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Document 62015CO0517

Despacho do vice-presidente do Tribunal de Justiça de 14 de janeiro de 2016.
AGC Glass Europe SA e o. contra Comissão Europeia.
Processo de medidas provisórias – Recurso de decisão do Tribunal Geral – Suspensão da execução de um acórdão do Tribunal Geral da União Europeia – Pedido de tratamento confidencial de determinadas informações que figuram numa decisão da Comissão que declara a existência de um cartel no mercado europeu do vidro destinado aos veículos automóveis – Decisão de indeferimento da Comissão e acórdão do Tribunal Geral que nega provimento ao recurso de anulação dessa decisão – Urgência – Prejuízo grave e irreparável – Inexistência.
Processo C-517/15 P-R.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:21

DESPACHO DO VICE‑PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

14 de janeiro de 2016 ( *1 )

«Processo de medidas provisórias — Recurso de decisão do Tribunal Geral — Suspensão da execução de um acórdão do Tribunal Geral da União Europeia — Pedido de tratamento confidencial de determinadas informações que figuram numa decisão da Comissão que declara a existência de um cartel no mercado europeu do vidro destinado aos veículos automóveis — Decisão de indeferimento da Comissão e acórdão do Tribunal Geral que nega provimento ao recurso de anulação dessa decisão — Urgência — Prejuízo grave e irreparável — Inexistência»

No processo C‑517/15 P‑R,

que tem por objeto um pedido de suspensão da execução nos termos dos artigos 278.° TFUE e 279.° TFUE, apresentado em 25 de setembro de 2015,

AGC Glass Europe SA, com sede em Bruxelas (Bélgica),

AGC Automotive Europe SA, com sede em Fleurus (Bélgica),

AGC França SAS, com sede em Boussois (França),

AGC Flat Glass Italia Srl, com sede em Cuneo (Itália),

AGC Glass UK Ltd, com sede em Northampton (Reino Unido),

AGC Glass Germany GmbH, com sede em Wegberg (Alemanha),

representadas por L. Garzaniti, A. Burckett St Laurent e F. Hoseinian, avocats,

recorrentes no recurso de decisão do Tribunal Geral,

sendo a outra parte no processo:

Comissão Europeia, representada por G. Meessen, P. Van Nuffel e F. van Schaik, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida em primeira instância,

O VICE‑PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

ouvido o advogado‑geral, M. Szpunar,

profere o presente

Despacho

1

Com o seu recurso, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 25 de setembro de 2015, a AGC Glass Europe SA, a AGC Automotive Europe SA, a AGC France SAS, a AGC Flat Glass Italia Srl, a AGC Glass UK Ltd e a AGC Glass Germany GmbH pediram ao Tribunal de Justiça a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 15 de julho de 2015, AGC Glass Europe e o./Comissão (T‑465/12, EU:T:2015:505, a seguir «acórdão recorrido»), que negou provimento ao recurso de anulação da Decisão C (2012) 5719 final da Comissão, de 6 de agosto de 2012, que indefere um pedido de tratamento confidencial apresentado pelas recorrentes, em aplicação do artigo 8.o da Decisão 2011/695/UE do presidente da Comissão, de 13 de outubro de 2011, relativa às funções e ao mandato do auditor em determinados procedimentos de concorrência (processo COMP/39.125 – Vidro automóvel) (a seguir «decisão controvertida»).

2

Por requerimento separado, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça no mesmo dia, as recorrentes apresentaram o presente pedido de medidas provisórias, nos termos dos artigos 278.° TFUE e 279.° TFUE, destinado a obter a suspensão da execução do acórdão recorrido e da decisão controvertida.

3

A Comissão Europeia apresentou observações escritas em 23 de outubro de 2015. Em 10 de dezembro de 2015, foram ouvidas as observações orais das recorrentes e da Comissão.

Antecedentes do litígio e acórdão recorrido

4

Em 12 de novembro de 2008, a Comissão aprovou a Decisão C (2008) 6815 final, relativa a um processo de aplicação do artigo 81. [CE] e do artigo 53.o do Acordo EEE contra vários fabricantes de vidro automóvel, entre os quais as recorrentes (processo COMP/39.125 – Vidro automóvel) (a seguir «decisão vidro automóvel»).

5

Por carta de 25 de março de 2009, a direção‑geral (DG) «Concorrência» da Comissão informou as recorrentes, designadamente, da sua intenção de publicar no seu sítio de Internet, em conformidade com o artigo 30.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos [81.° CE] e [82.° CE] (JO 2003, L 1, p. 1), uma versão não confidencial da decisão vidro automóvel nas línguas que fazem fé no caso em apreço, ou seja, as línguas inglesa, francesa e neerlandesa. Além disso, a DG «Concorrência» convidou as recorrentes a identificarem as eventuais informações confidenciais ou que constituem segredos comerciais e a fundamentarem a sua apreciação a esse respeito.

6

Na sequência da troca de correspondência com as recorrentes, a DG «Concorrência» proferiu, em dezembro de 2011, a versão não confidencial da decisão vidro automóvel a publicar no sítio de Internet da Comissão. Resulta da correspondência em questão que a DG «Concorrência» não deu seguimento aos pedidos das recorrentes de ocultação das informações contidas em 246 considerandos e 122 notas de pé de página da decisão vidro automóvel.

7

Nos termos do artigo 9.o da Decisão 2001/462/CE, CECA da Comissão, de 23 de maio de 2001, relativa às funções do auditor em determinados processos de concorrência (JO L 162, p. 21), as recorrentes manifestaram ao auditor a sua oposição à publicação, por um lado, de determinadas informações contendo os nomes dos clientes e a descrição dos produtos em causa, bem como de toda a informação suscetível de identificar um cliente, e, por outro, de um segmento de frase do considerando 726 da decisão vidro automóvel.

8

O auditor pronunciou‑se sobre o pedido das recorrentes através da decisão controvertida.

9

Em primeiro lugar, a título de observações preliminares, o auditor explicou que a Comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2006, C 298, p. 17), não gerava nas recorrentes uma confiança legítima que impedisse a Comissão de proceder à publicação das informações que não estivessem abrangidas pelo segredo profissional. Além disso, o interesse das recorrentes em que os detalhes do seu comportamento não abrangidos pelo referido segredo profissional não fossem divulgados não merecia proteção particular. Por outro lado, o auditor não tem competência para se pronunciar sobre a oportunidade da publicação das informações não confidenciais nem sobre as lesões resultantes da política geral da Comissão a este respeito.

10

Em segundo lugar, o auditor rejeitou o argumento de que a Comissão está vinculada pela sua prática anterior relativa ao alcance da publicação. Por outro lado, o auditor recordou que a publicação pretendida não incluía a fonte das declarações nem outros documentos apresentados no âmbito da referida comunicação, sublinhando que não tinha competência para se pronunciar sobre o alcance da publicação pretendida à luz do princípio da igualdade de tratamento.

11

Mais especificamente, a decisão controvertida assenta essencialmente no exame de dois argumentos apresentados pelas recorrentes. O primeiro argumento, examinado nos considerandos 22 a 35 dessa decisão, tem por objeto o caráter confidencial das informações em causa enquanto tais, e o segundo argumento, examinado nos considerandos 36 a 45 da referida decisão, tem por objeto a proteção da identidade das pessoas singulares.

12

Quanto ao primeiro argumento, o auditor considerou, em primeiro lugar, que as informações relativas aos nomes dos clientes e à descrição dos produtos em causa, eram, pela sua natureza e tendo em conta as especificidades do mercado do vidro automóvel, conhecidas para além das recorrentes, em segundo lugar, que eram históricas e, em terceiro lugar, que visavam a própria essência da infração, uma vez que a sua divulgação era, por outro lado, ditada pelos interesses das pessoas lesadas. Além disso, na medida em que as recorrentes tinham apresentado argumentos específicos destinados a provar o caráter confidencial dessas informações apesar das suas características gerais conforme acima descritas, o auditor concluiu, após uma análise que teve em conta três requisitos cumulativos, que as informações em causa não estavam abrangidas pelo segredo profissional.

13

Quanto ao segundo argumento, o auditor baseou‑se no artigo 5.o do Regulamento (CE) n.o 45/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2000, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições e pelos órgãos comunitários e à livre circulação desses dados (JO 2001, L 8, p. 1), e acolheu parcialmente o pedido das recorrentes.

14

Tendo o artigo 3.o da decisão controvertida indeferido o pedido quanto ao restante, as recorrentes interpuseram um recurso de anulação dessa decisão na medida em que indeferiu o seu pedido.

15

No âmbito do processo em primeira instância, as recorrentes tinham recebido a garantia da Comissão de que esta se absteria de executar a decisão controvertida até à prolação do acórdão recorrido, pelo que não consideraram necessário apresentar um pedido de medidas provisórias nesse sentido.

16

Como o acórdão recorrido negou provimento ao recurso das recorrentes, estas interpuseram recurso desse acórdão, conforme referido no n.o 1 do presente despacho, em apoio do qual invocam três fundamentos. O primeiro fundamento de recurso é relativo a um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral na medida em que considerou que a competência do auditor prevista no artigo 8.o da Decisão 2011/695/UE do Presidente da Comissão, de 13 de outubro de 2011, relativa às funções e ao mandato do Auditor em determinados procedimentos de concorrência, está limitada apenas à questão de saber se as informações que a Comissão pretende publicar constituem segredos comerciais ou, em todo o caso, têm um caráter confidencial. O segundo fundamento de recurso é também relativo a um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral na medida em que este concluiu que a decisão controvertida não violou os princípios da proteção da confiança legítima e da igualdade de tratamento. Por último, com o seu terceiro fundamento de recurso, as recorrentes sustentam que o Tribunal Geral se afastou da jurisprudência sem apresentar fundamentação suficiente.

17

Após o Tribunal Geral ter negado provimento ao recurso, a Comissão expressou a sua intenção de proceder à execução da decisão controvertida, sem esperar, desta vez, a prolação do acórdão do Tribunal de Justiça sobre o recurso interposto pelas recorrentes contra o acórdão recorrido. Nestas condições, as recorrentes apresentaram o presente pedido de medidas provisórias.

Pedidos das partes

18

As recorrentes pedem ao Tribunal de Justiça que se digne:

ordenar a suspensão da execução do dispositivo do acórdão recorrido e o artigo 3.o da decisão controvertida até se pronuncie sobre o recurso interposto contra aquele acórdão;

ordenar qualquer medida que se afigure justa e adequada nestas circunstâncias; e

condenar a recorrida nas despesas.

19

A Comissão pede o indeferimento do pedido de medidas provisórias e a condenação das recorrentes nas despesas.

Quanto ao pedido de medidas provisórias

20

Há que recordar que, segundo o artigo 60.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, um recurso de um acórdão do Tribunal Geral não tem, em princípio, efeito suspensivo. Todavia, em aplicação do artigo 278.o TFUE, o Tribunal de Justiça pode ordenar a suspensão do acórdão recorrido, se considerar que as circunstâncias o exigem.

21

O artigo 160.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça dispõe que os pedidos de medidas provisórias devem especificar «o objeto do litígio, as razões da urgência, bem como os fundamentos de facto e de direito que, à primeira vista, justificam a adoção da medida provisória requerida». Assim, a suspensão da execução e as restantes medidas provisórias podem ser concedidas pelo juiz das medidas provisórias se se chegar à conclusão de que, à primeira vista, a sua concessão é justificada de facto e de direito (fumus boni juris) e que são urgentes no sentido de que é necessário, para evitar um prejuízo grave e irreparável dos interesses da parte que as requer, que sejam decretadas e produzam os seus efeitos antes da decisão do recurso quanto ao mérito. Estes requisitos são cumulativos, de modo que o pedido de medidas provisórias deve ser indeferido se um deles não estiver preenchido. O juiz das medidas provisórias também procede, se for caso disso, à ponderação dos interesses em causa (despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Comissão/ANKO,C‑78/14 P‑R, EU:C:2014:239, n.o 14 e jurisprudência aí referida).

22

No que diz respeito à urgência das medidas provisórias requeridas, as recorrentes, com base na consideração de que as informações em causa são dignas de ser protegidas enquanto tais, sustentam que, dado que estas constituem informações comerciais específicas relativas a dados como nomes de clientes, descrições dos produtos em causa e outros elementos suscetíveis de permitir a identificação de alguns clientes das recorrentes, a posterior anulação da decisão controvertida não sanaria os efeitos da sua divulgação. Com efeito, tal publicação permitiria a terceiros aceder a essas informações e utilizá‑las, designadamente deduzindo das mesmas outros dados comerciais cuja confidencialidade deixaria, por esse facto, de ser assegurada, como cálculos de preços, alterações de preços e outras informações financeiras. Consequentemente, essa publicação causaria às recorrentes um prejuízo grave e irreparável, suficientemente previsível e provável.

23

O prejuízo que as recorrentes sofreriam seria irreparável, na medida em que, antes de mais, a divulgação de informações a um certo público reveste um caráter imediato e irreversível, pelo que a anulação da decisão controvertida já não seria suscetível de reparar o prejuízo causado por esta. O mesmo se aplica às informações em causa e à interdição da sua divulgação decidida posteriormente a esta última. Em seguida, o prejuízo financeiro das recorrentes não seria suscetível de ser contabilizado. Com efeito, em primeiro ligar, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, em especial do despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Comissão/Pilkington Group [C‑278/13 P(R), EU:C:2013:558], que esse prejuízo pode variar, tanto quanto à sua natureza como à sua extensão, consoante as pessoas que tomam conhecimento das informações em causa sejam clientes, concorrentes, fornecedores, ou ainda analistas financeiros ou membros do grande público. A este respeito, as recorrentes precisam que é impossível identificar o número e a qualidade de todas as pessoas suscetíveis de tomar conhecimento das informações em causa e apreciar assim os efeitos negativos concretos da sua publicação. Em segundo lugar, em razão da decisão vidro automóvel, as recorrentes já foram confrontadas com alguns pedidos de indemnização por perdas e danos, quer diretamente enquanto demandadas quer no âmbito da sua responsabilidade solidária com os outros destinatários dessa decisão. Neste contexto, a publicação das informações em causa enfraqueceria a posição das recorrentes nesses processos judiciais e nas negociações tendentes a eventuais acordos amigáveis. Por último, as recorrentes sustentam que as repercussões financeiras negativas associadas à publicação das informações em causa não podem ser contabilizadas em toda a sua extensão, tendo em conta que, atendendo a todos os montantes que podem vir a ser devidos pelas recorrentes a título de perdas e danos ou de pagamentos transacionais, não será possível contabilizar a parte imputável única e diretamente à divulgação das informações em causa.

24

Antes de mais, a Comissão contesta que essas informações sejam dignas de proteção. Se essa natureza lhes fosse reconhecida, tal seria unicamente no termo do processo quanto ao mérito, na hipótese de o segundo fundamente de recurso ser julgado procedente.

25

Relativamente aos argumentos específicos apresentados pelas recorrentes, a Comissão sustenta, em primeiro lugar, que o raciocínio do despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Comissão/Pilkington Group [C‑278/13 P(R), EU:C:2013:558] não é transponível para o caso em apreço, na medida em que, contrariamente ao processo que deu origem a esse despacho, no presente processo não é contestado que as informações em causa não constituem segredos comerciais ou outro tipo de informações de natureza confidencial. Neste contexto, a Comissão acrescenta que o argumento de que a publicação das informações em causa permitiria que terceiros tivessem conhecimento, por via de dedução, de outras informações comerciais cuja confidencialidade deixaria de ser assegurada, como cálculos de preços, alterações de preços e outras informações financeiras, é improcedente, visto que esses dados não deveriam beneficiar de confidencialidade, uma vez que as recorrentes nunca pediram o seu tratamento confidencial. Além disso, as recorrentes, ao mesmo tempo que reconhecem que o prejuízo seria de caráter financeiro, não sustentam nem, a fortiori, provam que esse prejuízo seria suscetível de pôr em causa a sua própria existência ou de reduzir substancialmente as suas quotas de mercado, quando essa prova é exigida pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, uma vez que se trata de considerar irreparável um prejuízo que reveste um caráter puramente financeiro. Dito de outro modo, o caráter irreparável da publicação não implica que o dano pretensamente causado por essa publicação seja, ele próprio, grave e irreparável.

26

Em segundo lugar, no que se refere à utilização das informações em causa no âmbito de ações de indemnização intentadas contra as recorrentes, a Comissão sustenta que, embora essas informações devam efetivamente ser úteis para apoiar tais ações, isso não significa que, por esse facto, a sua divulgação seja suscetível de causar um prejuízo grave e irreparável que poderia ser evitado com a suspensão da execução da decisão controvertida. A este respeito, a Comissão sustenta que o prejuízo financeiro ligado às indemnizações que as recorrentes podem ser condenadas a pagar não seria diretamente causado pela divulgação das referidas informações, mas pela participação das recorrentes no cartel declarado pela decisão vidro automóvel. Assim, a divulgação das informações em causa limitar‑se‑ia a permitir às pessoas que sofreram um prejuízo em razão deste cartel obter a sua reparação, apoiando‑se num direito que lhes é especificamente reconhecido pelos Tratados. A Comissão acrescenta que, no que respeita ao montante da reparação que poderia ser diretamente ligado à divulgação das informações em causa, as recorrentes não demonstraram de forma juridicamente bastante que a obrigação de pagar esse montante lhes poderia causar um prejuízo financeiro suscetível de pôr em causa a sua existência ou de reduzir substancialmente as suas quotas de mercado, nem que seria impossível determinar a extensão desse montante, apesar de o número de pessoas que sofreram um prejuízo devido à existência do cartel declarado pela decisão vidro automóvel ser limitado.

27

A fim de verificar se as medidas provisórias requeridas são urgentes, importa recordar que a finalidade do processo de medidas provisórias é garantir a plena eficácia da futura decisão definitiva, a fim de evitar uma lacuna na proteção jurídica garantida pelo Tribunal de Justiça. Para alcançar este objetivo, a urgência deve ser apreciada tendo em conta a necessidade de decidir provisoriamente para evitar que se cause um prejuízo grave e irreparável à parte que requer a medida provisória (despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Lito Maieftiko Gynaikologiko kai Cheirourgiko Kentro/Comissão,C‑506/13 P‑R, EU:C:2013:882, n.o 18 e jurisprudência aí referida). Cabe a esta parte provar que não pode aguardar o desfecho do processo relativo ao mérito sem sofrer um prejuízo grave e irreparável (despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Comissão/Rusal Armenal,C‑21/14 P‑R, EU:C:2014:1749, n.o 37 e jurisprudência aí referida).

28

No caso em apreço, as recorrentes identificam em substância dois tipos de prejuízo que sofreriam se não fosse suspensa a execução do acórdão recorrido e da decisão controvertida.

29

Em primeiro lugar, apoiando‑se no despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Comissão/Pilkington Group [C‑278/13 P(R), EU:C:2013:558], alegam que a publicação das informações em causa seria suscetível de lhes causar prejuízo em razão da própria natureza dessas informações.

30

A este respeito, importa salientar que, como resulta em especial dos n.os 18 e 38 desse despacho, no seu recurso de anulação, a Pilkington Group Ltd tinha contestado a apreciação da Comissão segundo a qual as informações cuja divulgação tinha sido decidida em aplicação do artigo 30.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003 não constituíam segredos comerciais, no sentido nomeadamente do artigo 339.o TFUE e dos artigos 28.°, n.o 1, e 30.°, n.o 2, do referido regulamento. Consequentemente, as considerações que o juiz das medidas provisórias teve em conta para concluir que o requisito da urgência estava demonstrado em concreto partiam da premissa, expressamente mencionada no n.o 47 do referido despacho, segundo a qual as informações em causa nesse processo estavam abrangidas pelo segredo profissional.

31

Ora, há que constatar que, como alega a Comissão, as circunstâncias do processo que deu origem a esse despacho são distintas das circunstâncias em causa no presente processo.

32

Com efeito, no presente processo, o Tribunal Geral, nos n.os 22 a 54 do acórdão recorrido, examinou e rejeitou o sexto fundamento invocado pelas recorrentes em apoio do seu recurso de anulação, no âmbito do qual contestavam a apreciação do auditor segundo a qual as informações em causa não constituíam segredos comerciais, na aceção dos artigos 30.°, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 e 8.°, n.o 2, da Decisão 2011/695.

33

Ora, resulta do pedido de medidas provisórias que o recurso interposto pelas recorrentes não abrange esta parte do acórdão recorrido, pelo que se deve considerar que ficou definitivamente decidido que as informações em causa não constituem segredos comerciais. Resulta daqui que a análise da urgência no presente processo deve partir da premissa, contrária à adotada pelo juiz das medidas provisórias no despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Comissão/Pilkington Group [C‑278/13 P(R), EU:C:2013:558], segundo a qual as informações em causa não podem estar abrangidas pelo segredo profissional.

34

Por outro lado, o facto de a publicação das informações em causa poder infringir os princípios da confiança legítima e da igualdade de tratamento, como alegam as recorrentes no seu segundo fundamento de recurso, não pode bastar, enquanto tal, para considerar que essas informações devem ser tratadas como estando abrangidas pelo segredo profissional e que, por conseguinte, a sua divulgação causaria às recorrentes um prejuízo grave e irreparável. Com efeito, tal circunstância, admitindo‑a provada, seria, quando muito, suscetível de fundamentar a obrigação da Comissão de não divulgar as referidas informações, como reconhece aliás esta instituição.

35

É verdade que, como sustentam as recorrentes, a publicação de informações, como as que estão em causa, tem um caráter irreversível, na medida em que a anulação da decisão controvertida não pode inverter os efeitos da sua divulgação, uma vez que a tomada de conhecimento dessas informações pelas pessoas que as leram é imediata e irreversível. De resto, a Comissão também não precisou as razões pelas quais os motivos que a levaram a suspender a divulgação das informações em causa na pendência da prolação do acórdão recorrido, que ocorreu no termo de um processo que se estendeu por um período de cerca de 25 meses, não são igualmente pertinentes para a levar a suspender a divulgação das mesmas informações na pendência da prolação do acórdão do Tribunal de Justiça que decide do mérito do recurso interposto pelas recorrentes.

36

Todavia, para satisfazer os requisitos previstos para a concessão de medidas provisórias e, muito em especial, o relativo à urgência, é ainda necessário que o caráter irreversível da divulgação das referidas informações seja suscetível de causar um prejuízo grave e irreparável às recorrentes.

37

Ora, a este respeito, importa recordar que, embora, para provar a existência de um prejuízo desse tipo, não seja necessário exigir que se demonstre a ocorrência do mesmo com um grau de certeza absoluta e que basta que esse prejuízo seja previsível com um grau de probabilidade suficiente, a verdade é que a parte que requer uma medida provisória continua obrigada a provar os factos que supostamente fundamentam a perspetiva de um tal prejuízo grave e irreparável [despachos do presidente do Tribunal de Justiça, HFB e o./Comissão, C‑335/99 P(R), EU:C:1999:608, n.o 67, e do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Comissão/Pilkington Group,C‑278/13 P(R), EU:C:2013:558, n.o 37]

38

No caso em apreço, as recorrentes limitaram‑se a alegar que, uma vez que as informações em causa constituíam informações comerciais específicas relativas a dados como nomes de clientes, descrições dos produtos em causa e outros elementos suscetíveis de permitir a identificação de alguns dos seus clientes, a divulgação dessas informações poderia, enquanto tal, causar‑lhes um prejuízo, porquanto permitiria a terceiros aceder a essas informações e utilizá‑las, designadamente deduzindo das mesmas outros dados comerciais cuja confidencialidade deixaria, por esse facto, de ser assegurada, como cálculos de preços, alterações de preços e outras informações financeiras.

39

Ora, a este último respeito, importa salientar, antes de mais, que as recorrentes não forneceram nenhum elemento que permita demonstrar que a divulgação das informações em causa permitiria a terceiros tomarem conhecimento, por via de dedução, desses outros dados comerciais, de modo que essas informações deveriam permanecer confidenciais.

40

Além disso, é verdade que foi declarado que a divulgação de segredos comerciais é suscetível de causar um prejuízo que consiste no facto de que, uma vez publicadas as informações confidenciais, uma anulação posterior da decisão controvertida, por violação do artigo 339.o TFUE e do direito fundamental à proteção do segredo profissional, não reverteria os efeitos decorrentes da publicação dessas informações. Com efeito, os clientes, os concorrentes e os fornecedores da empresa em questão, os analistas financeiros e o grande público poderiam aceder às informações em causa e explorá‑las livremente, o que causaria um prejuízo grave e irreparável à referida sociedade [v., neste sentido, despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Comissão/Pilkington Group,C‑278/13 P(R), EU:C:2013:558, n.os 46 a 48].

41

Todavia, o mesmo não se aplica no que respeita à divulgação de informações que não podem ser consideradas abrangidas pelo segredo profissional.

42

Ora, como resulta do n.o 33 do presente despacho, o Tribunal Geral, nos n.os 36 a 40 do acórdão recorrido, declarou, sem que tal tenha sido posto em causa pelas recorrentes no âmbito do presente recurso, por um lado, que as informações em questão, designadamente as relativas à identidade dos clientes, já eram conhecidas de um número não restrito de pessoas, tendo em conta em especial o grau de transparência que caracteriza, a este respeito, o mercado do vidro automóvel, e, por outro, que essas informações, pelo facto de remontarem a cinco anos ou mais a contar da publicação controvertida, revestiam um caráter histórico, na aceção da jurisprudência.

43

Consequentemente, as recorrentes não podem demonstrar que, apesar do facto de as informações em causa não estarem ou já não estarem abrangidas pelo segredo profissional, a sua divulgação seria suscetível de lhes causar um prejuízo em razão da própria natureza dessas informações.

44

Quanto ao segundo tipo de dano alegado pelas recorrentes, estas sustentam que a divulgação das informações em causa enfraqueceria a sua posição, por um lado, nos processos judiciais em curso que têm por objeto pedidos de indemnização em que estão implicadas, quer diretamente quer no âmbito da sua responsabilidade solidária com os outros destinatários da decisão vidro automóvel, e, por outro, nas negociações tendentes a eventuais acordos amigáveis.

45

A este respeito, importa recordar que, como alega a Comissão nas suas observações escritas, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, no caso de um pedido de suspensão da execução de um ato da União, a concessão da medida provisória solicitada só se justifica se o ato em causa constituir a causa determinante do prejuízo grave e irreparável alegado [despachos do presidente do Tribunal de Justiça, Akhras/Conselho,C‑110/12 P(R), EU:C:2012:507, n.o 44; Hassan/Conselho, C‑168/12 P(R), EU:C:2012:674, n.o 28; e do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, EDF/Comissão,C‑551/12 P(R), EU:C:2013:157, n.o 41].

46

Ora, a obrigação de reparar o dano causado por uma empresa pelo facto de ter cometido uma infração às regras de direito da União da concorrência enquadra‑se na responsabilidade civil dessa empresa. Consequentemente, a causa determinante do dano pretensamente ligado às ações de indemnização e às negociações tendentes a um acordo amigável não reside na divulgação das informações em causa pela Comissão, mas na infração ao direito da concorrência cometida pelas recorrentes, conforme declarada pela decisão vidro automóvel.

47

É verdade que, regra geral, nos processos judiciais que têm por objeto pedidos de indemnização por violação do direito da concorrência, o ónus da prova incumbe ao demandante que alegue ter sofrido um dano devido à infração. A este respeito, resulta expressamente das observações escritas da Comissão que as indemnizações em causa são efetivamente suscetíveis de facilitar a administração dessa prova pelos demandantes nas ações de indemnização contra as recorrentes, na medida em que essas informações fornecem aos referidos demandantes elementos de prova que de outra forma não poderiam invocar.

48

No entanto, ainda que o direito processual nacional não obrigue o demandado, no âmbito de uma ação de indemnização, a fornecer elementos de prova que demonstrem a sua própria responsabilidade, tal circunstância de direito não impede a Comissão de divulgar informações apenas porque estas podem constituir elementos de prova desse tipo e, portanto, prejudicar a posição desse demandado.

49

Com efeito, isso equivaleria a exigir que a Comissão mantivesse as informações confidenciais com a única finalidade de proteger o interesse, dos destinatários de uma decisão que declara a existência de uma infração às regras de direito da União da concorrência, em tornar os elementos de prova em questão inacessíveis aos demandantes numa ação de indemnização.

50

Embora reconhecendo a importância desse interesse, designadamente na medida em que se enquadra no âmbito dos direitos de defesa deste tipo de ações, não deixa de ser verdade que, por um lado, nenhuma regra de direito da União obriga a Comissão a proteger tal interesse impondo‑lhe que mantenha a confidencialidade de informações, como as informações em causa, contrariamente à obrigação de transparência que lhe incumbe por força do artigo 15.o TUE e, mais especificamente neste caso, do artigo 30.o do Regulamento n.o 1/2003. Por outro lado, o artigo 5.o, n.o 5, da Diretiva 2014/104/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de novembro de 2014, relativa a certas regras que regem as ações de indemnização no âmbito do direito nacional por infração às disposições do direito da concorrência dos Estados‑Membros e da União Europeia (JO L 349, p. 1), dispõe expressamente que o interesse das empresas em evitar ações de indemnização na sequência de uma infração ao direito da concorrência não constitui interesse que justifique proteção.

51

Por outro lado, mesmo admitindo que a divulgação das informações em questão possa ser considerada a causa determinante de um dano para as recorrentes e que o interesse em questão seja digno de proteção enquanto tal, importa recordar que, como resulta do n.o 28 do presente despacho, a urgência deve ser apreciada tendo em conta a necessidade de decidir provisoriamente para evitar que se cause um prejuízo grave e irreparável à parte que requer a medida provisória.

52

A este propósito, por um lado, há que salientar que, como reconhecem as próprias recorrentes, esse prejuízo é de ordem financeira.

53

Ora, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, um prejuízo de ordem pecuniária não pode, salvo circunstâncias excecionais, ser considerado irreparável, uma vez que uma compensação pecuniária é, regra geral, suscetível de colocar a pessoa lesada na situação anterior à ocorrência do prejuízo. Esse prejuízo pode designadamente ser reparado no âmbito de uma ação de indemnização intentada nos termos dos artigos 268.° TFUE e 340.° TFUE [despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Comissão/Pilkington Group,C‑278/13 P(R), EU:C:2013:558, n.o 50 e jurisprudência aí referida].

54

Contudo, um prejuízo de ordem financeira é considerado irreparável se não for suscetível de ser inteiramente compensado, o que pode designadamente ser o caso se o prejuízo, no momento em que ocorre, não puder ser quantificado [despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Comissão/Pilkington Group,C‑278/13 P(R), EU:C:2013:558, n.o 52 e jurisprudência aí referida].

55

No caso em apreço, as recorrentes alegam que o prejuízo em questão não é suscetível de ser quantificado no quadro de uma eventual ação de indemnização contra a União Europeia na hipótese de o seu recurso ser julgado procedente, tendo em conta que, atendendo às quantias totais que podem vir a ser devidas pelas recorrentes a título das ações de indemnização e de pagamentos transacionais, não será possível determinar a parte dessas quantias imputável única e diretamente à divulgação das informações em causa.

56

A este respeito, importa recordar que já foi declarado que a incerteza ligada à reparação de um prejuízo pecuniário no quadro de uma eventual ação de indemnização não pode ser considerada, em si mesma, uma circunstância suscetível de provar o caráter irreparável desse prejuízo. Com efeito, na fase do processo de medidas provisórias, a possibilidade de obter ulteriormente a reparação de um prejuízo pecuniário no quadro de uma eventual ação de indemnização, que poderia ser intentada no seguimento da anulação do ato recorrido, é necessariamente incerta. Ora, o processo de medidas provisórias não tem por objetivo substituir a ação de indemnização para eliminar essa incerteza, sendo a sua finalidade apenas garantir a plena eficácia da futura decisão definitiva que deve ser proferida no processo principal a que se refere a queixa, a saber, no presente caso, um recurso de anulação [despachos do presidente do Tribunal de Justiça, Alcoa Trasformazioni/Comissão,C‑446/10 P(R), EU:C:2011:829, n.os 55 a 57, e do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, Comissão/Pilkington Group,C‑278/13 P(R), EU:C:2013:558, n.o 53].

57

Consequentemente, os argumentos das recorrentes destinados a demonstrar que a divulgação das informações em causa lhes causaria um prejuízo irreparável não podem ser acolhidos.

58

Por outro lado, não se pode deixar de constatar que as recorrentes não fornecem, nem no pedido de medidas provisórias nem nas observações orais, elementos que permitam provar o caráter grave do prejuízo cuja existência alegam.

59

Em especial, dado que, como resulta do n.o 46 do presente despacho, esse pretenso prejuízo só pode, na verdade, ser relativo ao dano causado pela infração ao direito da União da concorrência, declarada pela decisão vidro automóvel, cabe às recorrentes, para efeitos do presente processo, se não quantificar com precisão a parte da indemnização que lhes incumbe – ou que lhes venha a incumbir – por efeito da divulgação das informações em causa, pelo menos fornecer as informações de natureza comercial ou financeira na sua posse que permitam ao Tribunal de Justiça apreciar, tendo em conta designadamente o volume de negócios ligado à venda dos produtos objeto da infração em questão e os custos de produção destes produtos, a extensão provável da sua obrigação de indemnização, bem como a sua importância relativa atendendo à capacidade financeira do grupo de que fazem parte. Interrogadas sobre este ponto pelo juiz das medidas provisórias na audiência de 10 de dezembro de 2015, as recorrentes limitaram‑se a reiterar a sua argumentação segundo a qual se encontram na incapacidade de determinar essa parte da indemnização, sem, todavia, explicar as razões pelas quais não lhes é possível realizar estimativas, mesmo que aproximadas, relativas ao impacto financeiro gerado pela infração ao direito da União da concorrência imputável às recorrentes, por exemplo com base nos pedidos de indemnização já pendentes.

60

Resulta de todas as considerações que precedem que as recorrentes não provaram que a execução do acórdão recorrido e da decisão controvertida seria suscetível de lhes causar um prejuízo grave e irreparável. Daqui decorre que o requisito da urgência não está preenchido, pelo que o presente pedido de medidas provisórias deve ser indeferido, sem que seja necessário examinar o requisito relativo à existência de um fumus boni juris nem proceder à ponderação dos interesses.

 

Pelos fundamentos expostos, o vice‑presidente do Tribunal de Justiça decide:

 

1)

O pedido de medidas provisórias é indeferido.

 

2)

Reserva‑se para final a decisão quanto às despesas.

 

Assinaturas


( *1 )   Língua do processo: inglês.

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