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Document 62016TJ0048

Acórdão do Tribunal Geral (Primeira Secção) de 3 de maio de 2018.
Sigma Orionis SA contra Comissão Europeia.
Cláusula compromissória — Sétimo Programa‑Quadro de atividades em matéria de investigação, desenvolvimento tecnológico e demonstração (2007 a 2013) e Programa‑Quadro de Investigação e Inovação (2014‑2020) “Horizonte 2020” — Suspensão dos pagamentos e revogação dos contratos de apoio financeiro na sequência de uma auditoria financeira — Pedido de pagamento dos montantes devidos pela Comissão no âmbito da execução dos contratos de apoio financeiro — Responsabilidade extracontratual.
Processo T-48/16.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2018:245

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

3 de maio de 2018 ( *1 )

«Cláusula compromissória — Sétimo Programa‑Quadro de atividades em matéria de investigação, desenvolvimento tecnológico e demonstração (2007 a 2013) e Programa‑Quadro de Investigação e Inovação (2014‑2020) “Horizonte 2020” — Suspensão dos pagamentos e revogação dos contratos de apoio financeiro na sequência de uma auditoria financeira — Pedido de pagamento dos montantes devidos pela Comissão no âmbito da execução dos contratos de apoio financeiro — Responsabilidade extracontratual»

No processo T‑48/16,

Sigma Orionis SA, com sede em Valbonne (França), representada por S. Orlandi e T. Martin, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por F. Dintilhac e Siekierzyńska, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto, por um lado, um pedido apresentado ao abrigo do disposto no artigo 272.o TFUE, destinado a obter a condenação da Comissão no pagamento à recorrente das quantias em dívida no âmbito dos contratos celebrados no contexto do Sétimo Programa‑Quadro de atividades em matéria de investigação, desenvolvimento tecnológico e demonstração (2007 a 2013) e do Programa‑Quadro de Investigação e Inovação «Horizonte 2020», e, por outro, um pedido apresentado ao abrigo do disposto no artigo 268.o TFUE, destinado a obter a reparação dos danos que a recorrente alega ter sofrido na sequência da violação, pela Comissão, das obrigações que lhe incumbem,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

Composto por: I. Pelikánová, presidente, P. Nihoul (relator) e J. Svenningsen, juízes,

secretário: M. Marescaux,

vistos os autos e após a audiência de 27 de junho de 2017,

profere o presente

Acórdão

Antecedentes do litígio

1

A recorrente, Sigma Orionis SA, é uma sociedade de direito francês ativa na disseminação e transmissão de resultados de projetos europeus no domínio das tecnologias da informação.

2

Celebrou com a Comissão Europeia 36 convenções de apoio financeiro no âmbito do Sétimo Programa‑Quadro de atividades em matéria de investigação, desenvolvimento tecnológico e demonstração (2007 a 2013) (a seguir «PC7») aprovado pela Decisão n.o 1982/2006/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006, relativa ao PC7 (JO 2006, L 412, p. 1).

3

Além disso, as mesmas partes celebraram oito convenções de apoio financeiro no âmbito do Programa‑Quadro de Investigação e Inovação (2014‑2020) «Horizonte 2020» (a seguir «H2020») instituído pelo Regulamento (UE) n.o 1291/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, que cria o H2020 e que revoga a Decisão n.o 1982/2006/CE (JO 2013, L 347, p. 104).

Inquérito realizado pelo OLAF

4

Em 24 de janeiro de 2014, o Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) abriu um inquérito à recorrente por alegadas manipulações de fichas horárias e salário horário excessivo no âmbito de projetos no contexto do PC7.

5

Esse inquérito tinha por base o artigo 3.o do Regulamento (UE, Euratom) n.o 883/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de setembro de 2013, relativo aos inquéritos efetuados pelo Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1073/1999 do Parlamento Europeu e do Conselho e o Regulamento (Euratom) n.o 1074/1999 do Conselho (JO 2013, L 248, p. 1).

6

Em 14 de abril de 2014, a recorrente foi notificada, pelo OLAF, da abertura do inquérito de que iria ser objeto. Nessa ocasião, foram‑lhe pedidos uma série de documentos. Para além disso, foram recolhidos uma série de depoimentos de antigos funcionários da recorrente.

7

Esses elementos convenceram o OLAF da necessidade de proceder a uma verificação no local ao abrigo do artigo 5.o do Regulamento (Euratom, CE) n.o 2185/96 do Conselho, de 11 de novembro de 1996, relativo às inspeções e verificações no local efetuadas pela Comissão para proteger os interesses financeiros das Comunidades Europeias contra a fraude e outras irregularidades (JO 1996, L 292, p. 2).

8

Por ofício de 14 de novembro de 2014, o OLAF informou o Ministério Público de Grasse (França) da sua intenção de proceder a inspeções e verificações na sede da recorrente. Nesse ofício, o OLAF também solicitava todo o apoio necessário por parte das autoridades francesas, incluindo medidas cautelares de caráter nacional, a fim de as provas serem preservadas.

9

De 2 a 5 de dezembro de 2014, o OLAF procedeu a essas inspeções e verificações no local. Os inspetores obtiveram documentos e recolheram informações. Ouviram dois interessados e cinco testemunhas na presença do advogado da recorrente.

10

Em 28 de abril de 2015, o OLAF deu aos dois interessados a possibilidade de apresentarem observações sobre factos que lhes diziam respeito.

11

Mais tarde, o OLAF enviou aos serviços da Comissão o seu relatório final. Nesse relatório, recomendava à Comissão que procedesse à cobrança do montante de 1545759 euros e que ponderasse impor sanções administrativas e financeiras ao abrigo do artigo 109.o do Regulamento (UE, Euratom) n.o 966/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União e que revoga o Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 (JO 2012, L 298, p. 1).

Intervenção da Comissão

12

Por ofício de 7 de outubro de 2015, a Comissão informou a recorrente da sua intenção de lhe impor uma sanção administrativa que consistia em excluí‑la de qualquer participação nos processos de adjudicação de contratos ou de concessão de subvenções da União Europeia durante cinco anos, suspender os pagamentos relativos a quinze projetos no contexto do PC7 e a cinco projetos concluídos no contexto do H2020, pôr termo à sua participação em doze projetos no contexto do PC7 e no conjunto dos projetos celebrado no contexto do H2020, assim como pôr termo à sua participação na preparação de seis convenções de apoio financeiro celebradas no contexto do H2020.

13

Nesse mesmo ofício, a recorrente foi convidada a apresentar as suas observações sobre as medidas em questão.

14

Em resposta, a recorrente, por carta de 28 de outubro de 2015, contestou o relatório do OLAF. Sustentou que esse organismo não apresentou qualquer prova da existência de fraude. Também referiu, nessa mesma carta, que as conclusões do OLAF eram falsas e exageradas.

15

Na sequência desta troca de correspondência, a Comissão notificou a recorrente do fim da sua participação em três séries de convenções e, relativamente a algumas delas, da suspensão dos pagamentos.

16

A primeira série inclui duas convenções de apoio financeiro celebradas no contexto do PC7, com as referências, respetivamente, 612451 — CRe‑AM e 610947 — RAPP. Por ofício de 1 de dezembro de 2015, a Comissão decidiu suspender os pagamentos em curso e a haver, bem como pôr termo à participação da recorrente nessas duas convenções. Por carta de 21 de dezembro de 2015, a recorrente reclamou junto do comité Redress II, um comité de recurso existente na Comissão e que vem referido no ponto 5.3 do anexo da Decisão 2011/161/UE Euratom da Comissão, de 28 de fevereiro de 2011, que altera a Decisão C(2008) 4617 relativa às regras de apresentação de propostas e aos procedimentos de avaliação, seleção e concessão de subvenções para ações indiretas no âmbito do PC7 e do Sétimo Programa‑Quadro da Comunidade Europeia da Energia Atómica (Euratom) de atividades de investigação e formação em matéria nuclear (2007‑2011) (JO 2011, L 75, p. 1). Em 29 de janeiro de 2016, o comité Redress II indeferiu essa reclamação. Considerou que os procedimentos de suspensão, informação prévia e termo de participação tinham sido conduzidos no respeito dos princípios e normas aplicáveis. Por ofício de 2 de fevereiro de 2016, a Comissão, na sequência do indeferimento da reclamação pelo comité Redress II, confirmou a sua decisão de pôr termo à participação da recorrente nessas duas convenções.

17

A segunda série de convenções diz respeito às que têm a referência 609154 — Performer e 314671 — Resilient, também celebradas no contexto do PC7. No que toca a essas convenções, a notificação da suspensão dos pagamentos e do fim da participação da recorrente ocorreu em, respetivamente, 26 e 28 de janeiro de 2016.

18

A terceira série diz respeito ao projeto integrado no H2020 e, nesse âmbito, à convenção com a referência 645775 — Dragon Star Plus. Em 27 de janeiro de 2016, a Comissão indicou ao coordenador do projeto que a participação da recorrente terminara.

Processos nacionais

19

Após tê‑lo enviado à Comissão, o OLAF enviou o seu relatório às autoridades francesas recomendando‑lhes, no que respeita aos comportamentos apurados, a abertura de um processo de natureza penal, a nível nacional, nos termos do direito francês, desde que esses comportamentos aí se encontrem tipificados.

20

Na sequência dessa comunicação, o Ministério Público de Grasse requereu, em 10 de abril de 2015, a abertura de um inquérito contra desconhecidos por fraude praticada entre 14 de novembro de 2011 e 10 de abril de 2015 em prejuízo da União. Em 15 de outubro de 2015, a recorrente, o seu administrador e dois dos seus quadros foram constituídos arguidos pelo crime de fraude.

21

Tendo o processo sido submetido à chambre de l’instruction de la cour d’appel d’Aix‑en‑Provence (França) (Secção de Instrução do Tribunal de Recurso de Aix‑en‑Provence; a seguir «Secção de Instrução»), esta proferiu o respetivo Acórdão em 17 de dezembro de 2015, no qual declarou a nulidade dos elementos utilizados pelas autoridades francesas no âmbito do processo penal que em França foi instaurado ao recorrente, ao seu administrador e aos dois referidos quadros. Segundo este órgão jurisdicional, esses elementos tinham sido obtidos com violação de diversas garantias processuais destinadas a assegurar a proteção dos direitos de defesa. Entre os elementos declarados nulos figurava o relatório final que o OLAF transmitiu às autoridades francesas.

22

Por decisão de 19 de fevereiro de 2016, o tribunal de commerce de Grasse (Tribunal de Comércio de Grasse) deu início a um processo judicial de recuperação de empresas relativamente à recorrente e procedeu à nomeação de um administrador judicial.

23

Em 27 de abril de 2016, esse mesmo órgão jurisdicional decretou a insolvência da recorrente.

24

Em 4 de maio de 2016, a Comissão declarou como créditos a incorporar no passivo da recorrente os montantes que considerava que esta lhe devia em virtude das convenções de apoio financeiro revogadas. Esses créditos, no montante total de 2639815,4 euros, foram contestados pela recorrente.

25

Em 8 de setembro de 2017, o tribunal de commerce de Grasse, em dois despachos, recusou que os créditos declarados pela Comissão fossem incorporados no passivo da recorrente, pois o inquérito levado a cabo pelo OLAF, na sequência do qual a Comissão chegou à conclusão de que algumas prestações não deviam ter sido pagas à recorrente, tinha sido declarado «nulo» em acórdão proferido pela Secção de Instrução em 17 de dezembro de 2015.

Tramitação processual e pedidos das partes

26

Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 2 de fevereiro de 2016, a recorrente interpôs o presente recurso.

27

Em requerimento separado, que deu entrada no mesmo dia na Secretaria do Tribunal Geral, a recorrente apresentou um pedido de medidas provisórias.

28

Por carta de 30 de setembro de 2016, de que a Secretaria do Tribunal Geral recebeu cópia em 3 de outubro de 2016, o administrador judicial, designado pelo tribunal de commerce de Grasse, autorizou o advogado da recorrente a prosseguir com o processo no Tribunal Geral.

29

Por Despacho de 25 de agosto de 2017, Sigma Orionis/Comissão (T‑48/16 R, não publicado, EU:T:2017:585), o presidente do Tribunal Geral indeferiu o pedido de medidas provisórias e reservou para final a decisão quanto às despesas.

30

Sob proposta do juiz relator, o Tribunal Geral (Primeira Secção) decidiu dar início à fase oral do processo.

31

As partes foram ouvidas em alegações e nas suas respostas às questões que lhes foram colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 27 de junho de 2017.

32

A fase oral do processo foi encerrada em 27 de junho de 2017.

33

Por Despacho de 25 de outubro de 2017, o Tribunal Geral ordenou a reabertura da fase oral do processo ao abrigo do artigo 113.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

34

Por decisão de 25 de outubro de 2017, o Presidente da Primeira Secção do Tribunal Geral decidiu juntar aos autos os dois despachos do tribunal de commerce de Grasse de 8 de setembro de 2017, referidos no n.o 2, supra, bem como um anexo, tendo a recorrente feito chegar estes documentos à Secretaria do Tribunal Geral por carta de 22 de setembro de 2017.

35

Nos termos do artigo 85.o, n.o 4, do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral deu às partes a oportunidade de tomarem posição sobre esses documentos, o que estas fizeram dentro do prazo estabelecido.

36

Por decisão de 17 de novembro de 2017, o Tribunal Geral encerrou novamente a fase oral do processo e este foi colocado em deliberação.

37

A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

decidir que, ao suspender a integralidade dos pagamentos devidos à recorrente com base num relatório de inquérito do OLAF elaborado ilegalmente, a Comissão violou as suas obrigações contratuais decorrentes dos contratos de apoio financeiro celebrados no contexto do PC7 e do H2020;

decidir que, ao pôr termo aos referidos contratos com base nesse relatório, a Comissão violou as suas obrigações contratuais decorrentes dos contratos de apoio financeiro celebrados no contexto do PC7 e do H2020;

por via de consequência, condenar a Comissão a pagar as quantias devidas à recorrente por força dos contratos celebrados no contexto do PC7, ou seja, 607404,49 euros, acrescidos, de acordo com a cláusula II.5.5, de juros de mora, calculados, a partir da data de vencimento das quantias em divida, à taxa definida pelo Banco Central Europeu (BCE) para as operações principais de refinanciamento, acrescida de 3,5 pontos;

por via de consequência, condenar a Comissão a pagar as quantias devidas à recorrente por força dos contratos celebrados no contexto do H2020, ou seja, 226688,68 euros, acrescidos, de acordo com a cláusula II.21.11.1, de juros de mora, calculados, a partir da data de vencimento das quantias em divida, à taxa definida pelo BCE para as operações principais de refinanciamento, acrescida de 3,5 pontos;

por via de consequência, condenar a Comissão no pagamento de uma indemnização por perdas e danos, de natureza extracontratual, estimados em 1500000 euros;

por via de consequência, condenar a Comissão nas despesas;

a título subsidiário, nomear um perito para efeitos da determinação das quantias incontestavelmente devidas à recorrente ao abrigo dos contratos de apoio financeiro.

38

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

julgar o recurso inadmissível ou, pelo menos, improcedente;

condenar a recorrente nas despesas.

Questão de direito

Quanto à violação das obrigações contratuais

39

Em apoio dos seus quatro primeiros e sétimo pedidos, a recorrente sustenta que a Comissão procedeu à suspensão dos pagamentos e pôs termo às convenções em causa (a seguir «medidas controvertidas») em violação das cláusulas contratuais.

Quanto à competência do Tribunal

40

A título preliminar, importa verificar se o Tribunal Geral é competente para apreciar o litígio que lhe é submetido.

41

A este propósito, importa sublinhar, como fez a recorrente, sem que a Comissão a contestasse, que, nos termos do artigo 272.o TFUE, conjugado com o artigo 256.o TFUE, o Tribunal Geral é competente para decidir em primeira instância com fundamento em cláusula compromissória constante de um contrato de direito privado, celebrado pela União ou por sua conta.

42

No presente caso, essa cláusula encontra‑se vertida no artigo 9.o das convenções celebradas no contexto do PC7 e no artigo 57.o das convenções celebradas no contexto do H2020.

43

Com este fundamento, há que considerar, como as partes reconhecem, que o Tribunal Geral tem competência no que respeita ao pedido da recorrente relativo à violação das obrigações contratuais da Comissão.

Quanto ao direito aplicável

44

A recorrente veio submeter este processo ao Tribunal Geral com base no artigo 272.o TFUE ao abrigo das cláusulas compromissórias contidas nas convenções de apoio financeiro celebradas no âmbito do PC7 e do H2020, pelo que o objeto do presente litígio não é a legalidade de uma qualquer decisão tomada pela Comissão e do procedimento administrativo que levou a essa decisão, mas a resolução de um litígio contratual surgido entre dois contraentes, resolução essa que deve ter em conta o direito aplicável às referidas convenções (v., neste sentido, Acórdão de 12 de julho de 2016, Comissão/Thales développement et coopération, T‑326/13, não publicado, EU:T:2016:403, n.o 73).

45

Segundo a cláusula 9 das convenções celebradas no contexto do PC7, aplicam‑se, por esta ordem, as estipulações contratuais, os atos emanados da Comunidade Europeia e da União referentes ao programa de investigação que está na origem das convenções, o regulamento financeiro correspondente ao orçamento geral da União, as outras normas emanadas da Comunidade e da União Europeia e, por último, a título subsidiário, o direito belga. No essencial, encontra‑se prevista a mesma regra na cláusula 57 das convenções de apoio financeiro celebradas no contexto do H2020, nos termos da qual as convenções se regem pelo direito aplicável da União e, subsidiariamente, pelo direito belga. Dessas disposições resulta que, não havendo contestação no que respeita à aplicação do regulamento financeiro correspondente ao orçamento geral da União, as normas a aplicar ao presente litígio são, desde que pertinentes e consoante o caso, as do direito da Comunidade e da União e, a título subsidiário, as de direito belga.

Quanto à admissibilidade

– Quanto ao interesse em agir

46

A Comissão sublinha que, no dia em que a petição foi apresentada, só tinha posto termo a uma convenção de apoio financeiro que a vinculava à recorrente.

47

A este respeito, importa recordar que, segundo a jurisprudência, o recorrente, para que o seu pedido possa ser examinado em sede de mérito, deve demonstrar que tem um interesse em agir efetivo e atual no momento da propositura da ação (Acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Planet/Comissão, C‑564/13 P, EU:C:2015:124, n.o 31).

48

A Comissão não suscita formalmente a questão da inadmissibilidade por falta de interesse em agir da recorrente, mas, segundo a jurisprudência, essa circunstância não obsta a que o Tribunal Geral examine oficiosamente essa questão de admissibilidade e declare, se assim o entender, o recurso inadmissível, dado que a falta de interesse em agir constitui um fundamento de inadmissibilidade de ordem pública (v. Despacho de 4 de dezembro de 2014, Talanton/Comissão, T‑165/13, não publicado, EU:T:2014:1027, n.o 69 e jurisprudência aí indicada).

49

Nos seus articulados, a recorrente acrescenta os montantes que lhe são devidos, segundo afirma, no âmbito de 22 convenções de apoio financeiro que celebrou com a Comissão no contexto do PC7 e do H2020.

50

Quando a petição foi apresentada, havia sido posto termo à participação da recorrente numa das convenções celebradas no contexto do H2020 e em quatro outras celebradas no contexto do PC7. A convenção que teve de abandonar no contexto do H2020 era a que tinha a referência 645775 — Dragon Star Plus. Além disso, as que teve de abandonar no contexto do PC7 têm as referências 610947 — RAPP, 612451 — CRe‑AM, 609154 — Performer e 314671 — Resilient.

51

Relativamente a essas cinco convenções, a Comissão tinha, portanto, tomado uma decisão quando foi apresentada a petição, pelo que, no que a elas respeita, a recorrente, quando interpôs o recurso, dispunha do interesse em agir que a jurisprudência exige.

52

O mesmo não se passa relativamente às outras 17 convenções celebradas no contexto do PC7 e do H2020, a respeito das quais a Comissão ainda não havia tomado qualquer decisão no momento em que foi apresentada a petição. No que toca a essas convenções, não existia interesse em agir no momento em que deu entrada a petição e o recurso deve, por conseguinte, ser declarado inadmissível, em conformidade com a jurisprudência referida no n.o 47, supra.

– Quanto ao fundamento de inadmissibilidade decorrente da falta de clareza e de precisão da petição

53

A Comissão entende que a petição não cumpre as exigências de clareza e precisão referidas no artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo pois a recorrente baseia a sua argumentação na violação de disposições nacionais não identificadas.

54

A este propósito, sublinhe‑se que, nos termos do artigo 76.o, alínea d), do Regulamento de Processo, a petição deve identificar o objeto do litígio e apresentar uma exposição sumária dos fundamentos, devendo as indicações ser claras e precisas para que a recorrida possa preparar a sua argumentação e o Tribunal da União exercer a sua função fiscalizadora (Acórdão de 15 de setembro de 2016, European Dynamics Luxembourg e Evropaïki Dynamiki/EIT, T‑481/14, não publicado, EU:T:2016:498, n.o 460).

55

No presente caso, resulta da petição apresentada pela recorrente que o objeto do litígio está identificado como pondo em causa as medidas controvertidas adotadas pela Comissão. Os fundamentos apresentados pela recorrente estão identificados como sendo relativos ao facto de a Comissão ter violado as suas obrigações contratuais, dado que as medidas controvertidas põem em causa a força de caso julgado do acórdão da câmara de instrução (primeiro fundamento), de o relatório do OLAF em que a Comissão se baseou para adotar essas medidas ter sido elaborado com base em provas recolhidas em condições que violam o direito nacional (segundo fundamento) e os direitos fundamentais da União (terceiro fundamento), de a Comissão não poder suspender e pôr termo a convenções celebradas no contexto do H2020 com base em inspeções e fiscalizações realizadas no âmbito de convenções celebradas no contexto do PC7 (quarto fundamento) e de a Comissão ter violado o principio da proporcionalidade ao adotar as medidas controvertidas (quinto fundamento).

56

Por outro lado, sublinhe‑se que a Comissão, atenta a argumentação que apresentou na contestação e na tréplica, estava, manifestamente, em condições de compreender as acusações que lhe eram feitas pela recorrente.

57

Nestas circunstâncias, as condições definidas no Regulamento de Processo no que respeita à admissibilidade devem considerar‑se satisfeitas, devendo, portanto, a questão prévia de inadmissibilidade suscitada pela Comissão ser julgada improcedente.

Quanto ao primeiro e ao segundo pedido

58

Há que abordar conjuntamente os dois primeiros pedidos da recorrente, que têm por objeto, respetivamente, a suspensão dos pagamentos relativos aos contratos de apoio financeiro no contexto do PC7 e do H2020, bem como o termo desses contratos.

59

Em apoio desses pedidos, a recorrente apresenta cinco fundamentos. Em primeiro lugar, o relatório do OLAF não pode servir de fundamento às medidas controvertidas, pois foi declarado nulo pela Secção de Instrução. Em segundo lugar, as medidas controvertidas são contrárias às convenções em causa, pois fundam‑se num relatório elaborado com base em provas obtidas em condições que violam o direito nacional. Em terceiro lugar, essas medidas são também contrárias a essas convenções pois as provas foram obtidas infringindo a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Em quarto lugar, para suspender e pôr termo a convenções no contexto do H2020, a Comissão não podia basear‑se, como fez, em inspeções e verificações realizadas no âmbito de convenções celebradas no contexto do PC7. Em quinto lugar, a Comissão violou o princípio da proporcionalidade.

– Quanto ao primeiro fundamento, relativo ao não respeito pela força de caso julgado do acórdão proferido pela Secção de Instrução

60

Segundo a recorrente, as medidas controvertidas não encontram justificação no relatório final elaborado pelo OLAF, pois esse relatório foi anulado pela Secção de Instrução.

61

Em resposta a este argumento, a Comissão alega que, enquanto preparava as decisões a tomar, o relatório elaborado pelo OLAF não podia considerar‑se suscetível de ser impugnado. Admitindo que o fosse, nunca poderia ser anulado por um órgão jurisdicional nacional, pois a competência para anular atos das instâncias da União pertence exclusivamente aos órgãos jurisdicionais integrados nesse ordenamento jurídico.

62

A este propósito, recorde‑se que, segundo a jurisprudência, só os órgãos jurisdicionais da União são competentes para declarar a invalidade de um ato da União (v. Acórdão de 21 de dezembro de 2011, Air Transport Association of America e o., C‑366/10, EU:C:2011:864, n.o 48 e jurisprudência aí indicada).

63

Nestas circunstâncias, independentemente do que a Secção de Instrução entendeu no acórdão que proferiu, o relatório do OLAF permanece intocado na ordem jurídica da União enquanto não for declarado inválido pelo órgão jurisdicional da União.

64

Segundo a expressão utilizada no acórdão da Secção de Instrução, esse órgão jurisdicional entendeu que «todo o inquérito preliminar, incluindo o inquérito [do] OLAF e os atos subsequentes […] d[evia]m ser declarados nulos, com exceção da informação inicial ao Ministério Público de Grasse, do que foi transmitido às autoridades policiais para efeitos do inquérito e da acusação que é da competência exclusiva do Procurador da República».

65

Contudo, a conclusão constante desse acórdão, como indicado pela Comissão, não é a de que o relatório elaborado pelo OLAF foi declarado nulo com efeitos na ordem jurídica da União, mas apenas que, segundo esse órgão jurisdicional, «não [era] necessário nem se justificava que um inquérito levado a cabo pelo OLAF em condições que estão em contradição com o artigo 6.o […] TUE e o Preâmbulo do Código de Processo Penal, segundo o qual o equilíbrio entre os direitos das partes deve ser preservado, pudesse ser apresentado ainda que a título meramente informativo num processo de natureza penal que tem por objeto o método de cálculo do tempo necessário para executar concursos públicos relativos a programas financiados pela Comissão Europeia sem que, nessa fase, a substância do trabalho efetuado tenha sido posta em causa pelo Organismo em questão».

66

Nestas circunstâncias, se, em cumprimento do acórdão da Secção de Instrução, o relatório do OLAF não podia ser utilizado no âmbito de um processo penal instaurado em França contra os dirigentes da recorrente, também não deixa de ser verdade que, no âmbito de um procedimento administrativo no contexto do direito da União e enquadrado por normas de natureza contratual, a Comissão podia basear‑se no referido relatório do OLAF para adotar as medidas controvertidas, desde que esse relatório não tivesse sido declarado nulo pelo órgão jurisdicional da União.

67

A recorrente invoca o Acórdão de 30 de setembro de 2009, Sison/Conselho (T‑341/07, EU:T:2009:372, n.o 116), a fim de demonstrar que a Comissão devia, de qualquer modo, ter em conta o acórdão da Secção de Instrução.

68

A este respeito, sublinhe‑se que o Acórdão de 30 de setembro de 2009, Sison/Conselho (T‑341/07, EU:T:2009:372), diz respeito à instituição de uma regulamentação em que as deliberações da instituição da União se devem fundar em decisões proferidas por instâncias nacionais, em especial por órgãos jurisdicionais nacionais. No presente processo, a situação é diversa, pois nenhuma disposição obriga a Comissão a basear‑se numa decisão a tomar por uma instância nacional — mesmo que fosse um órgão jurisdicional. De todo o modo, o Tribunal Geral não reconheceu aos órgãos jurisdicionais nacionais, no Acórdão de 30 de setembro de 2009, Sison/Conselho (T‑341/07, EU:T:2009:372), uma competência capaz de lhes permitir declarar a invalidade dos atos da União e de obrigar assim as instituições da União a deliberar tendo em conta essa invalidade.

69

Estas considerações não são postas em causa pelos despachos proferidos pelo tribunal de commerce (Tribunal de Comércio) de Grasse em 8 de setembro de 2017, despachos esses que foram transmitidos ao Tribunal Geral pela recorrente, tendo sido reaberta a fase oral do processo para efeitos da sua apreciação, como indicado nos n.os 33 a 35, supra, e nos termos dos quais os créditos apresentados pela Comissão não podem ser aceites pois decorrem de um inquérito, o efetuado pelo OLAF, que foi declarado «nulo» pela Secção de Instrução.

70

Com efeito, o processo que correu os seus termos no tribunal de commerce de Grasse não pode afetar o presente recurso pois, no que respeita à compatibilidade das medidas controvertidas com as convenções em causa e as regras que por via delas se tornaram aplicáveis, este recurso é da competência exclusiva do Tribunal Geral por força do artigo 272.o TFUE, conjugado com a cláusula compromissória constante das referidas convenções.

71

De resto, os dois processos prosseguem objetivos distintos, pois o presente diz respeito à compatibilidade das medidas controvertidas com essas convenções e essas regras, enquanto, segundo as explicações dadas pela recorrente, o processo que correu os seus termos no tribunal de commerce de Grasse tinha por objeto determinar se os créditos eventualmente detidos pela Comissão podiam ser considerados no contexto da declaração de insolvência da empresa.

72

Atentos estes elementos, há que negar provimento ao primeiro fundamento.

– Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do direito francês

73

A recorrente sustenta que o OLAF deve respeitar o direito nacional quando efetua inspeções e verificações no território de um Estado‑Membro, e isto por força dos regulamentos aplicáveis a esse organismo, ou seja, por um lado, o Regulamento n.o 883/2013 e, por outro, o Regulamento n.o 2185/96.

74

Para sustentar a sua argumentação, a recorrente invoca:

o artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 883/2013, segundo o qual «[d]urante as inspeções e verificações no local, o pessoal do [OLAF] atua, ao abrigo do direito aplicável da União, de acordo com as regras e as práticas do Estado‑Membro em causa»;

o artigo 6.o, n.o 1, terceiro parágrafo, do Regulamento n.o 2185/96, que prevê que, sob reserva do direito da União aplicável, os inspetores do OLAF são obrigados a respeitar as regras processuais previstas pela legislação do Estado‑Membro em que atuam;

o artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento n.o 883/2013, segundo o qual «[n]a elaboração dos […] relatórios e recomendações [do OLAF], é tido em conta o direito nacional do Estado‑Membro em causa».

75

No presente caso, o direito nacional foi violado nos três aspetos seguintes:

antes de efetuar a sua operação nas instalações da recorrente, o OLAF deveria ter obtido um mandado emitido por um órgão jurisdicional nacional;

durante essa operação, os seus inspetores deveriam fazer‑se acompanhar por membros da polícia judiciária nacional;

deveriam ter informado a recorrente do direito, que lhe assistia, de se opor às inspeções e verificações no local.

76

Para responder a esta argumentação, importa recordar que, como se referiu nos n.os 62 a 66, supra, o relatório do OLAF é legal na perspetiva da ordem jurídica da União enquanto não for declarado inválido pelo órgão jurisdicional da União, sem prejuízo das decisões que possam vir a ser tomadas pela autoridades ou órgãos jurisdicionais nacionais no que respeita ao uso que pode ser feito desse relatório nos processos instaurados ao abrigo do direito nacional.

77

Da terceira disposição invocada pela recorrente, ou seja, o artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento n.o 883/2013, resulta que os relatórios elaborados pelo OLAF podem ser utilizados nos processos nacionais desde que elaborados em conformidade com as normas e procedimentos definidos pelo ordenamento jurídico nacional. Se o direito nacional não tiver sido respeitado, como no presente caso sustenta a recorrente, a consequência será a de que o relatório elaborado pelo OLAF não poderá ser utilizado nos processos nacionais, não podendo, todavia, esse facto afetar a possibilidade de a Comissão basear as suas decisões no referido documento.

78

Segundo as outras disposições indicadas pela recorrente, ou seja, o artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 883/2013 e o artigo 6.o, n.o 1, terceiro parágrafo, do Regulamento n.o 2185/96, as inspeções e verificações no local são efetuadas pelo OLAF nos termos das regras e práticas em vigor no Estado‑Membro em causa, sem prejuízo da legislação da União em vigor.

79

Dessas disposições resulta que os inquéritos e verificações no local efetuados pelo OLAF decorrem num contexto marcado pela aplicação do direito nacional, mas em que este tem de necessariamente se diluir em benefício do direito da União, sempre que o Regulamento n.o 883/2013 ou o Regulamento n.o 2185/96 o prevejam.

80

A este propósito, sublinhe‑se que, no que respeita ao primeiro aspeto em que o direito francês teria sido violado, os Regulamentos n.o 883/2013 e n.o 2185/96 não obrigam a que se respeitem as exigências decorrentes do direito nacional antes de o OLAF efetuar as inspeções e verificações nas instalações de um operador económico, exceto se este último a isso se opuser.

81

Com efeito, só nesse caso é que o artigo 9.o do Regulamento n.o 2185/96 prevê, no primeiro parágrafo, que o Estado‑Membro interessado prestará aos inspetores do OLAF, de acordo com as disposições nacionais, a assistência necessária para lhes permitir desempenhar as suas funções de inspeção e de verificação no local e, no segundo parágrafo, que compete aos Estados‑Membros tomar, se necessário, e na observância do direito nacional, as medidas necessárias. Ora, dos autos resulta que a recorrente não se opôs às inspeções e verificações no local no processo ora presente a este Tribunal.

82

Assim, dado que os Regulamentos n.o 883/2013 e n.o 2185/96 não preveem a necessidade de respeitar exigências de caráter nacional, como a necessidade de um mandado prévio emitido por um órgão jurisdicional nacional, não havendo oposição do operador em causa, e subordinando esses diplomas a realização das inspeções e verificações no local realizadas pelo OLAF apenas à existência de uma autorização escrita emitida pelo Diretor‑Geral desse organismo (artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento n.o 883/2013 e artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 2185/96), a argumentação da recorrente não pode ser acolhida.

83

A recorrente alega que, no Acórdão de 22 de outubro de 2002, Roquette Frères (C‑94/00, EU:C:2002:603, n.o 48), o Tribunal de Justiça impôs à Comissão, no domínio da concorrência, obrigações em matéria de mandados judiciais no âmbito de procedimentos administrativos.

84

Este argumento não procede pois, contrariamente ao que refere a recorrente, o acórdão que cita não impõe a necessidade de se recorrer a um órgão jurisdicional nacional antes de se proceder às inspeções e verificações no local, mas esclarece apenas, à atenção da autoridade administrativa, que, antes de efetuar essas inspeções e verificações no local, deve especificar o objeto da busca. No presente caso, houve uma autorização que foi emitida em 27 de novembro de 2014 pelo Diretor‑Geral do OLAF e apresentada pelos agentes quando chegaram à sede da recorrente, onde foi também assinada pelo Diretor desta, que dela conservou uma cópia. Além disso, o conteúdo dessa habilitação nunca foi contestado.

85

Quanto ao segundo aspeto em que o direito francês não teria sido respeitado, refira‑se que nos termos dos Regulamentos da União Europeia aplicáveis:

os inquéritos são conduzidos pelo pessoal do OLAF sob a direção do seu Diretor‑Geral (artigo 7.o, n.o 1, do Regulamento n.o 883/2013, artigos 4.o e 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2185/96);

esse pessoal deve informar as autoridades nacionais antes de efetuar as inspeções e verificações no local (artigo 4.o, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 2185/96);

podem fazer‑se acompanhar por agentes nacionais, sendo estes enviados pelas respetivas autoridades nacionais ou atuando como peritos nacionais destacados na Comissão (artigo 4.o, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 2185/96);

a presença desses agentes deve ser aceite quando manifestem a vontade de o fazer (artigo 4.o, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 2185/96);

caso haja oposição a uma inspeção ou verificação no local, as autoridades nacionais devem tomar as medidas necessárias para garantir que o OLAF cumpre a sua missão respeitando o direito nacional (artigo 9.o do Regulamento n.o 2185/96).

86

Destas disposições decorre que a questão da presença de agentes nacionais se rege pelo Regulamento n.o 2185/96 e este requere‑a em duas circunstâncias, que não se verificavam no caso em apreço, quando das inspeções e verificações no local efetuadas pelo OLAF. Por um lado, é necessária caso um operador se oponha às fiscalizações e verificações efetuadas pelo OLAF. Segundo as informações fornecidas pela recorrente, essa oposição não se verificou. Por outro lado, a presença dos agentes nacionais deve ser aceite se forem eles a requerê‑la.

87

Dos autos resulta que, no presente caso, estiveram presentes três oficiais nacionais durante parte das diligências, que esses oficiais indicaram ao Diretor‑Geral da recorrente que lhe tinha sido aberto um inquérito preliminar, de natureza penal, com base no direito francês, paralelamente ao processo fundado no direito da União, e que, nesse âmbito, tinham procedido a determinadas diligências antes de abandonarem a sede da recorrente no final da manhã sem manifestarem o desejo de estar presentes durante as inspeções e verificações no local efetuadas ao abrigo do direito da União.

88

Assim, não foi devido a um comportamento do OLAF que os agentes nacionais não estiveram presentes durante toda a operação, mas sim por causa de uma decisão que tomaram, decisão essa que, por conseguinte, não podia afetar a validade das medidas controvertidas tomadas pela Comissão com base no relatório elaborado por esse organismo.

89

A recorrente invoca o Acórdão de 21 de setembro de 1989, Hoechst/Comissão (46/87 e 227/88, EU:C:1989:337, n.o 34), no qual o Tribunal de Justiça declarou que a Comissão devia respeitar as garantias processuais previstas pelo ordenamento jurídico nacional quando efetua inspeções e verificações no local.

90

Este argumento não pode proceder pois, tal como resulta dos autos, a recorrente não se opôs às inspeções e verificações no local no processo submetido à apreciação do Tribunal Geral, quando o acórdão invocado visa a hipótese em que é requerida a assistência de autoridades nacionais para fazer face à oposição manifestada por um operador económico relativamente a uma fiscalização ou a uma verificação no local efetuada pela Comissão no âmbito de um inquérito em matéria de concorrência.

91

Quanto ao terceiro aspeto invocado pela recorrente, observe‑se que, segundo o artigo 5.o, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 2185/96, os operadores económicos, para facilitar a realização das inspeções e verificações, devem facultar o acesso às instalações, terrenos, meios de transporte e outros locais, utilizados para fins profissionais.

92

Complementarmente, o artigo 9.o desse Regulamento determina que, sempre que os operadores económicos objeto de um inquérito se oponham a um controlo ou a uma verificação no local, o Estado‑Membro interessado prestará aos inspetores, de acordo com as disposições nacionais, a assistência necessária para lhes permitir desempenhar as suas funções de inspeção e de verificação no local. Segundo essa mesma disposição, competirá então aos Estados‑Membros tomar, se necessário, e na observância do direito nacional, as medidas necessárias.

93

A obrigação de os operadores económicos se submeterem às inspeções e verificações no local também se encontra prevista nos n.os 2 a 4 da cláusula II.22. do anexo II, nas convenções celebradas no contexto do PC7 subscritas pela recorrente e que definem o quadro em que decorreram as relações contratuais entre a Comissão e ela própria.

94

É verdade que o Regulamento n.o 2185/96 se refere, como se indicou no n.o 92, supra, à situação em que um operador económico se opõe a inspeções e verificações no local efetuadas pelo OLAF e prevê, para tal caso, que pode ser requerida a assistência das autoridades nacionais e que as operações por elas efetuadas devem decorrer em conformidade com o direito nacional.

95

Todavia, esta disposição não confere aos operadores económicos o direito de se oporem às operações tidas em vista pelo OLAF, antes prevendo apenas que em caso de oposição podem ser obrigados a aceitar essas operações, podendo a força pública nacional ser chamada a intervir nas condições definidas pelo ordenamento jurídico nacional.

96

Dos autos resulta que não foi necessário recorrer a essa disposição no presente caso, pois, como a própria recorrente referiu, não se opôs às inspeções e verificações no local efetuadas pelo OLAF.

97

Atento o conjunto destas considerações, o fundamento não pode ser acolhido.

– Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação dos direitos fundamentais

98

No terceiro fundamento, a recorrente afirma que as medidas controvertidas não podiam ser tomadas pela Comissão, pois fundavam‑se num relatório elaborado com base em provas obtidas em violação do artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais.

99

Na audiência, a recorrente indicou, em resposta a uma questão do Tribunal, que, em seu entender, a Comissão é obrigada a respeitar, na execução das convenções que celebra, os direitos cuja existência é reconhecida na Carta dos Direitos Fundamentais. Por seu lado, a Comissão alegou que, em sua opinião, a aplicação desses direitos aos comportamentos das instituições da União em matéria contratual não podia ser objeto de uma afirmação de caráter geral, antes devendo ser examinada caso a caso, em função, nomeadamente, do que preveem as disposições contratuais.

100

A este propósito, importa referir que, segundo uma jurisprudência constante, os direitos fundamentais têm a natureza de princípios gerais de direito na ordem jurídica da União (Acórdãos de 17 de dezembro de 1970, Internationale Handelsgesellschaft, 11/70, EU:C:1970:114, n.o 4; de 13 de maio de 2014, Google Spain e Google, C‑131/12, EU:C:2014:317, n.o 68, e de 3 de julho de 2014, Kamino International Logistics e Datema Hellmann Worldwide Logistics, C‑129/13 e C‑130/13, EU:C:2014:2041, n.o 69).

101

Esses direitos foram inscritos na Carta dos Direitos Fundamentais, que faz parte do Tratado UE e prevê, no seu artigo 51.o, n.o 1, sem exceção, que as suas disposições «têm por destinatários as instituições e órgãos da União, na observância do princípio da subsidiariedade».

102

A esse título, os direitos fundamentais destinam‑se a reger o exercício das competências atribuídas ás instituições da União, inclusive num quadro contratual, como se aplicam aos atos praticados pelos Estados‑Membros no contexto da aplicação do direito da União.

103

Este caráter geral dos direitos fundamentais implica que, como a Comissão reconheceu, essa instituição não possa, com base em informações obtidas pelo OLAF em violação dos direitos fundamentais, suspender os pagamentos devidos a um operador económico ou cancelar as convenções que o vinculam a esse operador.

104

De resto, da regulamentação resulta que esse organismo, ou seja, o OLAF, é obrigado a respeitar os direitos fundamentais quando efetua inquéritos no quadro das missões que lhe são confiadas.

105

Com efeito, segundo o Regulamento n.o 883/2013, os inquéritos levados a cabo pelo OLAF devem respeitar os direitos fundamentais. Essa obrigação decorre do considerando 51 desse regulamento.

106

O Regulamento n.o 2185/96 refere, por seu lado, no considerando 12, que as «inspeções e verificações no local devem ser efetuadas respeitando os direitos fundamentais das pessoas em questão».

107

No presente caso, a recorrente estima que o OLAF violou, no âmbito das inspeções e verificações no local que efetuou, o artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais, nos termos da qual, no essencial, toda a pessoa, na União, tem direito a que a sua causa seja, no que aqui releva, julgada publicamente, em caso de litígio, e em condições que garantam a independência e a imparcialidade.

108

Segundo a recorrente, o artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais foi violado porquanto as inspeções e verificações no local foram efetuadas pelo OLAF sem que os seus inspetores se fizessem acompanhar por elementos da polícia nacional, sem ter sido informada de que dispunha do direito de se opor a essas operações e sem terem sido previamente autorizadas por um órgão jurisdicional nacional.

109

No que respeita às duas primeiras críticas formuladas pela recorrente, refira‑se que a recorrente não forneceu elementos capazes de escorar a sua argumentação, em especial indícios demonstrativos de que o acompanhamento por elementos da polícia nacional e o direito de ser informada da possibilidade de se opor a uma operação conduzida pelo OLAF integram o âmbito do artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais.

110

Além disso, basta recordar que, como referido nos n.os 85 a 96, supra, as regras aplicáveis a essas operações não obrigam, nas circunstâncias do presente caso, os inspetores do OLAF a ser acompanhados por membros da polícia nacional e que essas regras não conferem aos operadores económicos, nomeadamente à recorrente, o direito de se opor a essas operações e a fortiori o de serem informadas da existência desse direito.

111

Relativamente à terceira crítica formulada pela recorrente, note‑se que esta última não forneceu ao Tribunal Geral elementos passíveis de acreditar a ideia de que, nas circunstâncias do presente caso, a obrigação de obter um mandado judicial podia decorrer do direito que toda a pessoa dispõe de ver a sua causa ser julgada por um tribunal independente e imparcial, tanto mais que, por um lado, a recorrente pôde recorrer a um órgão jurisdicional nacional para determinar se os elementos recolhidos pelo OLAF no contexto das operações em causa podiam, no âmbito do ordenamento jurídico interno, ser utilizados contra si e, por outro, pôde pedir ao órgão jurisdicional da União para serem controladas, no âmbito do ordenamento jurídico da União, as medidas tomadas pela Comissão com base nas informações obtidas no quadro das operações que são objeto das suas críticas.

112

Por último, importa recordar que, por força das regras aplicáveis às operações conduzidas pelo OLAF, a necessidade de obter um mandado judicial, quando prevista pelo direito nacional, só se aplica em caso de oposição manifestada pelo operador económico, devendo então o OLAF requerer a intervenção da força pública nacional, que, por força das normas que lhe são aplicáveis, deve respeitar as regras de direito interno.

113

Ora, como já se referiu, nomeadamente no n.o 81, supra, a recorrente não se opôs às inspeções e verificações no local levadas a cabo pelo OLAF.

114

Por último, a recorrente defende que o artigo 53.o da Carta dos Direitos Fundamentais inclui uma cláusula dita de «garantia mínima», em virtude da qual o OLAF, quando dos inquéritos, devia respeitar as regras nacionais quando estas oferecem aos interessados garantias mais amplas do que as previstas pelo direito da União.

115

A este respeito, importa referir que, segundo a jurisprudência, essa disposição não pode ser interpretada no sentido de permitir a um Estado‑Membro obstar à aplicação de atos do direito da União plenamente conformes à Carta, porque não respeitariam os direitos fundamentais garantidos pela Constituição desse Estado (Acórdão de 26 de fevereiro de 2013, Melloni, C‑399/11, EU:C:2013:107, n.o 58).

116

Como o Tribunal de Justiça indicou, essa jurisprudência decorre do princípio do primado do direito da União, que é uma característica essencial da ordem jurídica da União e em consequência do qual a invocação, por um Estado‑Membro, de disposições de direito nacional, ainda que de natureza constitucional, não pode afetar o efeito do direito da União no território desse Estado (v. Acórdão de 26 de fevereiro de 2013, Melloni, C‑399/11, EU:C:2013:107, n.o 59 e jurisprudência aí indicada).

117

Finalmente, contrariamente ao que a recorrente defende, os particulares, quando das inspeções e verificações no local efetuadas pelo OLAF, beneficiam de uma proteção em sede de direitos fundamentais pois, por um lado, esse organismo deve respeitar a regulamentação da União que determina que a sua ação deve ser conforme a esses direitos e, por outro, a Comissão não pode adotar medidas como as que tomou no presente caso com base em elementos adquiridos durante essas operações se essas operações tiverem sido efetuadas com violação dos referidos direitos, como indicado no n.o 103, supra.

118

É por estas razões que o terceiro fundamento não pode ser acolhido.

– Quanto ao quarto fundamento, relativo ao facto de o relatório do inquérito OLAF não ter tido repercussões nas convenções de apoio financeiro celebradas no contexto do H2020

119

No seu quarto fundamento, a recorrente sustenta que, para adotar medidas relativamente às convenções de apoio financeiro celebradas no contexto do H2020, a Comissão não podia basear‑se em provas ou elementos de prova obtidos pelo OLAF no quadro de um inquérito relativo à execução de projetos no contexto do PC7.

120

A este propósito, recorde‑se que, no que toca às convenções de apoio financeiro celebradas no contexto do H2020, as medidas adotadas pela Comissão consistiram em pôr termo à participação da recorrente na convenção com a referência 645775 — Dragon Star Plus, como referido no n.o 50, supra.

121

Além disso, importa referir que os direitos e as obrigações da Comissão no âmbito de uma convenção que subscreveu se regem pelas cláusulas que nela figuram.

122

Ora, a convenção em causa prevê, na cláusula 50.3.1, alínea m), a possibilidade de se pôr termo à participação de um seu beneficiário quando se verifiquem erros sistemáticos ou recorrentes, irregularidades, fraude ou violação séria dos compromissos assumidos noutras convenções.

123

Desta disposição resulta que a Comissão pode pôr termo à participação da recorrente na convenção em causa quando esses erros, irregularidades, fraude ou violação séria dos compromissos tenham ocorrido na execução de uma convenção, independentemente do programa que lhe possa estar associado, e, portanto, mesmo que esse programa não seja o que contém a sigla H2020.

124

Segundo o inquérito realizado pelo OLAF, a recorrente teve comportamentos que consistiram na manipulação de fichas horárias e concessão de salários excessivos que lhe permitiram financiar atividades não elegíveis e infringir o princípio do «sem fins lucrativos» em prejuízo do orçamento e da imagem da União. Segundo esse inquérito, essas atuações foram recorrentes, decorreram ao longo de diversos anos e tinham caráter generalizado, uma vez que foram comportamentos adotados pelo Diretor da recorrente e pelos seus quadros. Nestas condições, essas atuações constituíam, segundo as informações fornecidas à Comissão, informações essas que a recorrente contestou no Tribunal, uma violação séria dos compromissos assumidos pela recorrente no âmbito das convenções celebradas no contexto do PC7, pelo que a Comissão se encontrava então nas condições necessárias para poder pôr termo à participação da recorrente na convenção em causa celebrada no contexto do H2020.

125

Conclui‑se, portanto, que o quarto fundamento apresentado pela recorrente deve ser julgado improcedente.

– Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do princípio da proporcionalidade

126

No quinto fundamento que apresenta, a recorrente sustenta que as medidas controvertidas são contrárias ao princípio da proporcionalidade.

127

A este respeito, cabe recordar que, consagrado no artigo 5.o, n.o 4, TUE, o princípio da proporcionalidade é um princípio geral de direito da União que obriga as instituições da União a não ultrapassarem os limites do adequado e necessário para alcançar o objetivo pretendido nas ações que empreendem (Acórdão de 26 de janeiro de 2017, Diktyo Amyntikon Viomichanion Net/Comissão, T‑703/14, não publicado, EU:T:2017:34, n.o 156).

128

Segundo a jurisprudência, esse princípio pretende regular todos os modos de ação utilizados pela União, independentemente da sua natureza contratual ou não. Com efeito, no quadro do cumprimento de obrigações contratuais, o respeito desse princípio integra a obrigação mais geral das partes num contrato, que é a de o cumprir de boa fé (Acórdão de 26 de janeiro de 2017, Diktyo Amyntikon Viomichanion Net/Comissão, T‑703/14, não publicado, EU:T:2017:34, n.o 157).

129

No presente caso, há que examinar se essa obrigação foi respeitada pela Comissão quando, no quadro contratual correspondente a este processo, tomou as medidas controvertidas.

130

De acordo com as provas e os elementos de prova obtidos pelo OLAF, os comportamentos imputados à recorrente consistem na manipulação de fichas horárias e na atribuição de salários excessivos. Como se referiu no n.o 124, supra, esses comportamentos permitiram à recorrente financiar atividades não elegíveis e infringir o princípio do «sem fins lucrativos» em prejuízo do orçamento e da imagem da União. Foram recorrentes ao longo de um período de diversos anos e tinham caráter generalizado, tendo sido adotados tanto pelo Diretor da recorrente como pelos seus quadros.

131

A recorrente foi ouvida pela Comissão antes da adoção de cada uma das medidas controvertidas. Ora, na verdade, não logrou demonstrar que não cometeu as irregularidades de que essa instituição circunstanciadamente a acusava no ofício de 7 de outubro de 2015, e que confirmou e completou nas suas decisões de suspensão dos pagamentos e de pôr termo aos contratos, à luz dos argumentos expostos pela recorrente nas suas observações escritas, bem como nas decisões tomadas pelo comité Redress II no contexto do PC7 e nas decisões de confirmação da Comissão que se seguiram.

132

Além disso, na petição e por um lado, a recorrente não apresentou qualquer fundamento destinado a pôr em causa a justeza da análise da Comissão, nomeadamente no que respeita à sua prática de sobreavaliação das horas efetivamente prestadas pelos seus quadros dirigentes e de determinação retroativa das horas prestadas pelos membros do pessoal. Por outro lado, a argumentação apresentada em apoio dos seus pedidos não é passível de pôr em causa as afirmações da Comissão, constantes do ofício de 7 de outubro de 2015, quanto às irregularidades cometidas pela recorrente.

133

Ora, esses comportamentos devem ser examinados na perspetiva das obrigações da Comissão, em especial das resultantes do artigo 317.o TFUE, que impõe a essa instituição a obrigação de velar pela boa gestão dos recursos da União, e do artigo 325.o TFUE, que obriga a União e os Estados‑Membros a lutar contra a fraude e contra qualquer outra forma de atividade ilegal que ponha em causa os interesses financeiros da União.

134

Neste contexto, importa observar que, ao tomar as medidas controvertidas, a Comissão pretendeu evitar que à recorrente fossem confiados novos recursos provenientes do orçamento da União. Os dados obtidos pelo OLAF apontam no sentido da repetição e do caráter generalizado dos comportamentos proibidos adotados pela recorrente. Tendo sido informada disso, a Comissão pôde legitimamente temer que esses novos recursos, se fossem transferidos, seriam utilizados como os anteriores, ou seja, desrespeitando as normas contratuais aplicáveis.

135

Nos seus articulados, a recorrente apresenta dois argumentos para escorar o fundamento relativo à violação do princípio da proporcionalidade por parte da Comissão.

136

Em primeiro lugar, alega que as medidas tomadas pela Comissão foram decididas sem ter em consideração a qualidade do trabalho que realizou, ao passo que, segundo as auditorias técnicas até então efetuadas ao seu trabalho, os recursos colocados à sua disposição foram por si utilizados de acordo com os princípios da economia, da eficiência e da sã gestão financeira.

137

A este respeito, refira‑se que as auditorias técnicas referidas pela recorrente prosseguem um objetivo distinto do procurado pelo OLAF no seu inquérito. Com efeito, as mesmas visam avaliar, no plano intelectual, as investigações efetuadas pela recorrente com os recursos que lhe foram confiados pela Comissão. Por seu lado, o inquérito levado a cabo pelo OLAF visava determinar se, a nível financeiro, os recursos provenientes da União estavam a ser utilizados de acordo com os compromissos assumidos.

138

Além disso, independentemente do direito aplicável aos contratos de apoio financeiro em causa, a Comissão está vinculada, nos termos do artigo 317.o TFUE, ao dever de boa e sã gestão financeira dos recursos da União. No sistema de concessão dos apoios financeiros da União, a utilização desses apoios está sujeita a regras que podem conduzir à suspensão parcial ou total de um apoio já concedido. O beneficiário de um apoio não adquire, por esse facto, um direito definitivo ao pagamento integral do apoio caso não respeite as condições a que o apoio estava subordinado (v., neste sentido, Acórdão de 22 de maio de 2007, Comissão/IIC, T‑500/04, EU:T:2007:146, n.o 93).

139

Segundo um princípio fundamental que regula a concessão de apoios financeiros pela União, só podem ser subvencionadas despesas efetivamente efetuadas. Assim, para que a Comissão possa exercer um papel de controlo, os beneficiários desses apoios devem demonstrar o caráter elegível das despesas imputadas aos projetos para os quais esses apoios foram concedidos. Não basta demonstrar que um projeto foi realizado para justificar a atribuição de uma subvenção específica. O beneficiário do auxílio deve, além disso, fazer prova de que efetuou as despesas declaradas de acordo com as condições fixadas para a concessão do apoio em causa. A sua obrigação de respeitar as condições financeiras fixadas constitui um compromisso essencial e, por essa razão, condiciona a atribuição da contribuição financeira da União (v., neste sentido, Acórdão de 22 de maio de 2007, Comissão/IIC, T‑500/04, EU:T:2007:146, n.o 94).

140

Por conseguinte, tendo em atenção as conclusões constantes do relatório do inquérito do OLAF no que respeita às práticas da recorrente e os já referidos princípios decorrentes da jurisprudência, a Comissão não pode ser acusada de ter violado o princípio da proporcionalidade ao adotar as medidas controvertidas.

141

Em segundo lugar, na sua argumentação relativa ao princípio da proporcionalidade, a recorrente sustenta que a Comissão atuou de forma inaceitável ao adotar medidas que põem em causa o conjunto das convenções que as vinculavam entre si quando, segundo afirma, só num número limitado de situações se apurou existirem comportamentos proibidos. Para a recorrente, teria sido mais adequado informá‑la da existência de dificuldades e exigir‑lhe a adaptação das rubricas onde surgem despesas não elegíveis.

142

A este propósito, refira‑se que as medidas tomadas pela Comissão e criticadas pela recorrente se integram num contexto em que o organismo oficialmente encarregado de lutar contra o uso abusivo de fundos provenientes da União transmitiu àquela instituição elementos de prova que demonstram que a recorrente praticou fraudes sérias e recorrentes aquando da utilização desses fundos.

143

Neste contexto, a Comissão pôde pensar que, se limitasse a suspensão a apenas alguns pagamentos ou se só pusesse termo à participação em algumas das convenções que a vinculam à recorrente, os interesses financeiros da União não ficariam protegidos de forma suficientemente eficaz, contrariando assim a obrigação que lhe incumbe por força do referido artigo 317.o TFUE. Tendo os inquéritos sido efetuados por amostragem, o apuramento da existência de irregularidades numa convenção pôde afetar a confiança que a Comissão depositava no seu co‑contratante e conduzi‑la a pôr em causa a participação da recorrente no conjunto das convenções que celebraram entre si.

144

Destas considerações resulta que o quinto fundamento apresentado pela recorrente, ou seja, o fundamento relativo à violação do princípio da proporcionalidade, não pode ser acolhido.

145

Com base nestas considerações, há que negar provimento aos cinco fundamentos apresentados pela recorrente em apoio dos seus primeiro e segundo pedidos.

Quanto ao terceiro e ao quarto pedido

146

Com os seus terceiro e quarto pedidos, a recorrente solicita ao Tribunal Geral que condene a Comissão no pagamento das quantias cujo pagamento foi ilicitamente suspenso e que decorrem dos contratos celebrados no contexto do PC7 e do H2020, no montante de, respetivamente, 607404,49 euros e 226688,68 euros, acrescidos de juros de mora.

147

A este propósito, importa sublinhar que, como a própria Comissão admite, a recorrente, no período que antecedeu o cancelamento do contrato, pode ter tido de suportar despesas elegíveis, cujo pagamento podia reclamar nos termos das disposições contratuais aplicáveis.

148

Todavia, importa recordar que o financiamento pela União, ao abrigo dos contratos de apoio financeiro, não constitui uma contrapartida pelo trabalho efetuado pela recorrente, mas sim um auxílio a projetos que esta realiza e cujo pagamento está sujeito a condições precisas, contratualmente definidas. O financiamento da União apenas se destina a cobrir despesas elegíveis, tal como definidas nos contratos em causa.

149

No que a este aspeto toca, as condições gerais das convenções de apoio financeiro no contexto do PC7 preveem, na cláusula II.39, n.o 1, que, tendo terminado o contrato, as contribuições da Comissão ficam limitadas às despesas elegíveis suportadas e aceites até à data efetiva do cancelamento. Quanto às convenções de apoio financeiro no contexto do H2020, a cláusula 50.3.3, alínea b), prevê que a Comissão verifique, com base nos relatórios periódicos, no relatório final e no relatório sobre os pagamentos efetuados, que os pagamentos recebidos pelo beneficiário não excedem a contribuição da União (calculada aplicando a taxa de reembolso às despesas elegíveis declaradas pelo beneficiário e aprovadas pela Comissão) e que só as despesas suportadas pelo beneficiário até ao cancelamento da convenção são elegíveis.

150

A recorrente só pode, portanto, reclamar as quantias em causa desde que demonstre, nomeadamente, que correspondem a despesas elegíveis que foram suportadas e aceites até à data efetiva do cancelamento do contrato.

151

Ora, no presente caso, a recorrente não apresentou qualquer elemento de prova ou argumento específico a este respeito. Limitou‑se a solicitar o pagamento dos montantes indicados no n.o 146, supra, sem explicar a que correspondem e sem apresentar qualquer elemento suscetível de justificar esses valores na perspetiva das exigências decorrentes das disposições contratuais.

152

Consequentemente, há que negar provimento aos terceiro e quarto pedidos, sem que seja necessário proceder ao exame do interesse em agir da recorrente, como se deveria fazer nestes pedidos.

Quanto ao sétimo pedido

153

Com o seu sétimo pedido, a recorrente solicita «a título subsidiário» a nomeação de um perito cuja missão seria proceder a uma auditoria financeira aos contratos de apoio financeiro controvertidos a fim de determinar o montante das despesas elegíveis não reembolsadas e que deveriam, incontestavelmente, ser consideradas em dívida. Importa interpretar esse pedido no sentido de ser uma sugestão ao Tribunal Geral para que adote uma medida de instrução nos termos do artigo 91.o, alínea e), do Regulamento de Processo.

154

A este respeito, importa sublinhar que é à recorrente que, em virtude dos seus compromissos contratuais, cabe fazer prova das suas despesas em conformidade com as exigências em matéria de prova impostas pela cláusula II.14, n.o 1, das condições gerais das convenções de apoio financeiro no contexto do PC7 e pela cláusula 6.o das convenções de apoio financeiro no contexto do H2020 (Acórdãos de 22 de maio de 2007, Comissão/IIC, T‑500/04, EU:T:2007:146, n.os 104 e 105; de 17 de junho de 2010, CEVA/Comissão, T‑428/07 e T‑455/07, EU:T:2010:240, n.o 141, e de 5 de outubro de 2016, European Children’s Fashion Association e Instituto de Economía Pública/EACEA, T‑724/14, não publicado, EU:T:2016:600, n.o 137).

155

Além disso, só ao Tribunal Geral cabe apreciar a eventual necessidade de completar os elementos de informação de que dispõe relativamente aos processos que lhe foram submetidos ordenando medidas de instrução como a que no presente processo é requerida, medidas essas que não podem ter por objeto suprir as carências da recorrente na produção da prova (v. Acórdão de 16 de julho de 2009, SELEX Sistemi Integrati/Comissão, C‑481/07 P, não publicado, EU:C:2009:461, n.o 44 e jurisprudência aí indicada). No caso em apreço, na medida em que a recorrente não determinou os montantes que lhe deviam ser pagos, não há que ordenar a medida de instrução requerida (v., neste sentido, Acórdão de 9 de novembro de 2016, Trivisio Prototyping/Comissão, T‑184/15, não publicado, EU:T:2016:652, n.o 102).

Quanto ao pedido de indemnização de natureza extracontratual

156

Com o seu quinto pedido, a recorrente pretende fazer valer a responsabilidade extracontratual da Comissão.

157

Na petição, a recorrente sustenta ter sofrido um prejuízo no que respeita à sua reputação e ao seu caderno de encomendas. Refere ter sido objeto de um aviso de controlo no sistema de alerta precoce da Comissão com base nas informações transmitidas pelo OLAF. Ora, estas informações teriam sido obtidas desrespeitando os direitos fundamentais da recorrente, o que constitui uma violação suficientemente caracterizada de uma norma jurídica que visa conferir direitos aos particulares, ou seja, uma violação manifesta e grave, pela instituição em causa, dos limites do seu poder de apreciação.

158

Na réplica, a recorrente solicita a reparação do prejuízo material adicional que sofreu devido à falta cometida pela Comissão, que utilizou um relatório do OLAF elaborado a partir de provas obtidas ilegalmente a fim de adotar as medidas controvertidas. Refere que o não pagamento das quantias devidas representa uma diminuição importante do volume de negócios da recorrente, pois a sociedade realizava a quase totalidade do seu volume de negócios com os projetos subvencionados pela Comissão e a suas agências. Também refere que o processo de insolvência em que se encontra envolvida agrava o prejuízo material sofrido e que o aviso de exclusão no sistema de alerta precoce de que foi objeto na sequência do processo judicial de recuperação de que foi alvo a impede, de qualquer modo, de receber novos financiamentos ao abrigo dos contratos de apoio financeiro no contexto do PC7 ou do H2020.

159

Na sequência de uma questão submetida pelo Tribunal, a recorrente esclareceu na audiência que limitava a sua argumentação relativa à falta imputada à Comissão à violação do direito nacional e dos direitos fundamentais pelos inspetores do OLAF quando das inspeções e verificações efetuadas entre 2 e 5 de dezembro de 2014. Segundo a recorrente, essa falta implica que, devido à suspensão dos pagamentos, ao cancelamento das convenções e à não celebração de novos contratos, não pôde honrar as suas dívidas e, por isso, entrou em processo de insolvência. Ao pôr em causa a reputação da recorrente e impedindo a retoma de atividades a curto ou médio prazo, essa insolvência agravou o prejuízo material da recorrente.

160

A este propósito, recorde‑se que a responsabilidade extracontratual da União por atuação ilícita dos seus órgãos, na aceção do artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, depende da verificação de uma série de requisitos, concretamente, a ilegalidade do comportamento censurado à instituição, a realidade do dano e a existência de um nexo de causalidade entre este comportamento alegado e o prejuízo invocado (v. Acórdão de 2 de março de 2010, Arcelor/Parlamento e Conselho, T‑16/04, EU:T:2010:54, n.o 139 e jurisprudência aí indicada).

161

Tendo em conta que estes requisitos são cumulativos, basta que um deles não se encontre preenchido para que o pedido improceda (v. Acórdão de 2 de março de 2010, Arcelor/Parlamento e Conselho, T‑16/04, EU:T:2010:54, n.o 140 e jurisprudência aí indicada).

162

Por outro lado, importa observar que a violação de uma norma contratual por uma instituição não pode, por si só, desencadear a responsabilidade extracontratual da referida instituição relativamente a uma das partes com quem celebrou o contrato que inclui a referida norma. Com efeito, nesse caso, a ilegalidade imputável à referida instituição tem uma origem puramente contratual e decorre do seu compromisso enquanto parte contratante e não de uma qualquer outra qualidade, como a de autoridade administrativa. Por conseguinte, nessas circunstâncias, a alegação de violação de uma disposição contratual em apoio de um pedido de indemnização por responsabilidade extracontratual deve ser declarada irrelevante (Acórdão de 18 de novembro de 2015, Synergy Hellas/Comissão, T‑106/13, EU:T:2015:860, n.o 149).

163

Porém, não se pode excluir que as responsabilidades contratual e extracontratual de uma instituição da União coexistam relativamente a um dos contratantes. Com efeito, a natureza dos comportamentos ilícitos imputáveis a uma instituição que causam prejuízo e que podem ser objeto de um pedido de indemnização de natureza extracontratual não está predefinido (v., neste sentido, Acórdãos de 23 de março de 2004, Médiateur/Lamberts, C‑234/02 P, EU:C:2004:174, n.o 59 e jurisprudência aí indicada, e de 18 de dezembro de 2009, Arizmendi e o./Conselho e Comissão, T‑440/03, T‑121/04, T‑171/04, T‑208/04, T‑365/04 e T‑484/04, EU:T:2009:530, n.o 65).

164

Admitindo que essa coexistência de responsabilidades das instituições existe, só seria possível se, por um lado, a ilegalidade imputada à instituição em causa constituir um incumprimento não só a uma obrigação contratual, mas também a uma obrigação geral que lhe incumbe, e, por outro, se essa ilegalidade relativamente à referida obrigação geral tiver causado um prejuízo diverso do que resulta da má execução do contrato (Acórdão de 18 de novembro de 2015, Synergy Hellas/Comissão, T‑106/13, EU:T:2015:860, n.o 150).

165

No presente caso, a crítica feita pela recorrente em apoio do seu pedido de indemnização de natureza extracontratual, resumido no n.o 159, supra, coincide com os alegados incumprimentos de natureza contratual aduzidos pela recorrente no quadro dos seus primeiro e segundo fundamentos e nenhum outro prejuízo, para além do dano, que resulta da má‑execução do contrato é aduzido.

166

De qualquer modo, já se declarou, no presente acórdão, na sequência da apreciação dos primeiro e segundo fundamentos da recorrente formulados em apoio da sua atuação em violação das obrigações contratuais da Comissão, que as alegações da recorrente, apresentadas no n. o 159, supra, não podem ser acolhidas.

167

Não tendo, assim, a recorrente logrado demonstrar que a Comissão cometeu um erro suscetível de desencadear a sua própria responsabilidade, o pedido de indemnização decorrente da responsabilidade extracontratual da Comissão deve, de qualquer modo, ser julgado improcedente.

168

Atento o conjunto destes elementos, há que negar provimento à integralidade do recurso.

Quanto às despesas

169

Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a outra parte o tiver requerido. No presente caso, tendo a recorrente sido vencida, há que a condenar nas despesas, em conformidade com o pedido da Comissão, incluindo nas correspondentes ao processo de medidas provisórias.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A Sigma Orionis SA é condenada nas despesas, incluindo nas do processo de medidas provisórias.

 

Pelikánová

Nihoul

Svenningsen

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 3 de maio de 2018.

Assinaturas

Índice

 

Antecedentes do litígio

 

Inquérito realizado pelo OLAF

 

Intervenção da Comissão

 

Processos nacionais

 

Tramitação processual e pedidos das partes

 

Questão de direito

 

Quanto à violação das obrigações contratuais

 

Quanto à competência do Tribunal

 

Quanto ao direito aplicável

 

Quanto à admissibilidade

 

– Quanto ao interesse em agir

 

– Quanto ao fundamento de inadmissibilidade decorrente da falta de clareza e de precisão da petição

 

Quanto ao primeiro e ao segundo pedido

 

– Quanto ao primeiro fundamento, relativo ao não respeito pela força de caso julgado do acórdão proferido pela Secção de Instrução

 

– Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do direito francês

 

– Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação dos direitos fundamentais

 

– Quanto ao quarto fundamento, relativo ao facto de o relatório do inquérito OLAF não ter tido repercussões nas convenções de apoio financeiro celebradas no contexto do H2020

 

– Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do princípio da proporcionalidade

 

Quanto ao terceiro e ao quarto pedido

 

Quanto ao sétimo pedido

 

Quanto ao pedido de indemnização de natureza extracontratual

 

Quanto às despesas


( *1 ) Língua do processo: francês.

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