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Document 62016CJ0250

Acórdão do Tribunal de Justiça (Décima Secção) de 16 de novembro de 2017.
Ludwig-Bölkow-Systemtechnik GmbH contra Comissão Europeia.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Cláusula compromissória — Sexto programa‑quadro de ações em matéria de investigação, desenvolvimento tecnológico e demonstração (2002‑2006) — Reembolso de uma parte dos montantes pagos à recorrente — Indemnização contratual.
Processo C-250/16 P.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2017:871

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

16 de novembro de 2017 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Cláusula compromissória — Sexto programa‑quadro de ações em matéria de investigação, desenvolvimento tecnológico e demonstração (2002‑2006) — Reembolso de uma parte dos montantes pagos à recorrente — Indemnização contratual»

No processo C‑250/16 P,

que tem por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 2 de maio de 2016,

Ludwig‑Bölkow‑Systemtechnik GmbH, com sede em Ottobrunn (Alemanha), representada por M. Núñez Müller, Rechtsanwalt,

recorrente,

sendo a outra parte no processo:

Comissão Europeia, representada por T. Maxian Rusche e F. Moro, na qualidade de agentes,

demandada em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

composto por: A. Borg Barthet (relator), exercendo funções de presidente de secção, M. Berger e F. Biltgen, juízes,

advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Com o seu recurso, a Ludwig‑Bölkow‑Systemtechnik GmbH pede a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 19 de fevereiro de 2016, Ludwig‑Bölkow‑Systemtechnik/Comissão (T‑53/14, não publicado, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2016:88), pelo qual foi julgada parcialmente procedente a sua ação destinada a obter a declaração, por um lado, de que a Comissão não lhe podia pedir o reembolso dos adiantamentos pagos a título de três contratos e, por outro, de que a recorrente não estava obrigada a pagar uma indemnização contratual à Comissão.

Antecedentes do litígio

2

Os antecedentes do litígio estão resumidos como segue nos n.os 1 a 19 do acórdão recorrido:

«1

Em conformidade com o Regulamento (CE) n.o 2321/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo às regras de participação de empresas, centros de investigação e universidades e às regras de difusão de resultados de investigação para execução do sexto programa‑quadro da Comunidade Europeia (2002‑2006) (JO [2002,] L 355, p. 23), e no quadro definido pela Decisão n.o 1513/2002/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de junho de 2002, relativa ao sexto programa‑quadro da Comunidade Europeia de ações em matéria de investigação, desenvolvimento tecnológico e demonstração que visam contribuir para a realização do espaço europeu da investigação e para a inovação (2002‑2006) (JO [2002,] L 232, p. 1), a Comissão das Comunidades Europeias celebrou três contratos de subvenção com, entre outras partes, a recorrente, [Ludwig‑Bölkow‑Systemtechnik], uma empresa de consultoria tecnológica e estratégica, cuja atividade é principalmente exercida nos domínios da energia, da mobilidade e da sustentabilidade.

2

Em relação ao primeiro contrato, correspondente ao projeto “Development of a harmonised ‘European Hydrogen Energy RoAdmap’ by a balanced group of partners from industry, European regions and technical and socio‑economic scenario and modelling experts” (Desenvolvimento de um “roteiro europeu da energia de hidrogénio” harmonizado, por um grupo composto de forma paritária por parceiros da indústria, regiões europeias e peritos em cenários técnicos e sócio‑económicos e em modelagem) (a seguir “projeto HyWays”) e ao segundo contrato, correspondente ao projeto intitulado “Handbook for Approval of Hydrogen Refuelling Stations” (Manual para a aprovação das estações de reabastecimento de hidrogénio) (a seguir “projeto HyApproval”), a recorrente agia na qualidade de coordenadora. No que respeita ao terceiro contrato, correspondente ao projeto “Harmonisation of Standards and Regulations for a sustainable Hydrogen and Fuel Cell Technology” (Harmonização das normas e regulamentações para uma tecnologia sustentável do hidrogénio e das pilhas de combustível (a seguir “projeto HarmonHy”), era apenas um dos contratantes do consórcio.

3

Segundo o artigo 12.o de cada um dos contratos, a lei belga é‑lhes aplicável.

4

O artigo 13.o dos referidos contratos prevê uma cláusula compromissória que precisa que o Tribunal Geral tem competência exclusiva para decidir sobre os litígios entre a Comissão e os cocontratantes respeitantes à validade, à aplicação ou à interpretação dos mesmos contratos.

5

As condições gerais que, nos termos do artigo 14.o de cada contrato, fazem parte integrante dos mesmos, incluem uma primeira parte relativa, designadamente, à execução dos projetos em causa, à finalidade dos contratos e à responsabilidade (pontos II.2 a II.18), uma segunda parte relativa às disposições financeiras e aos controlos, auditorias, reembolsos e sanções (pontos II.19 a II.31) e uma terceira parte relativa aos direitos de propriedade intelectual (pontos II.32 a II.36).

6

O ponto II.19, n.o 1, das condições gerais define as despesas elegíveis para financiamento da União Europeia e estipula o seguinte:

“Os custos elegíveis resultantes da execução do projeto devem preencher as seguintes condições:

a)

devem ser reais, economicamente racionais e necessários para a execução do projeto;

b)

ser determinados em conformidade com os princípios contabilísticos habituais do cocontratante;

c)

devem ser apresentados ao longo da duração do projeto, conforme definida no artigo 4.o, n.o 2 […];

d)

devem ser registados nas contas do cocontratante que os efetuou, o mais tardar, na data de emissão do certificado de auditoria previsto no ponto II.26. Os procedimentos contabilísticos utilizados para registar as despesas e as receitas devem respeitar as regras de contabilidade do Estado de estabelecimento do cocontratante e permitir uma conciliação direta entre as despesas e as receitas realizadas para a execução do projeto e as declarações conjuntas relativas à atividade global do cocontratante […]”

7

O ponto II.19, n.o 2, alíneas a) a h), das condições gerais enuncia oito categorias de custos não elegíveis. O ponto II.19, n.o 2, alínea i), acrescenta que não são elegíveis todos os custos que não preenchem as condições estabelecidas no n.o 1.

8

Os pontos II.20 e II.21 das condições gerais definem dois tipos de custos elegíveis nas condições previstas no ponto II.19, a saber, em primeiro lugar, os custos diretos, imputáveis diretamente aos projetos e, em segundo lugar, os custos indiretos, não imputáveis diretamente aos projetos, mas suscetíveis de ser identificados e justificados pelo sistema contabilístico do cocontratante como custos suportados em relação com os custos diretos.

9

O ponto II.22, n.o 1, das condições gerais prevê três modelos de declaração dos custos, ou seja, o modelo do custo total utilizado para a imputação pelos contratantes dos custos elegíveis diretos e indiretos e o modelo do custo total‑taxa fixa utilizado pelos contratantes para a imputação dos custos elegíveis diretos e de uma taxa fixa para os custos indiretos. Esta taxa fixa é igual a 20% de todos os custos diretos menos os custos dos contratos de subcontratação, o que é suposto cobrir todos os custos indiretos efetuados pelo contratante no âmbito do projeto.

10

O ponto II.24, n.o 2, segundo parágrafo, das condições gerais estipula que a contribuição financeira da União não pode ser uma fonte de lucro para os contratantes.

11

De acordo com o ponto II.29, n.o 1, das condições gerais, a Comissão pode, a todo o tempo durante a vigência do contrato e até cinco anos após o termo do projeto, realizar auditorias. Essas auditorias podem ter por objeto aspetos científicos, financeiros, técnicos ou outros, como os princípios de contabilidade e de gestão, relativos à boa execução do projeto e do contrato.

12

O ponto II.30 das condições gerais está redigido da seguinte forma:

“Sem prejuízo das outras medidas previstas no presente contrato, os contratantes acordam que [a União], a fim de proteger os seus interesses financeiros, pode reclamar um prejuízo fixo a um contratante cujas despesas se verificaram exageradas e que, por isso, recebeu uma contribuição financeira injustificada da [União]. A indemnização contratual é devida além do reembolso da contribuição financeira injustificada a efetuar pelo contratante.

1.

O montante da indemnização contratual deve ser proporcional à despesa exagerada e à parte injustificada da contribuição da [União]. O montante da indemnização contratual é calculado de acordo com a seguinte fórmula:

Indemnização contratual = contribuição financeira injustificada × (despesa exagerada/total reclamado)

O cálculo de qualquer indemnização contratual tem unicamente em conta o período que se refere à contribuição da [União] exigida pelo contratante para esse período. Não é calculada em relação à contribuição total da [União].

2.

A Comissão notifica o seu pedido de pagamento por carta registada com aviso de receção ao contratante que considera devedor de uma indemnização contratual. O contratante dispõe de um prazo de 30 dias para responder ao pedido de indemnização da [União].

3.

O procedimento a observar para o reembolso de uma contribuição financeira injustificada e para o pagamento de uma indemnização contratual será determinado de acordo com as disposições do ponto II.31.

4.

A Comissão pode pedir uma indemnização por qualquer despesa exagerada verificada após o termo do contrato, de acordo com as disposições dos n.os 1 a 6.

5.

As disposições do presente artigo aplicam‑se sem prejuízo das sanções administrativas ou financeiras que a Comissão possa impor a qualquer contratante incumpridor, nos termos do regulamento financeiro, ou de qualquer outra via de reparação civil a que [a União] ou outro contratante possa recorrer. Além disso, as referidas disposições não excluem o recurso a procedimentos penais pelas autoridades dos Estados‑Membros.

6.

Por outro lado, como o regulamento financeiro prevê, qualquer contratante que se constate ter incumprido gravemente as suas obrigações contratuais poderá ser sujeito a uma sanção financeira de um valor compreendido entre 2% e 10% do montante da contribuição financeira que recebeu da [União]. Esta percentagem pode aumentar para 4% a 20%, no caso de reincidência nos cinco anos subsequentes ao primeiro incumprimento.”

13

Em fevereiro de 2008, a Comissão procedeu, em aplicação do ponto II.29 das condições gerais, a uma auditoria sobre a boa execução dos contratos controvertidos.

14

Em 17 de março de 2011, a Comissão comunicou à recorrente um projeto de relatório de auditoria. Por correios eletrónicos de 21 e de 22 de abril de 2011, a recorrente tomou posição sobre o referido projeto.

15

Em 25 de julho de 2011, a Comissão enviou à recorrente a versão final do relatório de auditoria. O relatório concluiu que a recorrente tinha fixado num nível demasiado elevado os seus custos de pessoal elegíveis. Além disso, segundo esse relatório, custos decorrentes da investigação tinham sido erradamente qualificados de custos de gestão. Por fim, não tinham sido declarados juros sobre os adiantamentos no valor de 1707,40 euros.

16

Relativamente aos três contratos aos quais, nessa data, tinha sido posto fim e cujo saldo total da participação financeira da União tinha sido pago, a Comissão informou a recorrente de que a notificaria das notas de débito.

17

De 10 de agosto de 2011 a 11 de novembro de 2013 prosseguiu a correspondência entre a recorrente e a Comissão, no decurso da qual as partes adotaram posições opostas quanto às conclusões do relatório final da auditoria.

18

Em 9 de dezembro de 2013, a Comissão notificou a recorrente de várias notas de débito. Resulta dessas notas que o montante a recuperar pela Comissão ascendia a 218539,62 euros a título do projeto HyWays, a 75407,06 euros a título do projeto HyApproval e a 47128,39 euros a título do projeto HarmonHy. Além disso, a Comissão exigiu à recorrente indemnizações contratuais em aplicação do ponto II.30 das condições gerais, ou seja, 60402,30 euros a título do projeto HyWays, 11019,61 euros a título do projeto HyApproval e 10002,17 euros a título do projeto HarmonyHy.

19

Posteriormente à propositura da ação, a Comissão emitiu a favor da recorrente as notas de crédito n.os 3233150004, 3233150005 e 3233150006, num montante respetivo de 108753,52 euros, 10875,35 euros e 23404,88 euros.»

Ação no Tribunal Geral e acórdão recorrido

3

Por petição apresentada em 20 de janeiro de 2014 na Secretaria do Tribunal Geral, a recorrente intentou uma ação destinada a obter a declaração, em primeiro lugar, de que a Comissão não tinha calculado os custos dos três projetos em conformidade com as disposições contratuais, em segundo lugar, que, no quadro do projeto HyWays, o montante da contribuição financeira da União recebida pela recorrente era inferior à que constava das duas notas de débito emitidas pela Comissão, em terceiro lugar, que a Comissão tinha requalificado erradamente custos de gestão em custos de investigação no projeto HyApproval, em quarto lugar, que a recorrente não estava obrigada a pagar uma indemnização contratual à Comissão no âmbito dos três projetos e, por fim, em quinto lugar, que a Comissão tinha emitido erradamente as notas de débito controvertidas, sendo os montantes devidos pela recorrente inferiores aos que constam dessas notas.

4

Em apoio da sua ação, a recorrente invocava, em substância, quatro fundamentos. O primeiro fundamento era relativo ao caráter incorreto da recusa da Comissão em aceitar o método de cálculo dos custos de projeto proposto pela recorrente. Com o segundo fundamento, a recorrente defendia que a Comissão tinha, erradamente, alegado que aquela tinha beneficiado no âmbito do projeto HyWays de uma contribuição financeira de um montante de 604240,79 euros. O terceiro fundamento incidia sobre o caráter incorreto da requalificação de certos custos incorridos no âmbito do contrato relativo ao projeto HyApproval. Por fim, o quarto fundamento era relativo ao caráter incorreto do pedido de indemnização contratual apresentado pela Comissão.

5

Quanto ao segundo e terceiro pedidos, o Tribunal Geral decidiu que não havia já que conhecer dos mesmos, uma vez que a Comissão, ao adotar as notas de crédito n.o 3233150004 e n.o 3233150006, tinha admitido a procedência das pretensões da recorrente.

6

O Tribunal Geral negou provimento ao primeiro pedido da recorrente relativo ao método de cálculo dos custos de projeto. Decidiu, nomeadamente, no n.o 58 do acórdão recorrido, que a Comissão tinha, corretamente, afastado o método de registo dos custos privilegiado pela recorrente, uma vez que levava a que se declarassem custos que nem eram reais, nem economicamente racionais, nem necessários para a execução do projeto na aceção do ponto II.19, n.o 1, alínea a), das condições gerais.

7

Quanto ao quarto pedido relativo à indemnização contratual, o Tribunal Geral analisou se a aplicação pela Comissão do ponto II.30 das condições gerais nas circunstâncias do caso em apreço era conforme com as regras do Código Civil belga que regem o recurso às cláusulas penais. Considerou, no termo dessa análise, que, em aplicação do artigo 1231.o do Código Civil belga, havia que reduzir as somas devidas a título de indemnizações contratuais pela recorrente a um montante equivalente a 10% dos adiantamentos indevidamente recebidos por esta última.

Pedidos das partes

8

No presente recurso, a recorrente conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne:

anular o acórdão impugnado na parte em que o Tribunal Geral negou provimento ao primeiro e quinto pedidos da recorrente;

anular o acórdão impugnado na parte em que o Tribunal Geral decidiu que as quantias devidas a título de indemnização contratual pela recorrente eram reduzidas a um montante equivalente a 10% dos adiantamentos que devem ser reembolsados no âmbito dos projetos HyWays, HyApproval e HarmonyHy e decidir que a recorrente não devia reembolsar nenhum montante a título de indemnização fixa;

anular o acórdão impugnado na parte em que o Tribunal Geral condenou a recorrente a suportar as suas próprias despesas; e

condenar a Comissão nas despesas do presente recurso e do processo em primeira instância.

9

A Comissão conclui pedindo que seja negado provimento ao recurso e que a recorrente seja condenada nas despesas.

10

Defende que o recurso é inadmissível na parte em que incide sobre a repartição das despesas decidida pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido, relativas ao segundo e terceiro pedidos do recurso sobre os quais o Tribunal Geral considerou não haver lugar a decisão de mérito.

Quanto ao presente recurso

Quanto aos pedidos do recurso na parte em que incidem sobre os contratos controvertidos

11

Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca cinco fundamentos relativos, respetivamente, à falta de fundamentação, à violação do princípio da boa‑fé, à desvirtuação dos elementos de prova, à violação dos artigos 1162.°, 1134.° e 1135.° do Código Civil belga e, por fim, a erros de direito relativos à aplicação da indemnização contratual.

Quanto ao primeiro fundamento

– Argumentos das partes

12

Com o seu primeiro fundamento, a recorrente defende que o Tribunal Geral não cumpriu o seu dever de fundamentação, nos n.os 51, 55 e 58 do acórdão recorrido, uma vez que rejeitou o método de cálculo da taxa horária que ela utilizou por este método dar origem a custos mais elevados «que não eram reais, nem economicamente racionais, nem necessários para a execução do projeto» e ter, além disso, por efeito fazer participar a Comissão «na cobertura de todos os custos da recorrente, independentemente de qualquer análise da sua relação com os projetos».

13

A recorrente alega que os fundamentos constantes desses pontos são incompreensíveis na medida em que o quociente que privilegiou (custos/horas de trabalho contabilizáveis) tem uma relação muito mais estreita com os projetos referidos nos contratos do que o quociente utilizado pela Comissão [custos/totalidade das horas de trabalho (contabilizáveis e não contabilizáveis)]. Com efeito, este último inclui não apenas outros projetos mas também todas as horas de trabalho sem relação com os projetos.

14

Na sua réplica, a recorrente indica que os conhecimentos adquiridos no âmbito do acompanhamento do projeto e do aperfeiçoamento garantem e melhoram a qualidade de todos os projetos, incluindo os projetos controvertidos. De onde resulta que os custos correspondentes ao acompanhamento do projeto e ao aperfeiçoamento são custos elegíveis, nos termos do ponto II.19, n.o 1, e do ponto II.20, n.o 1, das condições gerais.

15

A Comissão considera que o presente fundamento deve improceder.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

16

Importa recordar que o dever de fundamentação previsto no artigo 296.o TFUE constitui uma formalidade essencial que deve ser distinguida da questão da procedência da fundamentação, a qual faz parte da legalidade material do ato controvertido. Com efeito, a fundamentação de uma decisão consiste em exprimir formalmente as razões em que essa decisão assenta. Se essas razões estiverem feridas de erros, estes inquinam a legalidade material da decisão, mas não a sua fundamentação, que pode ser suficiente, embora exprimindo motivos errados. Daqui decorre que as acusações e os argumentos destinados a contestar a procedência de um ato são desprovidos de pertinência no âmbito de um fundamento relativo à falta ou à insuficiência de fundamentação (acórdão de 18 de junho de 2015, Ipatau/Conselho, C‑535/14 P, EU:C:2015:407, n.o 37 e jurisprudência referida).

17

Na medida em que a argumentação invocada pela recorrente em apoio do primeiro fundamento pode ser entendida como destinada quer a contestar o mérito da apreciação do Tribunal Geral relativa ao método de cálculo da taxa horária, quer a considerar que o Tribunal Geral fundamentou, nos n.os 51, 55 e 58 do acórdão recorrido, a sua apreciação de forma contraditória e equívoca, esta argumentação deve ser considerada improcedente.

18

Com efeito, o Tribunal Geral recordou, nos n.os 46 a 48 deste acórdão, as características particulares do financiamento da União concedido no âmbito de contratos de subvenção antes de verificar, à luz dessas características, se a Comissão podia afastar o método de determinação dos custos elegíveis aplicado pela recorrente por não ser conforme com as estipulações contratuais.

19

No n.o 51 do referido acórdão, o Tribunal Geral indicou que o método de cálculo da recorrente «tem por efeito excluir certas horas trabalhadas pelos seus colaboradores do cálculo da taxa horária, como as relativas ao acompanhamento do projeto, ao aperfeiçoamento, à participação em conferências, à prospeção e ao acompanhamento dos contactos com a clientela, por não serem consagradas a fornecer prestações de serviços a todos os que os solicitaram não sendo, por conseguinte, contabilizáveis». Segundo o Tribunal Geral, «daqui decorre que a base que serve de denominador é mais reduzida do que a constituída por todas as horas trabalhadas e que, por conseguinte, a taxa horária é superior», de modo que, «uma vez aplicada às horas efetivamente fornecidas no âmbito dos projetos, dá lugar a uma declaração dos custos mais elevada».

20

No n.o 55 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral salientou «que a redução da base de cálculo da taxa horária e o aumento do nível dos custos elegíveis daí resultante têm por efeito fazer participar a Comissão na cobertura de todos os custos da recorrente, independentemente de qualquer análise da sua relação com os projetos que são objeto de um financiamento da União». O Tribunal Geral deduz daí, no n.o 56 desse acórdão, que, «se tal abordagem se pode legitimamente compreender no âmbito de um contrato clássico de prestação de serviços, […] não é compatível com as particularidades dos contratos de subvenção em causa».

21

Daqui resulta que o Tribunal Geral considerou que não era determinante sabe, se o quociente que a recorrente aplicou tinha uma relação estreita com os projetos em causa nos contratos de subvenção, mas se, ao aplicar o referido quociente, os custos eram repartidos por todas as horas de trabalho, o que garantia que o orçamento da União não financiava os custos relativos ao acompanhamento do projeto, ao aperfeiçoamento, à participação em conferências, à prospeção e ao acompanhamento dos contactos com a clientela.

22

Foi, portanto, sem contradição que o Tribunal Geral decidiu, no n.o 58 do acórdão recorrido, que a Comissão tinha afastado corretamente o método de registo dos custos privilegiado pela recorrente, por conduzir à declaração de custos que não eram reais, nem economicamente racionais, nem necessários para a execução do projeto na aceção do ponto II.19 das condições gerais.

23

Daqui decorre que o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente.

Quanto ao segundo fundamento

– Argumentos das partes

24

Com o segundo fundamento, a recorrente afirma que o Tribunal Geral, ao não reconhecer que a Comissão tinha violado o princípio geral da boa‑fé que deve presidir às relações entre as instituições da União e os operadores do mercado, violou ele próprio esse princípio.

25

Com a primeira parte do segundo fundamento, a recorrente defende que a Comissão violou o referido princípio na medida em que não especificou, nos pontos II.19 e seguintes das condições gerais, a forma como deviam ser calculados os custos elegíveis pelo seu cocontratante. Considera que a Comissão se contentou assim em formular princípios gerais e remeter, no ponto II.19, n.o 1, alínea b), das condições gerais, para os princípios contabilísticos habituais do cocontratante. Precisa que o princípio da boa‑fé faz parte dos princípios gerais do direito da União estabelecidos pelo Tribunal de Justiça. Remete a este respeito para vários acórdãos, nomeadamente de 12 de julho de 1957, Algera e o./Assembleia Comum (7/56 e 3/57 a 7/57, EU:C:1957:7, pp. 114 e 115), e de 29 de abril de 2004, IPK‑München e Comissão (C‑199/01 P e C‑200/01 P, EU:C:2004:249, n.o 78).

26

Com a segunda parte do segundo fundamento, a recorrente considera que o Tribunal Geral, ao ter rejeitado, nos n.os 50 a 63 do acórdão recorrido, o método do cálculo da taxa horária que ela privilegiava e ao ter‑se contentado em afirmar, no n.o 59 desse acórdão, que a remessa para o modelo do custo total não era suscetível de demonstrar a conformidade do método de cálculo utilizado pela recorrente com, nomeadamente, o ponto II.19, n.o 1, alínea a), das condições gerais, violou também esse princípio.

27

A Comissão defende, a título principal, que o segundo fundamento deve ser considerado inadmissível e, a título subsidiário, que é desprovido de fundamento.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

28

Quanto à primeira parte do segundo fundamento relativo à violação pela Comissão do princípio geral da boa‑fé do direito da União, importa observar que, com a argumentação que expõe, a recorrente apenas põe em causa a decisão da Comissão. Assim sendo, tal argumentação, que não se dirige ao acórdão recorrido, é inadmissível no âmbito do recurso.

29

Quanto à segunda parte desse fundamento, relativo à violação, pelo Tribunal Geral, do princípio da boa‑fé, importa lembrar que, segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, permitir a uma parte suscitar pela primeira vez nesse Tribunal um fundamento que não suscitou no Tribunal Geral equivaleria a permitir‑lhe submeter ao Tribunal de Justiça um litígio mais amplo do que aquele de que o Tribunal Geral teve de conhecer. Em sede de recurso, a competência do Tribunal de Justiça está, em princípio, limitada ao exame da apreciação, pelo Tribunal Geral, dos fundamentos que foram debatidos perante ele. Contudo, um argumento não invocado em primeira instância não pode ser considerado um fundamento novo, inadmissível em segunda instância, se apenas constituir a ampliação de uma argumentação já desenvolvida no âmbito de um fundamento apresentado na petição inicial no Tribunal Geral (acórdão de 28 de julho de 2016, Tomana e o./Conselho e Comissão, C‑330/15 P, não publicado, EU:C:2016:601, n.o 33 e jurisprudência referida).

30

Uma vez que a recorrente alega, com esta segunda parte do referido fundamento, que o Tribunal Geral devia ter reconhecido que a Comissão tinha violado o princípio da boa‑fé, há que constatar que tal argumentação não foi suscitada nesse Tribunal. Assim, esta última tem um caráter novo e deve ser considerada inadmissível.

31

O segundo fundamento deve, pois, ser julgado inadmissível.

Quanto ao terceiro fundamento

– Argumentos das partes

32

Com o seu terceiro fundamento, a recorrente censura o Tribunal Geral por ter desvirtuado os elementos de prova.

33

Com a primeira parte desse fundamento, a recorrente alega que o Tribunal Geral desvirtuou os elementos de prova e os factos que avançou em apoio da sua argumentação ao considerar, nos n.os 55, 56 e 58 do acórdão recorrido, que o método de registo dos custos que utilizava a levava a declarar custos que não eram reais, nem economicamente racionais, nem necessários para a execução dos projetos e, logo, não podiam ser considerados elegíveis para a realização dos projetos em causa. Precisa, a este respeito, que o Tribunal Geral recordou, no n.o 46 desse acórdão «que os custos elegíveis não [podiam] ter por consequência a realização de lucro para o contratante». Ora, por um lado, a recorrente alegou, no âmbito da sua ação em primeira instância, que o seu método de cálculo não a levava a realizar lucro, podendo, pelo contrário, no máximo ter por resultado a cobertura dos custos ligados aos projetos, enquanto o método da Comissão lhe causava perdas consideráveis. Por outro lado, o fundamento que consta do n.o 58 do referido acórdão baseou‑se em elementos errados na medida em que eram contrários aos avançados e provados pela recorrente.

34

Com a segunda parte do referido fundamento, a recorrente acusa o Tribunal Geral de ter decidido, sem recolher provas sobre o método de cálculo por ela utilizado, que ela tinha obtido lucro e que o nexo suficientemente estreito entre os custos reclamados e os projetos em causa não existia.

35

Com a terceira parte do mesmo fundamento, a recorrente acusa o Tribunal Geral de não ter fornecido uma definição de «todos os custos» quando indicou, no n.o 55 do acórdão recorrido, que o método de cálculo da recorrente tinha por efeito fazer a Comissão participar «na cobertura de todos os custos da recorrente».

36

Por fim, com a quarta parte do terceiro fundamento, a recorrente afirma que o Tribunal Geral desvirtuou de forma manifesta a argumentação da Comissão, na medida em que considerou, no n.o 61 do acórdão recorrido, que a interpretação dos pontos II.19 e seguintes das condições gerais revestia um caráter «claro». Ora, a interpretação destas condições era equívoca também em relação à Comissão, uma vez que, para o numerador do quociente da taxa horária, tomava em consideração umas vezes os «custos de pessoal», outras vezes «todos os custos».

37

A Comissão considera que o presente fundamento deve improceder.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

38

Segundo jurisprudência constante, só o Tribunal Geral é competente para apurar os factos, salvo no caso de a inexatidão material das suas conclusões resultar dos autos que lhe foram submetidos, e para apreciar os elementos de prova apresentados. O apuramento destes factos e a apreciação destes elementos não constituem, portanto, exceto em caso de desvirtuação, uma questão de direito sujeita, como tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça (acórdão de 29 de outubro de 2015, Comissão/ANKO, C‑78/14 P, EU:C:2015:732, n.o 22 e jurisprudência referida).

39

Quando o recorrente alega uma desvirtuação de elementos de prova pelo Tribunal Geral, deve, em aplicação do artigo 256.o TFUE, do artigo 58.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 168.o, primeiro parágrafo, alínea d), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, indicar de modo preciso os elementos que, em seu entender, foram desvirtuados e demonstrar os erros de análise que, na sua apreciação, levaram o Tribunal Geral a essa desvirtuação. Por outro lado, é jurisprudência constante que a desvirtuação deve resultar de forma manifesta dos autos, sem que seja necessário proceder a uma nova apreciação dos factos e das provas (acórdão de 30 de novembro de 2016, Comissão/França e Orange, C‑486/15 P, EU:C:2016:912, n.o 99 e jurisprudência referida).

40

Embora, com o seu terceiro fundamento, a recorrente invoque uma desvirtuação dos elementos de prova, há todavia que observar que, com a primeira e quarta partes avançadas em apoio do referido fundamento, a recorrente se limita a criticar as apreciações factuais efetuadas pelo Tribunal Geral, por um lado, nos n.os 55, 56 e 58 do acórdão recorrido, segundo as quais, em substância, o método de cálculo da recorrente conduz à declaração de custos que não eram reais, nem economicamente racionais, nem necessários para a execução dos projetos em causa e, por outro, no n.o 61 desse acórdão, segundo as quais os pontos II.19 a II.21 das condições gerais revestiam um caráter claro. A recorrente pretende, na realidade, obter do Tribunal de Justiça uma nova apreciação dos factos a este respeito, sem indicar de modo preciso quais os elementos de prova que foram desvirtuados pelo Tribunal Geral. A primeira e quarta partes do terceiro fundamento devem, pois, ser consideradas inadmissíveis.

41

Quanto à segunda parte desse fundamento, não se pode acusar o Tribunal Geral de não ter recolhido os elementos de prova necessários, uma vez que incumbe à recorrente produzir, sendo caso disso, todos os elementos de prova suscetíveis de apoiar e corroborar os seus argumentos no âmbito da ação que intentou no Tribunal Geral (v., neste sentido, despacho de 30 de junho de 2015, Evropaïki Dynamiki/Comissão, C‑575/14 P, não publicado, EU:C:2015:443, n.o 21).

42

Quanto à terceira parte do terceiro fundamento, com a qual a recorrente acusa o Tribunal Geral de não ter facultado uma definição da expressão «todos os custos», constante do n.o 55 do acórdão recorrido, basta observar que essa alegação é dificilmente compreensível e desprovida de pertinência no âmbito de um fundamento relativo à desvirtuação dos elementos de prova na medida em que não incide sobre um elemento de prova.

43

Daqui resulta que o terceiro fundamento deve ser julgado parcialmente inadmissível e parcialmente improcedente.

Quanto ao quarto fundamento

– Argumentos das partes

44

Com o seu quarto fundamento, a recorrente alega que o Tribunal Geral, ao decidir, no n.o 61 do acórdão recorrido, que a interpretação dos pontos II.19 a II.21 das condições gerais revestia um caráter claro no que respeita ao método de determinação dos custos controvertido e que não havia, por isso, que recorrer aos princípios do direito civil belga, violou os artigos 1162.°, 1134.° e 1135.° do Código Civil belga.

45

Alega, a este propósito, que incumbia à Comissão precisar de forma clara, e antes da celebração dos contratos em causa, as modalidades de determinação dos custos. Afirma que uma vez que estas precisões não foram fornecidas, os contratos eram imprecisos quanto a este ponto. Deviam, pois, ter sido objeto de uma interpretação à luz das disposições referidas do direito belga, que preveem que, em caso de dúvida sobre a interpretação de uma convenção, esta é interpretada contra quem a estipulou e a favor de quem contraiu a obrigação e que os cocontratantes estão sujeitos à obrigação de execução de boa‑fé das convenções. Segundo a recorrente, o Tribunal Geral devia ter considerado que o método de cálculo da taxa horária que propôs era compatível com as condições gerais dos contratos em causa e as disposições referidas do Código Civil belga. Afirma que, nestas condições, o Tribunal Geral devia ter considerado as notas de débito controvertidas contrárias aos contratos e, logo, ilegais.

46

A recorrente alega também a este respeito que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça e, nomeadamente, com o acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Planet/Comissão (C‑564/13 P, EU:C:2015:124, n.o 21), a interpretação e a aplicação dos artigos 1162.°, 1134.° e 1135.° do Código Civil belga, na medida em que são abrangidas pelo direito nacional aplicável aos contratos ao abrigo de uma cláusula compromissória, é uma questão de direito que pode ser submetida ao Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso.

47

A Comissão defende que o quarto fundamento deve ser considerado inadmissível ou inoperante.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

48

Com o seu quarto fundamento, a recorrente acusa, em substância, o Tribunal Geral de não ter, no n.o 61 do acórdão recorrido, aplicado os artigos 1162.°, 1134.° e 1135.° do Código Civil belga, por a definição dos custos diretos e indiretos elegíveis constantes dos pontos II.19 a II.21 das condições gerais revestir um caráter claro e não haver, por isso, que recorrer aos princípios do direito civil belga de interpretação dos contratos.

49

Importa todavia observar que, ao fazê‑lo, a recorrente contesta na realidade a interpretação dos pontos II.19 a II.21 das condições gerais dos contratos de subvenção segundo a qual o Tribunal Geral considerou que estes revestiam um caráter claro. Ora, a interpretação de uma disposição contratual efetuada pelo Tribunal Geral constitui uma questão de facto, que não pode ser submetida, como tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso (v., neste sentido, acórdão de 29 de outubro de 2015, Comissão/ANKO, C‑78/14 P, EU:C:2015:732, n.o 23).

50

Daqui decorre que há que julgar inadmissível o quarto fundamento.

Quanto ao quinto fundamento

– Argumentos das partes

51

Com a primeira parte suscitada em apoio do quinto fundamento, a recorrente alega que o Tribunal Geral não cumpriu o seu dever de fundamentação na medida em que, no n.o 79 do acórdão recorrido, considerou, sem outra precisão a esse respeito, «manifestamente improcedente» a argumentação da recorrente baseada numa alegada contradição entre o ponto II.30 das condições gerais e os bons costumes protegidos pelo artigo 1172.o do Código Civil belga.

52

Com a segunda parte desse fundamento, a recorrente acusa o Tribunal Geral de não ter examinado a questão da nulidade do ponto II.30 das condições gerais, sendo que, em sua opinião, esse ponto viola os artigos 1172.° e 1231.° do Código Civil belga. A recorrente reconhece que o Tribunal Geral limitou as consequências da aplicação do ponto II.30 das condições gerais. Para esse feito, por um lado, no n.o 94 do acórdão recorrido, considerou que o referido ponto não se podia aplicar ao simples prejuízo relacionado com o atraso de reembolso dos adiantamentos indevidamente pagos. Recorreu, por outro lado, à possibilidade prevista no artigo 1231.o do Código Civil belga de reduzir o montante da indemnização contratual que a Comissão pode exigir para 10% do montante dos adiantamentos a reembolsar. Ao fazê‑lo, o Tribunal Geral procedeu a uma redução dos montantes a reembolsar mantendo a aplicabilidade do ponto II.30 das condições gerais ao caso em apreço. Ora, a recorrente afirma que o Tribunal Geral devia ter declarado a nulidade desse ponto II.30 por ser contrário ao artigo 1172.o do Código Civil belga e, logo, considerar que a recorrente não estava obrigada ao pagamento de qualquer indemnização.

53

A recorrente remete, a este propósito, para a jurisprudência constante no domínio das cláusulas abusivas relativamente aos consumidores, segundo a qual o Tribunal de Justiça considerou que o órgão jurisdicional competente não pode reduzir condições gerais abusivas de um contrato à parte ainda lícita das mesmas, devendo, pelo contrário, excluir a sua aplicação relativamente ao cocontratante (acórdão de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito, C‑618/10, EU:C:2012:349, n.os 58 e segs.). A recorrente considera que esta jurisprudência é transponível para o caso em apreço, na medida em que ela é, à semelhança dos consumidores, a parte fraca do contrato de financiamento da União a quem são impostas as condições gerais contratuais da Comissão, sem as poder negociar.

54

A Comissão considera que o quinto fundamento deve ser considerado improcedente.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

55

Quanto à primeira parte do quinto fundamento, relativo à falta de fundamentação, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, no âmbito de um recurso de decisão do Tribunal Geral, por um lado, a fiscalização do Tribunal de Justiça tem por objeto, designadamente, verificar se o Tribunal Geral respondeu de modo juridicamente suficiente a todos os argumentos invocados pelo recorrente e, por outro, o fundamento relativo a uma falta de resposta do Tribunal Geral a argumentos invocados em primeira instância equivale, em substância, a invocar uma violação do dever de fundamentação que decorre do artigo 36.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, aplicável ao Tribunal Geral por força do artigo 53.o, primeiro parágrafo, do mesmo Estatuto, e do artigo 117.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral (acórdão de 11 de maio de 2017, Dyson/Comissão, C‑44/16 P, EU:C:2017:357, n.o 37 e jurisprudência referida).

56

A este propósito, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que o dever de fundamentação que incumbe ao Tribunal Geral não impõe que este último forneça uma exposição que siga exaustiva e individualmente todos os raciocínios articulados pelas partes no litígio e que a fundamentação desse Tribunal pode, portanto, ser implícita desde que permita aos interessados conhecerem as razões pelas quais o Tribunal Geral não acolheu os seus argumentos e ao Tribunal de Justiça dispor de elementos suficientes para exercer a sua fiscalização (acórdão de 11 de maio de 2017, Dyson/Comissão, C‑44/16 P, EU:C:2017:357, n.o 38 e jurisprudência referida).

57

No caso em apreço, o Tribunal Geral, no n.o 79 do acórdão recorrido, considerou manifestamente improcedente a argumentação da recorrente baseada numa alegada contradição entre o ponto II.30 das condições gerais e os bons costumes protegidos pelo artigo 1172.o do Código Civil belga. Ao fazê‑lo, limitou‑se a rejeitar essa argumentação sem indicar qualquer fundamento em apoio da sua apreciação.

58

Embora seja verdade que a alegação da recorrente foi considerada «manifestamente» improcedente, não é menos verdade que a rejeição de um argumento invocado por uma parte recorrente, por muito manifesta que seja, não isenta o Tribunal Geral da sua obrigação de fundamentar a decisão. Assim, o Tribunal Geral viciou a sua apreciação de insuficiência de fundamentação, que não é, todavia, no caso em apreço, suscetível de conduzir à anulação do acórdão recorrido.

59

Com efeito, como o Tribunal Geral indicou no n.o 76 do acórdão recorrido, a análise do quarto pedido, relativo à indemnização contratual, implicava verificar se a aplicação pela Comissão desse ponto nas circunstâncias do caso em apreço era conforme com as regras do Código Civil belga que regem o recurso às cláusulas penais. Uma vez que o direito belga, aplicável aos contratos de subvenção controvertidos, prevê o recurso a essas cláusulas e que essa cláusula penal tem por efeito, nos termos do artigo 1229.o do Código Civil belga, e como o Tribunal Geral recordou, nos n.os 81 e 82 do acórdão recorrido, compensar o atraso na execução da obrigação principal ou a sua inexecução, a cláusula penal prevista no ponto II.30 das condições gerais não pode, por conseguinte, ser considerada ilícita ou contrária aos bons costumes.

60

Quanto à segunda parte do quinto fundamento, há que observar que assenta na premissa de que os artigos 1172.° e 1231.° do Código Civil belga foram violados.

61

Ora, como resulta do exame da primeira parte do quinto fundamento, o Tribunal Geral não violou o artigo 1172.o do Código Civil belga. No que respeita ao artigo 1231.o do referido código, basta lembrar, como indicou corretamente o Tribunal Geral, no n.o 90 do acórdão recorrido, que esta disposição não condiciona a validade de uma cláusula penal, mas permite ao juiz reduzir o montante exigido pelo credor quando excede manifestamente o montante que as partes podiam fixar para reparar o prejuízo resultante da inexecução da convenção em causa.

62

Por outro lado, quanto ao argumento relativo ao acórdão de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349), para corroborar que o Tribunal Geral devia ter declarado inaplicável o ponto II.30 das condições gerais, há que declarar que tal argumento é invocado pela primeira vez no Tribunal de Justiça e que deve ser rejeitado pelos mesmos motivos expostos no n.o 29 do presente acórdão.

63

Daqui decorre que o quinto fundamento não pode ser acolhido.

Quanto aos pedidos do recurso na parte em que incidem sobre as despesas da primeira instância

64

A recorrente pede a anulação do ponto 4 do dispositivo do acórdão recorrido na medida em que o Tribunal Geral a condenou a suportar as suas próprias despesas, incluindo relativamente ao segundo e terceiro pedidos da ação, que foram objeto de uma decisão de não conhecimento de mérito.

65

Importa recordar que, nos termos do artigo 58.o, segundo parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, «[n]ão pode ser interposto recurso que tenha por único fundamento o montante das despesas ou a determinação da parte que as deve suportar». Além disso, é jurisprudência constante que, na hipótese de todos os outros fundamentos de recurso terem sido considerados improcedentes, os pedidos relativos à alegada irregularidade da decisão do Tribunal Geral sobre as despesas devem ser considerados inadmissíveis, em aplicação dessa disposição (v., nomeadamente, despacho de 16 de setembro de 2005, Schmoldt e o./Comissão, C‑342/04 P, não publicado, EU:C:2005:562, n.o 65 e jurisprudência referida).

66

Daqui decorre que, na medida em que improcedam todos os outros fundamentos de um recurso de uma decisão do Tribunal Geral, os pedidos relativos à alegada irregularidade da decisão do Tribunal Geral sobre as despesas devem ser julgados inadmissíveis.

67

Decorre das considerações precedentes que há que negar provimento ao recurso na sua totalidade.

Quanto às despesas

68

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, aplicável aos recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação da recorrente nas despesas e tendo esta sido vencida, há que condená‑la nas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A Ludwig‑Bölkow‑Systemtechnik GmbH é condenada nas despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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