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Document 62017CJ0448

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Oitava Secção) de 20 de setembro de 2018.
    EOS KSI Slovensko s.r.o. contra Ján Danko e Margita Danková.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Krajský súd v Prešove.
    Reenvio prejudicial — Contratos celebrados com os consumidores — Diretiva 93/13/CEE — Cláusulas abusivas — Artigo 4.o, n.o 2, e artigo 5.o — Obrigação de redigir as cláusulas de maneira clara e compreensível — Artigo 7.o — Recurso aos tribunais por pessoas ou organizações que têm um interesse legítimo em proteger os consumidores contra a utilização de cláusulas abusivas — Legislação nacional que subordina a possibilidade de uma associação de consumidores intervir no processo ao consentimento do consumidor — Crédito ao consumo — Diretiva 87/102/CEE — Artigo 4.o, n.o 2 — Obrigação de indicar a taxa anual de encargos efetiva global no contrato escrito — Contrato que contém apenas uma equação matemática de cálculo da taxa anual de encargos efetiva global sem os elementos necessários para proceder a esse cálculo.
    Processo C-448/17.

    Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2018:745

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção)

    20 de setembro de 2018 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Contratos celebrados com os consumidores — Diretiva 93/13/CEE — Cláusulas abusivas — Artigo 4.o, n.o 2, e artigo 5.o — Obrigação de redigir as cláusulas de maneira clara e compreensível — Artigo 7.o — Recurso aos tribunais por pessoas ou organizações que têm um interesse legítimo em proteger os consumidores contra a utilização de cláusulas abusivas — Legislação nacional que subordina a possibilidade de uma associação de consumidores intervir no processo ao consentimento do consumidor — Crédito ao consumo — Diretiva 87/102/CEE — Artigo 4.o, n.o 2 — Obrigação de indicar a taxa anual de encargos efetiva global no contrato escrito — Contrato que contém apenas uma equação matemática de cálculo da taxa anual de encargos efetiva global sem os elementos necessários para proceder a esse cálculo»

    No processo C‑448/17,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Krajský súd v Prešove (Tribunal Regional de Prešov, Eslováquia), por decisão de 16 de maio de 2017, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 25 de julho de 2017, no processo

    EOS KSI Slovensko s.r.o.

    contra

    Ján Danko,

    Margita Danková,

    sendo interveniente:

    Združenie na ochranu občana spotrebiteľa HOOS,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),

    composto por: J. Malenovský, presidente de secção, M. Safjan (relator) e M. Vilaras, juízes,

    advogado‑geral: E. Tanchev,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação do Governo eslovaco, por B. Ricziová, na qualidade de agente,

    em representação da Comissão Europeia, por A. Tokár e N. Ruiz García, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 4.o, n.o 2, e do artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13/CEE do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores (JO 1993, L 95, p. 29).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a EOS KSI Slovensko s.r.o. (a seguir «EOS») a Ján Danko e a Margita Danková a propósito de um pedido de pagamento de quantias em dívida no âmbito de um crédito ao consumo.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    Diretiva 87/102

    3

    O artigo 1.o da Diretiva 87/102/CEE do Conselho, de 22 de dezembro de 1986, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros relativas ao crédito ao consumo (JO 1987, L 42, p. 48), conforme alterada pela Diretiva 98/7/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de fevereiro de 1998 (JO 1998, L 101, p. 17) (a seguir «Diretiva 87/102»), dispõe:

    «1.   A presente diretiva é aplicável aos contratos de crédito.

    2.   Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

    […]

    d)

    “Custo total do crédito para o consumidor”: todos os custos, incluindo juros e outras despesas, que o consumidor deve pagar pelo crédito;

    e)

    “Taxa anual de encargos efetiva global”: o custo total do crédito para o consumidor expresso em percentagem anual do montante do crédito concedido e calculado de acordo com o artigo 1.o‑A da presente diretiva.»

    4

    O artigo 1.o‑A da Diretiva 87/102 prevê:

    «1.   

    a.

    A taxa anual de encargos efetiva global que torna equivalentes, numa base anual, os valores atuais do conjunto dos compromissos (empréstimos, reembolsos e encargos) existentes ou futuros, assumidos pelo mutuante e pelo consumidor, será calculada de acordo com a fórmula matemática constante do anexo II.

    b.

    Expõem‑se no anexo III quatro exemplos de cálculo, a título indicativo.

    2.   Para calcular a taxa anual de encargos efetiva global, determina‑se o custo total do crédito para o consumidor, tal como é definido no n.o 2, alínea d), do artigo 1.o, com exceção das seguintes despesas:

    […]

    4.   

    a.

    A taxa anual de encargos efetiva global será calculada no momento da celebração do contrato de crédito, sem prejuízo do disposto no artigo 3.o relativamente aos anúncios e ofertas publicitários.

    b.

    O cálculo será efetuado no pressuposto de que o contrato de crédito permanece em vigor durante o período de tempo acordado e que o mutuante e o consumidor cumprem as respetivas obrigações nos prazos e datas acordados.

    […]

    6.   Quanto aos contratos de crédito que contenham cláusulas que permitam alterar a taxa de juro e o montante ou o nível das outras despesas incluídas na taxa anual de encargos efetiva global, mas que não possam ser quantificados no momento do respetivo cálculo, a taxa anual de encargos efetiva global será calculada tomando como hipótese que a taxa e as outras despesas se mantêm fixas relativamente ao nível inicial e são aplicáveis até ao termo do contrato de crédito.

    […]»

    5

    O artigo 4.o desta diretiva dispõe, no seu n.o 2:

    «O contrato escrito deve indicar:

    a)

    A taxa anual de encargos efetiva global;

    b)

    As condições em que pode ser alterada a taxa anual de encargos efetiva global;

    […]»

    6

    A Diretiva 87/102 foi revogada com efeitos a partir de 11 de junho de 2010, nos termos do artigo 29.o da Diretiva 2008/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2008, relativa a contratos de crédito aos consumidores e que revoga a Diretiva 87/102/CEE do Conselho (JO 2008, L 133, p. 66, e retificação no JO 2009, L 207, p. 14). Tendo em conta a data dos factos no processo principal, é a Diretiva 87/102 que continua aplicável no caso em apreço.

    Diretiva 93/13

    7

    Nos termos do artigo 1.o, n.o 2, da Diretiva 93/13:

    «As disposições da presente diretiva não se aplicam às cláusulas contratuais decorrentes de disposições legislativas ou regulamentares imperativas, bem como das disposições ou dos princípios previstos nas convenções internacionais de que os Estados‑Membros ou a [União Europeia] sejam parte, nomeadamente no domínio dos transportes.»

    8

    O artigo 3.o, n.o 1, desta diretiva enuncia:

    «Uma cláusula contratual que não tenha sido objeto de negociação individual é considerada abusiva quando, a despeito da exigência de boa‑fé, der origem a um desequilíbrio significativo em detrimento do consumidor, entre os direitos e obrigações das partes decorrentes do contrato.»

    9

    O artigo 4.o da referida diretiva prevê:

    «1.   Sem prejuízo do artigo 7.o, o caráter abusivo de uma cláusula poderá ser avaliado em função da natureza dos bens ou serviços que sejam objeto do contrato e mediante consideração de todas as circunstâncias que, no momento em que aquele foi celebrado, rodearam a sua celebração, bem como de todas as outras cláusulas do contrato, ou de outro contrato de que este dependa.

    2.   A avaliação do caráter abusivo das cláusulas não incide nem sobre a definição do objeto principal do contrato nem sobre a adequação entre o preço e a remuneração, por um lado, e os bens ou serviços a fornecer em contrapartida, por outro, desde que essas cláusulas se encontrem redigidas de maneira clara e compreensível.»

    10

    O artigo 5.o da mesma diretiva tem a seguinte redação:

    «No caso dos contratos em que as cláusulas propostas ao consumidor estejam, na totalidade ou em parte, consignadas por escrito, essas cláusulas deverão ser sempre redigidas de forma clara e compreensível. Em caso de dúvida sobre o significado de uma cláusula, prevalecerá a interpretação mais favorável ao consumidor. Esta regra de interpretação não é aplicável no âmbito dos processos previstos no n.o 2 do artigo 7.o»

    11

    Nos termos do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13:

    «Os Estados‑Membros estipularão que, nas condições fixadas pelos respetivos direitos nacionais, as cláusulas abusivas constantes de um contrato celebrado com um consumidor por um profissional não vinculem o consumidor e que o contrato continue a vincular as partes nos mesmos termos, se puder subsistir sem as cláusulas abusivas.»

    12

    O artigo 7.o desta diretiva dispõe:

    «1.   Os Estados‑Membros providenciarão para que, no interesse dos consumidores e dos profissionais concorrentes, existam meios adequados e eficazes para pôr termo à utilização das cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores por um profissional.

    2.   Os meios a que se refere o n.o 1 incluirão disposições que habilitem as pessoas ou organizações que, segundo a legislação nacional, têm um interesse legítimo na defesa do consumidor, a recorrer, segundo o direito nacional, aos tribunais ou aos órgãos administrativos competentes para decidir se determinadas cláusulas contratuais, redigidas com vista a uma utilização generalizada, têm ou não um caráter abusivo, e para aplicar os meios adequados e eficazes para pôr termo à utilização dessas cláusulas.

    3.   Respeitando a legislação nacional, os recursos previstos no n.o 2 podem ser interpostos, individualmente ou em conjunto, contra vários profissionais do mesmo setor económico ou respetivas associações que utilizem ou recomendem a utilização das mesmas cláusulas contratuais gerais ou de cláusulas semelhantes.»

    13

    O artigo 8.o da referida diretiva dispõe:

    «Os Estados‑Membros podem adotar ou manter, no domínio regido pela presente diretiva, disposições mais rigorosas, compatíveis com o Tratado, para garantir um nível de proteção mais elevado para o consumidor.»

    Direito eslovaco

    14

    O artigo 53.oa do Občiansky zákonník (Código Civil), que transpõe o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, proíbe a qualquer profissional a utilização de uma cláusula contratual que tenha sido declarada abusiva por um tribunal em decisão proferida num litígio em matéria de direito dos consumidores. Contudo, esta disposição exige que o consumidor seja demandante no litígio ou que, quando demandado, tenha realizado um ato processual.

    15

    O artigo 93.o da zákon č. 99/1963 Zb., Občiansky súdny poriadok (Lei n.o 99/1963 relativa ao Código de Processo Civil), na sua versão aplicável aos factos no processo principal (a seguir «Código de Processo Civil»), prevê:

    «1)   Pode intervir na qualidade de interveniente, em apoio dos pedidos do demandante ou do demandado, a pessoa que tem um interesse jurídico na resolução do litígio […].

    2)   Pode igualmente intervir, na qualidade de interveniente no processo, em apoio dos pedidos do demandante ou do demandado, qualquer pessoa coletiva cuja atividade tenha por objeto a defesa de direitos, em aplicação de uma disposição específica.

    3)   Essa pessoa intervém no processo por iniciativa própria ou a pedido de uma parte, transmitido pelo órgão jurisdicional. O órgão jurisdicional só se pronuncia quanto à admissibilidade da intervenção quando lhe é submetido um pedido nesse sentido.

    4)   No âmbito do processo, a parte interveniente tem os mesmos direitos e obrigações que as partes no processo. No entanto, só atua por conta própria. Se esses atos se opõem aos da parte em apoio da qual intervém, o órgão jurisdicional aprecia esses atos após análise de todas as circunstâncias.»

    16

    Segundo o artigo 172.o do Código de Processo Civil:

    «1)   O juiz pode emitir uma injunção de pagamento mesmo sem pedido expresso do demandante e sem ter ouvido o demandado se no pedido é alegado um direito ao pagamento de uma quantia em dinheiro decorrente das circunstâncias invocadas pelo demandante. Na injunção de pagamento, notifica o demandado de que deve pagar ao demandante, no prazo de quinze dias a contar da notificação, o crédito vencido e as custas judiciais, ou deduzir, nesse prazo, oposição perante o juiz que emitiu a injunção de pagamento. A dedução de oposição contra a injunção de pagamento deve ser fundamentada. […]

    […]

    3)   Se o juiz não emitir a injunção de pagamento, fixa a realização de uma audiência.

    […]

    7)   Se o pedido invoca um direito parcialmente em contradição manifesta com a lei, o juiz só emite uma injunção de pagamento, com o consentimento do demandante, para a parte não afetada pela referida contradição; uma vez expresso esse consentimento, o processo apenas tem como objeto esta parte do pedido, e o juiz não se pronuncia sobre o restante. O processo, mesmo após a emissão da injunção de pagamento, continua a ter como objeto a parte da ação sobre a qual o juiz se pronunciou ao emitir a referida injunção de pagamento; esta disposição aplica‑se também mesmo se foi deduzida oposição.

    […]

    9)   No caso de reivindicação do direito ao pagamento de uma quantia em dinheiro nos termos de um contrato celebrado com um consumidor e no caso de o demandado ser um consumidor, o juiz não emite uma injunção de pagamento se o contrato contém cláusulas abusivas.»

    17

    Nos termos do artigo 4.o, n.o 2, alínea g), da Lei n.o 258/2001 sobre o crédito ao consumo, aplicável aos factos no processo principal, um contrato de crédito ao consumo que não mencione a taxa anual de encargos efetiva global (a seguir «TAEG») considera‑se sem vencimento de juros e sem despesas.

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    18

    Em 24 de outubro de 2005, Ján Danko subscreveu com a Všeobecná úverová banka a.s. um contrato de crédito ao consumo renovável por um montante de 30000 coroas eslovacas (SKK) (aproximadamente 995 euros). O mutuante, posteriormente, cedeu o seu crédito decorrente do referido contrato à EOS, agência de cobrança de dívidas.

    19

    Resulta da decisão de reenvio que o contrato em causa no processo principal não indicava a TAEG e que figurava nele apenas uma equação matemática de cálculo da TAEG, sem os elementos necessários para proceder a esse cálculo.

    20

    Invocando a violação do referido contrato pelo mutuário, a EOS instaurou uma ação no Okresný súd Humenné (Tribunal de Primeira Instância de Humenné, Eslováquia) pedindo o pagamento do montante de 1123,12 euros, acrescido de juros de mora à taxa de 9,5%. Neste contexto, pediu a emissão de uma injunção de pagamento nos termos do artigo 172.o, n.o 1, do Código de Processo Civil, no quadro de um procedimento acelerado, caracterizado pelo facto de a decisão de mérito ser tomada sem audiência, sem produção de provas e unicamente com base nas afirmações do demandante.

    21

    Em 24 de agosto de 2012, o Okresný súd Humenné (Tribunal de Primeira Instância de Humenné) emitiu a injunção de pagamento requerida. Esta injunção foi emitida não por um magistrado, mas por um funcionário. A referida jurisdição não tomou em conta o facto de o contrato de crédito em causa no processo principal não indicar a TAEG, nem apreciou o caráter eventualmente abusivo das cláusulas deste contrato.

    22

    A Združenie na ochranu občana spotrebiteľa HOOS (Associação eslovaca de Defesa do Consumidor, a seguir «HOOS») interveio em apoio dos direitos de Ján Danko e de Margita Danková, deduzindo oposição contra a injunção de pagamento.

    23

    Por Despacho de 17 de janeiro de 2013, o Okresný súd Humenné (Tribunal de Primeira Instância de Humenné) rejeitou a oposição com o fundamento de que, como o consumidor não deduziu ele próprio oposição, não estavam preenchidos os requisitos para que a HOOS interviesse no processo.

    24

    Na sequência de um recurso interposto pela HOOS, o Krajský súd v Prešove (Tribunal Regional de Prešov, Eslováquia), por Despacho de 30 de setembro de 2013, anulou o despacho referido no número anterior e ordenou ao Okresný súd Humenné (Tribunal de Primeira Instância de Humenné) que marcasse uma audiência, procedesse à produção de prova e conhecesse de novo do mérito do processo após ter procedido a uma fiscalização jurisdicional das cláusulas contratuais do contrato de crédito em causa no processo principal. O Krajský súd v Prešove (Tribunal Regional de Prešov) admitiu a oposição da HOOS com o fundamento de que esta dispunha dos mesmos direitos que um consumidor‑mutuário, e considerou que o litígio no processo principal não podia ser sujeito a um procedimento acelerado, uma vez que este excluía a realização de uma audiência e a produção de prova.

    25

    O Ministério Público (Eslováquia) interpôs recurso extraordinário de cassação do despacho do Krajský súd v Prešove (Tribunal Regional de Prešov) para o Najvyšší súd (Supremo Tribunal, Eslováquia).

    26

    Por Despacho de 10 de março de 2015, o Najvyšší súd (Supremo Tribunal) anulou o despacho do Krajský súd v Prešove (Tribunal Regional de Prešov) e remeteu o processo a este órgão jurisdicional. O primeiro destes órgãos jurisdicionais declarou que a finalidade da intervenção de uma associação de defesa do consumidor só pode ser atingida após a ocorrência de um litígio, ou seja, só a partir do momento em que o consumidor deduz oposição contra uma injunção de pagamento.

    27

    O Krajský súd v Prešove (Tribunal Regional de Prešov) questiona‑se sobre se a legislação nacional respeita o princípio da equivalência previsto pelo direito da União, quanto às condições em que uma associação de defesa do consumidor pode intervir no processo no interesse do consumidor relativamente às regras gerais do direito eslovaco em matéria de intervenção no interesse da parte demandada.

    28

    A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio alega que numa situação em que um consumidor demandado num litígio, no âmbito de um processo destinado a pôr termo à utilização das cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores por um profissional, previsto no artigo 53.oa do Código Civil, ignora o processo e não atua, e não é possível contactá‑lo, os seus direitos não podem ser adequadamente defendidos se o tribunal ao qual é solicitada a emissão de uma injunção de pagamento devesse renunciar a fiscalizar o caráter abusivo das cláusulas em causa.

    29

    Ora, as disposições do direito eslovaco não permitem a uma associação de defesa do consumidor intervir, no interesse do consumidor, no processo, na medida em que essas disposições exigem que:

    o consumidor dê o seu consentimento por escrito a essa intervenção;

    os argumentos de defesa deduzidos pela referida associação sejam aprovados também pelo consumidor enquanto parte demandada;

    o consumidor dê o seu consentimento para que essa associação possa interpor recurso da decisão judicial que lhe diz respeito.

    30

    Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, no processo principal, o direito eslovaco foi aplicado de modo menos favorável do que numa situação sem qualquer conexão com o direito da União, em violação da jurisprudência resultante do Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Pohotovosť (C‑470/12, EU:C:2014:101, n.o 46). Com efeito, numa situação não abrangida pelo direito da União, o litígio surge na data da apresentação da petição inicial num tribunal nacional, embora a parte interveniente possa intervir no processo desde o seu início.

    31

    Por último, tratando‑se da cláusula do contrato em causa no processo principal respeitante à TAEG, o órgão jurisdicional de reenvio considera que a mesma não é transparente e é contrária aos bons costumes de modo que, em conformidade com o direito eslovaco, o crédito em causa no processo principal deve considerar‑se sem vencimento de juros nem despesas. No entender desse órgão jurisdicional, essa sanção seria proporcionada e dissuasiva à luz das exigências colocadas pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 9 de novembro de 2016, Home Credit Slovakia (C‑42/15, EU:C:2016:842, n.os 65 e 69).

    32

    Nestas condições, o Krajský súd v Prešove (Tribunal Regional de Prešov) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Tendo em conta o Acórdão [de 27 de fevereiro de 2014, Pohotovost’ (C‑470/12, EU:C:2014:101)], e as considerações formuladas pelo [Tribunal de Justiça] no n.o 46 [desse acórdão], é contrária ao princípio da equivalência do direito da União uma legislação que, no âmbito da equivalência entre os interesses protegidos pela lei e a proteção dos direitos do consumidor contra cláusulas contratuais abusivas, não permite, sem o consentimento do consumidor recorrido, a uma pessoa coletiva cuja atividade tem por objeto a defesa coletiva dos consumidores contra cláusulas contratuais abusivas e que visa a realização do objetivo previsto no artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva [93/13], que foi transposto pelo artigo 53.oa, n.os 1 e 3, do Código Civil, participar, na qualidade de interveniente, no processo judicial desde o início, e utilizar eficazmente, em benefício do consumidor, os meios de ação e de defesa judicial, procurando no âmbito desse processo protegê‑lo contra a utilização sistemática de cláusulas contratuais abusivas, enquanto noutra situação uma outra parte (interveniente) que intervenha num processo judicial em apoio do recorrido e que tenha interesse na definição do direito material (patrimonial) objeto do processo, diferentemente de uma associação de defesa do consumidor, não necessita de modo algum do consentimento do recorrido, em apoio de cujo pedido intervém, para participar no processo judicial desde o início e para o exercício eficaz dos meios de defesa e ação em juízo em benefício do recorrente?

    2)

    Deve interpretar‑se a expressão “redigidas de maneira clara e compreensível”, constante do artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13, tendo também em consideração as conclusões do Tribunal de Justiça nos Acórdãos de [30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai (C‑26/13, EU:C:2014:282), e de 23 de abril de 2015, Van Hove (C‑96/14, EU:C:2015:262)], no sentido de que uma cláusula contratual se pode considerar redigida de maneira “não clara e compreensível” — com a consequência jurídica de ser submetida [oficiosamente] à apreciação judicial do seu caráter abusivo — mesmo no caso de o instituto jurídico (instrumento) que regula ser, em si, complexo, de as suas consequências jurídicas serem dificilmente previsíveis para o consumidor médio e de, para a sua compreensão, ser geralmente necessário um aconselhamento jurídico, cujos custos não são proporcionais ao valor da prestação que o consumidor [obtém] com base no contrato?

    3)

    No caso de um tribunal deliberar sobre os direitos decorrentes de um contrato celebrado com um consumidor, invocados contra um consumidor que é recorrido, unicamente com base nas declarações do recorrente, através de uma injunção de pagamento no âmbito de um processo sumário, e no processo não aplicar de modo algum o disposto no artigo 172.o, n.o 9, do Código [de] Processo Civil, que exclui a emissão de uma injunção de pagamento em caso de cláusulas contratuais abusivas num contrato celebrado com um consumidor, é contrária ao direito da União uma legislação de um Estado‑Membro que, atendendo ao curto prazo para a dedução de oposição e à eventual impossibilidade de localizar o consumidor ou à inércia deste, não permite a uma associação de defesa do consumidor, qualificada e autorizada para alcançar o objetivo previsto no artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva [93/13,] conforme transposto pelo artigo 53.oa, n.os 1 e 2, do Código Civil, invocar de forma eficaz, sem o consentimento do consumidor (e sem o desacordo expresso deste), a única possibilidade de proteção do consumidor, sob a forma de oposição à injunção de pagamento, em caso de inobservância por parte do juiz da obrigação a que se refere o artigo 172.o, n.o 9, do Código [de] Processo Civil?

    4)

    Para a resposta à segunda e terceira questões, pode ser considerada relevante a circunstância de o ordenamento jurídico não reconhecer ao consumidor o direito à assistência jurídica obrigatória e de o seu desconhecimento na matéria, na falta de advogado que o represente, poder constituir um risco não negligenciável de que não invoque o caráter abusivo das cláusulas contratuais e não atue sequer de modo a possibilitar a intervenção em apoio do seu pedido, no processo judicial, de uma associação de defesa do consumidor, qualificada e autorizada para alcançar o objetivo a que se refere o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, conforme transposto pelo artigo 53.oa, n.os 1 e 2, do Código Civil?

    5)

    É contrária ao direito da União e à exigência de avaliação de todas as circunstâncias do caso nos termos do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva [93/13], uma legislação como a do processo sumário para a emissão de uma injunção de pagamento [(artigos 172.o, n.os 1 e segs., do Código de Processo Civil)], que permite 1) reconhecer ao profissional, com efeitos de sentença, o direito a uma prestação pecuniária 2) no âmbito de um processo sumário 3) perante um funcionário administrativo do órgão judicial 4) unicamente com base nas declarações do profissional, e 5) sem produção de prova numa situação em que 6) o consumidor não está representado por advogado 7) e a sua defesa não pode ser feita eficazmente, sem o seu consentimento, por uma associação de defesa do consumidor, qualificada e habilitada para alcançar o objetivo a que se refere o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva [93/13], conforme transposto pelo artigo 53.oa, n.os 1 e 2 do Código Civil?»

    Quanto às questões prejudiciais

    Quanto à primeira questão

    33

    Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se a Diretiva 93/13 deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que não permite a uma organização de defesa do consumidor intervir, no interesse do consumidor, num processo de injunção de pagamento que envolve um consumidor individual e deduzir oposição contra essa injunção na falta de contestação desta pelo referido consumidor.

    34

    A este respeito, há que salientar que o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 obriga os Estados‑Membros a assegurar que existam meios adequados e eficazes para pôr termo à utilização de cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores. Resulta do artigo 7.o, n.o 2, desta diretiva que esses meios incluem a possibilidade de as pessoas ou as organizações que tenham um interesse legítimo em proteger os consumidores recorrerem aos tribunais para que estes determinem se as cláusulas, redigidas com vista a uma utilização generalizada, têm ou não um caráter abusivo e, se necessário, obterem a sua proibição (Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Pohotovost’, C‑470/12, EU:C:2014:101, n.o 43 e jurisprudência referida).

    35

    Contudo, nem a Diretiva 93/13 nem as que lhe sucederam, que completam o regime regulamentar da proteção dos consumidores, contêm quaisquer disposições que regulem o papel que pode ou deve ser atribuído às associações de defesa dos consumidores no âmbito de litígios individuais que envolvem um consumidor. Deste modo, a Diretiva 93/13 não regula a questão de saber se essas associações devem ser admitidas como intervenientes, em apoio dos consumidores, no âmbito desses litígios individuais (v., neste sentido, Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Pohotovost’, C‑470/12, EU:C:2014:101, n.o 45).

    36

    Daqui resulta que, na falta de regulamentação da União no que respeita ao direito de as associações de defesa dos consumidores intervirem em litígios individuais que envolvem consumidores, cabe à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro estabelecer essas regras, por força do princípio da autonomia processual, desde que, contudo, não sejam menos favoráveis do que as que regulam situações semelhantes sujeitas ao direito interno (princípio da equivalência) e que não tornem impossível na prática ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pelo direito da União (princípio da efetividade) (v., neste sentido, Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Pohotovost’, C‑470/12, EU:C:2014:101, n.o 46).

    37

    No que toca, em primeiro lugar, ao princípio da equivalência, o órgão jurisdicional de reenvio observa que os requisitos a que a legislação nacional em causa no processo principal subordina a possibilidade, para uma associação de defesa do consumidor, de ser admitida a intervir seriam mais favoráveis quando a ação é intentada exclusivamente com fundamento no direito interno do que quando o é com fundamento no direito da União. Com efeito, enquanto num processo que não comporta elementos abrangidos pelo direito da União o litígio surge, em conformidade com a legislação nacional, na data da apresentação da petição inicial num tribunal, de modo que a parte interveniente está habilitada a intervir no processo desde o seu início, afigura‑se em contrapartida que, no litígio no processo principal, abrangido pelo direito da União, o litígio surge apenas a partir do momento em que o consumidor deduz oposição contra a injunção de pagamento, embora a associação de defesa dos consumidores em causa só possa intervir a partir da data da oposição.

    38

    A este propósito, há que recordar que o respeito do princípio da equivalência exige a aplicação indiferenciada das regras nacionais aos processos baseados no direito da União e aos baseados no direito nacional (v., neste sentido, Acórdão de 20 de outubro de 2016, Danqua, C‑429/15, EU:C:2016:789, n.o 30).

    39

    Por conseguinte, este princípio deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que submete a intervenção de associações de defesa do consumidor, nos litígios abrangidos pelo direito da União, a condições menos favoráveis do que as aplicáveis no caso de litígios abrangidos exclusivamente pelo direito interno.

    40

    Embora o Governo eslovaco afirme, nas suas observações escritas, que a aplicação diferenciada das regras nacionais que foram identificadas pelo órgão jurisdicional de reenvio não tem por fundamento a conexão do litígio ao direito da União, mas a natureza diferenciada dos processos em causa, cabe, contudo, ao órgão jurisdicional de reenvio, que tem conhecimento direto das modalidades processuais dos recursos na sua ordem jurídica interna, verificar o respeito do princípio da equivalência no litígio que lhe foi submetido, procedendo a uma análise dos recursos em causa, atendendo ao seu objeto, ao seu fundamento e aos seus elementos essenciais.

    41

    No que diz respeito, em segundo lugar, ao princípio da efetividade, o Tribunal de Justiça decidiu que a recusa de admitir a intervenção de uma associação de defesa do consumidor num processo que envolve um consumidor não afeta o direito da referida associação a uma tutela judicial efetiva para a defesa dos direitos que lhe são reconhecidos na qualidade de associação desse tipo, que consiste, nomeadamente, nos seus direitos de ação coletiva previstos no artigo 7.o, n.o 2, da Diretiva 93/13. Além disso, há que acrescentar que, nos termos da legislação nacional em causa no processo principal, uma associação pode representar diretamente esse consumidor em qualquer processo, incluindo o de execução, mediante um mandato conferido por este último (v., neste sentido, Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Pohotovost’, C‑470/12, EU:C:2014:101, n.os 54 e 55).

    42

    Nestas condições, não se afigura que a legislação nacional em causa no processo principal viole o princípio da efetividade no que respeita ao direito das associações de defesa do consumidor a intervir nos litígios que envolvem consumidores numa situação como a do processo principal.

    43

    Atendendo a todas as considerações precedentes, há que responder à primeira questão que a Diretiva 93/13, lida em conjugação com o princípio da equivalência, deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio principal, que não permite a uma organização de defesa do consumidor intervir, no interesse do consumidor, num processo de injunção de pagamento que envolve um consumidor individual e deduzir oposição contra essa injunção na falta de contestação desta pelo referido consumidor, no caso de a referida legislação submeter efetivamente a intervenção das associações de consumidores nos litígios abrangidos pelo direito da União a condições menos favoráveis do que as aplicáveis a litígios exclusivamente de direito interno, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

    Quanto à terceira a quinta questões

    44

    Com a terceira a quinta questões, que há que apreciar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se a Diretiva 93/13 deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que, ao prever, na fase da emissão da injunção de pagamento contra um consumidor, a fiscalização do caráter abusivo das cláusulas que constam de um contrato celebrado entre um profissional e esse consumidor, por um lado, confia a um funcionário administrativo de um tribunal, que não tem o estatuto de magistrado, a competência para emitir essa injunção de pagamento e, por outro, limita a quinze dias o prazo para deduzir oposição e exige que esta seja fundamentada.

    45

    A este respeito, há que recordar que a proteção efetiva dos direitos que decorrem da Diretiva 93/13 só pode ser garantida se o sistema processual nacional prever, no contexto do procedimento de injunção de pagamento ou do processo de execução da mesma, uma fiscalização oficiosa, por um juiz, da natureza potencialmente abusiva das cláusulas contidas no contrato em causa (v., neste sentido, Acórdão de 18 de fevereiro de 2016, Finanmadrid EFC, C‑49/14, EU:C:2016:98, n.os 45 e 46).

    46

    Assim, na hipótese de não estar prevista nenhuma fiscalização oficiosa, por um juiz, da natureza potencialmente abusiva das cláusulas que constam do contrato em causa na fase de execução da injunção de pagamento, uma legislação nacional deve ser considerada suscetível de violar a efetividade da proteção pretendida pela Diretiva 93/13, se não prevê essa fiscalização na fase da emissão da injunção ou, quando essa fiscalização apenas está prevista na fase de dedução da oposição contra a injunção emitida, se existe um risco não negligenciável de que o consumidor em causa não deduza a oposição exigida quer devido ao prazo particularmente curto previsto para o efeito, quer atendendo aos custos que uma ação judicial implica relativamente ao montante da dívida contestada, quer porque a legislação nacional não prevê a obrigação de que lhe sejam comunicadas todas as informações necessárias que lhe permitam determinar o alcance dos seus direitos (v., por analogia, Acórdãos de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito, C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 54, e de 18 de fevereiro de 2016, Finanmadrid EFC, C‑49/14, EU:C:2016:98, n.o 52).

    47

    No caso em apreço, o artigo 172.o, n.o 9, do Código de Processo Civil prevê que, em caso de reivindicação do direito ao pagamento de um montante em dinheiro a título de um contrato celebrado com um consumidor e no caso de o recorrente ser um consumidor, o juiz não emite uma injunção de pagamento se o contrato incluir cláusulas abusivas.

    48

    No entanto, a decisão de reenvio precisa que a legislação nacional atribui competência, em matéria de emissão de injunções de pagamento, a um funcionário do tribunal que não tem o estatuto de magistrado.

    49

    A este respeito, há que realçar que a preservação do efeito útil da Diretiva 93/13 se opõe a que uma legislação nacional permita que uma injunção de pagamento seja emitida sem que o consumidor esteja em condições de beneficiar, a qualquer momento do processo, da garantia de que a fiscalização da inexistência de uma cláusula abusiva no contrato em causa seja feita por um juiz (v., neste sentido, Acórdão de 18 de fevereiro de 2016, Finanmadrid EFC, C‑49/14, EU:C:2016:98, n.o 45).

    50

    Por conseguinte, a circunstância de a legislação nacional atribuir competência em matéria de emissão de injunções de pagamento a um funcionário que não tem estatuto de magistrado não é de molde a prejudicar a preservação do efeito útil da Diretiva 93/13, desde que uma fiscalização pelo juiz da inexistência da cláusula abusiva no contrato em causa seja prevista na fase de execução da injunção de pagamento ou no caso de oposição a esta.

    51

    Assim sendo, como foi recordado no n.o 46 do presente acórdão, a existência de tal fiscalização unicamente na fase da oposição só é suscetível de preservar o efeito útil da Diretiva 93/13 se os consumidores não forem dissuadidos de deduzir essa oposição.

    52

    Ora, neste contexto, a legislação nacional em causa no processo principal prevê um prazo de quinze dias, unicamente durante o qual o consumidor pode deduzir oposição à injunção de pagamento, exigindo‑lhe, além disso, que fundamente quanto ao mérito a sua oposição.

    53

    Consequentemente, existe, com essa legislação, um risco não negligenciável de que o consumidor em causa não deduza oposição e de que, por conseguinte, a fiscalização oficiosa por um juiz da não existência de cláusula abusiva no contrato em causa não possa ser realizada.

    54

    À luz destas considerações, há que responder à terceira a quinta questões que a Diretiva 93/13 deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que, ao prever, na fase da emissão de uma injunção de pagamento contra um consumidor, a fiscalização do caráter abusivo das cláusulas que constam de um contrato celebrado entre um profissional e esse consumidor, por um lado, confia a um funcionário administrativo de um tribunal, que não tem o estatuto de magistrado, a competência para emitir essa injunção de pagamento e, por outro, prevê um prazo de quinze dias para deduzir oposição e exige que esta seja fundamentada, no caso de tal fiscalização oficiosa não estar prevista na fase de execução da referida injunção, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

    Quanto à segunda questão

    Quanto à admissibilidade

    55

    Nas suas observações escritas, o Governo eslovaco sustenta, em substância, que esta questão apresenta um caráter hipotético, uma vez que um eventual reconhecimento, pelo órgão jurisdicional de reenvio, da qualidade para agir da HOOS implicaria a anulação do Despacho do Okresný súd Humenné (Tribunal de Primeira Instância de Humenné) de 17 de janeiro de 2013 e a remissão do processo a este último. Assim, o órgão jurisdicional de reenvio não se pronunciaria sobre o caráter abusivo da cláusula contratual em causa.

    56

    A este respeito, cumpre recordar que, segundo jurisprudência constante, as questões relativas à interpretação do direito da União submetidas pelo juiz nacional no quadro regulamentar e factual que este define sob sua responsabilidade, e cuja exatidão não compete ao Tribunal de Justiça verificar, beneficiam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar responder a uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para responder utilmente às questões que lhe são submetidas (Acórdão de 21 de setembro de 2017, Malta Dental Technologists Association e Reynaud, C‑125/16, EU:C:2017:707, n.o 28 e jurisprudência referida).

    57

    Por outro lado, cabe ao órgão jurisdicional nacional decidir em que fase do processo deve este órgão colocar uma questão prejudicial ao Tribunal de Justiça (Acórdão de 21 de setembro de 2017, Malta Dental Technologists Association e Reynaud, C‑125/16, EU:C:2017:707, n.o 29 e jurisprudência referida).

    58

    À luz desta jurisprudência e tendo em conta a resposta dada à primeira, terceira, quarta e quinta questões, há que declarar que a segunda questão é admissível.

    Quanto ao mérito

    59

    Com a segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se o artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 deve ser interpretado no sentido de que a cláusula de um contrato de crédito ao consumo relativa ao custo do crédito deve ser considerada redigida de forma clara e compreensível, na aceção desta disposição, no caso de esse contrato, por um lado, não indicar a TAEG e apenas conter uma equação matemática de cálculo dessa TAEG, sem elementos necessários para proceder a esse cálculo, e, por outro lado, não mencionar a taxa de juro.

    60

    A título preliminar, há que observar que o artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 prevê que a apreciação do caráter abusivo das cláusulas de um contrato celebrado com um consumidor não incide nem sobre a definição do objeto principal do contrato, nem sobre a adequação entre o preço e a remuneração, por um lado, e os serviços ou os bens prestados em contrapartida, por outro, desde que essas cláusulas se encontrem redigidas de maneira clara e compreensível.

    61

    A este respeito, o Tribunal de Justiça teve oportunidade de precisar que esta exigência de transparência das cláusulas contratuais, também recordada no artigo 5.o da Diretiva 93/13, não pode ficar reduzida apenas ao caráter compreensível das mesmas nos planos formal e gramatical, mas que, pelo contrário, dado que o sistema de proteção instituído por esta diretiva assenta na ideia de que o consumidor se encontra numa situação de inferioridade face ao profissional, no que respeita designadamente ao nível de informação, esta exigência de redação clara e compreensível das cláusulas contratuais e, portanto, de transparência, imposta pela mesma diretiva, deve ser entendida de maneira extensiva (Acórdão de 20 de setembro de 2017, Andriciuc e o., C‑186/16, EU:C:2017:703, n.o 44 e jurisprudência referida).

    62

    Como consequência, para determinar se a cláusula de um contrato de crédito relativa ao custo deste, e que, neste contexto, incide sobre o objeto principal desse contrato, se encontra redigida de maneira clara e compreensível, é necessário ter em conta o conjunto das disposições do direito da União que fixa obrigações em matéria de informação dos consumidores que são suscetíveis de se aplicar ao contrato em causa.

    63

    Ora, o Tribunal de Justiça já declarou, relativamente à Diretiva 87/102, que, atendendo ao objetivo de proteção do consumidor, prosseguido por esta diretiva, contra condições de crédito injustas e para lhe permitir ter um completo conhecimento das condições da execução futura do contrato celebrado, o artigo 4.o da referida diretiva exige que o devedor, no momento da celebração, esteja na posse de todos os elementos suscetíveis de ter influência sobre a sua vinculação (Acórdão de 9 de julho de 2015, Bucura, C‑348/14, não publicado, EU:C:2015:447, n.o 57 e jurisprudência referida).

    64

    Em conformidade com o artigo 4.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 87/102, o contrato de crédito deve ser reduzido a escrito e esse documento escrito deve indicar a TAEG e as condições em que esta pode ser alterada. O seu artigo 1.o‑A fixa as modalidades de cálculo da TAEG e precisa, no seu n.o 4, alínea a), que esta será calculada «no momento da celebração do contrato». Essa informação do consumidor sobre o custo global do crédito, na forma de uma taxa calculada segundo uma fórmula matemática única, reveste, assim, importância essencial (v., neste sentido, Despacho de 16 de novembro de 2010, Pohotovost’, C‑76/10, EU:C:2010:685, n.os 69 e 70).

    65

    Por conseguinte, a não indicação da TAEG num contrato de crédito pode constituir um elemento decisivo no quadro da análise, a efetuar pelo órgão jurisdicional nacional em causa, da questão de saber se a cláusula desse contrato relativa ao custo do crédito está redigida de forma clara e compreensível, na aceção do artigo 4.o da Diretiva 93/13. Se assim não for, esse órgão jurisdicional nacional pode apreciar o caráter abusivo dessa cláusula na aceção do artigo 3.o dessa diretiva (v., neste sentido, Despacho de 16 de novembro de 2010, Pohotovost’, C‑76/10, EU:C:2010:685, n.os 71 e 72).

    66

    Importa acrescentar que deve ser equiparada à situação de falta de indicação da TAEG num contrato de crédito aquela em que, como no litígio em causa no processo principal, o contrato contém unicamente uma equação matemática do cálculo desta TAEG sem os elementos necessários para proceder a esse cálculo.

    67

    Com efeito, nessa situação, não se pode considerar que o consumidor tenha pleno conhecimento das condições da execução futura do contrato celebrado, no momento da sua celebração e, por conseguinte, que disponha de todos os elementos suscetíveis de ter influência sobre a sua vinculação.

    68

    Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à segunda questão que o artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 deve ser interpretado no sentido de que, no caso de um contrato de crédito ao consumo, por um lado, não indicar a TAEG e apenas conter uma equação matemática de cálculo dessa TAEG sem os elementos necessários para proceder a esse cálculo e, por outro, não mencionar a taxa de juro, tal circunstância é um elemento decisivo no quadro da análise, pelo órgão jurisdicional nacional em causa, da questão de saber se a cláusula do referido contrato relativa ao custo do crédito está redigida de maneira clara e compreensível, na aceção da referida disposição.

    Quanto às despesas

    69

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declara:

     

    1)

    A Diretiva 93/13/CEE do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores, lida em conjugação com o princípio da equivalência, deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que não permite a uma organização de defesa do consumidor intervir, no interesse do consumidor, num processo de injunção de pagamento que envolve um consumidor individual e deduzir oposição contra essa injunção na falta de contestação desta pelo referido consumidor, no caso de a referida legislação submeter efetivamente a intervenção das associações de consumidores nos litígios abrangidos pelo direito da União a condições menos favoráveis do que as aplicáveis a litígios exclusivamente de direito interno, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

     

    2)

    A Diretiva 93/13 deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que, ao prever, na fase da emissão de uma injunção de pagamento contra um consumidor, a fiscalização do caráter abusivo das cláusulas que constam de um contrato celebrado entre um profissional e esse consumidor, por um lado, confia a um funcionário administrativo de um tribunal, que não tem o estatuto de magistrado, a competência para emitir essa injunção de pagamento e, por outro, prevê um prazo de quinze dias para deduzir oposição e exige que esta seja fundamentada, no caso de tal fiscalização oficiosa não estar prevista na fase de execução da referida injunção, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

     

    3)

    O artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 deve ser interpretado no sentido de que, no caso de um contrato de crédito ao consumo, por um lado, não indicar a taxa anual de encargos efetiva global e apenas conter uma equação matemática de cálculo dessa taxa anual de encargos efetiva global sem os elementos necessários para proceder a esse cálculo e, por outro, não mencionar a taxa de juro, tal circunstância é um elemento decisivo no quadro da análise, pelo órgão jurisdicional nacional em causa, da questão de saber se a cláusula do referido contrato relativa ao custo do crédito está redigida de maneira clara e compreensível, na aceção da referida disposição.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: eslovaco.

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