de abril de 2014, Areva e o./Comissão, C‑247/11 P e C‑253/11 P, EU:C:2014:257 , n.o 124).

64

Segundo jurisprudência assente, o conceito de «empresa», na aceção do direito da concorrência da União, designa qualquer entidade que exerça uma atividade económica, independentemente do seu estatuto jurídico e do seu modo de financiamento. Esse conceito designa uma unidade económica, mesmo que, do ponto de vista jurídico, essa unidade seja constituída por várias pessoas singulares ou coletivas (Acórdãos de 10 de abril de 2014, Areva e o./Comissão, C‑247/11 P e C‑253/11 P, EU:C:2014:257, n.o 125, e de 27 de abril de 2017, Akzo Nobel e o./Comissão, C‑516/15 P, EU:C:2017:314, n.os 47 e 48).

65

Quando a Comissão dispõe, por força do artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, da faculdade de condenar solidariamente numa coima várias pessoas jurídicas que fazem parte de uma única e mesma empresa responsável pela infração, a determinação do montante dessa coima pela Comissão, na medida em que resulta da aplicação do conceito de empresa a um caso concreto, que é um conceito do direito da União, está sujeita a certas restrições que impõem que se tenham devidamente em conta as características da empresa em causa, tal como era constituída durante o período em que a infração foi cometida (Acórdão de 10 de abril de 2014, Comissão e o./Siemens Österreich e o., C‑231/11 P a C‑233/11 P, EU:C:2014:256, n.o 51).

66

A este respeito, como salientou, em substância, o advogado‑geral no n.o 49 das suas conclusões, a composição da empresa em causa pode assumir configurações diferentes no decurso da participação dessa empresa numa infração, em função das diferentes entidades que entram ou saem da sua composição. Estas variações são suscetíveis de ocorrer, em particular, quando, como no caso em apreço, a infração se protrai no tempo por um longo período.

67

Uma vez que essas variações não põem em causa a unicidade da empresa enquanto pessoa coletiva à qual é imputável a infração, não afetam o poder da Comissão, recordado no n.o 59 do presente acórdão, de aplicar solidariamente uma coima a várias pessoas jurídicas pertencentes a uma única e mesma empresa.

68

No caso em apreço, como resulta dos n.os 1 a 3 e 6 a 8 do acórdão recorrido, a estrutura do grupo GEA, durante o período em que a infração foi cometida, era a seguinte. Entre o ano de 1991 e 17 de maio de 2000, a OCG, que depois desta última data era denominada ACW, era uma filial a 100 % da MG, que, por sua vez, passou a ser GEA a partir de 2005. Durante esse mesmo período, a OCA, que a partir de 30 de agosto de 2000, é denominada CPA, era detida a 100 % pela MG e, durante diferentes períodos, era filial ou sociedade‑mãe direta da OCG. A OCA foi a sociedade‑mãe com um controlo direto a 100 % da OCG de 30 de setembro de 1995 a 30 de setembro de 1999. De 30 de setembro de 1999 a 17 de maio de 2000, a OCG foi a sociedade‑mãe com um controlo direto a 100 % da OCA e exerceu um controlo direto sobre esta última sociedade.

69

Tendo em conta os ensinamentos decorrentes do Acórdão de 10 de setembro de 2009, Akzo Nobel e o./Comissão (C‑97/08 P, EU:C:2009:536), a Comissão podia declarar na Decisão de 2009 que, tendo em conta os vínculos económicos, organizacionais e jurídicos que unem as sociedades em causa, exercendo uma influência determinante sobre as suas filiais, a MG, atual GEA, fazia parte, com a OCG e a OCA, que se tornaram, respetivamente, ACW e CPA, de uma única empresa, na aceção do direito da concorrência da União.

70

Resulta das considerações precedentes que a Comissão podia validamente considerar que a GEA, a ACW e a CPA formavam uma única e mesma empresa que, nas suas diferentes configurações sucessivas, cometeu a infração em causa.

71

Assim, há que reconhecer que, ao considerar, no n.o 55 do acórdão recorrido, que havia, por um lado, uma empresa, na aceção do direito da concorrência da União, composta pela GEA, pela ACW e pela CPA, de 30 de setembro de 1995 a 17 de maio de 2000 e, por outro, uma empresa, na aceção desse direito, composta pela GEA e pela ACW de 11 de setembro de 1991 a 29 de setembro de 1995, o Tribunal Geral concluiu pela existência de duas empresas na aceção do direito da concorrência da União e, portanto, cometeu um erro de direito ao não ter em conta o conceito de «empresa», na aceção do artigo 81.o CE.

72

Uma vez que a responsabilidade solidária é apenas uma manifestação de um efeito de pleno direito do conceito de empresa e que, no caso em apreço, existia uma única e mesma empresa, a Comissão tinha o direito de determinar, inicialmente no artigo 2.o, segundo parágrafo, pontos 31 e 32, da Decisão de 2009, e, em seguida, no artigo 2.o, segundo parágrafo, pontos 31.a), 31.b) e 32, da Decisão de 2009, conforme alterada pela decisão controvertida, os montantes máximos da coima pela qual podiam ser consideradas conjunta e solidariamente responsáveis a GEA, a ACW e a CPA pelo pagamento de uma única coima enquanto entidades que faziam parte de uma única e mesma empresa a quem é imputável a infração em causa. Com efeito, como a Comissão salientou, numa situação como a que está em causa, a fixação desses montantes máximos não reflete períodos específicos da participação das entidades que compõem a empresa única na infração em causa.

73

Nestas condições, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao declarar, nos n.os 106 e 109 do acórdão recorrido, que, no caso em apreço, existiam duas relações de solidariedade entre a GEA, a ACW e a CPA, quando estas faziam parte de uma única e mesma empresa, e duas coimas aplicadas por dois períodos específicos que refletiam a participação dessas três sociedades na infração em causa e, portanto, violou as regras da determinação da responsabilidade solidária tal como resultam do artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003.

74

Quanto ao facto de, por força da decisão controvertida, a GEA passar a ser a única responsável pelo montante de 1432229 euros, esta circunstância é, como salientou o advogado‑geral no n.o 53 das suas conclusões, uma consequência puramente automática da redução da coima aplicada à ACW.

75

A este respeito, há que salientar que, quando duas pessoas coletivas distintas, como uma sociedade‑mãe e a sua filial, já não constituírem uma empresa na aceção do artigo 81.o CE, na data da adoção de uma decisão que lhes impõe uma coima têm direito a que lhe seja aplicado individualmente o limite de 10 % do respetivo volume de negócios (v., neste sentido, Acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão, C‑50/12 P, EU:C:2013:771, n.o 57).

76

No caso em apreço, como resulta dos n.os 2 e 3 do acórdão recorrido, é pacífico que, à data da adoção da Decisão de 2009, a GEA já não constituía uma entidade económica com a ACW e a CPA na aceção do artigo 81.o CE.

77

Esta particularidade levou a Comissão a calcular separadamente o referido limite com base no volume de negócios, tal como foi realizado durante o exercício social que precedeu a adoção da decisão controvertida (v., por analogia, Acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão, C‑50/12 P, EU:C:2013:771, n.o 67).

78

Por outro lado, como resulta do n.o 8 do acórdão recorrido, o montante que a Comissão considerou inicialmente adequado imputar a título da responsabilidade solidária da ACW pela sua participação no cartel correspondia a 3346200 euros, ou seja, exatamente o mesmo montante que o considerado para a GEA.

79

Ora, há que considerar que o facto de, na decisão controvertida, a Comissão ter considerado, por um lado, a GEA solidariamente responsável pelo pagamento do montante total da coima, que ascende a 3346200 euros, e, por outro, a ACW solidariamente responsável pelo pagamento de um montante de 1086129 euros, resulta da aplicação à ACW do limite de 10 % do volume de negócios previsto no artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003.

80

Assim, o facto de a GEA passar a ser a única responsável pelo montante de 1432229 euros resulta da circunstância específica de, à data da adoção da Decisão de 2009, esta sociedade já não constituir uma única empresa com a ACW e a CPA na aceção do artigo 81.o CE.

81

Neste contexto, a GEA não pode defender utilmente que tinha sido cometida uma violação do princípio da igualdade de tratamento em seu prejuízo. A este respeito, basta salientar que uma violação deste princípio não pode ser declarada numa situação como a que está em causa, em que uma sociedade filial, que, à data da adoção de uma decisão que aplica uma coima à empresa única a que pertencia, já não faz parte dessa empresa única, tem direito a que lhe seja aplicado individualmente o limite de 10 % do volume de negócios. Esta circunstância específica não permite considerar que as sociedades em questão se encontravam em situações comparáveis (v., neste sentido, Acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão, C‑50/12 P, EU:C:2013:771, n.o 68).

82

Em todo o caso, não se pode utilmente invocar uma violação do princípio da igualdade de tratamento, uma vez que, no caso em apreço, como resulta do n.o 73 do presente acórdão, não há duas relações de solidariedade que reflitam períodos específicos e, logo, não pode ser efetuada nenhuma repartição da responsabilidade solidária.

83

Por conseguinte, o artigo 2.o, segundo parágrafo, ponto 32, da Decisão de 2009, conforme alterada pela decisão controvertida, que aplica o montante da coima de 1432229 euros à GEA, não se dirige à CPA não porque este ponto tenha por objeto um período de infração específico durante o qual esta não participou na infração única declarada pela Comissão, o que não é o caso, mas simplesmente porque o montante da coima de que a CPA é devedora a título da sua participação individual nessa infração em razão da sua pertença à empresa que a cometeu, está totalmente abrangido pelos montantes da coima previstos nos pontos 31.a) e 31.b) do referido artigo 2.o, segundo parágrafo.

84

Nestas circunstâncias, há que concluir que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar, no n.o 111 do acórdão recorrido, que a Comissão não respeitou as suas obrigações decorrentes do princípio da igualdade de tratamento.

85

Tendo em conta o conjunto das considerações que precedem, há que julgar procedente a primeira parte do primeiro fundamento.

2.   Quanto ao segundo fundamento

86

O segundo fundamento é composto por duas partes. Na sua primeira parte a Comissão acusa, em substância, o Tribunal Geral de ter cometido um erro ao considerar que a data de exigibilidade da coima em causa só podia ser determinada a partir da data de receção da notificação da decisão controvertida. A segunda parte do referido fundamento, que importa examinar em primeiro lugar, é relativa à violação do dever de fundamentação.

a)   Quanto à segunda parte do segundo fundamento

1) Argumentos das partes

87

Com a segunda parte do segundo fundamento, a Comissão censura o Tribunal Geral por não ter suficientemente fundamentado a sua conclusão, que consta do n.o 126 do acórdão recorrido, segundo o qual há que considerar que a obrigação de pagar as coimas resulta unicamente do artigo 1.o da decisão controvertida e que a data de exigibilidade dessas coimas só podia ser determinada a contar da data de receção da notificação dessa decisão.

88

A GEA contrapõe que o acórdão recorrido está suficientemente fundamentado.

2) Apreciação do Tribunal de Justiça

89

Como foi recordado no n.o 42 do presente acórdão, o dever de fundamentação que incumbe ao Tribunal Geral impõe‑lhe dar a conhecer de forma clara e inequívoca o raciocínio que seguiu, por forma a permitir aos interessados conhecer as razões da decisão tomada e ao Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização jurisdicional.

90

No caso em apreço, basta observar que o raciocínio exposto pelo Tribunal Geral nos n.os 122 a 125 do acórdão recorrido é suscetível de permitir tanto à Comissão conhecer as razões pelas quais o Tribunal Geral acolheu a primeira parte do quinto fundamento invocado pela GEA em primeira instância como ao Tribunal de Justiça dispor de elementos suficientes para exercer a sua fiscalização jurisdicional.

91

Com efeito, resulta destes números, em substância, que, devido ao facto de a redação inicial do artigo 2.o, segundo parágrafo, pontos 31 e 32, da Decisão de 2009 ter sido substituída pela resultante do artigo 1.o da decisão controvertida, o Tribunal Geral concluiu, no n.o 126 do acórdão recorrido, que a obrigação de pagar as coimas resulta unicamente do artigo 1.o da decisão controvertida e que a data de exigibilidade dessas coimas só podia ser determinada a contar da data de receção da notificação.

92

A segunda parte do segundo fundamento deve, pois, ser julgada improcedente.

b)   Quanto à primeira parte do segundo fundamento

1) Argumentos das partes

93

Na primeira parte do seu segundo fundamento, a Comissão acusa o Tribunal Geral de ter cometido um erro de direito ao considerar, no n.o 126 do acórdão recorrido, que a data de exigibilidade da coima no caso em apreço só podia ser determinada a contar da data de receção da notificação da decisão controvertida.

94

A Comissão precisa que a anulação da Decisão de 2010 teve por efeito reativar não apenas o artigo 2.o, segundo parágrafo, pontos 31 e 32, da Decisão de 2009, mas também a data de exigibilidade inicial fixada no artigo 2.o, último parágrafo, desta decisão.

95

Neste contexto, a Comissão alega que tinha o direito de alterar o montante da coima aplicada e a responsabilidade solidária sem ter de fixar necessariamente uma nova data de exigibilidade dessa coima. Assim, a Comissão considera que, embora, através da decisão controvertida, tenha alterado as partes do dispositivo da Decisão de 2009 que determinavam o montante da coima e a responsabilidade solidária, não estava obrigada a fixar uma data de exigibilidade da coima aplicada posterior à data da notificação da decisão controvertida.

96

Segundo esta instituição, se o Tribunal de Justiça confirmasse que deve fixar uma data de exigibilidade das coimas posterior à da notificação de uma decisão modificativa como a decisão controvertida, isso conduziria à perda dos juros vencidos sobre a parte subsistente da coima desde a data de exigibilidade inicialmente fixada, o que limitaria a sua margem de apreciação e reduziria a eficácia das coimas por si aplicadas.

97

Nestas condições, a Comissão considera que, no caso em apreço, para não colocar a GEA numa posição mais desvantajosa do que a ACW e a CPA, tinha o direito de fixar a data de exigibilidade das coimas em 10 de maio de 2010.

98

A GEA contrapõe que, embora seja verdade que a Comissão tem o poder de determinar a data em que as coimas são exigíveis e a data a partir da qual começam a correr os juros de mora, esse poder não abrange a fixação de uma data de exigibilidade dos juros de mora que seja anterior à data em que as coimas foram fixadas. Não é possível justificar com a eficácia do direito da União a fixação de uma data de exigibilidade de uma coima anterior à notificação da decisão que constitui o fundamento dessa coima.

99

Por conseguinte, segundo a GEA, visto que a data de exigibilidade da coima não pode ser fixada numa data anterior à notificação da decisão controvertida, os juros relativos ao pagamento da coima só podem começar a correr a contar da data de notificação desta decisão, em conformidade com o princípio segundo o qual o acessório segue o principal.

2) Apreciação do Tribunal de Justiça

100

As decisões da Comissão através das quais aplica coimas por infrações ao direito da concorrência da União determinam, nomeadamente, o montante das coimas em causa e os juros de mora, bem como as coordenadas da conta bancária da Comissão sobre a qual as empresas em causa devem pagar essas coimas. Estas decisões fixam também o prazo de pagamento das coimas aplicadas. A fim de evitar a cobrança coerciva, o pagamento deve ser efetuado antes do termo desse prazo.

101

A esse propósito, recorde‑se que, nos termos do artigo 299.o TFUE, as decisões da Comissão que imponham uma obrigação pecuniária a pessoas que não sejam Estados‑Membros constituem título executivo.

102

Importa igualmente salientar que, por força do artigo 278.o TFUE, os recursos interpostos para o Tribunal de Justiça da União Europeia contra tais tipos de decisões não têm efeito suspensivo.

103

Daqui resulta que as decisões da Comissão têm força executória nas condições fixadas no artigo 299.o TFUE e que as coimas que comportam são, em princípio, exigíveis no termo do prazo nelas fixado.

104

Nestas condições e tendo em conta o objetivo de assegurar o respeito efetivo das regras do direito da concorrência da União, há que considerar que, em princípio, o devedor deve proceder ao pagamento que lhe incumbe antes da data de exigibilidade desse pagamento fixada pela Comissão na sua decisão.

105

No caso em apreço, a Comissão previu inicialmente, no artigo 2.o, último parágrafo, da Decisão de 2009, uma data de exigibilidade das coimas aplicadas, que foi fixada no termo do prazo de três meses a contar da data de notificação dessa decisão, para todas as empresas destinatárias da referida decisão.

106

Como resulta do n.o 124 do acórdão recorrido, a Decisão de 2010, pela qual a Comissão decidiu que havia que alterar a Decisão de 2009, uma vez que, por um lado, a coima aplicada à ACW ultrapassava o limite máximo de 10 % do volume de negócios e, por outro, o montante da coima pela qual a ACW era considerada solidariamente responsável com a GEA e a CPA devia ser reduzida, foi anulada pelo Tribunal Geral no seu Acórdão de 15 de julho de 2015, GEA Group/Comissão (T‑189/10, EU:T:2015:504), na parte em que dizia respeito à GEA. Esta anulação teve por efeito a reativação da redação inicial do artigo 2.o da Decisão de 2009, como o Tribunal Geral salientou no n.o 125 do acórdão recorrido.

107

No entanto, a referida redação foi novamente substituída pela que resulta da decisão controvertida. O artigo 2.o desta decisão fixou uma nova data de exigibilidade das coimas, ou seja, 10 de maio de 2010.

108

Esta data é, por um lado, anterior à data de receção da notificação da decisão controvertida e, por outro, posterior à data de exigibilidade das coimas fixada na Decisão de 2009. Corresponde à data de exigibilidade indicada num ofício da Comissão de 9 de fevereiro de 2010 que acompanhava a decisão de 2010.

109

Nestas circunstâncias, há que realçar que a Comissão está investida de um poder que inclui a faculdade de determinar a data de exigibilidade da coima que aplica e a de vencimento de juros de mora, de fixar a taxa desses juros e de decidir as modalidades de execução da sua decisão, exigindo, se for caso disso, a prestação de uma garantia bancária abrangendo o capital e os juros da coima aplicada. Sem esse poder, o benefício que as empresas poderiam retirar do pagamento tardio das coimas teria como efeito o enfraquecimento das sanções aplicadas pela Comissão no âmbito da função que lhe é atribuída de velar pela aplicação das regras do direito da concorrência da União.

110

No caso em apreço, como salientou o advogado‑geral no n.o 62 das suas conclusões, a alteração introduzida no artigo 2.o, segundo parágrafo, pontos 31 e 32, da Decisão de 2009, por efeito da Decisão de 2010, primeiro, entretanto anulada, e da decisão controvertida, depois, visou apenas o montante da coima aplicada à ACW e a nova determinação das relações de solidariedade, mas não sobre a aplicação da coima enquanto tal, nem sobre o seu montante global. Por conseguinte, há que observar que, contrariamente ao que o Tribunal Geral declarou no n.o 126 do acórdão recorrido, o artigo 2.o da Decisão de 2009 constitui o fundamento jurídico da obrigação de a GEA, a ACW e a CPA pagarem a coima, e não o artigo 1.o da decisão controvertida.

111

Nestas condições, há que concluir que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar, no n.o 126 do acórdão recorrido, que o prazo de exigibilidade das coimas só podia ser determinado a contar da data de receção da notificação da decisão controvertida.

112

Tendo em conta o conjunto das considerações que precedem, há que julgar procedente a primeira parte do segundo fundamento.

113

Consequentemente, o acórdão recorrido deve ser anulado.

Quanto à remessa do processo ao Tribunal Geral

114

Nos termos do artigo 61.o do Estatuto do Tribunal de Justiça, quando o recurso for julgado procedente, o Tribunal de Justiça anula a decisão do Tribunal Geral. Pode, neste caso, decidir definitivamente o litígio, se estiver em condições de ser julgado, ou remeter o processo ao Tribunal Geral, para julgamento.

115

A este respeito, há que observar que, no caso em apreço, o Tribunal de Justiça não dispõe dos elementos necessários para decidir definitivamente sobre todos os fundamentos invocados em primeira instância.

116

Os aspetos do litígio suscitados por estes fundamentos implicam o exame de questões de facto com base em elementos que, por um lado, não foram apreciados pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido, tendo este considerado, no n.o 128 desse acórdão, que esse exame era supérfluo, uma vez que julgou procedente o quarto fundamento e a primeira parte do quinto fundamento invocados pela GEA e, por outro, não foram debatidos no Tribunal de Justiça, donde resulta que, quanto a este ponto, o processo não está em condições de ser julgado.

117

Por conseguinte, há que remeter o processo ao Tribunal Geral e deixar para final a decisão quanto às despesas.

Quanto às despesas

118

Sendo o processo remetido ao Tribunal Geral, há que reservar para final a decisão quanto às despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

 

1)

O Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 18 de outubro de 2018, GEA Group/Comissão (T‑640/16, EU:T:2018:700), é anulado.

 

2)

O processo T‑640/16 é remetido ao Tribunal Geral da União Europeia.

 

3)

Reserva‑se para final a decisão quanto às despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

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