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Document 62015CJ0632

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 26 de abril de 2017.
Costin Popescu contra Guvernul României e o.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pela Înalta Curte de Casație şi Justiție.
Reenvio prejudicial — Transportes — Transportes rodoviários — Carta de condução — Diretiva 2006/126/CE — Artigo 13.°, n.° 2 — Conceito de “direito de conduzir concedido até 19 de janeiro de 2013” — Regulamentação nacional que transpõe esta diretiva — Obrigação de obter uma carta de condução imposta às pessoas detentoras de uma autorização de conduzir ciclomotores sem carta de condução antes da entrada em vigor desta regulamentação.
Processo C-632/15.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2017:303

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

26 de abril de 2017 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Transportes — Transportes rodoviários — Carta de condução — Diretiva 2006/126/CE — Artigo 13.o, n.o 2 — Conceito de “direito de conduzir concedido até 19 de janeiro de 2013” — Regulamentação nacional que transpõe esta diretiva — Obrigação de obter uma carta de condução imposta às pessoas detentoras de uma autorização de conduzir ciclomotores sem carta de condução antes da entrada em vigor desta regulamentação»

No processo C‑632/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela Înalta Curte de Casaţie şi Justiţie (Tribunal Superior de Cassação e Justiça, Roménia), por decisão de 12 de novembro de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 30 de novembro de 2015, no processo

Costin Popescu

contra

Guvernul României,

Ministerul Afacerilor Interne,

Direcția Regim Permise de Conducere si Înmatriculare a Vehiculelor,

Direcția Rutieră,

Serviciul public comunitar regim permise de conducere și Înmatriculare a autovehiculelor,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: T. von Danwitz, presidente de secção, E. Juhász (relator), C. Vajda, K. Jürimäe e C. Lycourgos, juízes,

advogado‑geral: H. Saugmandsgaard Øe,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação de C. Popescu, pelo próprio,

em representação do Governo romeno, por R.‑H. Radu, O.‑C. Ichim e E. Gane, na qualidade de agentes,

em representação do Governo eslovaco, por B. Ricziová, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por L. Nicolae e J. Hottiaux, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 24 de novembro de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação das disposições da Diretiva 2006/126/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de dezembro de 2006, relativa à carta de condução (JO 2006, L 403, p. 18), em especial, do artigo 13.o, n.o 2, lido em conjugação com o considerando 5 desta diretiva.

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe Costin Popescu ao Guvernul României (Governo romeno), representado pelo Secretariatul General al Guvernului (Secretariado‑Geral do Governo), ao Ministerul Afacerilor Interne (Ministro da Administração Interna), à Direcția Regim Permise de Conducere și Înmatriculare a Vehiculelor (Direção do sistema de cartas de condução e de matrícula de veículos a motor), à Direcția Rutieră (Direção Rodoviária) e ao Serviciul Public Comunitar Regim Permise de Conducere și Înmatriculare a Vehiculelor (Serviço Público local — Sistema de cartas de condução e de matrícula de veículos a motor), a respeito da obrigação de as pessoas autorizadas a conduzir ciclomotores sem serem titulares de carta de condução antes da entrada em vigor da regulamentação romena que transpõe a Diretiva 2006/126 para o direito nacional obterem essa carta para poderem continuar a conduzir esses veículos.

Quadro jurídico

Direito da União

3

O considerando 2 da Diretiva 2006/126 enuncia:

«A regulamentação relativa à carta de condução é um elemento indispensável para realizar a política comum dos transportes, contribuindo para melhorar a segurança rodoviária e facilitar a circulação das pessoas que se estabelecem num Estado‑Membro distinto daquele que emitiu a carta de condução […]»

4

Nos termos do considerando 5 desta diretiva, esta não deve prejudicar o direito de condução concedido ou adquirido antes da data da sua aplicação.

5

O considerando 8 da referida diretiva está redigido nos seguintes termos:

«Por razões de segurança rodoviária, é necessário fixar as condições mínimas para a emissão de uma carta de condução. É necessário proceder à harmonização das normas relativas ao exame de condução e à emissão da carta de condução. Para tanto, é necessário definir os conhecimentos, as aptidões e os comportamentos associados à condução de veículos a motor, o exame de condução deve ser estruturado com base nesses conceitos e redefinir as normas mínimas relativas à aptidão física e mental para a condução de tais veículos.»

6

Segundo o considerando 13 da mesma diretiva, a introdução de uma categoria de carta de condução para os ciclomotores destina‑se, em especial, a reforçar a segurança rodoviária no que respeita aos condutores mais jovens, que, segundo as estatísticas, são os mais afetados pelos acidentes rodoviários.

7

O considerando 16 da Diretiva 2006/126 tem a seguinte redação:

«O modelo de carta de condução estabelecido na Diretiva 91/439/CEE [do Conselho, de 29 de julho de 1991, relativa à carta de condução (JO 1991, L 237, p. 1)] deve ser substituído por um modelo único com o formato de um cartão plastificado. Este modelo de carta de condução carece ao mesmo tempo de uma adaptação devido à introdução de uma nova categoria de carta de condução para os ciclomotores e de uma nova categoria de carta de condução para os motociclos.»

8

O artigo 4.o desta diretiva, sob a epígrafe «Categorias, definições e idades mínimas», prevê:

«1.   A carta de condução prevista no artigo 1.o habilita a conduzir os veículos com motor de propulsão das categorias adiante definidas. Pode ser emitida a partir da idade mínima indicada para cada categoria. A expressão “veículo com motor de propulsão” designa qualquer veículo autopropulsionado que circule por estrada pelos seus próprios meios, com exceção dos veículos que se deslocam sobre carris.

2.   Ciclomotores:

Categoria AM:

veículos de duas ou três rodas com uma velocidade máxima de projeto que não exceda 45 quilómetros por hora, tal como definidos na alínea a) do n.o 2 do artigo 1.o da Diretiva 2002/24/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de março de 2002, relativa à homologação dos veículos a motor de duas ou três rodas [e que revoga a Diretiva 92/61/CEE do Conselho (JO 2002, L 124, p. 1)] (com exceção dos veículos com uma velocidade máxima de projeto inferior ou igual a 25 km/h) e quadriciclos ligeiros tal como definidos na alínea a) do n.o 3 do artigo 1.o da Diretiva 2002/24/CE;

a idade mínima para a categoria AM é fixada em 16 anos.

[…]»

9

O artigo 7.o da Diretiva 2006/126, sob a epígrafe «Categorias, definições e idades mínimas», dispõe:

«1.   As cartas de condução só serão emitidas aos candidatos:

a)

aprovados num exame de controlo de aptidão e de comportamento e num exame teórico de avaliação dos conhecimentos, e que satisfaçam as normas médicas, nos termos dos [a]nexos II e III;

b)

aprovados unicamente num exame teórico de avaliação dos conhecimentos, no que diz respeito à categoria AM. Os Estados‑Membros podem impor um exame de avaliação da aptidão e do comportamento e um exame médico para esta categoria.

Para os triciclos e quadriciclos desta categoria, os Estados‑Membros podem impor um exame distinto de controlo de aptidão e de comportamento. Para a diferenciação dos veículos da categoria AM, o respetivo código nacional pode ser inserido na carta de condução;

[…]»

10

O artigo 13.o da Diretiva 2006/126, sob a epígrafe «Equivalências de cartas de condução de modelo não comunitário», tem a seguinte redação:

«1.   Obtido o acordo da Comissão, os Estados‑Membros estabelecerão equivalências entre os direitos obtidos antes da entrada em vigor da presente diretiva e as categorias definidas no artigo 4.o

Após consulta à Comissão, os Estados‑Membros poderão introduzir nas suas legislações nacionais as adaptações necessárias para a aplicação do disposto nos n.os 4, 5 e 6 do artigo 11.o

2.   Qualquer direito de conduzir concedido até 19 de janeiro de 2013 não poderá ser anulado ou de qualquer modo restringido pelas disposições da presente diretiva.»

11

O artigo 16.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2006/126, sob a epígrafe «Transposição», obriga os Estados‑Membros, por um lado, a adotarem e publicarem as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento às disposições da referida diretiva nele enumeradas, de entre as quais o artigo 4.o, n.os 1 e 2, o artigo 7.o, n.o 1, alínea b), e o seu artigo 13.o, o mais tardar até 19 de janeiro de 2011, e, por outro, a aplicarem as disposições transpostas a partir de 19 de janeiro de 2013.

Direito romeno

12

A legea nr. 203/2012 pentru modificarea şi completarea Ordonanţei de urgenţă a Guvernului nr. 195/2002 privind circulaţia pe drumurile publice (Lei n.o 203/2012, que altera e completa o Despacho Urgente do Governo n.o 195/2002, relativo à circulação na via pública, Monitorul Oficial al României, n.o 760, de 12 de novembro de 2012), que transpôs certas disposições da Diretiva 2006/126 para o direito romeno, é aplicável desde 19 de janeiro de 2013. Esta lei alterou o Ordonanța de urgență a Guvernului nr. 195/2002 privind circulația pe drumurile publice (Despacho Urgente do Governo n.o 195/2002 relativo à circulação na via pública, Monitorul Oficial al României, parte I, n.o 670, de 3 de agosto de 2006, a seguir «OUG n.o 195/2002»), e o regulamento de aplicação deste despacho urgente, aprovado pela Hotărârea Guvernului nr. 1391/2006 (Decisão do Governo n.o 1391/2006, Monitorul Oficial al României, parte I, n.o 876, de 26 de outubro de 2006).

13

A fim de assegurar a transposição da referida diretiva, as disposições dos artigos 160.° e 161.° do regulamento de aplicação do OUG n.o 195/2002, relativas aos ciclomotores, foram revogadas.

14

Antes da entrada em vigor da Lei n.o 203/2012, o regulamento de aplicação do OUG n.o 195/2002, previa, no seu artigo 160.o, n.o 2, que «[a]s pessoas que não possuam carta de condução só podem conduzir ciclomotores na via pública se fizerem prova de que completaram um curso sobre o Código da Estrada, num estabelecimento autorizado para a formação de condutores de veículos a motor».

15

O artigo 161.o, n.o 2, do referido regulamento de aplicação especificava que, antes da entrada em vigor da Lei n.o 203/2012, «[q]uando circulem na via pública, os ciclistas devem estar munidos do seu documento de identificação e os condutores de ciclomotores devem, além disso, estar munidos do seu certificado de formação sobre a regulamentação rodoviária e do certificado de registo do veículo».

16

O artigo 6.o, pontos 6 e 21 do OUG n.o 195/2002 define os conceitos de «veículo a motor» e de «ciclomotor». Especifica, por um lado, que «os ciclomotores […] são considerados veículos a motor» e, por outro, que os quadriciclos ligeiros «[s]ão equiparados a ciclomotores».

17

O artigo 20.o, n.os 1 a 3, do OUG n.o 195/2002 tem a seguinte redação:

«(1)   Para conduzirem, na via pública, veículos a motor, elétricos, tratores utilizados exclusivamente em explorações agrícolas e florestais, ou veículos semoventes, os condutores devem estar na posse da respetiva carta de condução.

(2)   As cartas de condução são emitidas para as seguintes categorias de veículos: AM […].

(3)   A descrição das categorias de veículos a que se refere o n.o 2, para as quais são emitidas cartas de condução, consta do anexo 1.»

18

O anexo 1 do OUG n.o 195/2002 enumera as categorias de veículos para as quais é emitida uma carta de condução em conformidade com o seu artigo 20.o, n.o 2. A alínea a) do referido anexo define a «categoria AM» como visando os «ciclomotores».

19

Nos termos do artigo 23.o, n.os 1 e 9, do OUG n.o 195/2002:

«(1)   O direito de conduzir um veículo a motor […] na via pública é concedido exclusivamente ao titular de uma carta de condução válida, correspondente à categoria à qual pertence o veículo, ou a qualquer pessoa que exiba, em substituição, um documento que a autorize a circular na via pública.

[…]

(9)   O exame para obtenção da carta de condução consiste na realização de uma prova teórica de avaliação de conhecimentos e numa prova prática de avaliação da aptidão e do comportamento, em função da categoria de carta pretendida. A prova prática para a categoria AM consiste unicamente na avaliação da aptidão em recintos fechados destinados ao efeito. As condições de obtenção da carta de condução são estabelecidas por regulamento.»

Factos do processo principal e questão prejudicial

20

C. Popescu possui o certificado de registo de um quadriciclo ligeiro da marca Aixam, classificado como veículo de categoria L6e, equiparado a um ciclomotor, e um certificado de participação num curso sobre o Código da Estrada para a condução de ciclomotores na via pública. Os referidos documentos, que foram emitidos em 2010, permitiam‑lhe circular com um veículo como o seu, nos termos dos artigos 160.° e 161.° do regulamento de aplicação do OUG n.o 195/2002 na versão em vigor antes de 19 de janeiro de 2013.

21

A partir de 19 de janeiro de 2013, a condução na via pública de ciclomotores, ou de veículos equiparados, na Roménia, ficou subordinada à obtenção de uma carta de condução, por força da Lei n.o 203/2012, que alterou o OUG n.o 195/2002, para transpor para o direito nacional algumas disposições da Diretiva 2006/126.

22

C. Popescu interpôs um recurso contra diversas autoridades nacionais na Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia), para que o seu direito de conduzir ciclomotores na via pública, tal como adquirido antes de 19 de janeiro de 2013, fosse reconhecido após essa data, sem que tivesse de cumprir formalidades adicionais, e para que a autoridade competente lhe emitisse um documento que atestasse este direito. Para fundamentar o recurso, alegou que a nova regulamentação, decorrente da Lei n.o 203/2012, é contrária às disposições da referida diretiva.

23

Tendo C. Popescu suscitado também uma exceção de inconstitucionalidade de certas disposições do OUG n.o 195/2002, conforme alterado pela Lei n.o 203/2012, a Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste) submeteu a questão à Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional, Roménia).

24

Por decisão de 5 de dezembro de 2013, este último órgão jurisdicional, precisando que a interpretação das regras do direito da União excedia o âmbito das suas competências e que esta prerrogativa cabia exclusivamente ao Tribunal de Justiça da União Europeia, julgou improcedente a exceção de inconstitucionalidade, pelo facto de as disposições do direito nacional visadas por C. Popescu estarem em conformidade com a Constituição romena.

25

Com base na referida decisão, a Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste) declarou o recurso de C. Popescu inadmissível.

26

C. Popescu interpôs recurso desta decisão para a Înalta Curte de Casație și Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça, Roménia), alegando que as disposições da Lei n.o 203/2012 não estão em conformidade com o considerando 5 e o artigo 13.o, n.o 2, da Diretiva 2006/126, segundo o qual qualquer direito de conduzir concedido até 19 de janeiro de 2013 não poderá ser anulado ou de qualquer modo restringido pelas disposições dessa diretiva.

27

Na contestação, o Inspectoratul General al Poliției Române (Inspeção Geral da polícia romena) defendeu que as alterações ao OUG n.o 195/2002 resultantes da Lei n.o 203/2012, que consistem em subordinar a condução de um ciclomotor à obtenção de uma carta de condução, foram motivadas pelo objetivo de melhorar a segurança rodoviária, reduzindo o número e as consequências dos acidentes rodoviários que envolvam ciclomotores, mediante a obrigação imposta aos condutores de adquirirem os conhecimentos teóricos e as aptidões práticas necessárias no âmbito de uma formação adequada.

28

Nestas circunstâncias, o Înalta Curte de Casație și Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Deve a Diretiva 2006/126[…] ser interpretada no sentido de que autoriza o Estado romeno a obrigar os condutores de ciclomotores, detentores de um documento oficial que lhes atribuía o direito de conduzir na via pública antes de 19 de janeiro de 2013, a obter uma carta de condução, submetendo‑se a provas ou exames semelhantes aos previstos para os demais veículos a motor, para poderem continuar a conduzir ciclomotores após tal data?»

Quanto à questão prejudicial

29

Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se as disposições da Diretiva 2006/126, em especial, o seu artigo 13.o, n.o 2, devem ser interpretadas no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional, adotada com vista à transposição desta diretiva para o direito interno, que põe termo à autorização de conduzir ciclomotores sem ser titular de carta de condução, cuja emissão está subordinada à aprovação em provas ou em exames semelhantes aos exigidos para a condução de outros veículos a motor.

30

O artigo 13.o, n.o 2, da referida diretiva dispõe que qualquer direito de conduzir concedido até 19 de janeiro de 2013 não poderá ser anulado ou de qualquer modo restringido pelas disposições da mesma diretiva e o seu considerando 5 enuncia que esta não deve prejudicar o direito de condução concedido ou adquirido antes da data da sua aplicação.

31

A este respeito, C. Popescu alega que, aquando da adoção da Lei n.o 203/2012 que transpõe a Diretiva 2006/126 para o direito romeno, os direitos de condução existentes, adquiridos antes da entrada em vigor desta lei, não podiam ser prejudicados. Na sua opinião, o artigo 13.o, n.o 2, desta diretiva deve ser interpretado no sentido de que visa qualquer habilitação para conduzir que tenha sido reconhecida, mesmo sem um ato formal, por um Estado‑Membro e não unicamente as habilitações materializadas pela entrega de uma carta de condução ou de um ato de natureza equivalente.

32

C. Popescu baseia estas considerações, designadamente, na redação da versão em língua romena desta disposição, na qual figura a expressão «drept de conducere acordat», que inclui o termo «drept» que evoca normalmente o direito em si e não o documento que atesta um direito concedido, e a palavra «acordat» que significa literalmente «acordado» ou «concedido», e pode referir‑se tanto a um direito como a um documento que atesta esse direito.

33

Em contrapartida, como o advogado‑geral referiu no n.o 42 das suas conclusões, uma interpretação literal da expressão «droit de conduire délivré» [«direito de conduzir concedido»], que figura na versão francesa, em especial à luz da aceção comum do termo «délivré» [«concedido»], pode permitir considerar que a formulação do referido artigo 13.o, n.o 2, da Diretiva 2006/126 implica que apenas as habilitações expressas para a condução que resultem de um ato atribuído formalmente, geralmente sob a forma de um ato administrativo individual, anterior a 19 de janeiro de 2013, não seriam afetadas, por força desta disposição, pelos requisitos estabelecidos nessa diretiva.

34

Assim, parece haver divergências entre as diferentes versões linguísticas do artigo 13.o, n.o 2, da Diretiva 2006/126.

35

A este respeito, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a redação utilizada numa das versões linguísticas de uma disposição do direito da União não pode servir de base única à interpretação dessa disposição e não lhe pode ser atribuído caráter prioritário em relação às outras versões linguísticas. As disposições do direito da União devem, com efeito, ser interpretadas e aplicadas de maneira uniforme, à luz das versões redigidas em todas as línguas da União Europeia. Em caso de divergência entre as diferentes versões linguísticas de um texto do direito da União, a disposição em causa deve ser interpretada em função da sistemática geral e da finalidade da regulamentação de que constitui um elemento (acórdãos de 28 de julho de 2016, Edilizia Mastrodonato,C‑147/15, EU:C:2016:606, n.o 29, e de 22 de setembro de 2016, Breitsamer und Ulrich, C‑113/15, EU:C:2016:718, n.o 58).

36

Em primeiro lugar, no que respeita à sistemática geral da Diretiva 2006/116, há que salientar que esta última institui um modelo de carta de condução comunitário único que visa substituir as diferentes cartas de condução existentes nos Estados‑Membros, e introduz uma nova categoria de carta de condução para os ciclomotores. Assim, fixa e define, no seu artigo 4.o, as diferentes categorias de cartas de condução com as quais os Estados‑Membros, tendo, individualmente, já definido as suas próprias categorias de cartas de condução, devem estabelecer equivalências (v., neste sentido, acórdão de 26 de abril de 2012, Hofmann,C‑419/10, EU:C:2012:240, n.o 40).

37

Ora, neste contexto, o Tribunal de Justiça já declarou que o artigo 13.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Equivalências de cartas de condução de modelo não comunitário», em que figura a expressão «direito de conduzir concedido» em causa, visa unicamente regular a questão das equivalências entre os direitos adquiridos antes da entrada em vigor desta diretiva e as diferentes categorias de cartas de condução por ela definidas (v., neste sentido, acórdão de 26 de abril de 2012, Hofmann,C‑419/10, EU:C:2012:240, n.o 41), ou seja, entre as diferentes categorias de cartas de condução instituídas pelos Estados‑Membros e as resultantes da Diretiva 2006/126.

38

Decorre desta jurisprudência que a disposição em causa apenas respeita às equivalências entre as antigas cartas de condução e o novo modelo único comunitário.

39

Esta conclusão é confirmada pelo exame dos trabalhos preparatórios da Diretiva 2006/126, dos quais resulta que o artigo 13.o, n.o 2, desta diretiva foi aditado por iniciativa do Parlamento Europeu, que justificou este aditamento, esclarecendo que a «troca das antigas cartas de condução» não devia de forma alguma saldar‑se por uma perda ou por uma restrição dos direitos adquiridos no que diz respeito à autorização de conduzir diversas categorias de veículos (v., neste sentido, acórdão de 26 de abril de 2012, Hofmann,C‑419/10, EU:C:2012:240, n.o 42).

40

Em segundo lugar, no que se refere à finalidade da Diretiva 2006/126, há que recordar que esta tem por objetivo melhorar a segurança rodoviária, como confirmam os seus considerandos 2, 8 e 13.

41

Com efeito, segundo o considerando 2 desta diretiva, a regulamentação relativa à carta de condução contribui para melhorar a segurança rodoviária. O considerando 8 da referida diretiva enuncia que «[p]or razões de segurança rodoviária, é necessário fixar as condições mínimas para a emissão de uma carta de condução». Nos termos do considerando 13 da mesma diretiva, «[a] introdução de uma categoria de carta de condução para os ciclomotores destina‑se, em especial, a reforçar a segurança rodoviária no que respeita aos condutores mais jovens, que, segundo as estatísticas, são os mais afetados pelos acidentes rodoviários».

42

Nesta perspetiva, enquanto os ciclomotores não estão abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva 91/439, a Diretiva 2006/126, que a substituiu, alargou esse âmbito de aplicação e introduziu a exigência de uma carta de condução para este tipo de veículo.

43

A partir de 19 de janeiro de 2013, os Estados‑Membros foram obrigados a instituir uma nova categoria de carta de condução para os ciclomotores, por força do artigo 16.o, n.os 1 e 2, desta diretiva, que prevê que aplicam a regulamentação adotada para transpor estas disposições da referida diretiva. Essas cartas são emitidas, em conformidade com o artigo 7.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2006/126, aos candidatos aprovados num exame teórico e, caso o legislador assim o tenha decidido, num exame prático e/ou num exame médico.

44

É inegável que esta exigência de os condutores de ciclomotores adquirirem conhecimentos teóricos e, eventualmente, aptidões práticas visa aumentar o nível de segurança rodoviária. Além disso, como o advogado‑geral salienta no n.o 54 das suas conclusões, a necessidade de obtenção prévia de uma carta de condução torna possível a aplicação a estes últimos, no caso de infração ao Código da Estrada, das disposições nacionais em matéria de apreensão, suspensão, renovação e cassação da carta de condução.

45

Consequentemente, como salientaram acertadamente os Governos romeno e eslovaco nas suas observações, uma interpretação do artigo 13.o, n.o 2, da Diretiva 2006/126 que proíba os Estados‑Membros de tornar mais rígidas as condições de habilitação para a condução de ciclomotores na via pública que existiam antes de 19 de janeiro de 2013 obstaria à prossecução do objetivo de melhoria da segurança rodoviária pretendido pelo legislador da União.

46

Por conseguinte, há que concluir que decorre tanto da interpretação sistemática como da interpretação teleológica da Diretiva 2006/126 que o artigo 13.o, n.o 2, desta diretiva apenas se refere à detenção de cartas de condução e de documentos oficiais equivalentes a estas, que habilitam expressamente o respetivo titular para a condução.

47

No que respeita mais especificamente aos factos em causa no processo principal, resulta dos autos à disposição do Tribunal de Justiça que C. Popescu foi autorizado a circular na Roménia, antes de 19 de janeiro de 2013, com um veículo pertencente à categoria dos ciclomotores, na sua qualidade de titular de um certificado de registo de um quadriciclo, equiparado a um ciclomotor, e de um certificado de participação num curso sobre o Código da Estrada para a condução de ciclomotores na via pública. Uma vez que não é titular de uma carta de condução nem de um documento equivalente, não pode, por conseguinte, invocar a proteção prevista no artigo 13.o, n.o 2, da referida diretiva para que lhe seja reconhecido, pela autoridade romena competente, o direito de continuar a utilizar ciclomotores na via pública sem cumprir as formalidades adicionais e entregue um documento oficial que ateste esse direito.

48

Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à questão que as disposições da Diretiva 2006/126, em especial, o seu artigo 13.o, n.o 2, devem ser interpretadas no sentido de que não se opõem a uma regulamentação nacional, adotada com vista à transposição desta diretiva para o direito interno, que põe termo à autorização de conduzir ciclomotores sem ser titular de carta de condução, cuja emissão está subordinada à aprovação em provas ou em exames semelhantes aos exigidos para a condução de outros veículos a motor.

Quanto às despesas

49

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

 

As disposições da Diretiva 2006/126/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de dezembro de 2006, relativa à carta de condução, em especial, o seu artigo 13.o, n.o 2, devem ser interpretadas no sentido de que não se opõem a uma regulamentação nacional, adotada com vista à transposição desta diretiva para o direito interno, que põe termo à autorização de conduzir ciclomotores sem ser titular de carta de condução, cuja emissão está subordinada à aprovação em provas ou em exames semelhantes aos exigidos para a condução de outros veículos a motor.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: romeno.

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