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Document 62016CC0147

Conclusões da advogada-geral E. Sharpston apresentadas em 30 de novembro de 2017.
Karel de Grote – Hogeschool Katholieke Hogeschool Antwerpen VZW contra Susan Romy Jozef Kuijpers.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Vredegerecht te Antwerpen.
Reenvio prejudicial — Diretiva 93/13/CEE — Cláusulas abusivas nos contratos celebrados entre um profissional e um consumidor — Apreciação oficiosa, pelo órgão jurisdicional nacional, da inclusão de um contrato no âmbito de aplicação desta diretiva — Artigo 2.o, alínea c) — Conceito de “profissional” — Estabelecimento de ensino superior cujo financiamento é assegurado, no essencial, por fundos públicos — Contrato relativo a um plano de pagamentos sem juros das propinas e de participação nas despesas de uma viagem de estudo.
Processo C-147/16.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2017:928

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

ELEANOR SHARPSTON

apresentadas em 30 de novembro de 2017 ( 1 )

Processo C‑147/16

Karel de Grote — Hogeschool Katholieke Hogeschool Antwerpen VZW

contra

Susan Romy Jozef Kuijpers

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Vredegerecht te Antwerpen (Julgado de Paz, Antuérpia, Bélgica)]

«Diretiva 93/13/CEE — Cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores — Apreciação oficiosa por um órgão jurisdicional nacional da inclusão de um contrato no âmbito de aplicação da Diretiva 93/13 — Artigo 2.o, alínea c) — Conceito de “profissional”»

1.

Quando um estabelecimento de ensino sem fins lucrativos oferece crédito aos seus alunos que lhes permitem pagar as propinas e o custo das visitas de estudo sob a forma de um plano de pagamento em prestações sem juros, atua como um «profissional» na aceção da Diretiva 93/13/CEE ( 2 )? Além disso, nas circunstâncias em que a estudante em questão não desempenhou um papel ativo nos processos subsequentes de recuperação do montante em dívida, acrescido de juros e de uma compensação para cobrir as despesas de cobrança, tem um órgão jurisdicional nacional a obrigação de apreciar oficiosamente se um contrato é abrangido pelo âmbito de aplicação da referida diretiva?

2.

Essas questões surgiram no quadro de um litígio entre um estabelecimento de ensino e um dos seus alunos, e proporcionam ao Tribunal a oportunidade de definir de forma mais criteriosa o âmbito de aplicação da Diretiva 93/13 e as competências e obrigações dos órgãos jurisdicionais nacionais ao abrigo da mesma.

Legislação

Diretiva 93/13

3.

A Diretiva 93/13 foi adotada com base no artigo 100.o‑A CEE (atual artigo 114.o TFUE). Os seus objetivos incluem a garantia de não inclusão de cláusulas abusivas nos contratos de consumo celebrados com consumidores e a proteção dos consumidores contra abusos de poder dos vendedores ou dos prestatários ( 3 ). Os Estados‑Membros podem assegurar aos consumidores um nível de proteção mais elevado através de disposições nacionais mais rigorosas do que as da diretiva ( 4 ).

4.

O décimo considerando da diretiva estabelece que as regras em matéria de condições abusivas são aplicáveis a «todos os contratos» celebrados entre um profissional e um consumidor. Indica explicitamente que, por conseguinte, são nomeadamente excluídos da diretiva os contratos de trabalho, os contratos relativos aos direitos sucessórios, os contratos relativos ao estatuto familiar, bem como os contratos relativos à constituição e aos estatutos das sociedades. No entanto, a diretiva é aplicável a todas as atividades profissionais, incluindo as de caráter público ( 5 ).

5.

O artigo 1.o, n.o 1, define o âmbito de aplicação da Diretiva 93/13:

«A presente diretiva tem por objetivo a aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros relativas às cláusulas abusivas em contratos celebrados entre profissionais e consumidores.»

6.

O artigo 2.o, alíneas b) e c), define os termos «consumidor» como «qualquer pessoa singular que, nos contratos abrangidos pela [Diretiva 93/13], atue com fins que não pertençam ao âmbito da sua atividade profissional» e «profissional» ( 6 ) como «qualquer pessoa singular ou coletiva que, nos contratos abrangidos pela [Diretiva 93/13], seja ativa no âmbito da sua atividade profissional, pública ou privada».

7.

O artigo 3.o, n.o 1, prevê que «[u]ma cláusula contratual que não tenha sido objeto de negociação individual é considerada abusiva quando, a despeito da exigência de boa fé, der origem a um desequilíbrio significativo[,] em detrimento do consumidor, entre os direitos e obrigações das partes decorrentes do contrato».

Legislação belga

8.

A Diretiva 93/13 foi transposta para o direito nacional pela Marktpraktijkenwet (Lei das práticas de mercado) de 6 de abril de 2010. Esta lei introduziu o termo «empresa», em vez do termo «profissional» utilizado no artigo 2.o, alínea c), daquela diretiva, a fim de definir o seu âmbito. O artigo I.1, n.o 1, do Wetboek Economisch Recht (Código de Direito Económico) define uma empresa como «qualquer pessoa singular ou coletiva que prossiga um objetivo económico a longo prazo, incluindo qualquer associação dessas pessoas».

9.

O artigo 806.o do Gerechtelijk Wetboek (Código de Processo Civil) estabelece as obrigações do órgão jurisdicional no caso de julgamentos à revelia: «num julgamento à revelia, o órgão jurisdicional deve julgar procedentes o pedido da parte presente, salvo se o processo judicial ou o pedido ou os fundamentos forem contrários à ordem pública».

Factos, processo e questões prejudiciais

10.

Susan Kuijpers era aluna da Karel de Grote Hogesschool (Escola Superior Karel de Grote, a seguir «KdG»). Em 3 de fevereiro de 2014, foi‑lhe exigido que procedesse ao pagamento do montante total de 1546 euros à KdG a título de propinas relativas aos anos académicos de 2012‑2013 e de 2013‑2014 e de contribuição para uma viagem de estudo. Uma vez que não conseguia pagar este montante de uma só vez, os serviços académicos da KdG (KdG studievoorzieningsdienst, a seguir «KdG Stuvo») autorizaram que o fizesse no quadro de um plano de pagamentos em prestações sem juros. Ao abrigo do referido plano, o KdG Stuvo pagaram a Susan Kuijpers o montante de que necessitava, para que pudesse pagar à KdG. A partir de 25 de fevereiro de 2014, Susan Kuijpers deveria restituir 200 euros por mês, durante sete meses, ao KdG Stuvo. A prestação final de 146 euros deveria ser paga até 25 de setembro de 2014.

11.

O contrato incluía a seguinte cláusula:

«Se o montante emprestado não for atempadamente restituído (em parte ou na íntegra), são automaticamente devidos, sem necessidade de interpelação, juros à taxa de 10% ao ano, calculados sobre o montante em dívida e desde a data de vencimento e de incumprimento. Será ainda devida uma compensação para cobrir as despesas de cobrança, convencionada em 10% sobre o montante em dívida, com um valor mínimo de 100 euros.»

12.

Apesar de ter recebido uma carta de interpelação formal, Susan Kuijpers não procedeu ao pagamento das prestações em causa.

13.

Em 27 de novembro de 2015, a KdG intentou uma ação contra Susan Kuijpers no Vredegerecht te Antwerpen (Julgado de Paz, Antuérpia, Bélgica) visando obter (ao abrigo do contrato celebrado com o KdG Stuvo) o capital em dívida (1546 euros), juros de mora de 10% a contar de 25 de fevereiro de 2014 (269,81 euros) e uma compensação (154,60 euros). Por decisão interlocutória de 4 de fevereiro de 2016, esse órgão jurisdicional reconheceu o direito da KdG à restituição do capital em dívida no valor de 1546 euros. No entanto, no que diz respeito aos juros e à compensação, procedeu à reabertura dos debates para tomar conhecimento da posição da KdG sobre a submissão de uma questão prejudicial ao Tribunal de Justiça da União Europeia. Em 4 de março de 2016, a KdG apresentou alegações orais a esse respeito. Susan Kuijpers não compareceu na audiência.

14.

O órgão jurisdicional nacional refere que, nos termos do artigo 806.o do Código do Processo Civil, uma vez que Susan Kuijpers não compareceu na audiência deve julgar procedente o pedido da KdG, salvo se este for contrário à ordem pública. Isto suscita, em primeiro lugar, a questão de saber se o órgão jurisdicional de reenvio pode apreciar oficiosamente se o contrato em que se baseia o pedido está abrangido pelo âmbito de aplicação da legislação nacional que transpõe a Diretiva 93/13 e, em segundo lugar, se a legislação nacional que se opõe a tal apreciação com base no facto de as disposições relativas às cláusulas contratuais abusivas não terem caráter obrigatório é compatível com a referida diretiva ( 7 ). O órgão jurisdicional de reenvio expressa igualmente dúvidas quanto à compatibilidade da legislação nacional que limita o âmbito de aplicação das cláusulas contratuais abusivas aos contratos celebrados entre consumidores e «empresas» ( 8 ) com a Diretiva 93/13.

15.

Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio solicitou ao Tribunal de Justiça que esse pronunciasse sobre as seguintes questões:

«1)

No caso de uma ação instaurada contra um consumidor sobre o cumprimento de um contrato e se o tribunal nacional, segundo as normas de processo nacionais, oficiosamente apenas tiver competência para examinar se o pedido é contrário às normas nacionais de ordem pública, esse tribunal nacional é igualmente competente para apreciar oficiosamente, mesmo em caso de revelia, o caráter eventualmente abusivo da cláusula e determinar se o contrato é abrangido pelo âmbito de aplicação da [Diretiva 93/13], tal como transposta para o direito belga?

2)

Uma instituição de ensino independente que preste um serviço de ensino subsidiado a um consumidor pelo qual cobra uma propina, eventualmente acrescida dos montantes correspondentes à restituição de custos suportados pela instituição de ensino, deve ser considerada uma empresa na aceção do Direito [da União]?

3)

Um contrato entre um consumidor e uma instituição de ensino independente subsidiada, relativo à prestação de um serviço de ensino subsidiado, é abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva [93/13], e deve tal instituição de ensino independente que presta um serviço de ensino subsidiado a um consumidor, no tocante ao contrato de prestação desse serviço de ensino, ser considerada um profissional, na aceção desta diretiva?»

16.

Os Governos austríaco, belga e polaco, bem como a Comissão Europeia, apresentaram observações escritas. Na audiência de 9 de março de 2017, o Governo belga e a Comissão apresentaram alegações orais e responderam às questões do Tribunal de Justiça.

Questão 1

17.

Com esta questão o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se tem competência para apreciar oficiosamente se determinado contrato está abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva 93/13, ainda que o consumidor não tenha comparecido na audiência. Esta questão está ligada à existência de uma disposição nacional que determina que os tribunais apenas são competentes para examinar oficiosamente se o pedido é contrário às normas nacionais de ordem pública. Analisarei essa questão em primeiro lugar, uma vez que a questão de saber se a Diretiva 93/13 é aplicável (e se a sua aplicabilidade pode ser examinada ex ofício) precede logicamente as questões relativas ao estatuto das partes num determinado contrato e à legalidade dos seus termos.

18.

A Comissão alega que a disposição que determina que as cláusulas contratuais abusivas não são vinculativas para o consumidor tem caráter imperativo. Os órgãos jurisdicionais nacionais têm, por conseguinte, a competência e a obrigação para apreciar oficiosamente se um contrato é abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva 93/13, mesmo que o consumidor não compareça na audiência.

19.

O Governo belga concorda com a conclusão da Comissão. Argumenta que o artigo 806.o do Código do Processo Civil está em conformidade com essa interpretação, uma vez que, ao analisar se deve ou não evocar oficiosamente uma questão de ordem pública, um órgão jurisdicional nacional deve começar por determinar se a disposição se insere, de facto, no âmbito de aplicação das normas de ordem pública. O princípio da equivalência exige que se aplique o mesmo raciocínio no que respeita às disposições das diretivas, como a Diretiva 93/13.

20.

É, com efeito, jurisprudência constante que um órgão jurisdicional nacional deve examinar oficiosamente se determinada cláusula de um contrato celebrado entre um profissional e um consumidor é abrangido pelo âmbito de aplicação da referida diretiva e, em caso afirmativo, se a referida cláusula é abusiva ( 9 ).

21.

Contudo, persiste a questão de saber se o órgão jurisdicional nacional está sujeito à mesma obrigação quando o consumidor é revel.

22.

Para responder a esta questão, cumpre ter em conta diversos princípios já consagrados na jurisprudência do Tribunal de Justiça.

23.

Em primeiro lugar, «o sistema de proteção instituído pela Diretiva 93/13 assenta, com efeito, na ideia de que o consumidor se encontra numa situação de inferioridade relativamente ao profissional, no que respeita tanto ao poder de negociação como ao nível de informação, situação esta que o leva a aderir às condições redigidas previamente pelo profissional, sem poder influenciar o seu conteúdo» ( 10 ).

24.

Em segundo lugar, a disposição segundo a qual as «cláusulas abusivas não vinculam o consumidor constitui uma disposição imperativa que pretende substituir o equilíbrio formal que o contrato estabelece entre os direitos e as obrigações dos cocontratantes por um equilíbrio real de molde a restabelecer a igualdade entre eles» [ ( 11 )]. Deve ser considerada «uma norma equivalente às regras nacionais que ocupam, na ordem jurídica interna, o grau de normas de ordem pública» ( 12 ). A análise da aplicabilidade da diretiva a uma determinada situação precede logicamente aquela análise (v. o n.o 20 acima e notas de pé de página).

25.

Em terceiro lugar, a situação de desigualdade existente entre o consumidor e o profissional só pode ser compensada por uma intervenção positiva, alheia às partes no contrato ( 13 ). Essa intervenção positiva consiste na análise oficiosa, pelo órgão jurisdicional, da questão de saber se um contrato é abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva 93/13 e do caráter abusivo ou não das suas cláusulas. Com efeito, a proteção conferida aos consumidores pela diretiva em causa estende‑se os casos em que o consumidor não invoca o caráter abusivo das cláusulas, ou porque desconhece os seus direitos ou porque é dissuadido de os exercer devido aos custos de uma ação judicial ( 14 ).

26.

Além disso, de acordo com o princípio da autonomia processual dos Estados‑Membros, na falta de harmonização dos mecanismos nacionais, as modalidades de aplicação de procedimentos nacionais que tornam possível essa intervenção positiva dependem da ordem jurídica interna dos Estados‑Membros, na condição, porém, de não serem menos favoráveis do que as que regulam situações análogas de natureza interna (princípio da equivalência) e de não tornarem impossível, na prática, ou excessivamente difícil, o exercício dos direitos conferidos aos consumidores pelo direito da União (princípio da efetividade) ( 15 ).

27.

O Tribunal de Justiça teve a oportunidade de se pronunciar sobre os processos sem contraditório no acórdão Asturcom Telecomunicaciones, que dizia respeito a um contrato que comportava uma cláusula arbitral. Foi proferida uma decisão arbitral sem a comparência da consumidora, a qual não recorreu da mesma dentro do prazo previsto na legislação nacional. Por esta razão, a decisão tornou‑se definitiva. Quando a Asturcom procurou executar a referida decisão, o órgão jurisdicional nacional competente considerou a cláusula arbitral abusiva. No entanto, a legislação nacional aplicável não continha qualquer disposição relativa à apreciação do caráter abusivo das cláusulas de arbitragem pelo órgão jurisdicional competente para conhecer da ação executiva de uma decisão arbitral que se tornou definitiva. Nessas circunstâncias, o órgão jurisdicional nacional inquiriu o Tribunal de Justiça sobre se poderia conhecer oficiosamente da nulidade da convenção arbitral e, consequentemente, anular a decisão arbitral por considerar que essa convenção continha uma cláusula arbitral abusiva ( 16 ).

28.

Tendo em conta a importância do princípio da res judicata, o Tribunal de Justiça declarou que a necessidade de respeitar o princípio da efetividade não pode ter como efeito a exigência de que um órgão jurisdicional nacional compense integralmente uma omissão processual de um consumidor que não interveio no processo arbitral nem interpôs um recurso de anulação da decisão arbitral, a qual, por consequência, se tornou definitiva ( 17 ).

29.

No entanto, considerou que decorre do princípio da equivalência que, na medida em que o juiz nacional chamado a conhecer de uma ação executiva de uma decisão arbitral definitiva deva, segundo as regras processuais internas, apreciar oficiosamente se uma cláusula arbitral é contrária às regras nacionais de ordem pública, lhe incumbe igualmente apreciar oficiosamente o caráter abusivo dessa cláusula à luz da diretiva, desde que disponha dos elementos jurídicos e de facto necessários para esse efeito ( 18 ).

30.

No processo VB PénzügyiLízing, o órgão jurisdicional de reenvio procurava esclarecer se tinha a obrigação de proceder oficiosamente a uma instrução para apurar os elementos de facto e de direito necessários à apreciação do caráter eventualmente abusivo de uma cláusula contratual atributiva de competência jurisdicional territorial exclusiva, no caso em que o direito nacional só prevê essa instrução se uma das partes o requerer ( 19 ). O Tribunal de Justiça declarou que, a fim de garantir a eficácia da proteção dos consumidores, o órgão jurisdicional nacional deve, em todos os casos e quaisquer que sejam as normas de direito interno, determinar se a cláusula controvertida foi ou não objeto de negociação individual entre um profissional e um consumidor, para estabelecer se se insere no âmbito de aplicação da Diretiva 93/13 ( 20 ).

31.

Esta abordagem foi confirmada no processo Banco Español de Crédito (processo relativo ao eventual caráter abusivo de uma cláusula sobre juros de mora pelo atraso de pagamento das prestações de um empréstimo). O Tribunal considerou que uma disposição processual que não permite ao tribunal em que é apresentado um pedido de injunção de pagamento, e na falta de oposição do consumidor, apreciar oficiosamente o caráter abusivo de uma cláusula de juros de mora constante de um contrato celebrado entre um profissional e um consumidor, mesmo quando disponha dos elementos de direito e de facto necessários para esse efeito, é suscetível de prejudicar a eficácia da tutela prevista na Diretiva 93/13 ( 21 ).

32.

No processo ERSTE Bank Hungary, o Tribunal desenvolveu aquela afirmação, explicando que a tutela jurisdicional efetiva garantida pela Diretiva 93/13 assenta na premissa de que uma das partes no contrato recorre previamente aos órgãos jurisdicionais nacionais ( 22 ). Observo que, nessas circunstâncias, é provável que o consumidor, caso não tenha sido a parte a instaurar o processo, se veja prejudicado no final do mesmo; e o processo afetará a sua situação jurídica, tenha ele intervindo ou não no processo.

33.

Na minha opinião, é possível extrair os seguintes princípios da jurisprudência: i) o princípio da efetividade não exige que o sistema judicial nacional intervenha quando nenhuma das partes num contrato tenha instaurado uma ação perante os órgãos jurisdicionais nacionais; ii) quando tenham sido instauradas ações, esses órgãos jurisdicionais devem, oficiosamente, em todos os casos e independentemente das disposições do respetivo direito interno, analisar se um contrato é abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva 93/13; iii) se for o caso, devem também, oficiosamente, analisar o caráter abusivo ou não das cláusulas desse contrato; iv) o caráter imperativo das disposições previstas na diretiva impõe a sua aplicação, independentemente do estatuto conferido às normas nacionais que as executam pelo ordenamento jurídico nacional e pelas ações ou alegações processuais das partes.

34.

O facto de o consumidor não ter sido a parte que instaurou a ação, de não ter comparecido na audiência ou de não ter invocado a Diretiva 93/13 não pode alterar essa conclusão.

35.

Neste contexto, a legislação belga que autoriza os órgãos jurisdicionais nacionais a apreciar oficiosamente se um o pedido é ou não contrário às regras nacionais de ordem pública, sem que, simultaneamente, lhe assista o direito de analisar se o pedido em questão viola os princípios estabelecidos pela Diretiva 93/13, pode afigurar‑se problemática.

36.

Contudo, estas regras devem ser interpretadas de acordo com o direito da UE. Quando o juiz nacional for competente, segundo as normas de processo internas, para examinar oficiosamente a validade de um ato jurídico à luz das normas nacionais de ordem pública, deve exercer igualmente essa competência no que respeita às normas de ordem pública da UE, em conformidade com os princípios da equivalência e efetividade. Com base nessa interpretação, concordo com a abordagem do Governo belga, baseada no acórdão AsbeekBrusse e de Man Garabito ( 23 ), segundo a qual, nos termos do artigo 806.o do Código de Processo Civil, o órgão jurisdicional nacional tem a obrigação de analisar oficiosamente o caráter eventualmente abusivo de uma cláusula à luz da Diretiva 93/13 da mesma maneira que o faz relativamente às normas nacionais de ordem pública.

37.

Por conseguinte, concluo que um órgão jurisdicional nacional tem a competência e a obrigação de apreciar oficiosamente se um contrato é abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva 93/13, mesmo que não tenha sido especificamente convocado a fazê‑lo, nomeadamente porque o consumidor não interveio no processo.

Questões 2 e 3

Observações gerais

38.

Antes de abordar a substância das questões 2 e 3, cuja análise beneficia se feita em conjunto, há que definir o seu conteúdo.

39.

O recurso ao termo «empresa» na redação da questão 2 é curioso no contexto da proteção do consumidor. Suponho que resultou da redação das disposições da legislação nacional subjacentes a este pedido de decisão prejudicial.

40.

Como explica o Governo belga nas suas observações escritas, o termo «empresa», que tem a sua origem no direito da concorrência, foi utilizado pelo legislador belga a fim de transpor para a ordem jurídica nacional o termo «profissional» usado no artigo 2.o, alínea c) da Diretiva 93/13 ( 24 ). É provável que tenha isso que levou o órgão jurisdicional nacional a perguntar se uma instituição de ensino independente que preste um serviço de ensino subsidiado, como a KdG no presente processo, pode ser considerada uma «empresa» na aceção do direito da União.

41.

Contudo, decorre da exigência de uma aplicação uniforme do direito da União que, na medida em que uma disposição do direito da União não remeta para o direito dos Estados‑Membros no que respeita a um conceito específico, este último deve ser objeto, em toda a União Europeia, de uma interpretação autónoma e uniforme, que deve ser procurada tendo em conta o contexto da disposição e o objetivo prosseguido pela regulamentação em causa ( 25 ).

42.

Com efeito, a Diretiva 93/13 define o termo «profissional» sem remeter para a legislação nacional. Daqui decorre que essa expressão deve ser considerada, para efeitos de aplicação da diretiva, como designando um conceito autónomo de direito da União que deve ser interpretado de forma uniforme em toda a União Europeia.

43.

O significado do termo «profissional» não pode assim depender da forma como o legislador nacional decidiu transpor para o direito nacional o referido termo. Quer a legislação nacional que transpõe a diretiva utilize, ou não, «profissional», «atividade profissional», «empresa» ou outros termos, estes devem ser interpretados de forma uniforme de acordo com a definição estabelecida no artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 93/13. Por conseguinte, o que interessa neste caso não é o significado do conceito de «empresa» no contexto do direito da concorrência, ou a forma como é interpretado na jurisprudência relativa à prestação de serviços. O que interessa é se um contrato celebrado entre um consumidor e uma entidade como a KdG é abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva 93/13.

44.

Neste contexto, entendo o objetivo do órgão jurisdicional de reenvio em submeter ambas as questões 2 e 3 para determinar se uma instituição de ensino independente que presta um serviço de ensino subsidiado, como é o caso da KdG, deve ser considerada um «profissional», na aceção da definição constante do artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 93/13.

O âmbito do termo «profissional»

45.

O Governo belga alega que uma instituição de ensino independente que preste um serviço de ensino subsidiado, como a KdG, não pode ser considerada um «profissional», na aceção da Diretiva 93/13. Um contrato de «prestação de serviços» pressupõe um elemento de remuneração que neste caso está ausente ou, se não ausente, é mínimo. Isso ocorre porque o estabelecimento público em questão desenvolve uma atividade nos domínios social, cultural e educativo, direcionada para a população no seu conjunto. O Governo austríaco é da mesma opinião.

46.

Em contrapartida, o Governo polaco alega que essa instituição de ensino é um «profissional» na aceção da diretiva. O contrato entre uma instituição de ensino e um estudante faz parte das atividades profissionais dessa instituição. O facto de ter ou não lucro em resultado das mesmas é irrelevante.

47.

A Comissão considera que deve ser feita uma distinção entre a principal atividade educativa da KdG e a sua atividade secundária ocasional como instituição de crédito. O presente caso diz respeito à última. Embora a principal atividade educativa da KdG seja uma atividade de interesse geral não abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 93/13, a sua atividade secundária ocasional já se inscreve no âmbito de aplicação da mesma.

48.

Na minha opinião, o ponto de partida para a interpretação de «profissional» deve ser a redação efetiva da definição constante do artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 93/13. Esse conceito inclui os seguintes elementos: «qualquer pessoa singular ou coletiva», «ativa no âmbito da sua atividade profissional, pública ou privada», e «contratos abrangidos pela presente diretiva».

49.

Essa definição deve ser interpretada procurando ter em conta o seu contexto e o objetivo prosseguido pela regulamentação em causa ( 26 ). Tem caráter objetivo e está baseada em determinados elementos verificáveis ( 27 ). O termo «profissional» é específico da Diretiva 93/13 e, na minha opinião, mais lato do que os termos utilizados em vários outros instrumentos legislativos em matéria de defesa do consumidor ( 28 ).

50.

A primeira parte desta definição, a saber, «qualquer pessoa singular ou coletiva […] pública ou privada», torna claro que a qualificação, o estatuto jurídico e as características específicas da entidade em questão ao abrigo do direito nacional são desprovidos de pertinência para efeitos da sua qualificação como «profissional» ( 29 ).

51.

A utilização da palavra «qualquer» indica que a definição deve ser interpretada em sentido lato, por forma a abranger todas as pessoas singulares ou coletivas que possam impor cláusulas contratuais abusivas aos consumidores.

52.

A segunda parte da definição exige que o profissional seja «ativ[o] no âmbito da sua atividade profissional».

53.

A diretiva não delimita de forma alguma as atividades desde que consistam na atividade de venda de bens e de prestação de serviços ( 30 ). A abordagem é funcional: o contrato deve estar enquadrado nas atividades realizadas no âmbito da atividade profissional da pessoa. A definição de «consumidor» e a definição de «profissional» dependem da esfera de atividade da pessoa em questão ( 31 ). O «consumidor» e o «profissional» encontram‑se nos extremos opostos na transação legal. O consumidor, considerado vulnerável e numa posição de inferioridade, situa‑se num desses extremos; e o profissional, que está numa posição de força que lhe permite impor os seus próprios termos relativamente à transação, situa‑se na outra extremidade. A definição não contém qualquer requisito relativo à natureza ou à finalidade das atividades do profissional.

54.

Além disso, não há nada na diretiva que exclua do seu âmbito um determinado tipo de atividade profissional. É verdade que o décimo considerando refere que existem vários tipos de contratos que não devem ser abrangidos, como os relativos aos direitos sucessórios ( 32 ), mas não existe nenhuma disposição equivalente aplicável a qualquer tipo específico de atividade profissional. Pelo contrário, o décimo quarto considerando afirma expressamente que a diretiva se aplica igualmente às atividades profissionais de caráter público.

55.

No acórdão Šiba, o Tribunal de Justiça considerou que um advogado que presta, no quadro da sua atividade profissional, a título oneroso, serviços jurídicos em benefício de uma pessoa singular que atua para fins privados é um «profissional», na aceção do artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 93/13 e que o caráter público dessas atividades não invalida essa conclusão ( 33 ).

56.

No contexto mais amplo das diretivas relativas aos direitos do consumidor, o Tribunal de Justiça considerou igualmente que o termo «profissional» utilizado no quadro da Diretiva relativa às práticas comerciais desleais não exclui do seu âmbito de aplicação as entidades que prosseguem uma missão de interesse geral. Por conseguinte, o Tribunal determinou que «profissional» inclui uma entidade de direito público encarregada de uma missão de interesse geral, como a gestão de um regime legal de seguro de doença ( 34 ). Em minha opinião, esta abordagem pode legitimamente ser transposta para o conceito de «profissional» no contexto da Diretiva 93/13 (que, além do mais — ao contrário da Diretiva relativa às práticas comerciais desleais — declara expressamente que inclui atividades de caráter público no seu âmbito de aplicação).

57.

Embora o Tribunal se tivesse referido a «profissional» como uma pessoa que exerce uma atividade remunerada, fê‑lo com o objetivo de salientar que não excluía do âmbito de aplicação da Diretiva relativa às práticas comerciais desleais as entidades que prosseguem uma missão de interesse geral nem as que se apresentam sob um estatuto de direito público ( 35 ). As missões de interesse geral são frequente e normalmente conduzidas sem fins lucrativos. Por conseguinte, sou de opinião que o caráter lucrativo ou não lucrativo da organização é irrelevante para a definição de «profissional» para efeitos de um determinado contrato.

58.

No que diz respeito ao caráter do serviço prestado, não considero que o argumento apresentado pelo Governo belga e pela Comissão de que o ensino público, financiado principalmente pelo orçamento do Estado, não pode ser considerado um serviço nos termos do artigo 57.o do TFUE signifique que, consequentemente, os estabelecimentos de ensino estão excluídos do âmbito de aplicação da Diretiva 93/13 quando celebram contratos que incluem cláusulas abusivas.

59.

É, efetivamente, verdade que o Tribunal de Justiça declarou que os cursos oferecidos por determinadas instituições de ensino que fazem parte de um sistema de ensino público financiado total ou principalmente por fundos públicos estão excluídos da definição de serviços, uma vez que ao estabelecer e manter tal sistema, o Estado não pretende envolver‑se em atividades remuneradas, mas cumprir a sua missão nos domínios social, cultural e educativo perante a sua população ( 36 ).

60.

Contudo, existe também jurisprudência assente no sentido de que o ensino ministrado por estabelecimentos de ensino financiados essencialmente por fundos privados (nomeadamente, mas não necessariamente, pelos estudantes e pelos seus pais) constitui um serviço, na aceção do artigo 57.o do TFUE, uma vez que o fim prosseguido por esses estabelecimentos consiste em proporcionar um serviço mediante remuneração ( 37 ).

61.

Resulta destas duas linhas de jurisprudência que o Tribunal de Justiça considera que o elemento essencial na definição de serviços para efeitos do artigo 57.o do TFUE é o facto de o serviço ser prestado tendo em vista a remuneração e não o caráter das missões realizadas.

62.

A jurisprudência sobre a Diretiva relativa às práticas comerciais desleais ( 38 ) confirma essa abordagem, na medida em que inclui uma entidade de direito público encarregada de uma missão de interesse geral, como a gestão de um regime legal de seguro de doença, no âmbito dessa diretiva ( 39 ). A Diretiva relativa às práticas comerciais desleais tem a mesma base jurídica que a Diretiva 93/13, nomeadamente o artigo 95.o CE (antigo 100.o‑A CEE, agora artigo 114.o TFUE) sobre a aproximação das legislações. Essa base jurídica sublinha expressamente a necessidade de legislar em prol de um nível de proteção ao consumidor elevado ( 40 ), um objetivo que não é abordado no artigo 57.o do TFUE sobre a livre prestação de serviços.

63.

Por último, a redação da Diretiva 93/13 não inclui qualquer limitação no que respeita ao caráter e finalidade das atividades em questão ou à forma como são financiadas. Pelo contrário, inclui expressamente atividades de caráter público no seu âmbito de aplicação ( 41 ).

64.

Por conseguinte, considero que o facto de uma pessoa singular ou coletiva poder prestar um serviço de ensino subsidiado não obsta a que seja considerada «profissional» na aceção do artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 93/13.

65.

No que respeita à terceira parte da definição de «profissional» (contratos abrangidos pela diretiva), o artigo 1.o, n.o 1, e o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 deixam claro que a diretiva se aplica às cláusulas constantes de «contratos celebrados entre profissionais e consumidores» que não tenham sido objeto de «negociação individual» ( 42 ). O décimo considerando da diretiva sublinha o âmbito alargado desse conceito. «Todos os contratos» celebrados entre um profissional e um consumidor (com exceção de contratos de trabalho, contratos relativos aos direitos sucessórios, contratos relativos ao estatuto familiar, bem como os contratos relativos à constituição e aos estatutos das sociedades) são abrangidos pela diretiva ( 43 ). Um contrato pode ser escrito ou oral ( 44 ). O objeto do contrato é irrelevante para a definição do âmbito de aplicação da diretiva ( 45 ).

66.

Fundamentalmente, é com referência à qualidade dos contratantes, consoante atuem ou não no quadro da sua atividade profissional, que a Diretiva 93/13 define os contratos a que se aplica. Esse critério corresponde à ideia em que assenta o sistema de proteção instituído pela mesma diretiva, nomeadamente de que o consumidor se encontra numa situação de inferioridade relativamente ao profissional, no que respeita tanto ao poder de negociação como ao nível de informação. Consequentemente, o consumidor pode concluir que tem de aderir às condições redigidas previamente pelo profissional, sem poder influenciar o seu conteúdo ( 46 ).

67.

Resulta do exposto que um «profissional», na aceção da Diretiva 93/13, é uma pessoa singular ou coletiva, pública ou privada, independentemente do seu estatuto jurídico ou características que: (i) fornece bens ou serviços de todos os tipos e descrições; (ii) celebra um contrato com um consumidor; em que (iii) esse contrato está relacionado com as suas atividades profissionais. A natureza (pública ou privada), o objeto (missões públicas ou privadas, missões de interesse geral) e o resultado (com fins lucrativos ou sem fins lucrativos) são, todos eles, irrelevantes. A finalidade do contrato é igualmente imaterial, desde que seja celebrado entre um consumidor e um profissional e se relacione com a atividade profissional deste último.

68.

Considero, por conseguinte, que uma instituição de ensino independente que preste um serviço de ensino subsidiado pode ser considerada um «profissional», na aceção da Diretiva 93/13, quando celebra um contrato abrangido por essa diretiva para fins relacionados com as suas atividades. Se tal é, ou não, o caso no presente processo e se o contrato celebrado entre Susan Kuijpers e a KdG infringe as disposições imperativas estabelecidas nessa diretiva, compete ao órgão jurisdicional nacional determinar.

Conclusão

69.

À luz das considerações anteriores, proponho ao Tribunal de Justiça que responda ao pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Vredegerecht te Antwerpen (Julgado de Paz, Antuérpia, Bélgica) da seguinte forma:

Um órgão jurisdicional nacional tem a competência e a obrigação de apreciar oficiosamente se um contrato está abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva 93/13/CEE do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa a cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores, mesmo que não tenha sido especificamente solicitado a fazê‑lo, nomeadamente porque o consumidor não interveio no processo.

Uma instituição de ensino independente que preste um serviço de ensino subsidiado pode ser considerada como um «profissional», na aceção da Diretiva 93/13, quando esta celebra um contrato abrangido por essa diretiva para fins relacionados com as suas atividades. Compete ao órgão jurisdicional nacional determinar, em qualquer caso específico, se assim é e se o contrato em questão infringe as disposições imperativas estabelecidas na referida diretiva.


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) Diretiva do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores (JO 1993, L 95, p. 29).

( 3 ) V. quarto e nono considerandos.

( 4 ) Décimo segundo considerando.

( 5 ) Décimo quarto considerando.

( 6 ) Os textos em língua francesa e neerlandesa recorrem a um único termo, «professionnel» e «verkoper» respetivamente. NT: o texto em língua portuguesa recorre igualmente a um único termo: «profissional».

( 7 ) O órgão jurisdicional nacional expressa dúvidas quanto à natureza das normas nacionais relativas às cláusulas abusivas. Não é certo que possam ser consideradas disposições de «ordem pública» ao abrigo da legislação nacional.

( 8 ) O conceito de «empresa» na legislação de transposição belga pode ser entendido como mais restrito do que o de «profissional» (parte da definição do âmbito de aplicação ratione personae da Diretiva 93/13), excluindo assim os contratos como o que está em causa do âmbito de aplicação da diretiva.

( 9 ) Acórdão de 21 de fevereiro de 2013, Banif Plus Bank (C‑472/11, EU:C:2013:88, n.o 24 e jurisprudência referida). V. igualmente o acórdão de 9 de novembro de 2010, VB PénzügyiLízing (C‑137/08, EU:C:2010:659, n.o 56). Neste último acórdão, o Tribunal de Justiça estabeleceu expressamente a distinção, nos n.os 49 a 52, entre a análise da inclusão ou não de um contrato no âmbito de aplicação da Diretiva 93/13 (primeira etapa do raciocínio) e a relativa ao caráter abusivo ou não das suas cláusulas (segunda etapa do raciocínio).

( 10 ) Acórdão de 21 de fevereiro de 2013, Banif Plus Bank (C‑472/11, EU:C:2013:88, n.o 19 e jurisprudência referida).

( 11 ) Acórdão de 30 de maio de 2013, AsbeekBrussee e de Man Garabito (C‑488/11, EU:C:2013:341, n.o 38 e jurisprudência referida).

( 12 ) Acórdão de 6 de outubro de 2009, Asturcom Telecomunicaciones (C‑40/08, EU:C:2009:615, n.o 52).

( 13 ) Acórdão de 30 de maio de 2013, AsbeekBrussee e de Man Garabito (C‑488/11, EU:C:2013:341, n.o 39).

( 14 ) Acórdão de 26 de outubro de 2006, Mostaza Claro (C‑168/05, EU:C:2006:675, n.o 29) (v. n.o 20, supra). No processo em apreço, a eventualidade de Susan Kuijpers ter tido dificuldades financeiras para cumprir o plano de pagamentos prestacionais de 200 euros mensais junto do KdG Stuvo poderá tê‑la levado a pôr de parte a ideia de contratar um advogado para a ajudar na sua defesa na ação judicial subsequente.

( 15 ) Acórdão de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 46 e jurisprudência referida). V., também, as minhas conclusões no processo Faber (C‑497/13, EU:C:2014:2403, n.os 57 a 59).

( 16 ) Acórdão de 6 de outubro de 2009, Asturcom Telecomunicaciones (C‑40/08, EU:C:2009:615, n.os 20 a 27).

( 17 ) Acórdão de 6 de outubro de 2009, Asturcom Telecomunicaciones (C‑40/08, EU:C:2009:615, n.o 47).

( 18 ) Acórdão de 6 de outubro de 2009, Asturcom Telecomunicaciones (C‑40/08, EU:C:2009:615, n.o 53).

( 19 ) Acórdão de 9 de novembro de 2010, VB PénzügyiLízing (C‑137/08, EU:C:2010:659, n.o 45).

( 20 ) Acórdão de 9 de novembro de 2010, VB PénzügyiLízing (C‑137/08, EU:C:2010:659, n.o 51).

( 21 ) Acórdão de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito (C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 53).

( 22 ) Acórdão de 1 de outubro de 2015, ERSTE Bank Hungary (C‑32/14, EU:C:2015:637, n.o 63).

( 23 ) Acórdão de 30 de maio de 2013 (C‑488/11, EU:C:2013:341, n.o 45).

( 24 ) V. n.o 8, supra.

( 25 ) Acórdão de 7 de setembro de 2017, Schottelius (C‑247/16, EU:C:2017:638, n.o 31 e jurisprudência referida).

( 26 ) Acórdão de 9 de novembro de 2016, Wathelet (C‑149/15, EU:C:2016:840, n.o 28 e jurisprudência referida).

( 27 ) V., por analogia, conclusões do advogado‑geral H. Saugmandsgaard Øe em Wathelet (C‑149/15, EU:C:2016:217, n.o 44).

( 28 ) A diferente terminologia utilizada nesses instrumentos reflete, obviamente, as diferenças no seu âmbito de aplicação. Assim, no artigo 1.o, n.o 2, alíneas c) e d), da Diretiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio de 1999, relativa a certos aspetos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas (JO 1999, L 171, p. 12) são utilizados o termo «vendedor» e «produtor»; no artigo 2.o, alínea b), da Diretiva 2005/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2005, relativa às práticas comerciais desleais das empresas face aos consumidores no mercado interno e que altera a Diretiva 84/450/CEE do Conselho, as Diretivas 97/7/CE, 98/27/CE e 2002/65/CE e o Regulamento (CE) n.o 2006/2004 («Diretiva relativa às práticas comerciais desleais») (JO 2005, L 149, p. 22) é utilizado o termo «profissional»; no artigo 3.o, alínea b), da Diretiva 2008/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2008, relativa a contratos de crédito aos consumidores e que revoga a Diretiva 87/102/CEE do Conselho (JO 2008, L 133, p. 66) é utilizado o termo «mutuante»; e no artigo 2.o, ponto 2, da Diretiva 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2011, relativa aos direitos dos consumidores, que altera a Diretiva 93/13/CEE do Conselho e a Diretiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e que revoga a Diretiva 85/577/CEE do Conselho e a Diretiva 97/7/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2011, L 304, p. 64) é utilizado o termo «profissional».

( 29 ) V., por analogia, acórdão de 3 de outubro de 2013, Zentrale zur Bekämpfung unlauteren Wettbewerbs (C‑59/12, EU:C:2013:634, n.o 26).

( 30 ) Sétimo considerando.

( 31 ) V. conclusões do advogado‑geral P. Cruz Villalón em Costea (C‑110/14, EU:C:2015:271, n.o 20).

( 32 ) Curiosamente, não existe qualquer disposição substantiva que confira efeito específico às exclusões referidas na terceira parte desse considerando.

( 33 ) Acórdão de 15 de janeiro de 2015, Šiba (C‑537/13, EU:C:2015:14, n.os 24 e 25).

( 34 ) Acórdão de 3 de outubro de 2013, Zentrale zur Bekämpfung unlauteren Wettbewerbs (C‑59/12, EU:C:2013:634, n.os 37 e 41).

( 35 ) Acórdão de 3 de outubro de 2013, Zentrale zur Bekämpfung unlauteren Wettbewerbs (C‑59/12, EU:C:2013:634, n.o 32).

( 36 ) Acórdão de 7 de dezembro de 1993, Wirth (C‑109/92, EU:C:1993:916, n.o 15).

( 37 ) Acórdão de 20 de maio de 2010, Zanotti (C‑56/09, EU:C:2010:288, n.os 32 e 33 e jurisprudência referida).

( 38 ) V. n.o 56, supra.

( 39 ) Acórdão de 3 de outubro de 2013, Zentrale zur Bekämpfung unlauteren Wettbewerbs (C‑59/12, EU:C:2013:634, n.os 37 e 41).

( 40 ) V. artigo 100.o‑A, n.o 3, CEE e artigo 95.o, n.o 3, CE.

( 41 ) Décimo quarto considerando. V., também, acórdão de 15 de janeiro de 2015, Šiba (C‑537/13, EU:C:2015:14, n.os 24 e 25).

( 42 ) Acórdão de 15 de janeiro de 2015, Šiba (C‑537/13, EU:C:2015:14, n.o 19).

( 43 ) Décimo considerando.

( 44 ) Décimo primeiro considerando.

( 45 ) Despacho de 14 de setembro de 2016, Dumitraș (C‑534/15, EU:C:2016:700, n.o 27).

( 46 ) Acórdão de 15 de janeiro de 2015, Šiba (C‑537/13, EU:C:2015:14, n.os 21 e 22 e jurisprudência referida).

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