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Document 62018CJ0684

Acórdão do Tribunal de Justiça (Nona Secção) de 28 de maio de 2020.
World Comm Trading Gfz SRL contra Agenţia Naţională de Administrare Fiscală (ANAF) e Direcţia Generală Regională a Finanţelor Publice Ploieşti.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pela Curtea de Apel Bucureşti.
Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 90.o — Artigos 184.o a 186.o — Princípio da neutralidade do IVA — Regularização da dedução de imposto inicialmente efetuada — Descontos concedidos em entregas intracomunitárias e internas de bens.
Processo C-684/18.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2020:403

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção)

28 de maio de 2020 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 90.o — Artigos 184.o a 186.o — Princípio da neutralidade do IVA — Regularização da dedução de imposto inicialmente efetuada — Descontos concedidos em entregas intracomunitárias e internas de bens»

No processo C‑684/18,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela Curtea de Apel Bucureşti (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia), por Decisão de 26 de setembro de 2018, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 6 de novembro de 2018, no processo

World Comm Trading Gfz SRL

contra

Agenţia Naţională de Administrare Fiscală (ANAF),

Direcţia Generală Regională a Finanţelor Publice Ploieşti,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção),

composto por: S. Rodin, presidente de secção, K. Jürimäe (relatora) e N. Piçarra, juízes,

advogado‑geral: J. Kokott,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da World Comm Trading Gfz SRL, por L. Ionescu‑Donoiu, avocată,

em representação do Governo romeno, inicialmente por E. Gane, R. I. Haţieganu e C.‑R. Canţăr, e em seguida por E. Gane e R. I. Haţieganu, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por A. Armenia e J. Jokubauskaitė, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 90.o da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1, a seguir «Diretiva IVA»), e dos princípios da neutralidade do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e da proporcionalidade.

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a World Comm Trading Gfz SRL (a seguir «World Comm Trading»), sociedade com sede na Roménia, à Agenția Națională de Administrare Fiscală (ANAF) (Agência Nacional da Administração Fiscal, Roménia) e à Direcția Generală Regională a Finanțelor Publice Ploieşti (Direção‑Geral Regional de Finanças de Ploiești, Roménia), a respeito de uma regularização do IVA liquidado à World Comm Trading na sequência dos descontos que lhe foram feitos relativamente a entregas intracomunitárias e internas de bens sujeitos àquele imposto.

Quadro jurídico

Direito da União

3

O artigo 90.o da Diretiva IVA estabelece:

«1.   Em caso de anulação, rescisão, resolução, não pagamento total ou parcial ou redução do preço depois de efetuada a operação, o valor tributável é reduzido em conformidade, nas condições fixadas pelos Estados‑Membros.

2.   Em caso de não pagamento total ou parcial, os Estados‑Membros podem derrogar o disposto no n.o 1.»

4

O artigo 184.o desta diretiva diz o seguinte:

«A dedução inicialmente efetuada é objeto de regularização quando for superior ou inferior à dedução a que o sujeito passivo tinha direito.»

5

O artigo 185.o da referida diretiva dispõe:

«1.   A regularização é efetuada nomeadamente quando se verificarem, após a declaração de IVA, alterações dos elementos tomados em consideração para a determinação do montante das deduções, por exemplo no caso de anulação de compras ou de obtenção de abatimentos nos preços.

2.   Em derrogação do disposto no n.o 1, não é efetuada qualquer regularização no caso de operações total ou parcialmente por pagar, no caso de destruição, perda ou roubo devidamente comprovados ou justificados, bem como no caso das afetações de bens a ofertas de pequeno valor e a amostras referidas no artigo 16.o

No caso de operações total ou parcialmente por pagar e nos casos de roubo, os Estados‑Membros podem, todavia, exigir a regularização.»

6

Nos termos do artigo 186.o da mesma diretiva:

«Os Estados‑Membros determinam as normas de aplicação dos artigos 184.o e 185.o»

Direito romeno

7

O artigo 138.o, alínea c), da Legea nr. 571/2003 privind Codul fiscal (Lei n.o 571/2003, que Aprova o Código Tributário), de 22 de dezembro de 2003 (Monitorul Oficial al României, parte I, n.o 927, de 23 de dezembro de 2003), na sua versão em vigor à data dos factos do processo principal (a seguir «Código Tributário»), prevê:

«O valor tributável é reduzido […] nos casos em que os descontos, as vantagens, os bónus e outras reduções de preço a que se refere o artigo 137.o, n.o 3, alínea a), são concedidos depois da entrega dos bens ou da prestação dos serviços.»

8

O artigo 138.o bis, n.o 1, do Código Tributário dispõe:

«Nas aquisições intracomunitárias de bens, o valor tributável é constituído pelos mesmos elementos que os utilizados, em conformidade com o artigo 137.o, para a determinação do valor tributável no caso de entrega dos mesmos bens no interior do Estado. No caso de uma aquisição intracomunitária de bens, em conformidade com o artigo 130.o bis, n.o 2, alínea a), o valor tributável é determinado em conformidade com o disposto no artigo 137.o, n.o 1, alínea c), e no artigo 137.o, n.o 2.»

9

O ponto 19, n.o 1, do Hotărârea Guvernului nr. 44/2004 pentru aprobarea Normelor metodologice de aplicare a Legii 571/2003 privind Codul fiscal (Decisão do Governo n.o 44/2004, que Aprova as Normas Metodológicas de Execução da Lei n.o 571/2003, que Aprova o Código Tributário, Monitorul Oficial al României, partie I, n.o 112, de 6 de fevereiro de 2004), na sua versão em vigor em dezembro de 2008, dispunha o seguinte:

«Nos termos do artigo 137.o, n.o 3, alínea a), do Código Tributário, os descontos, as vantagens, os bónus, os abatimentos e as outras reduções de preço não são incluídos no valor tributável se forem concedidos pelo fornecedor/prestador em benefício direto do cliente no momento da entrega/prestação e não constituírem, de facto, a remuneração de um serviço ou de uma entrega. Para esse efeito, a fatura emitida deve indicar o contravalor dos bens entregues ou dos serviços prestados, líquidos do imposto, e, numa linha diferente, regista o montante em que é reduzido o valor tributável, que se subtrairá. O [IVA] aplica‑se à diferença obtida.»

10

Nos termos do ponto 20 da mesma decisão do governo:

«(1)

Nos casos previstos no artigo 138.o do Código Tributário, os fornecedores de bens e/ou os prestadores de serviços regularizam o valor tributável do imposto após a realização da entrega/prestação ou após a faturação da entrega/prestação, mesmo que a entrega/prestação não tenha sido realizada, desde que os eventos previstos no artigo 138.o do Código Tributário ocorram após faturação e registo do imposto na contabilidade do sujeito passivo. Para esse efeito, os fornecedores/prestadores devem emitir faturas, com os valores precedidos do sinal «menos» quando o valor tributável for reduzido ou, se for o caso, sem o sinal «menos», quando o valor tributável for aumentado, as quais serão também transmitidas ao destinatário. O disposto no presente número é igualmente aplicável às entregas intracomunitárias.

(2)

Os beneficiários estão obrigados a regularizar o direito à dedução inicialmente exercido, de acordo com o disposto no artigo 148.o, alínea b), e no artigo 149.o, n.o 4, alínea e), do Código Tributário, apenas para operações previstas no artigo 138.o, alíneas a) a c) e e), do referido código. O disposto no presente número é igualmente aplicável às aquisições intracomunitárias.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

11

A World Comm Trading, que é uma sociedade estabelecida na Roménia, celebrou em 1 de abril de 2004 um contrato de distribuição de produtos de telefonia móvel com a Nokia Corporation (a seguir «Nokia»).

12

Nos termos desse contrato, a World Comm Trading adquiriu à Nokia vários produtos de telefonia móvel. Esses produtos foram objeto de entregas à World Comm Trading pela Nokia a partir da Finlândia, da Alemanha, da Hungria e da Roménia.

13

Para as entregas intracomunitárias desses produtos a partir da Finlândia, da Alemanha e da Hungria, a Nokia utiliza, respetivamente, os seus números de IVA finlandês, alemão e húngaro. Para essas entregas, a Nokia emitiu faturas isentas de IVA e a World Comm Trading contabilizou o IVA na Roménia mediante o mecanismo da autoliquidação.

14

Para as entregas internas dos referidos produtos a partir da Roménia, a Nokia emitiu faturas com o seu número de IVA romeno e a World Comm Trading contabilizou o IVA como IVA dedutível.

15

A Nokia fazia trimestralmente à World Comm Trading descontos quantitativos na venda de produtos de telefonia móvel, concretamente reduções de preço quando um determinado valor quantitativo era atingido. Esse valor quantitativo foi calculado independentemente do lugar da entrega dos produtos.

16

A NokiA emitia trimestralmente para esses descontos uma fatura em que era indicado um saldo negativo, com o sinal «‑» (menos). Essa fatura tinha o seu número de IVA finlandês, embora uma parte dos produtos abrangidos pelos descontos tivesse sido entregue a partir da Roménia. A World Comm Trading contabilizava depois o IVA correspondente aplicando o mecanismo da autoliquidação. Com efeito, a World Comm Trading contabilizava a totalidade do montante correspondente aos descontos obtidos como referentes a operações intracomunitárias.

17

Na sequência de uma fiscalização, as autoridades tributárias romenas constataram que a World Comm Trading contabilizara o IVA de forma errada, pois não distinguira entre as entregas internas e as entregas intracomunitárias. Segundo as mesmas autoridades, a World Comm Trading devia ter contabilizado o IVA correspondente aos descontos das entregas internas separadamente do correspondente às entregas intracomunitárias dos produtos em causa. Por consequência, as autoridades tributárias emitiram um aviso de liquidação no valor total de 821377 leus romenos (RON) (cerca de 173855,84 euros), incluindo igualmente juros de mora e penalidades.

18

A este respeito, o tribunal de reenvio, a Curtea de Apel Bucureşti (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia), precisa, na sua resposta a um pedido de esclarecimento do Tribunal de Justiça, que esse montante corresponde à diferença entre o montante da dedução inicialmente efetuada e um montante do IVA dedutível reavaliado, tendo em conta a base de tributação retificada na sequência dos descontos feitos nas entregas internas de produtos de telefonia móvel na Roménia.

19

Por Decisão de 30 de outubro de 2014, a Agência Nacional da Administração Fiscal indeferiu a reclamação apresentada pela World Comm Trading contra o aviso de liquidação referido no n.o 17 do presente acórdão.

20

Depois de o Tribunalul București (Tribunal de Grande Instância de Bucareste, Roménia) ter negado provimento ao recurso interposto contra essa decisão, a World Comm Trading interpôs recurso para o tribunal de reenvio.

21

No recurso, a World Comm Trading sustenta que a exigência da Administração Fiscal relativamente à contabilização separada do IVA correspondente aos descontos efetuados nas entregas internas e o correspondente aos descontos efetuados nas entregas intracomunitárias resulta de um formalismo excessivo. O Orçamento do Estado não é afetado pela forma como são contabilizados os descontos feitos pela Nokia. Além disso, tal exigência seria contrária ao princípio da neutralidade do IVA, visto que à data em que foi realizada a fiscalização tributária a Nokia já tinha cessado a sua atividade na Roménia e não podia já emitir faturas com um número de IVA romeno a título dos descontos quantitativos referentes às entregas internas de produtos de telefonia móvel na Roménia.

22

Em face destes argumentos, o tribunal de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber se, tendo‑se considerado que uma sociedade preenchia as condições substantivas para regularizar o seu direito a dedução do IVA, lhe poderia ser recusada essa regularização pelo facto de a legislação nacional ou a prática administrativa nacional proibirem a dedução do IVA no caso de um fornecedor emitir uma só fatura para os produtos que foram objeto de entregas internas e para os produtos objeto de entregas intracomunitárias.

23

A este respeito, o tribunal de reenvio interroga‑se mais concretamente sobre a questão de saber se o princípio da proporcionalidade se opõe a que as autoridades tributárias nacionais imponham à World Comm Trading a restituição da diferença entre o montante da dedução inicialmente efetuada e um montante do IVA dedutível reavaliado. Questiona especialmente se essas autoridades podem exigir tal restituição numa situação como a do processo principal, na qual a base de tributação foi retificada na sequência dos descontos obtidos para as entregas de produtos de telefonia móvel efetuadas na Roménia, quando a Nokia cessara a sua atividade nesse Estado‑Membro e não podia já emitir uma fatura relativa aos descontos referentes às entregas internas com o seu número de IVA romeno.

24

Além disso, referindo o artigo 90.o da Diretiva IVA, o qual dá aos Estados‑Membros a liberdade de determinar as condições concretas em que a base de tributação é reduzida, o tribunal de reenvio interroga‑se sobre se essa disposição obriga os Estados‑Membros a adotar legislação clara e previsível relativamente aos requisitos formais e materiais do exercício do direito a dedução. Na falta dessa legislação nacional, o tribunal de reenvio pretende saber se é possível recusar o direito a dedução do IVA.

25

Neste contexto, a Curtea de Apel Bucureşti (Tribunal de Recurso de Bucareste) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

O artigo 90.o da [Diretiva IVA] e o princípio da neutralidade do IVA, opõem‑se a uma legislação nacional (ou a uma prática administrativa fundada numa legislação pouco clara) que recusa a uma sociedade o direito de deduzir IVA proporcionalmente ao valor do desconto aplicado a entregas nacionais de bens, pelo facto de a fatura fiscal emitida pelo fornecedor intracomunitário (na qualidade de representante de um grupo económico) registar o desconto global, concedido tanto para os produtos intracomunitários como para os produtos nacionais fornecidos no âmbito do mesmo contrato‑quadro[,] mas registados como aquisições provenientes do Estado‑Membro de referência (adquiridas a uma sociedade pertencente a esse grupo, com um número de identificação IVA diferente do da fatura relativa ao desconto)?

2)

Em caso de resposta negativa à primeira questão […], o princípio da proporcionalidade opõe‑se a que seja recusado ao beneficiário o direito à dedução do IVA proporcionalmente ao valor do desconto concedido globalmente pelo fornecedor intracomunitário, no caso de o fornecedor local (que pertence ao mesmo grupo) ter cessado a atividade económica e já não poder reduzir o valor tributável das entregas através da emissão de uma fatura com o seu número de identificação IVA, para efeitos do reembolso da diferença de IVA cobrado em excesso?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

26

A título liminar, importa referir que, no âmbito do processo de cooperação entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça, instituído pelo artigo 267.o TFUE, cabe a este dar ao órgão jurisdicional nacional uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido. Nesta ótica, incumbe, sendo caso disso, ao Tribunal de Justiça reformular as questões que lhe são submetidas (Acórdão de 11 de março de 2020, Rensen Shipbuilding, C‑192/19, EU:C:2020:194, n.o 25).

27

No caso em apreço, importa observar que a primeira questão diz respeito à interpretação do artigo 90.o da Diretiva IVA, que visa, no seu n.o 1, os casos de anulação, rescisão, resolução, não pagamento total ou parcial ou de redução do preço após a data em que foi efetuada a operação e obriga os Estados‑Membros a reduzir a base de tributação e, portanto, o montante do IVA devido pelo sujeito passivo sempre que, posteriormente à realização de uma transação, uma parte ou a totalidade da contrapartida não seja por ele recebida (Acórdão de 3 de julho de 2019, UniCredit Leasing, C‑242/18, EU:C:2019:558, n.o 37 e jurisprudência aí referida).

28

Ora, como resulta das indicações dadas pelo tribunal de reenvio, a primeira questão visa determinar se as autoridades tributárias nacionais podem emitir um aviso de liquidação a um sujeito passivo, em virtude de uma regularização de uma dedução inicialmente efetuada, na sequência da obtenção de descontos para entregas internas de bens.

29

Ora, é precisamente o artigo 185.o da Diretiva IVA que tem por objeto a regularização da dedução inicialmente efetuada, designadamente no caso de serem obtidos descontos posteriormente à declaração de IVA.

30

Por conseguinte, a primeira questão deve ser entendida no sentido de que visa determinar se o artigo 185.o da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que as autoridades tributárias nacionais podem impor a um sujeito passivo a regularização da dedução do IVA inicialmente efetuada, quando, na sequência da obtenção pelo sujeito passivo de descontos nas entregas internas de bens, essas autoridades considerem que a dedução do IVA inicialmente efetuada era superior à que esse sujeito passivo tinha o direito de efetuar.

31

A este respeito, importa referir que os artigos 184.o a 186.o da Diretiva IVA determinam as condições em que a Administração Fiscal pode exigir a regularização por parte do sujeito passivo. O mecanismo de regularização previsto nestes artigos faz parte integrante do regime de dedução do IVA estabelecido pela mesma diretiva e visa aumentar a precisão das deduções por forma a garantir a neutralidade do IVA (v., neste sentido, Acórdão de 13 de março de 2014, FIRIN, C‑107/13, EU:C:2014:151, n.os 48 e 50).

32

No que se refere à regularização da dedução do IVA pago a montante, o artigo 184.o da Diretiva IVA prevê que a dedução inicialmente efetuada deve ser regularizada quando for inferior ou superior à que o sujeito passivo tinha o direito de efetuar.

33

Segundo o n.o 1 do artigo 185.o desta diretiva, deve ser feita a regularização de uma dedução inicialmente efetuada, designadamente, quando a alteração dos elementos tidos em consideração para a determinação do montante das deduções tiver ocorrido posteriormente à declaração do IVA e, concretamente, em caso de obtenção de descontos.

34

Decorre da leitura conjunta dos artigos 184.o e 185.o, n.o 1, da Diretiva IVA que, quando, devido à alteração de um dos elementos inicialmente considerados no cálculo das deduções, se torne necessária a regularização, o cálculo do montante desta regularização deve levar a que o montante das deduções efetuadas a final corresponda àquele que o sujeito passivo teria o direito de efetuar se essa alteração tivesse inicialmente sido tida em conta (v., neste sentido, Acórdão de 16 de junho de 2016, Kreissparkasse Wiedenbrück, C‑186/15, EU:C:2016:452, n.o 47).

35

Ora, no caso em apreço, conforme resulta das indicações dadas pelo tribunal de reenvio, os descontos obtidos pela World Comm Trading, referentes às entregas internas de produtos de telefonia móvel na Roménia, reduziram o montante do IVA dedutível relativo a essas entregas, tal como inicialmente calculado pelas autoridades tributárias.

36

Nesse caso, como resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça recordada no n.o 34 do presente acórdão, há que regularizar a dedução do IVA inicialmente efetuada, por forma a que, com essa alteração, o montante dessa dedução corresponda, a final, ao que o sujeito passivo tinha o direito de efetuar se a dita alteração tivesse inicialmente sido tida em conta.

37

O facto de o sujeito passivo não dispor de uma fatura distinta referente aos descontos obtidos nas entregas internas emitida pelo fornecedor nacional, mas unicamente de uma fatura global emitida pelo fornecedor intracomunitário, que afeta igualmente a base de tributação das entregas internas, não o dispensa do dever de regularizar a dedução do IVA inicialmente efetuada, na sequência da obtenção da redução do preço, uma vez que esse dever faz parte integrante do regime de dedução do IVA estabelecido pela Diretiva IVA.

38

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o artigo 185.o da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que as autoridades tributárias nacionais devem impor a um sujeito passivo a regularização da dedução do IVA inicialmente efetuada, quando, na sequência da obtenção, por parte deste, de descontos nas entregas internas de bens, essas autoridades considerarem que a dedução inicialmente efetuada era superior à que esse sujeito passivo tinha o direito de efetuar.

Quanto à segunda questão

39

Com a segunda questão, o tribunal de reenvio pretende saber, em substância, se o artigo 185.o da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que uma regularização de uma dedução do IVA inicialmente efetuada é exigida a um sujeito passivo estabelecido num Estado‑Membro, mesmo que o fornecedor desse sujeito passivo tenha cessado a sua atividade nesse Estado‑Membro e não possa, por esse facto, pedir o reembolso de uma parte do IVA que pagou.

40

No caso em apreço, resulta das indicações dadas pelo tribunal de reenvio que a World Comm Trading invocou nesse tribunal, para se opor à regularização do IVA, que o seu fornecedor, que cessou a sua atividade na Roménia, deixou de estar registado no IVA nesse Estado‑Membro e, portanto, não está em condições de emitir uma fatura relativa aos descontos respeitantes às entregas nacionais com um número de IVA romeno, nem de requerer às autoridades tributárias romenas o reembolso de uma parte do IVA que pagou.

41

A este respeito, importa constatar que o facto de o IVA devido pelo fornecedor do sujeito passivo não ser regularizado não tem nenhuma influência no direito da Administração Fiscal nacional competente de exigir a regularização do IVA deduzido por um sujeito passivo.

42

Com efeito, por um lado, esse facto não consta das derrogações previstas no artigo 185.o, n.o 2, da Diretiva IVA, que enumera os diferentes casos que não dão origem à regularização de uma dedução inicialmente efetuada.

43

Por outro lado, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o facto de o IVA devido pelo fornecedor de um sujeito passivo não ter sido regularizado é irrelevante para o direito da Administração Fiscal de obter a restituição do IVA deduzido por um sujeito passivo (v., neste sentido, Acórdão de 13 de março de 2014, FIRIN, C‑107/13, EU:C:2014:151, n.o 57).

44

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à segunda questão que o artigo 185.o da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que a regularização de uma dedução do IVA inicialmente efetuada é exigida a um sujeito passivo estabelecido num Estado‑Membro mesmo que o fornecedor desse sujeito passivo tenha cessado a sua atividade nesse Estado‑Membro e não possa, por esse facto, pedir o reembolso de uma parte do IVA que pagou.

Quanto às despesas

45

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Nona Secção) declara:

 

1)

O artigo 185.o da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretado no sentido de que as autoridades tributárias nacionais devem impor a um sujeito passivo a regularização da dedução do imposto sobre o valor acrescentado inicialmente efetuada, quando, na sequência da obtenção, por parte deste, de descontos nas entregas internas de bens, essas autoridades considerarem que a dedução inicialmente efetuada era superior à que esse sujeito passivo tinha o direito de efetuar.

 

2)

O artigo 185.o da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que a regularização de uma dedução do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) inicialmente efetuada é exigida a um sujeito passivo estabelecido num Estado‑Membro mesmo que o fornecedor desse sujeito passivo tenha cessado a sua atividade nesse Estado‑Membro e não possa, por esse facto, pedir o reembolso de uma parte do IVA que pagou.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: romeno.

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