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Document 62017CC0384

Conclusões do advogado-geral M. Bobek apresentadas em 26 de junho de 2018.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2018:494

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MICHAL BOBEK

apresentadas em 26 de junho de 2018 ( 1 )

Processo C‑384/17

Dooel Uvoz‑Izvoz Skopje Link Logistik N&N

contra

Budapest Rendőrfőkapitánya

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Szombathelyi Közigazgatási és Munkaügyi Bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Szombathely, Hungria)]

«Pedido de decisão prejudicial — Transporte rodoviário — Aplicação de imposições a pesados de mercadorias pela utilização de certas infraestruturas — Diretiva 1999/62/CE — Artigo 9.o‑A Requisito de proporcionalidade das sanções — Interpretação conforme — Efeito direto — Consequências para os órgãos jurisdicionais nacionais e autoridades administrativas — Competência para aplicar uma sanção mais moderada enquanto se aguarda a intervenção legislativa»

I. Introdução

1.

A Dooel Uvoz‑Izvoz Skopje Link Logistik N&N (a seguir «recorrente») é uma empresa que explora veículos pesados de mercadorias. Em outubro de 2015, não garantiu o pagamento de uma portagem por parte do motorista de um dos seus veículos antes de o veículo em causa entrar no troço portajado de uma estrada. A recorrente, enquanto exploradora do veículo, foi multada. A recorrente impugnou o montante da coima perante os tribunais húngaros. Alega que a coima é desproporcionada e que a legislação nacional em questão é incompatível com o direito da União.

2.

O Tribunal de Justiça já declarou, no Acórdão Euro‑Team e Spirál‑Gép ( 2 ) que o regime de sanções previsto pela legislação húngara não cumpria o requisito de proporcionalidade estabelecido no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62/CE, relativa à aplicação de imposições aos veículos pesados de mercadorias pela utilização de certas infraestruturas ( 3 ). A análise e as conclusões do Tribunal de Justiça nesse acórdão foram gerais, no sentido de que se traduziram numa declaração de incompatibilidade de um regime de sanções (como o que está em causa no processo principal) com o requisito de proporcionalidade.

3.

No presente processo, o Tribunal de Justiça é convidado por outro tribunal húngaro a dar orientações mais específicas: quais são as consequências específicas de tal incompatibilidade? Quem deve garantir a proporcionalidade exigida das sanções e como? Em especial, como é que estas questões devem ser respondidas no que respeita ao período transitório antes de o legislador nacional prever um novo quadro legislativo? Para o efeito, pede‑se ao Tribunal de Justiça que aprecie se o artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 tem efeito direto ou se o direito nacional deve ser interpretado em conformidade com essa disposição. Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio suscita uma questão conexa: a de saber sobre que órgão, jurisdicional ou administrativo, recai esse dever e exatamente de que forma deverá ser cumprido.

II. Quadro jurídico

A. Direito da União

1.   Diretiva 1999/62

4.

O considerando 14 da Diretiva 1999/62/CE, de 17 de junho de 1999, tem a seguinte redação: «Considerando que é necessário que as portagens e os direitos de utilização não sejam discriminatórios, não impliquem formalidades excessivas e não criem obstáculos nas fronteiras internas; que, por conseguinte, é necessário tomar medidas adequadas para permitir o pagamento das portagens e direitos de utilização a qualquer momento e com diversos meios de pagamento;»

5.

O considerando 15 tem a seguinte redação: «Considerando que as taxas dos direitos de utilização devem ser fixadas em função da utilização da infraestrutura em questão e ser diferenciadas em relação aos custos gerados pelos veículos rodoviários;»

6.

O considerando 21 dispõe que: «Considerando que, em aplicação do princípio da proporcionalidade, a presente diretiva se limita ao mínimo necessário para alcançar os objetivos prosseguidos, de acordo com o disposto no terceiro parágrafo do artigo 5.o do Tratado.»

7.

O artigo 2.o, alínea b), da Diretiva 1999/62 define «portagem» como «um determinado montante, a pagar por um veículo com base na distância percorrida numa dada infraestrutura e na categoria do veículo, que inclui uma taxa de utilização da infraestrutura e/ou uma taxa de externalidade».

8.

O artigo 2.o, alínea c), define «direito de utilização» como «um determinado montante cujo pagamento confere o direito à utilização, por um veículo, das infraestruturas referidas no n.o 1 do artigo 7.o durante um dado período de tempo».

9.

O capítulo III da diretiva é dedicado às portagens e direitos de utilização.

10.

O artigo 7.o, n.o 1, dispõe que: «Sem prejuízo do disposto no n.o 1‑A do artigo 9.o, os Estados‑Membros podem manter ou introduzir portagens e/ou direitos de utilização na rede rodoviária transeuropeia ou em determinados troços dessa rede, bem como em qualquer outro troço da sua rede de autoestradas que não faça parte da rede rodoviária transeuropeia, nas condições estabelecidas nos n.os 2, 3, 4 e 5 do presente artigo e nos artigos 7.o‑A a 7.o‑K. Tal situação não prejudica o direito de os Estados‑Membros aplicarem, nos termos do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, portagens e/ou direitos de utilização noutras infraestruturas, desde que a sua imposição nessas infraestruturas não discrimine negativamente o tráfego internacional nem dela resultem distorções de concorrência entre operadores».

11.

Nos termos do artigo 7.o‑A, n.o 1, «os direitos de utilização devem ser proporcionais ao tempo de utilização da infraestrutura, sem exceder os valores previstos no anexo II, e devem ter validade diária, semanal, mensal ou anual. […]».

12.

O artigo 9.o‑A dispõe que: «Os Estados‑Membros instauram os controlos adequados e determinam o regime de sanções aplicável às infrações às disposições nacionais adotadas nos termos da presente diretiva. Tomam todas as medidas necessárias para assegurar a respetiva aplicação. As sanções previstas devem ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas».

B. Direito húngaro

1.   Lei da Circulação Rodoviária

13.

O artigo 20.o, n.o 1, da közúti közlekedésről szóló 1988. évi I. törvény (Lei n.o I de 1988, relativa à circulação rodoviária, a seguir «Lei da Circulação Rodoviária») dispõe:

«Está sujeito a coima quem infringir o disposto na presente lei, em atos legislativos ou regulamentares específicos e em atos de direito da União relativos:

[…]

m)

à portagem, proporcional à distância percorrida, devida pela utilização de um troço de estrada portajado.

[…]»

14.

O artigo 21.o da Lei da Circulação Rodoviária prevê:

«(1)   A pessoa que explora o veículo ou, no caso previsto no artigo 21.o‑A, n.o 2, a pessoa a quem o veículo foi confiado para efeitos da sua utilização é responsável, quando da exploração ou utilização do veículo […]

[…]

(h)

pelo cumprimento das regras estabelecidas em disposições específicas relativas à portagem, proporcional à distância percorrida, devida pela utilização de um troço de estrada portajado.

[…]

(2)   Em caso de infração ao disposto no n.o 1, é aplicada à pessoa que explora o veículo ou, no caso previsto no artigo 21.o‑A, n.o 2, à pessoa a quem o veículo foi confiado para efeitos da sua utilização uma coima de 10000 a 300000 [forints húngaros (HUF)] (cerca de 32 euros a 974 euros)]. O montante das coimas aplicáveis devido à infração das distintas disposições é fixado pelo Governo por regulamento. Quando o mesmo comportamento constitui uma infração a diversas regras e é analisado no âmbito do mesmo procedimento, é sancionado com uma coima cujo montante corresponde à soma dos montantes das coimas previstas para cada uma dessas infrações.

[…]

(5)   O Governo — atendendo ao disposto no n.o 1 — aprova por regulamento a lista de infrações que poderão dar origem à aplicação de uma coima […] à pessoa que explora o veículo.»

2.   Lei das Portagens

15.

O artigo 3.o, n.os 1 e 6, da az autópályák, autóutak és főutak használatáért fizetendő, megtett úttal arányos díjról szóló 2013. évi LXVII. törvény (Lei LXVII de 2013, relativa à portagem, proporcional à distância percorrida, devida pela utilização de autoestradas, vias rápidas e estradas nacionais, a seguir «Lei das Portagens»), dispõe:

«(1)   Os veículos sujeitos a portagem devem possuir a autorização de trânsito prevista na presente lei para circularem nos troços de estrada portajados.

[…]

(6)   A pessoa que explora o veículo é responsável, no que diz respeito ao veículo que explora, pelo cumprimento do disposto no n.o 1.»

16.

O artigo 14.o da Lei das Portagens tem a seguinte redação:

«Considera‑se que não existe autorização de trânsito […] quando:

a)

O sujeito obrigado ao pagamento da portagem não tenha adquirido, antes de iniciar a utilização do troço de estrada portajado, um bilhete correspondente ao troço que utilizou nem tenha celebrado um contrato válido com o gestor do sistema de portagem para a apresentação de declarações ao sujeito encarregado de cobrar a portagem e para o pagamento desta nos termos da presente lei,

b)

O sujeito obrigado ao pagamento da portagem circule pelo troço de estrada portajado com uma declaração de tarifa ou de categoria ambiental inferior à que corresponde ao veículo em causa, ou

c)

Exista, relativamente ao veículo em causa, um contrato válido para circular no troço de estrada portajado, celebrado com o gestor do sistema de portagem para a apresentação de declarações ao sujeito encarregado de cobrar a portagem e para o pagamento desta nos termos da presente lei, mas durante a circulação no referido troço não seja cumprido algum dos requisitos do regular funcionamento do dispositivo a bordo, estabelecidos pelo regulamento aprovado nos termos da presente lei, sem que o sujeito obrigado ao pagamento da portagem tenha adquirido, antes de iniciar a utilização do troço de estrada portajado, um bilhete correspondente ao troço que utilizou.»

17.

O artigo 15.o desta lei dispõe:

«(1)   O montante da coima é fixado de modo a incentivar os devedores a pagar a portagem exigida.

[…]»

3.   Decreto governamental n.o 410/2007

18.

O artigo 1.o, n.o 1, do közigazgatási bírsággal sújtandó közlekedési szabályszegések köréről, az etevékenységekre vonatkozó rendelkezések megsértése esetén kiszabható bírságok összegéről, felhasználásának rendjéről és az ellenőrzésben történő közreműködés feltételeiről szóló 410/2007. (XII.29.) Korm. rendelet (Decreto governamental n.o 410/2007, relativo à lista de infrações de trânsito punidas com coima, ao montante das coimas que podem ser aplicadas em caso de violação das disposições que regulam a matéria, ao regime de afetação das mesmas e às condições de participação no controlo), de 29 de dezembro de 2007 (a seguir «Decreto governamental n.o 410/2007»), dispõe:

«Em conformidade com o disposto no n.o 1 do artigo 21.o da [Lei da Circulação Rodoviária], em caso de infrações às disposições previstas nos artigos 2.o a 8.o‑A, é aplicada à pessoa que explora o veículo […] uma coima em montante fixado no presente decreto.»

19.

O artigo 8.o‑A do Decreto governamental n.o 410/2007 enuncia:

«(1)   No que respeita ao disposto no artigo 21.o, n.o 1, alínea h), da [Lei da Circulação Rodoviária], em caso de infração às disposições previstas no anexo 9, a pessoa que explora o veículo tem que pagar uma coima de determinado montante em função da categoria do veículo.

[…]»

20.

O anexo 9 deste decreto contém a seguinte tabela:

A

B

 

B1

B2

B3

1. Infração prevista na Lei n.o LXVII de 2013

Montante da coima em função da categoria do veículo

 

J2

J3

J4

2. Artigo 14.o, alínea a), da Lei n.o LXVII de 2013

140 000

150 000

165 000

3. Artigo 14.o, alínea b), da Lei n.o LXVII de 2013

80 000

90 000

110 000

4. Artigo 14.o, alínea c), da Lei n.o LXVII de 2013

140 000

150 000

165 000

III. Matéria de facto, tramitação do processo e questões prejudiciais

21.

Em 29 de outubro de 2015, às 19 h 34 m, um veículo pesado de transporte de mercadorias da categoria J4 explorado pela Link Logistik N&N circulava no ponto 3670 quilómetros do troço portajado da estrada 14 (em direção ao ponto de partida da estrada). O veículo entrou no troço viário portajado sem ter procedido ao pagamento prévio obrigatório da portagem, proporcional ao trajeto realizado.

22.

Dezoito minutos depois, o condutor adquiriu, por iniciativa própria, um bilhete correspondente à totalidade do itinerário planeado no troço portajado. Esse bilhete, que custa HUF 19573, incluía a parte da viagem que já tinha sido percorrida e a parte que o motorista ainda iria percorrer.

23.

Em 15 de janeiro de 2016, o Vas Megye Rendőrfőkapitánya (Comissariado Central da Polícia da Província de Vas, Hungria), autoridade administrativa competente em primeira instância, declarou que, na data do controlo, no local e no sentido indicados anteriormente, o veículo explorado pela Link Logistik circulava sem ter pagado a portagem, violando assim o artigo 14.o, alínea a), da Lei das Portagens húngara. Por conseguinte, o Comissariado Central da Polícia aplicou à Link Logistik uma coima de HUF 165000, em conformidade com o disposto nos artigos 21.o a 21.o‑B da Lei da Circulação Rodoviária, várias vezes alterada, e nos artigos 1.o, n.o 1, e 8.o‑A do Decreto governamental n.o 410/2007.

24.

A autoridade administrativa de recurso, o Budapest Rendőrfőkapitánya (Comissariado Central da Polícia, Budapeste, Hungria) confirmou a decisão de primeira instância. Declarou que a legislação nacional aplicável não atribui à autoridade competente poderes discricionários ou de apreciação equitativa relativamente ao montante da coima. O Comissariado Central da Polícia de Budapeste afirmou que a legislação nacional apenas permite tomar em consideração as circunstâncias previstas na lei. Tal não inclui as circunstâncias específicas invocadas pela Link Logistik, nomeadamente o facto de o bilhete ter sido adquirido a posteriori para a totalidade do itinerário portajado e de ter decorrido um curto espaço de tempo, bem como os eventuais obstáculos à aquisição do bilhete antes da utilização do troço portajado.

25.

A Link Logistik recorreu da decisão do Comissariado Central da Polícia (a seguir «recorrido») perante o órgão jurisdicional de reenvio. No seu recurso, a recorrente alegou que a legislação húngara não é compatível com o direito da União. Considerou excessivo o montante da coima por ser de montante igual à aplicada a quem não tenha adquirido qualquer bilhete.

26.

Neste contexto factual e jurídico, o Szombathelyi Közigazgatási és Munkaügyi Bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Szombathely, Hungria) decidiu suspender a instância e submeter as seguintes questões ao Tribunal de Justiça:

«1.

O requisito de proporcionalidade estabelecido no artigo 9.o‑A da [Diretiva 1999/62/CE] e interpretado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia no seu acórdão de 22 de março de 2017, proferido nos processos apensos C‑497/15 e C‑498/15, [Euro Team e Spirál‑Gép] (EU:C:2017:229), constitui uma disposição diretamente aplicável da diretiva?

2.

Caso o requisito de proporcionalidade estabelecido no artigo 9.o‑A da [Diretiva 1999/62/CE] e interpretado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia no seu acórdão de 22 de março de 2017, proferido nos processos apensos C‑497/15 e C‑498/15, [Euro Team e Spirál‑Gép] (EU:C:2017:229), não constitua uma disposição diretamente aplicável da diretiva:

— a interpretação do direito nacional conforme com o direito da União permite e exige que o tribunal e a autoridade administrativa nacionais completem — sem intervenção legislativa a nível nacional — a legislação húngara pertinente no presente processo com os critérios materiais do requisito de proporcionalidade estabelecidos no acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia de 22 de março de 2017, proferido nos processos apensos C‑497/15 e C‑498/15, [Euro Team e Spirál‑Gép] (EU:C:2017:229)?»

27.

Foram apresentadas observações escritas pelo Governo húngaro e pela Comissão Europeia.

IV. Apreciação

28.

As presentes conclusões estão estruturadas da forma a seguir indicada. Começarei por discutir a razão pela qual as sanções devem ser proporcionadas à luz do direito da União, quer em termos gerais, quer, mais especificamente, nos termos do artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 (A). De seguida, darei uma resposta às duas questões explícitas do órgão jurisdicional de reenvio, a saber, se o requisito de proporcionalidade enunciado no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 tem efeito direto ou pode dar lugar à obrigação de interpretação conforme (B). Por último, analisarei o problema aflorado pelo órgão jurisdicional de reenvio na sua segunda questão relativamente às implicações institucionais e processuais da resposta dada: quem deve assegurar a conformidade com os requisitos decorrentes do direito da União na falta de intervenção legislativa a nível nacional — os órgãos jurisdicionais ou as autoridades administrativas nacionais — e de que forma? (C).

A. Por que razão devem as sanções ser proporcionadas

29.

Nos últimos anos, vários processos ( 4 ) foram apresentados ao Tribunal de Justiça relativamente à conformidade de diversos aspetos do regime de sanções húngaro com o requisito de proporcionalidade, como previsto na Diretiva 1999/62 ou no Regulamento (CE) n.o 561/2006 ( 5 ).

30.

Por força do artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62, os Estados‑Membros fixam o regime de sanções aplicável às infrações às disposições nacionais adotadas nos termos dessa diretiva. As sanções devem ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas.

31.

Esta disposição foi recentemente interpretada pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Euro‑Team ( 6 ). Este acórdão agregou dois processos com enquadramentos factuais semelhantes: as recorrentes nesses processos tinham falhado a saída correta da autoestrada, uma delas devido a um erro no sistema de navegação do veículo, a outra devido a uma falta de atenção. Foram‑lhes aplicadas coimas pela utilização de um troço de autoestrada sem terem pagado previamente a respetiva portagem exigida para aquele troço. As coimas eram, respetivamente, 500 e 87 vezes superiores ao montante devido pela portagem. Nesses casos, as autoridades não puderam tomar em consideração a situação concreta e particular da pessoa que explora o veículo nem verificar se a infração lhe foi efetivamente imputável. As recorrentes alegaram que o montante da sanção era desproporcionada e, consequentemente, contrária ao direito da União ( 7 ).

32.

Nesse contexto factual, o Tribunal de Justiça recordou que, na falta de harmonização da legislação da União no domínio das sanções, os Estados‑Membros são competentes para escolher as sanções que se lhes afigurem adequadas. Todavia, estão obrigados a exercer essa competência no respeito pelo direito da União e dos seus princípios gerais, incluindo o princípio da proporcionalidade. Tal implica que o rigor das sanções deve ser adequado à gravidade das violações. Por outro lado, o princípio da proporcionalidade é imposto aos Estados‑Membros não apenas no que diz respeito à determinação dos elementos constitutivos de uma infração e das regras relativas ao montante das coimas mas igualmente no que diz respeito à apreciação dos elementos que podem entrar em linha de conta para fixar o montante da coima ( 8 ).

33.

Por conseguinte, o Tribunal de Justiça declarou que o requisito de proporcionalidade das sanções previsto no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 se opunha a um regime de sanções que prevê a aplicação de uma coima de montante fixo a todas as infrações, independentemente da sua natureza e gravidade, ao abrigo das regras relativas à obrigação de proceder ao pagamento prévio da portagem devida pela utilização de uma infraestrutura rodoviária. O facto de as autoridades nacionais encarregadas de sancionar as infrações não poderem ter em conta as circunstâncias particulares do caso concreto nem, eventualmente, reduzir o montante dessa coima, foi declarado incompatível com o direito da União ( 9 ).

34.

O Tribunal de Justiça chegou também à mesma conclusão no contexto do Regulamento n.o 561/2006. Este regulamento tem uma disposição semelhante à do artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 ( 10 ). Em especial, no Acórdão Urbán, o Tribunal de Justiça declarou que o requisito de proporcionalidade previsto no artigo 19.o, n.os 1 e 4 do Regulamento n.o 561/2006 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a um regime de sanções que prevê a aplicação de uma coima de montante fixo a todas as infrações, independentemente da sua gravidade, às regras relativas à utilização das folhas de registo ( 11 ).

35.

Por conseguinte, resulta da jurisprudência que, quer nos termos da Diretiva 1999/62, quer nos termos do Regulamento n.o 561/2006, as sanções aplicadas por violação desses atos devem ser proporcionadas. No entanto, esse requisito não está de forma alguma limitado a esses dois atos de direito derivado.

36.

Em primeiro lugar, num nível mais abstrato, o princípio da proporcionalidade é um princípio geral de direito da União. Deve ser observado por qualquer legislação nacional que se enquadre no âmbito do direito da União ou que execute esse direito. Exige que os Estados‑Membros adotem medidas que sejam adequadas para alcançar os objetivos prosseguidos e não excedam o que é necessário para os atingir ( 12 ).

37.

Em segundo lugar, tal princípio, quando aplicado especificamente a sanções, não está de forma alguma limitado ao domínio dos transportes rodoviários. Aplica‑se transversalmente a vários domínios do direito da União, como por exemplo direitos aduaneiros ( 13 ), direito da concorrência ( 14 ), proteção dos interesses financeiros da União Europeia ( 15 ), livre circulação de trabalhadores ( 16 ), ou imigração ilegal ( 17 ).

38.

Em terceiro lugar, o princípio da proporcionalidade é igualmente assegurado a nível constitucional pelo artigo 49.o, n.o 3, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»). Esta disposição exige que as penas não devem ser desproporcionadas em relação à infração. Isto implica que todas as sanções penais aplicadas devem corresponder à gravidade da infração em causa ( 18 ).

39.

Obviamente, o artigo 49.o, n.o 3, refere‑se a infrações penais. Assim, à primeira vista pode ser questionada a sua relevância argumentativa no que respeita a uma infração administrativa. No entanto, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (a seguir «TEDH») ( 19 ) o Tribunal de Justiça tem mantido uma interpretação material ampla do conceito de «infração penal» ( 20 ). Isto significa que, em função do cumprimento dos critérios definidos pelo TEDH e retomados pelo Tribunal de Justiça, uma infração formalmente administrativa também pode ser classificada como penal e, portanto, sujeita ao artigo 49.o, n.o 3, da Carta. Sem pretender antecipar este aspeto no presente processo, limito‑me a observar que a distinção entre o que é «penal» e o que é «administrativo» está longe de ser clara. Além disso, independentemente da sua classificação, a referência aqui feita permanece apenas ao nível dos princípios.

40.

Em quarto lugar e por último, o requisito de proporcionalidade das sanções também está presente na jurisprudência do TEDH. Em especial, o artigo 1.o do Primeiro Protocolo Adicional à Convenção dispõe que «[q]ualquer pessoa singular ou coletiva tem direito ao respeito dos seus bens». A fim de determinar se existe uma violação desse direito, o TEDH avalia se as sanções de natureza pecuniária, tanto penais como também (ou em especial) administrativas, são proporcionadas, isto é, se não implicam um encargo excessivo ou a privação da propriedade da pessoa a quem a pena é aplicada ( 21 ). Ao fazê‑lo, o TEDH tem em conta as circunstâncias particulares de cada caso, a fim de determinar se a sanção é proporcionada ( 22 ).

41.

Nos termos do artigo 52.o, n.o 3, da Carta, na medida em que a Carta enuncia direitos que correspondem aos direitos garantidos pela CEDH, o sentido e o alcance daqueles direitos serão os mesmos que os previstos na CEDH. Assim, no final, independentemente da questão da aplicabilidade do artigo 49.o, n.o 3, da Carta, os requisitos do TEDH atrás delineados, relativos à proporcionalidade das sanções, são aplicáveis a um caso como o do processo principal pela aplicação conjugada do artigo 17.o, n.o 1, do artigo 52.o, n.o 1, do artigo 51.o, n.o 1 e do artigo 52.o, n.o 3 da Carta.

42.

O que resulta claramente do exposto é que a proporcionalidade das sanções tem duas vertentes: em primeiro lugar, a sanção aplicada deve ser proporcionada à gravidade da infração. Em segundo lugar, na previsão dessa sanção, concretamente na fixação do valor de uma coima, devem ser consideradas as circunstâncias particulares de cada caso.

43.

Gostaria de acrescentar duas ressalvas finais. Em primeiro lugar, o requisito de proporcionalidade, como acima definido, não pode indubitavelmente ser interpretado no sentido de que exclui o quadro legislativo das penas. Muito pelo contrário, é prerrogativa do legislador não apenas determinar o que é ilegal, mas também definir, em termos gerais, qual será a pena para tal ilegalidade. Em segundo lugar, na minha opinião, o dever de ter em conta as circunstâncias individuais não deve levar a excluir, por si só, a possibilidade de existirem coimas de valor fixo para determinados tipos de infrações. Existem determinados tipos de infrações para as quais tais sanções são idóneas e adequadas: como exemplo podem citar‑se infrações de trânsito menores ou de estacionamento.

44.

No entanto, tendo em conta as duas ressalvas referidas, a chave para decidir que regime será ou não adequado está novamente na proporcionalidade de qualquer regime desse tipo. Isso apenas demonstra o quão profundamente está incorporada no atual entendimento da lei a análise orientada para a proporcionalidade. O papel de um juiz já não é o de uma «máquina de subsunção» ( 23 )que é simplesmente chamada a identificar a transgressão relevante a que se deve seguir uma sanção uniforme. O papel do juiz pode, de facto, ser circunscrito nalguns casos, mas sob a condição de o regime de sanções instituído pelo legislador já ser em si mesmo proporcionado. De certa forma, a proporcionalidade legislativa (geral) e a proporcionalidade (particular) no julgamento estão articuladas. Quanto mais houver da primeira, talvez menor necessidade haja da segunda, e vice‑versa. Em qualquer caso, a regra geral para o funcionamento de um sistema como um todo é a da proporcionalidade direta: quanto maior for a interferência nos direitos individuais, por exemplo, quanto mais severas forem as sanções, maior a necessidade de ter em consideração as circunstâncias particulares do caso concreto e o poder de alterar a sanção, se for adequado.

B. Requisito de proporcionalidade estabelecido no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62: efeito direto ou interpretação conforme

45.

As duas questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio são apresentadas em alternativa: o requisito de proporcionalidade previsto no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 é diretamente aplicável? Se não é diretamente aplicável, pode o direito nacional ser interpretado em conformidade com esse requisito?

46.

Antes de abordar estas questões, afigura‑se conveniente formular duas observações gerais prévias.

47.

Em primeiro lugar, conforme atrás referido, o presente processo segue o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça no processo Euro‑Team ( 24 ) e, em certa medida, também no processo Urbán ( 25 ). Levando o assunto mais longe, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta agora, em substância, o que é que precisamente, do ponto de vista do direito da União, os órgãos jurisdicionais nacionais e/ou as autoridades administrativas estão autorizados ou até obrigados a fazer em casos concretos pendentes durante a fase transitória que medeia entre uma declaração de incompatibilidade e a adoção de um novo quadro legislativo pelas autoridades competentes dos Estados‑Membros ( 26 ). Assim, de certa forma, o Tribunal de Justiça é chamado a tomar posição sobre duas questões inter‑relacionadas: como é que o princípio da proporcionalidade das sanções, estabelecido no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62, se estende aos sistemas jurídicos nacionais? Depois de determinado esse aspeto, a questão prejudicial conexa é: quem deve aplicá‑lo e de que forma?

48.

Em segundo lugar, o presente pedido de decisão prejudicial foi submetido alguns meses apenas após a prolação do Acórdão no processo Euro‑Team ( 27 ). Essa decisão respeitava às mesmas disposições da legislação húngara que também são aplicáveis no processo principal do caso em apreço. Neste contexto, formulando o argumento como fundamento de inadmissibilidade, o Governo húngaro alegou que não compete ao Tribunal de Justiça interpretar o direito nacional em conformidade com a diretiva.

49.

O Governo húngaro tem razão. Sem dúvida que não é ao Tribunal de Justiça que cabe interpretar o direito nacional e determinar se este pode — ou não — ser interpretado em conformidade com o direito da União. Não obstante, o que o Tribunal de Justiça pode fazer é fornecer orientações quanto às consequências que decorrem do Acórdão Euro‑Team, designadamente no que se refere à questão de saber quais são os poderes e as obrigações dos órgãos jurisdicionais nacionais e/ou autoridades administrativas relativamente à salvaguarda eficaz a nível nacional dos direitos baseados no direito da União.

50.

No seu despacho de reenvio, o tribunal explica que existem opiniões divergentes a nível nacional sobre a questão de saber se, além da anulação da sanção desproporcionada, também é possível ou mesmo necessário instaurar novos processos perante as autoridades administrativas. Por conseguinte, o que o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber é se, na inércia do legislador húngaro, a interpretação conforme do direito nacional ou o efeito direto permite ou até mesmo impõe aos órgãos jurisdicionais nacionais e/ou às autoridades administrativas o poder de completar a legislação húngara antes de esta ter sido alterada de forma eficaz de molde a cumprir o requisito de proporcionalidade estabelecido no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62.

51.

Estas questões, e a questão de saber se o requisito de proporcionalidade estabelecido no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 é ou não diretamente aplicável, são questões importantes de interpretação do direito da União. Esta preocupação com os efeitos do direito da União durante o período de transição entre a declaração de incompatibilidade e a adoção de novas medidas pelo legislador já foi analisada no passado pelo Tribunal de Justiça ( 28 ). Por conseguinte, nesta medida, estas matérias devem ser abordadas pelo Tribunal de Justiça.

1.   Interpretação conforme ou efeito direto

52.

Antes de examinar se o requisito de proporcionalidade constante do artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 tem efeito direto ou pode dar origem a uma interpretação conforme, há que fazer uma observação geral prévia sobre o efeito direto e a interpretação conforme. Os dois conceitos são apresentados nas questões do órgão jurisdicional de reenvio como duas matérias distintas.

53.

Tal apresentação reflete, de facto, a evolução de ambas as categorias na jurisprudência como dois mecanismos distintos. Os mesmos estão sujeitos a diferentes condições. Cada um deles é extensível às ordens jurídicas nacionais de forma diferente e tem diferentes consequências processuais associadas, dependendo, em especial, dos seus limites e do tipo de relações jurídicas em causa.

54.

Mas, ao mesmo tempo, o que é exigido em termos de resultado prático nos casos concretos dentro de cada uma destas categorias pode não ser muito diferente, em especial nos casos em que um Estado‑Membro está a ser processado por um particular. A realidade parece mais próxima de um continuum entre estes dois recursos: discute‑se frequentemente em que fase termina a «mera» interpretação conforme e começa o efeito direto. A indefinição dessa fronteira entre o efeito direto e a interpretação conforme será ainda maior nos casos em que estejam em causa requisitos como o da proporcionalidade, que podem encontrar‑se em diversos atos jurídicos com diferentes pesos jurídicos a todos os níveis, europeu e nacional.

55.

Com esta ressalva em mente, devo abordar em primeiro lugar a questão da interpretação conforme. É verdade que o órgão jurisdicional de reenvio indaga primeiro sobre o efeito direto. Tanto quanto julgo saber, o Tribunal de Justiça nunca fez qualquer declaração explícita sobre a existência de uma ordem ou hierarquia entre o efeito direto e a interpretação conforme ( 29 ). No entanto, numas conclusões relativas à importância do princípio da proporcionalidade (mas talvez não exclusivamente), o mesmo princípio também poderia ser tido em conta para limitar o nível de ingerência na escolha legislativa nacional ao estritamente necessário. Por outras palavras, se a interpretação conforme for efetivamente possível, sem que ocorra uma distorção e flexibilização não natural das regras nacionais e tendo em conta o tipo de relação em causa no processo principal para atingir o propósito ou objetivo exigido pelo direito da União, então talvez a mesma deva ser preferida porque também é previsível que minimize o impacto sobre a integridade da ordem jurídica nacional ( 30 ).

a)   Interpretação conforme

56.

Relativamente à segunda questão do órgão jurisdicional de reenvio, as declarações deste no seu despacho de reenvio, conjuntamente com as observações do Governo húngaro e da Comissão, apontam em grande medida no mesmo sentido. Em especial, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que a interpretação jurídica não é ilimitada e não pode constituir uma atividade legislativa velada ou uma assunção dos poderes do legislador nacional pelos órgãos jurisdicionais nacionais, que excederiam assim a sua competência.

57.

O órgão jurisdicional de reenvio tem seguramente razão. Existem limites para a interpretação conforme, como claramente confirmado pela jurisprudência ( 31 ). Por um lado, a obrigação de interpretar o direito nacional em conformidade com o direito da União é «inerente ao sistema do Tratado, na medida em que permite ao órgão jurisdicional nacional assegurar, no âmbito das suas competências, a plena eficácia do direito comunitário» ( 32 ). Por outro lado, um dos limites da interpretação conforme é que não pode ser usada para alcançar um resultado contra legem ( 33 ).

58.

No entanto, este limite não é assim tão fácil de avaliar. É evidente que a interpretação conforme não pode levar a situações em que as regras nacionais possam ser completamente negadas. Uma regra para «ser A» não pode de repente transformar‑se numa regra para «não ser A» ( 34 ). Todavia, além destes casos evidentes, o que é intra, o que é praeter e o que já é contra legem depende inevitavelmente de uma avaliação interpretativa subjetiva de um juiz sobre se um resultado específico é alcançável com base numa avaliação global do direito nacional.

59.

Isto é tanto mais verdade porquanto o dever de interpretação conforme não se limita ao instrumento jurídico específico que foi adotado para transpor uma obrigação de direito da União. Também constitui matéria assente que a interpretação conforme envolve a análise do direito nacional, no seu todo ( 35 ), de qualquer norma do quadro jurídico nacional que possa, com base numa interpretação adequada e admissível do direito nacional, garantir a sua interpretação conforme com o direito da União ( 36 ). Metaforicamente falando, a interpretação conforme não se limita ao exame de um ramo ou ramificação específico do direito nacional que tenha o mesmo nome da medida da União a executar, mas envolve toda a árvore do direito nacional, incluindo o tronco e as raízes do direito constitucional ou administrativo geral. No entanto, a existência de algum outro elemento na árvore legislativa nacional que possa lançar uma luz interpretativa diferente sobre o ramo chamado proporcionalidade de sanções administrativas, é de facto uma questão a verificar pelo tribunal ou tribunais nacionais.

60.

No presente processo, tem sido sugerido que a interpretação conforme não é possível. Se, de facto, o problema for enquadrado no sentido de que passa por um conflito entre, por um lado, a legislação setorial húngara específica relativa a infrações rodoviárias, que prevê tabelas e números ou montantes específicos e que não permite qualquer moderação de sanções e, por outro lado, a inexistência de qualquer norma na lei húngara, de qualquer categoria, que exija que as sanções sejam proporcionadas, então, de facto, é forçoso concordar que não é possível interpretar o que é claramente um montante X como sendo um montante Y. Mas, novamente, cabe ao órgão jurisdicional nacional verificar tais questões, tendo presentes as orientações gerais fornecidas nos parágrafos anteriores.

b)   Efeito direto

61.

Se o tribunal nacional decidir que no caso em apreço a interpretação conforme não é uma opção, a questão principal reside em saber se o artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62, que enuncia o requisito de proporcionalidade das sanções, tem efeito direto.

62.

Atendendo à sua redação e natureza, esta questão está circunscrita ao efeito direto do requisito de que as sanções devem ser proporcionadas, enunciado no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62. Isto significa uma dupla limitação: em primeiro lugar, ainda que, como sublinhado na secção anterior, o princípio da proporcionalidade seja aplicado em vários domínios do direito da União, a apreciação a fazer em relação à primeira questão do órgão jurisdicional nacional diz respeito estritamente a uma disposição específica de uma determinada diretiva. Isto significa que cada tomada de posição possível está limitada ao âmbito material da diretiva em questão. Em segundo lugar, a mesma avaliação naturalmente diz respeito apenas ao requisito de proporcionalidade das sanções enunciado naquele artigo, mas não a outros eventuais requisitos constantes do mesmo artigo.

1) Requisitos

63.

O efeito direto refere‑se à faculdade de uma regra do direito da União poder ser diretamente sujeita a fiscalização jurisdicional a nível nacional. A questão de saber se uma disposição tem ou não efeito direto deve ser apreciada tendo em conta a natureza, a sistemática geral e a letra da disposição em causa ( 37 ). Uma disposição terá efeito direto sempre que, do ponto de vista do seu conteúdo, se mostre suficientemente clara, precisa e incondicional para ser invocada contra qualquer disposição nacional não conforme ou na medida em que a mesma define direitos que os particulares podem invocar contra o Estado ( 38 ).

64.

Impõem‑se quatro observações gerais baseadas na jurisprudência antes de voltar ao presente processo ( 39 ).

65.

Em primeiro lugar, decorre claramente da jurisprudência que «claro e preciso» é uma expressão bastante flexível. Uma disposição pode ser «clara e precisa», apesar de conter expressões indefinidas — ou mesmo vagas — ou conceitos jurídicos indeterminados.

66.

Em segundo lugar, o Tribunal de Justiça parece estar mais inclinado a concluir que uma disposição, não obstante a utilização de conceitos vagos ou indeterminados, é diretamente aplicável quando contém uma proibição. Quando a disposição é invocada como fonte de um direito autónomo, cujos contornos devem ser definidos, o recurso a conceitos vagos é geralmente mais problemático. No entanto, em vários casos, uma proibição pode ser transformada num requisito positivo e vice‑versa.

67.

Em terceiro lugar, para determinar se uma disposição é diretamente aplicável a um determinado caso, o Tribunal de Justiça não procura verificar se toda a disposição tem efeito direto e é aplicável literalmente. Pelo contrário, procede por extração, isto é, tenta determinar se é possível extrair da disposição do direito da União (eventualmente mais longa e mais complexa) uma regra de conduta precisa, diretamente aplicável.

68.

Em quarto lugar, o critério «incondicional» do efeito direto implica que a disposição do direito da União não exija a adoção de qualquer outra medida ou medidas por parte das instituições da União ou dos Estados‑Membros. Além disso, segundo a jurisprudência, os Estados‑Membros não devem gozar de qualquer poder discricionário ( 40 ) quanto à aplicação das mesmas, nem ser autorizados a invocar uma impossibilidade de utilizar essa discricionariedade ( 41 ). Todavia, não obstante a existência de poder discricionário por parte do Estado‑Membro, os requisitos do efeito direto ainda podem ser satisfeitos. Isso acontecerá, nomeadamente, se a questão de saber se as autoridades nacionais excederam o seu poder discricionário puder ser objeto de fiscalização jurisdicional ( 42 ). Será assim, em princípio, se se puder determinar um «mínimo de garantia», «direitos mínimos» ou «proteção mínima» ( 43 ) e a fiscalização jurisdicional puder verificar se esse nível mínimo foi respeitado pelos Estados‑Membros ( 44 ).

69.

Em síntese, ao determinar se uma disposição que impõe uma proibição ou um comando tem efeito direto, a questão fundamental é a de saber se a regra está sujeita a fiscalização jurisdicional. Para esse fim, os requisitos «suficientemente clara, precisa e incondicional» devem ser interpretados no que diz respeito à capacidade real de as autoridades nacionais compreenderem e aplicarem essa disposição. Se essas autoridades detêm um poder discricionário ou uma margem de discricionariedade na referida aplicação, tal poder discricionário deve ser limitado pela estrutura da própria disposição.

2) Aplicação ao presente processo

70.

O órgão jurisdicional de reenvio considera que o requisito de proporcionalidade estabelecido no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 não é uma disposição diretamente aplicável. De acordo com aquele órgão jurisdicional, da diretiva não é possível deduzir a que é que a sanção deve ser proporcionada. Cabe ao legislador nacional estabelecer os critérios de proporcionalidade com base na definição do Tribunal de Justiça.

71.

Segundo o Governo húngaro, o teor do artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 não é suficientemente preciso e específico para ser diretamente aplicável. O Governo húngaro considera que a referida disposição não cria direitos em benefício do recorrente, mas que apenas define limites que permitem, no quadro da aplicação de sanções, estabelecer um equilíbrio entre a proteção objetiva da lei e os direitos individuais.

72.

Por seu turno, a Comissão alega que o artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 é claro, preciso e incondicional, na medida em que as sanções aplicadas pelos Estados‑Membros devem respeitar sempre o requisito da proporcionalidade. Assim, os particulares podem invocar esse requisito estabelecido na diretiva contra o Estado, perante um tribunal.

73.

Subscrevo a opinião da Comissão. O requisito de proporcionalidade das sanções consagrado no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 é suficientemente claro e preciso e incondicional para ser dotado de efeito direto.

74.

O referido requisito é claro e preciso. Em primeiro lugar, o significado e as consequências exatas do requisito de proporcionalidade no contexto das sanções podem compreender‑se facilmente: as sanções aplicadas não devem exceder o estritamente necessário para atingir o objetivo visado. Pouca diferença faz a forma exata como a disposição extraída do artigo 9.o‑A da diretiva é formulada, ou seja, se o requisito é redigido de forma a exigir uma intervenção positiva («as sanções devem ser proporcionadas») ou em forma de proibição («as sanções não devem ser desproporcionadas»).

75.

Em segundo lugar, é também bastante claro a que devem as sanções ser proporcionadas: as sanções devem ser adequadas à gravidade da infração cometida, tendo em consideração, se necessário, as circunstâncias particulares do caso concreto. Esta avaliação deve ocorrer no contexto específico da Diretiva 1999/62 que prevê os objetivos e o quadro normativo de aplicabilidade do requisito de proporcionalidade das sanções.

76.

Em terceiro lugar, em termos de clareza e precisão, a clareza de uma norma não se confunde com a clareza do resultado da aplicação dessa norma a cada caso concreto. O teste do efeito direto de uma disposição do direito da União é claramente o da primeira situação enunciada: a exigência geral ou normativa, ou o requisito, é suficientemente claro, preciso e incondicional para ser sujeito a fiscalização jurisdicional? Por outras palavras, a instância, seja ela um tribunal ou uma autoridade administrativa, consegue usar e aplicar diretamente a norma num litígio pendente que lhe foi submetido, sem que seja necessária maior clarificação dessa norma? Isto não significa necessariamente (e pela própria natureza da lei não pode significar) que a norma forneça ex ante uma resposta clara a qualquer processo judicial abrangido pelo seu âmbito material. De modo geral, não importa quantas diretrizes, tabelas ou acórdãos sejam proferidos para interpretar o significado de «sanção proporcionada» uma vez que a margem de apreciação inerente à aplicação dessa norma ao caso concreto nunca será eliminada.

77.

Em quarto lugar, o requisito de proporcionalidade também parece ser claro e preciso se tomarmos em consideração o ponto de vista das autoridades que são chamadas a aplicá‑lo numa base regular, se não diária, ou seja, os órgãos jurisdicionais nacionais e os órgãos administrativos. Estas autoridades devem, de facto, estar familiarizadas e bem equipadas com o teste da proporcionalidade, em especial no contexto das sanções ( 45 ).

78.

Quanto ao caráter incondicional do requisito de proporcionalidade das sanções, também é claro que a aplicação desse princípio não está sujeita a condições prévias.

79.

Em primeiro lugar, é indubitavelmente ao legislador nacional que cabe aplicar essa disposição através de instrumentos mais específicos e modelar a proporcionalidade de determinada forma, mediante a definição de parâmetros e valores exatos. Contudo, isso não pode ser levado ao ponto de se afirmar que, pela mesma razão, os demais intervenientes, como as autoridades judiciais ou administrativas, não podem apreciar questões de proporcionalidade, em especial nos casos em que o legislador nacional permaneceu inativo ou transpôs a norma em questão incorretamente.

80.

Em segundo lugar, esta conclusão é sobretudo válida quando o caso em apreço for claramente abrangido pelo que pode ser designado como «mínimo de garantia» ou «proteção mínima» do requisito de proporcionalidade. Neste sentido, poder‑se‑ia invocar algum grau de condicionalidade da norma, caso a aplicação da mesma permanecesse dentro do âmbito da margem de apreciação que pode razoavelmente considerar‑se reservada aos Estados‑Membros. No entanto, através da criação de um regime de sanções que, como o Tribunal de Justiça declarou, aplica sanções que são várias centenas de vezes mais elevadas do que o montante devido ( 46 ) e que simultaneamente impossibilita que as circunstâncias particulares do caso concreto sejam tidas em conta e a moderação da coima, um Estado‑Membro vai claramente além do que pode razoavelmente considerar‑se como sendo abrangido pela margem de apreciação e, por conseguinte, por qualquer grau de condicionalidade da norma associado à transposição. Por outras palavras, não existe qualquer condicionalidade além do que é razoavelmente abrangido pela margem de apreciação dos Estados‑Membros.

3) Conclusão intercalar

81.

Resulta do acima exposto que o artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62, na medida em que exige que as sanções sejam proporcionadas, tem efeito direto.

C. Dimensão institucional

82.

Uma vez determinado que o requisito de proporcionalidade previsto no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 tem efeito direto ( 47 ), a questão conexa passa a ser a seguinte: quem deve fazer o quê, do ponto de vista do direito da União, num contexto em que parece que os órgãos jurisdicionais e as autoridades administrativas nacionais não podem, nos termos do direito nacional, ter em conta as circunstâncias do caso concreto, ou, se for o caso, reduzir o montante da coima em causa? ( 48 )

83.

Estas duas subquestões, abordadas pelo órgão jurisdicional de reenvio na sua segunda questão e posteriormente desenvolvidas no seu despacho de reenvio, serão agora apreciadas em separado. Propõe‑se que o requisito de proporcionalidade das sanções diretamente aplicável signifique que é o direito da União que confere às autoridades nacionais o poder de moderarem, no caso concreto e se tal se justificar, o nível desproporcionado das sanções previsto na legislação (1). Além disso, ainda que caiba a cada Estado‑Membro decidir quais os poderes que devem ser exercidos por cada uma das autoridades no caso concreto, cabe, em última análise, aos órgãos jurisdicionais nacionais garantir que o direito da União é respeitado (2).

1.   O quê: anulação ou moderação da sanção?

84.

É jurisprudência assente que qualquer disposição da legislação nacional contrária ao direito da União deve ser considerada inaplicável ( 49 ). No presente processo, é evidente que a incompatibilidade da legislação húngara com o requisito de proporcionalidade enunciado no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 significa que essa legislação deve, consequentemente, ser considerada inaplicável.

85.

Menos clara é a questão de saber o que é que concretamente deve ser considerado inaplicável. Todo o instrumento legislativo? Ou apenas a tabela do anexo que define os valores das sanções? Ou é a decisão concreta que aplica o conteúdo dessa tabela? Ou apenas as disposições específicas das decisões que fixam as sanções?

86.

Fundamentalmente, o efeito direto do requisito de proporcionalidade enunciado no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 significa que qualquer sanção deve ser inaplicável? Ou poderá o referido efeito direto significar na realidade que os próprios órgãos jurisdicionais nacionais e/ou as autoridades administrativas podem decidir, com base no direito da União, moderar o montante e aplicar uma sanção proporcionada que substitua a sanção desproporcionada inicialmente aplicada com base no direito nacional? Por outras palavras, pode o requisito de proporcionalidade diretamente aplicável, como previsto no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62, ser inserido no direito nacional a fim de autorizar órgãos nacionais a aplicar sanções em conformidade com esse requisito?

87.

Essa questão parece preocupar o órgão jurisdicional de reenvio quando pergunta, na sua segunda questão, se os órgãos jurisdicionais nacionais e as autoridades administrativas podem ou até devem «[complementar][,]sem intervenção legislativa a nível nacional[,] a legislação húngara pertinente […] com os critérios materiais do requisito de proporcionalidade estabelecidos no [Acórdão Euro‑Team]».

88.

Para o Governo húngaro, nem os órgãos jurisdicionais nacionais nem as autoridades administrativas têm jurisdição ou competência para completar a legislação nacional, porque é apenas ao legislador que cabe legislar ou alterar a legislação.

89.

A Comissão também é de opinião que cabe apenas ao legislador adotar um regime de sanções proporcionado. O facto de o requisito de proporcionalidade constante do artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 ser diretamente aplicável não significa que os particulares possam invocá‑lo e obter uma decisão do tribunal nacional com a aplicação de uma nova sanção proporcionada. No entender da Comissão, enquanto o legislador nacional não instituir um novo regime de sanções no pleno respeito pelo requisito de proporcionalidade previsto no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62, os órgãos jurisdicionais nacionais apenas podem anular a sanção desproporcionada.

90.

Devo admitir que a posição defendida pela Comissão me parece algo desproporcionada. Tal posição traduz‑se, resumidamente, em sugerir que o efeito direto (com o qual a Comissão concordou) do requisito de proporcionalidade das sanções significa de facto que enquanto o legislador não adotar um novo regime de sanções não pode haver sanções.

91.

O meu ponto de vista sobre esta questão pode diferir do da Comissão por duas razões: a estrutura das disposições aplicáveis ao caso em apreço e as consequências resultantes de uma disposição do direito da União ter efeito direto.

92.

Em primeiro lugar, ao aplicar sanções por infrações como as do presente processo, a estrutura jurídica das normas a aplicar tende a ser a seguinte: em primeiro lugar existe uma regra que prevê que a portagem deve ser paga e qual é o valor (obrigação). Em segundo lugar, existe uma disposição que estabelece que a falta de pagamento da portagem é punível (base jurídica da punição). Em terceiro lugar, o que às vezes é conjugado e outras vezes separado da etapa anterior, indicação do nível das sanções, normalmente mediante a previsão de que para este e aquele tipo de comportamento podem ser aplicadas esta e aquela sanção. Em quarto lugar, no mesmo título, ou expressamente no texto da própria disposição em causa, ou por vezes em várias disposições gerais de uma lei ou até num código do procedimento administrativo, tende a haver uma lista (geralmente apenas exemplificativa) de elementos que o órgão jurisdicional deve ter em conta ao estabelecer o nível das sanções e, assim, exercer a sua margem de apreciação dentro dos limites estabelecidos pela lei e/ou pela jurisprudência dos tribunais.

93.

Em segundo lugar, com o efeito direto não está em causa, ou seguramente não está apenas em causa, excluir uma disposição incompatível do direito nacional. Se a constatação do efeito direto de uma disposição de uma diretiva conduzisse sempre à mera inaplicabilidade da legislação nacional incompatível, estou certo de que concordaria que o efeito direto não teria qualquer valor acrescentado relativamente ao princípio do primado do direito da União ( 50 ). A inaplicabilidade, que resulta na anulação da sanção é a consequência necessária do primado. O efeito direto não é necessário para esse fim.

94.

Na minha opinião, em processos como o presente, o efeito direto também significa substituição. Uma regra diretamente aplicável do direito da União torna‑se suscetível de ser objeto de fiscalização jurisdicional de forma independente e passa a ser aplicável perante os órgãos nacionais, independentemente da legislação nacional adotada para lhe conferir efeito. Essa regra diretamente aplicável não precisa de excluir nada ao nível nacional: ela pode simplesmente acrescentar algo anteriormente indisponível na estrutura da lei nacional.

95.

Aplicando esta lógica ao presente processo, inserir o requisito de proporcionalidade das sanções diretamente aplicável enunciado no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 na ordem jurídica nacional significa conferir aos órgãos nacionais o poder que aparentemente tinham perdido de acordo com a quarta etapa acima descrita. Isso não significa necessariamente que qualquer um dos passos anteriores precisará de ser posto de lado: o facto de a portagem ser devida permanece válido; o mesmo acontece com o facto de, se alguém não pagar a portagem, se seguir uma sanção; e também com o nível inicial das sanções, imposto antes de poder ser aplicada qualquer moderação, como previsto no anexo.

96.

No entanto, devido ao efeito direto do requisito de proporcionalidade das sanções, o que muda é o facto de ser conferido aos órgãos nacionais, nalguns casos dentro do período de transição, ou seja, salvo se o legislador nacional adotar um novo regime de sanções compatível com o direito da União, o poder de moderar as sanções aplicadas em função da gravidade da infração em causa e das circunstâncias de cada caso concreto. No exercício de tal poder de alteração, os montantes estabelecidos no anexo 9 do Decreto governamental n.o 410/2007 podem ser considerados como o limiar máximo, acima do qual a coima aplicada naturalmente não pode ir, mas abaixo do qual tais montantes podem ser reduzidos em casos concretos, tendo em conta a gravidade da infração e as circunstâncias particulares do caso concreto.

97.

Por estas razões, sou da opinião de que o efeito direto do requisito de proporcionalidade das sanções deve de facto significar «sanções proporcionadas» e não «inexistência de sanções». Como já se sugeriu ( 51 ), o efeito direto também pode ser aplicado de uma forma proporcionada, salvaguardando‑se assim ao máximo a integridade de ambos os sistemas. Utilizar a precisão cirúrgica orientada para inserir uma norma na ordem jurídica nacional que é necessária para garantir a conformidade imediata desta última com o direito da União, embora naturalmente se deixe a porta aberta ao legislador nacional para estipular de outra forma para o futuro, é porventura preferível a tornar de facto impossível a consecutiva aplicação de todo o sistema nacional de sanções.

98.

É necessário abordar um último ponto para concluir esta secção. É jurisprudência assente que uma diretiva não pode, por si só e independentemente de uma lei adotada para a sua aplicação, conduzir a determinar ou a agravar a responsabilidade penal de quem quer que aja em violação das disposições dessa diretiva ( 52 ). Acresce que uma disposição diretamente aplicável de uma diretiva não pode, por si só, criar obrigações na esfera jurídica de um particular ( 53 ). Não pode, portanto, ser invocada por outra pessoa, seja pública ou privada, em detrimento daquele particular. Esta é uma das razões pelas quais o Tribunal de Justiça excluiu a possibilidade de um particular invocar uma disposição diretamente aplicável de uma diretiva contra outro particular («efeito direto horizontal») ou de uma autoridade pública a invocar contra um particular («efeito direto vertical descendente»).

99.

Poder‑se‑ia eventualmente sugerir, com base nesta jurisprudência, que o efeito direto por substituição, tal como delineado, equivaleria a aplicar uma disposição da diretiva incorretamente transposta (artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62) em detrimento do particular. Esta disposição da diretiva seria efetivamente utilizada para agravar a situação do particular e, de certo modo, «salvar» o Estado‑Membro em falta.

100.

Na minha opinião, o presente processo tem um caráter diferente. Em primeiro lugar, tal argumento vai demasiado longe. Já supõe que a aplicabilidade das sanções deve ser categoricamente excluída em virtude do primado do direito da União, ao passo que o efeito direto do requisito de proporcionalidade das sanções significa que elas são efetivamente «reintroduzidas» no quadro. No entanto, como já foi sublinhado no n.o 92, a situação típica, relativamente à qual qualquer «agravamento» ou «melhoria» da situação jurídica do particular deve ser analisado, é realmente diferente: trata‑se do dever imposto a nível nacional de pagar a portagem e, em caso de incumprimento, da sanção pelo montante total previsto na legislação nacional.

101.

Em segundo lugar, medido por essa bitola, o resultado final será sempre favorável aos particulares. A situação do particular será efetivamente melhor com base na diretiva, pois nos casos mais flagrantes de violação intencional ser‑lhe‑á aplicada a mesma sanção, ao passo que na maior parte dos casos incorrerá numa sanção mais leve do que a prevista pela legislação nacional incompatível.

102.

Em terceiro lugar, será sempre um particular, como a recorrente, que invocará a Diretiva 1999/62 para poder beneficiar dos direitos que a mesma lhe confere contra um Estado‑Membro. Mais uma vez, é útil recordar a exata natureza desse direito garantido pela diretiva: a fixação de sanções proporcionadas. A diretiva não prevê a inexistência de sanções. Assim, o direito decorrente do artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 que a recorrente pode invocar não é o direito a nenhuma sanção, mas o direito de não incorrer numa sanção desproporcionada.

103.

Seria muito estranho se um particular que invocasse uma disposição da diretiva diretamente aplicável pudesse obter uma proteção maior do que aquela que a diretiva poderia alguma vez, de facto, ter‑lhe concedido.

2.   Quem: órgãos jurisdicionais nacionais e/ou autoridades administrativas?

104.

O último elemento refere‑se a um problema suscitado pelo órgão jurisdicional de reenvio no seu despacho de reenvio e que transparece na segunda questão. Entendo que a natureza do problema é a seguinte: o sistema jurídico nacional não permite que as autoridades administrativas modifiquem as sanções e tenham em conta as circunstâncias do caso concreto ao decidir sobre a sanção. Os poderes conferidos ao tribunal administrativo, nos termos do direito nacional, apenas lhe permitem anular a decisão da autoridade administrativa e remeter o caso para um novo processo perante a autoridade administrativa, embora esta aparentemente também não possa alterar a sanção aplicada. É neste contexto que entendo que a questão do tribunal nacional é a de saber quem deve garantir o cumprimento do direito da União — a autoridade administrativa e/ou o órgão jurisdicional nacional?

105.

É jurisprudência assente que «é incompatível com as exigências inerentes à própria natureza do direito da União qualquer disposição de um ordenamento jurídico nacional ou qualquer prática legislativa, administrativa ou judicial que tenha por efeito a diminuição da eficácia do direito da União pelo facto de negar ao juiz competente para a aplicação desse direito o poder de, no próprio momento dessa aplicação, fazer tudo o que for necessário para não aplicar as disposições legislativas nacionais que eventualmente obstem à plena eficácia das normas diretamente aplicáveis do direito da União. […] [É] esse o caso se, […] o obstáculo daí resultante para a plena eficácia do direito da União [for] apenas temporário» ( 54 ).

106.

Está também estabelecido que o dever de aplicação imediata do direito da União é igualmente aplicável aos órgãos jurisdicionais nacionais ( 55 ) e às autoridades administrativas ( 56 ). Ambos, no âmbito das respetivas competências, têm a obrigação de garantir a plena eficácia das disposições do direito da União, sem pedir nem aguardar pela eliminação prévia de qualquer disposição nacional contrária por via legislativa ou por qualquer outro procedimento constitucional ( 57 ). Por último, aplicar integralmente as disposições do direito da União inclui a aplicação de todos os princípios de aplicação nacional do direito da União, como o primado, o efeito direto ou a interpretação conforme.

107.

Assim, em termos práticos, é evidente que os dois tipos de órgãos, os órgãos jurisdicionais nacionais ou as autoridades administrativas, são obrigados a aplicar o direito da União a nível nacional. Certamente que existem alguns limites. Mesmo uma disposição diretamente aplicável do direito da União não deve afetar a natureza e o tipo de competências que normalmente são conferidos aos tribunais e órgãos administrativos, de acordo com o sistema jurídico nacional ( 58 ). No entanto, tal disposição terá um impacto sobre os poderes específicos atribuídos por esse sistema aos seus órgãos nacionais para desempenharem determinadas funções. Em especial, os Estados‑Membros têm a obrigação de prever determinadas vias de recurso perante os seus tribunais e autoridades administrativas, a fim de assegurarem a aplicação imediata e uniforme do direito da União ( 59 ).

108.

Por conseguinte, se aplicado aos factos no caso em apreço, decorre da circunstância de o requisito de proporcionalidade das sanções, consagrado no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62, ter efeito direto que, dentro do âmbito de aplicação dessa diretiva, as autoridades nacionais têm poderes para moderar sanções em casos concretos de modo a torná‑las proporcionadas à gravidade da infração cometida, sem terem de esperar até que o legislador nacional altere a legislação pertinente. Essas autoridades recebem um mandato direto, do ponto de vista do direito da União, para confirmarem imediatamente o direito do recorrente a sanções proporcionadas (ou de não incorrer em sanções desproporcionadas) que decorre do artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62.

109.

Dentro desses limites, cabe a cada Estado‑Membro, através do seu próprio sistema estruturado interno, decidir, em conformidade com o princípio da autonomia institucional e processual, que órgão nacional será responsável pela aplicação do requisito da proporcionalidade. Não creio que seja aconselhável ou adequado que o Tribunal de Justiça vá além dessa orientação geral e tome efetivamente decisões sobre a forma como as competências devem ser atribuídas a nível nacional interno.

110.

No entanto, gostaria de acrescentar duas notas finais.

111.

Em primeiro lugar, o primado, o efeito direto e a obrigação de interpretação conforme são vinculativos para todas as autoridades dos Estados‑Membros, tanto judiciais como administrativas. Neste contexto, é efetivamente uma questão de direito nacional saber a que entidade específica cabe garantir o respeito dessas obrigações, desde que alguém o faça. Na prática, se um Estado‑Membro desejar manter a regra de que os tribunais administrativos exercem uma fiscalização restrita, deve dar às autoridades administrativas o poder de moderar as sanções. Se um Estado‑Membro preferir circunscrever a margem de apreciação das autoridades administrativas, deve nesse caso permitir que os tribunais decidam sobre as sanções proporcionadas. No entanto, um «conflito negativo de competências», em que ambos os tipos de órgãos se declarem incompetentes, seria incompatível com a aplicação efetiva do direito da União.

112.

Em segundo lugar, de certa forma, o direito da União já antecipa qualquer problema deste tipo, afirmando que, numa União baseada no Estado de direito, a regra do poder de assegurar a proteção jurídica que aos particulares advém das disposições do direito da União e garantir a plena eficácia destas cabe em especial aos órgãos jurisdicionais nacionais ( 60 ). Afinal, o elemento estruturante do sistema de proteção previsto no direito da União, ou nos termos do artigo 19.o, n.o1, segundo parágrafo, TUE, ou nos termos do artigo 47.o da Carta, é que se trata de um sistema de tutela jurisdicional efetiva ( 61 ). O direito da União não só confere poderes aos órgãos jurisdicionais nacionais, como também lhes impõe a obrigação última de garantir que, a nível nacional, o direito (da União) é respeitado. Este é, de facto, o alcance total do mandato de um juiz de direito da União.

V. Conclusão

113.

À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões prejudiciais que lhe foram submetidas pelo Szombathelyi Közigazgatási és Munkaügyi Bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Szombathely, Hungria), nos seguintes termos:

O artigo 9.o‑A da Diretiva n.o 1999/62/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de junho de 1999, relativa à aplicação de imposições aos veículos pesados de mercadorias pela utilização de certas infraestruturas, na medida em que exige que as sanções devem ser proporcionadas, tem efeito direto.

Cabe a cada Estado‑Membro decidir, em conformidade com o princípio da autonomia institucional e processual, que órgão nacional será encarregado da aplicação desse requisito de proporcionalidade. No entanto, na falta de uma decisão nesse sentido, cabe aos órgãos jurisdicionais nacionais assegurar a proteção jurídica que decorre para os particulares das disposições do direito da União e garantir a plena eficácia dessas disposições, incluindo assegurar que as sanções impostas em cada caso concreto não violam o requisito de proporcionalidade consagrado no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62.


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) Acórdão de 22 de março de 2017 (C‑497/15 e C‑498/15, EU:C:2017:229).

( 3 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de junho de 1999 (JO 1999, L 187, p. 42).

( 4 ) V. Acórdãos de 9 de fevereiro de 2012, Urbán (C‑210/10, EU:C:2012:64); de 9 de junho de 2016, Eurospeed (C‑287/14, EU:C:2016:420); de 19 de outubro de 2016, EL‑EM‑2001 (C‑501/14, EU:C:2016:777); e de 22 de março de 2017, Euro‑Team e Spirál‑Gép (C‑497/15 e C‑498/15, EU:C:2017:229).

( 5 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, relativo à harmonização de determinadas disposições em matéria social no domínio dos transportes rodoviários que altera os Regulamentos (CEE) n.o 3821/85 e (CEE) n.o 2135/98 do Conselho e revoga o Regulamento (CEE) n.o 3820/85 do Conselho (JO 2006, L 102, p. 1).

( 6 ) Acórdão de 22 de março de 2017, Euro‑Team e Spirál‑Gép (C‑497/15 e C‑498/15, EU:C:2017:229).

( 7 ) Acórdão de 22 de março de 2017, Euro‑Team e Spirál‑Gép (C‑497/15 e C‑498/15, EU:C:2017:229, n.os 29 a 30).

( 8 ) Acórdão de 22 de março de 2017, Euro‑Team e Spirál‑Gép (C‑497/15 e C‑498/15, EU:C:2017:229, n.os 39 a 43). V., também, novamente no contexto do regime húngaro de sanções por infrações rodoviárias, Acórdãos de 9 de fevereiro de 2012, Urbán (C‑210/10, EU:C:2012:64, n.os 53 a 54), e de 19 de outubro de 2016, EL‑EM‑2001 (C‑501/14, EU:C:2016:777, n.os 40 a 41).

( 9 ) Acórdão de 22 de março de 2017, Euro‑Team e Spirál‑Gép (C‑497/15 e C‑498/15, EU:C:2017:229, n.os 50 e 60).

( 10 ) O artigo 19.o, n.o 1, do Regulamento n.o 561/2006 dispõe que «[o]s Estados‑Membros devem determinar o regime de sanções aplicável às violações do disposto no presente regulamento e no Regulamento (CEE) n.o 3821/85 e tomar todas as medidas necessárias para assegurar a sua aplicação. Essas sanções devem ser eficazes, proporcionadas, dissuasivas e não discriminatórias. […]». O artigo 19.o, n.o 4, dispõe ainda que «[o]s Estados‑Membros devem assegurar a vigência de um sistema de sanções proporcionadas, que podem incluir sanções financeiras, por infração ao presente regulamento […]».

( 11 ) Acórdão de 9 de fevereiro de 2012, Urbán (C‑210/10, EU:C:2012:64, n.o 44). V., também, Acórdãos de 9 de junho de 2016, Eurospeed (C‑287/14, EU:C:2016:420), e de 19 de outubro de 2016, EL‑EM‑2001 (C‑501/14, EU:C:2016:777). V., também, em relação ao antecessor do Regulamento n.o 561/2006, Acórdão de 10 de julho de 1990, Hansen (C‑326/88, EU:C:1990:291).

( 12 ) V., muito recentemente, por exemplo, Acórdão de 17 de abril de 2018, Egenberger (C‑414/16, EU:C:2018:257, n.o 68). Ou v. Acórdão de 6 de março de 2014, Siragusa (C‑206/13, EU:C:2014:126, n.o 34 e jurisprudência referida).

( 13 ) V. Acórdãos de 16 de dezembro de 1992, Comissão/Grécia (C‑210/91, EU:C:1992:525, n.o 20), e de 12 de julho de 2001, Louloudakis (C‑262/99, EU:C:2001:407, n.o 67).

( 14 ) V. artigo 7.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.o e 82.o do Tratado (JO 2003, L 1, p. 1), relativamente às coimas aplicadas pela Comissão. Em termos gerais, v., por exemplo, Acórdão de 28 de junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão (C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, EU:C:2005:408, n.os 279 a 281) (que tem em conta a dimensão da empresa através do seu volume de negócios global aquando da fixação do montante da coima).

( 15 ) V. artigo 7.o, n.o 1 e artigo 9.o da Diretiva (UE) 2017/1371 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de julho de 2017, relativa à luta contra a fraude lesiva dos interesses financeiros da União através do direito penal (JO 2017, L 198, p. 29).

( 16 ) Acórdão de 14 de julho de 1977, Sagulo e o. (8/77, EU:C:1977:131, n.o 13), em que o Tribunal de Justiça declarou que as sanções aplicadas a uma pessoa por não se munir de um documento de identidade previstos no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 68/360/CEE do Conselho, de 15 de outubro de 1968, relativa à supressão das restrições à deslocação e permanência dos trabalhadores dos Estados‑Membros e suas famílias na Comunidade, não poderão exceder a medida que se mostre proporcionada à natureza da infração cometida.

( 17 ) O artigo 5.o, n.o 1, e os artigos 10.o e 12.o da Diretiva 2009/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de junho de 2009, que estabelece normas mínimas sobre sanções e medidas contra os empregadores de nacionais de países terceiros em situação irregular (JO 2009, L 168, p. 24), exigem que os Estados‑Membros tomem as medidas necessárias para assegurar que as infrações a certas disposições da referida diretiva sejam eficazes, proporcionais e dissuasivas contra o empregador.

( 18 ) V., por exemplo, Acórdão de 20 de março de 2018, Garlsson Real Estate e o. (C‑537/16, EU:C:2018:193, n.o 56), em que o Tribunal de Justiça observou que essa exigência resultava tanto do artigo 52.o, n.o 1, quanto do artigo 52.o, n.o 1, da Carta (exigência de restrições proporcionadas ao exercício dos direitos e liberdades reconhecidos pela Carta). V., também, Acórdão de 28 de julho de 2016, JZ (C‑294/16 PPU, EU:C:2016:610, n.os 42 a 45).

( 19 ) V., nomeadamente, Acórdãos do TEDH de 8 de junho 1976, Engel e o./Países Baixos (CE:ECHR:1976:0608JUD000510071, n.os 80 a 82), e de 10 de fevereiro de 2009, Sergey Zolotukhi/Rússia (CE:ECHR:2009:0210JUD001493903, n.os 52 a 53).

( 20 ) V., por exemplo, Acórdãos de 5 de junho de 2012, Bonda (C‑489/10, EU:C:2012:319, n.o 37); de 26 de fevereiro de 2013, Åkerberg Fransson (C‑617/10, EU:C:2013:105, n.o 35); e de 20 de março de 2018, Garlsson Real Estate e o. (C‑537/16, EU:C:2018:193, n.o 28).

( 21 ) Como exemplos de processos em que se concluiu existir violação do artigo 1.o do Primeiro Protocolo com fundamento em falta de proporcionalidade de sanções, v. Acórdãos do TEDH de 11 de janeiro de 2007, Mamidakis/Grécia (CE:ECHR:2007:0111JUD003553304, n.os 47 a 48); de 6 de novembro de 2008, Ismayilov/Rússia (CE: ECHR:2008:1106JUD003035203, n.o 38); e de 26 de fevereiro de 2009, Grifhorst/França (CE:ECHR:2009:0226JUD002833602, n.os 94 a 106). Como exemplos de processos em que não se concluiu existir violação do artigo 1.o do Primeiro Protocolo, após avaliação da proporcionalidade das sanções aplicadas, v. Acórdãos do TEDH de 7 de julho de 1989, Tre Traktörer Aktiebolag/Suécia (CE:ECHR:1989:0707JUD001087384, n.o 62); de 18 de junho de 2013, S.C. Complex Herta Import Export S.R.L. Lipova/Roménia (CE:ECHR:2013:0618JUD001711804, n.o 38); e de 4 de março de 2014, Grande Stevens/Itália (CE:ECHR:2014:0304JUD001864010, n.o 199).

( 22 ) Pode acrescentar‑se que a gravidade da sanção, por exemplo um montante avultado de dinheiro, também pode sugerir a natureza criminal da sanção para efeitos do artigo 6.o, n.o 1, da Convenção (v., por exemplo, Acórdão do TEDH de 11 de janeiro de 2007, Mamidakis/Grécia (CE:ECHR:2007:0111JUD003553304, n.os 20 a 21).

( 23 ) Ogorek, R., Richterkönig oder Subsumtionsautomat? Zur Justiztheorie im 19. Jahrhundert, Frankfurt am Main, V. Klostermann, 1986. Whether that picture was, as a matter of fact, correct even in the 19th century is another debate. See, for example, Gläser, M., Lehre und Rechtsprechung im französischen Zivilrecht des 19. Jahrhunderts, Frankfurt am Main, V. Klostermann 1996.

( 24 ) Acórdão de 22 de março de 2017 (C‑497/15 e C‑498/15, EU:C:2017:229).

( 25 ) Acórdão de 9 de fevereiro de 2012, Urbán (C‑210/10, EU:C:2012:64).

( 26 ) Foi, de facto, indicado pelo Governo húngaro que o regime nacional de sanções foi alterado depois da prolação do Acórdão Euro‑Team. As novas disposições definem a escala das coimas de acordo com o período de tempo decorrido entre a primeira e a última constatação de irregularidade na utilização da estrada portajada. Ao que parece, numa situação como a que está em causa no processo principal o montante da coima seria agora de HUF 40000 (aproximadamente EUR 127). Nas suas observações escritas, o Governo húngaro indicou que estas novas disposições entraram em vigor em 12 de novembro de 2017. Por conseguinte, não são aplicáveis ao presente caso.

( 27 ) Acórdão de 22 de março de 2017 (C‑497/15 e C‑498/15, EU:C:2017:229).

( 28 ) V., nesse sentido, Acórdãos de 19 de novembro de 2009, Filipiak (C‑314/08, EU:C:2009:719, n.os 44 a 45), e de 8 de setembro de 2010, Winner Wetten (C‑409/06, EU:C:2010:503, n.os 40 a 41).

( 29 ) Para um exemplo de variações de apreciação, comparar os Acórdãos de 27 de fevereiro de 2014, OSA (C‑351/12, EU:C:2014:110, n.os 43 a 44, e de 25 de junho de 2015, Indėlių ir investicijų draudimas e Nemaniūnas (C‑671/13, EU:C:2015:418, n.os 56 a 57).

( 30 ) V. as minhas Conclusões no processo Pöpperl (C‑187/15, EU:C:2016:194, n.o 62) ou as Conclusões da advogada‑geral E. Sharpston no processo OSA (C‑351/12, EU:C:2013:749, n.o 45); v., também, em termos gerais, Prechal, S., Directives in EC‑Law, 2.a edição, Oxford University Press, Oxford, 2005, pp. 314 e 315.

( 31 ) Acórdãos de 10 de abril de 1984, von Colson e Kamann (14/83, EU:C:1984:153, n.o 26), e de 5 de outubro de 2004, Pfeiffer e o. (C‑397/01 a C‑403/01, EU:C:2004:584, n.os 111 a 119). V., também, acórdãos de 4 de julho de 2006, Adeneler e o. (C‑212/04, EU:C:2006:443, n.o 109), e de 24 de janeiro de 2012, Dominguez (C‑282/10, EU:C:2012:33, n.o 25).

( 32 ) Acórdão de 5 de outubro de 2004, Pfeiffer e o. (C‑397/01 a C‑403/01, EU:C:2004:584, n.o 114).

( 33 ) V., por exemplo, Acórdão de 4 de julho de 2006, Adeneler e o. (C‑212/04, EU:C:2006:443, n.o 110); de 15 de abril de 2008, Impact (C‑268/06, EU:C:2008:223, n.o 100); e de 11 de novembro de 2015, Klausner Holz Niedersachsen (C‑505/14, EU:C:2015:742, n.o 32).

( 34 ) Para um exemplo específico, v., por exemplo, Conclusões da advogada‑geral E. Sharpston no processo Unibet (C‑432/05, EU:C:2006:755, n.o 55).

( 35 ) «O princípio da interpretação conforme exige que os órgãos jurisdicionais nacionais façam tudo o que for da sua competência, tomando em consideração todo o direito interno e aplicando os métodos de interpretação por este reconhecidos, para garantir a plena eficácia do direito da União e alcançar uma solução conforme ao objetivo por ele prosseguido» [v., para uma reafirmação mais recente do princípio, por exemplo, Acórdão de 13 de julho de 2016, Pöpperl (C‑187/15, EU:C:2016:550, n.o 43 e jurisprudência referida)].

( 36 ) Comprovativo de uma abordagem ampla do dever de interpretação conforme por inclusão de lei nacional posterior no alcance desse dever, v., por exemplo, Acórdãos de 16 de dezembro de 1993, Wagner Miret (C‑334/92, EU:C:1993:945, n.o 20), e de 27 de junho de 2000, Océano Grupo Editorial e Salvat Editores (C‑240/98 a C‑244/98, EU:C:2000:346, n.o 32).

( 37 ) V., por exemplo, Acórdão de 4 de dezembro de 1974, Van Duyn (41/74, EU:C:1974:133, n.o 12).

( 38 ) Acórdãos de 19 de janeiro de 1982, Becker (C‑8/81, EU:C:1982:7, n.o 25); e de 15 de abril de 2008, Impact (C‑268/06, EU:C:2008:223, n.os 56 e 57).

( 39 ) Para uma argumentação mais detalhada conjuntamente com outros exemplos e referências para cada uma das considerações gerais, v. as minhas recentes Conclusões no processo Klohn (C‑167/17, EU:C:2018:387, n.os 38 a 46).

( 40 ) Acórdão de 4 de dezembro de 1974, Van Duyn (C‑41/74, EU:C:1974:133, n.o 6).

( 41 ) Acórdão de 19 de janeiro de 1982, Becker (C‑8/81, EU:C:1982:7, n.os 28 a 30).

( 42 ) Acórdão de 4 de dezembro de 1974, Van Duyn (C‑41/74, EU:C:1974:133, n.os 7 e 13). V. também, Acórdãos de 24 de outubro de 1996, Kraaijeveld e o. (C‑72/95, EU:C:1996:404, n.o 59); de 15 de abril de 2008, Impact (C‑268/06, EU:C:2008:223, n.o 64); e de 21 de março de 2013, Salzburger Flughafen (C‑244/12, EU:C:2013:203, n.os 29 e 31).

( 43 ) V., respetivamente, Acórdãos de 19 de novembro de 1991, Francovich (C‑6/90, EU:C:1991:428, n.o 19); de 14 de julho de 1994, Faccini Dori (C‑91/92, EU:C:1994:292, n.o 17); e de 24 de janeiro de 2012, Dominguez (C‑282/10, EU:C:2012:33, n.o 35).

( 44 ) V., neste sentido, Acórdão de 19 de setembro de 2000, Linster (C‑287/98, EU:C:2000:468, n.o 37).

( 45 ) Mais uma vez, para ilustrar algumas das outras matérias em que o requisito de proporcionalidade das sanções é aplicado v., supra, n.os 29 a 42.

( 46 ) V., supra, n.o 31 destas conclusões.

( 47 ) Pode acrescentar‑se que os argumentos apresentados na presente secção poderão ser aplicáveis, em grande medida, se o órgão jurisdicional de reenvio acabar por considerar que o direito nacional pode ser interpretado em conformidade com o artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62.

( 48 ) V., também, Acórdão de 22 de março de 2017, Euro‑Team e Spirál‑Gép (C‑497/15 e C‑498/15, EU:C:2017:229, n.o 60).

( 49 ) V., por exemplo, Acórdãos de 9 de março de 1978, Simmenthal (106/77, EU:C:1978:49, n.o 21); de 18 de julho de 2007, Lucchini (C‑119/05, EU:C:2007:434, n.o 61); e de 3 de outubro de 2013, Confédération paysanne (C‑298/12, EU:C:2013:630, n.o 37).

( 50 ) Sobre este debate, v., por exemplo, Lenaerts, K., Corthaut, T., Of Birds and Hedges: The Role of Primacy in Invoking Norms of EU Law (2006) 31 European Law Review, Vol. 31, 2006, pp. 287 a 315; Prechal, S., Direct Effect, Indirect Effect, Supremacy and the Evolving Constitution of the European Union, in Barnard. C. (ed.), The Fundamentals of EU Law Revisited: Assessing the Impact of the Constitutional Debate, Oxford University Press, 2007, pp. 35 a 69; Gallo, D., L’efficacia diretta del diritto dell’Unione europea negli ordinamenti nazionali, Evoluzione di una dottrina ancora controversa, Giuffrè, 2018, pp. 351 a 418.

( 51 ) No que diz respeito à relação entre o efeito direto e a interpretação conforme (v., supra, n.o 55).

( 52 ) V., por exemplo, Acórdãos de 8 de outubro de 1987, Kolpinghuis Nijmegen (80/86, EU:C:1987:431, n.o 48), e de 22 de novembro de 2005, Grøngaard e Bang (C‑384/02, EU:C:2005:708, n.o 30).

( 53 ) V., por exemplo, Acórdão de 26 de fevereiro de 1986, Marshall (152/84, EU:C:1986:84); de 5 de outubro de 2004, Pfeiffer e o. (C‑397/01 a C‑403/01, EU:C:2004:584, n.o 108); e de 10 de outubro de 2017, Farrell (C‑413/15, EU:C:2017:745, n.o 31).

( 54 ) V., por exemplo, Acórdãos de 9 de março de 1978, Simmenthal (106/77, EU:C:1978:49, n.os 22 a 23), e de 8 de setembro de 2010, Winner Wetten (C‑409/06, EU:C:2010:503, n.os 56 a 57). O sublinhado é meu.

( 55 ) V., por exemplo, Acórdãos de 9 de março de 1978, Simmenthal (106/77, EU:C:1978:49, n.o 24); de 19 de janeiro de 2010, Kücükdeveci (C‑555/07, EU:C:2010:21, n.o 55); e de 5 de julho de 2016, Ognyanov (C‑614/14, EU:C:2016:514, n.o 34).

( 56 ) V., por exemplo, Acórdãos de 22 de julho de 1989, Costanzo (103/88, EU:C:1989:256, n.o 31); de 12 de janeiro de 2010, Petersen (C‑341/08, EU:C:2010:4, n.o 80); e de 10 de outubro de 2017, Farrell (C‑413/15, EU:C:2017:745, n.o 34).

( 57 ) V., por exemplo, recentemente, Acórdão de 14 de setembro de 2017, e Trustees of the BT Pension Scheme (C‑628/15, EU:C:2017:687, n.o 54 e jurisprudência referida).

( 58 ) Assim, o Tribunal de Justiça normalmente qualifica o alcance desse dever como matéria da competência dos tribunais «no âmbito das suas competências» [v., por exemplo, Acórdão de 15 de abril de 2008, Impact (C‑268/06, EU:C:2008:223, n.o 99)] e das autoridades nacionais «no âmbito das suas competências» (v., por exemplo, Acórdãos de 12 de junho de 1990, Alemanha/Comissão (C‑8/88, EU:C:1990:241, n.o 3); ou de 12 de fevereiro de 2008, Kempter (C‑2/06, EU:C:2008:78, n.o 34)].

( 59 ) V., por exemplo, Acórdãos de 19 de junho de 1990, Factortame e o. (C‑213/89, EU:C:1990:257, n.o 21); de 27 de junho de 2000, Océano Grupo Editorial e Salvat Editores (C‑240/98 a C‑244/98, EU:C:2000:346, n.o 29); e de 26 de outubro de 2006, Mostaza Claro (C‑168/05, EU:C:2006:675, n.o 39). No contexto específico dos poderes das autoridades administrativas, v., por exemplo, Acórdão de 9 de setembro de 2003, CIF (C‑198/01, EU:C:2003:430, n.o 58).

( 60 ) V., por exemplo, Acórdão de 5 de outubro de 2004, Pfeiffer e o. (C‑397/01 a C‑403/01, EU:C:2004:584, n.o 111).

( 61 ) V., por exemplo, Parecer 1/09 (Acordo que cria um sistema unificado de resolução de litígios em matéria de patentes), de 8 de março de 2011, EU:C:2011:123, n.o 69); Acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 99); ou Acórdão de 27 de fevereiro de 2018, Associação Sindical dos Juízes Portugueses (C‑64/16, EU:C:2018:117, n.os 32 a 33).

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