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Document 62015CJ0457

Acórdão do Tribunal de Justiça (Sexta Secção) de 28 de julho de 2016.
Vattenfall Europe Generation AG contra Bundesrepublik Deutschland.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgericht Berlin.
Reenvio prejudicial — Regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na União Europeia — Diretiva 2003/87/CE — Âmbito de aplicação ratione temporis — Momento da constituição da obrigação de comercialização de licenças — Artigo 3.° — Anexo I — Conceito de ‘instalação’ — Atividade de combustão de combustíveis em instalações com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW.
Processo C-457/15.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:613

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção)

28 de julho de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na União Europeia — Diretiva 2003/87/CE — Âmbito de aplicação ratione temporis — Momento da constituição da obrigação de comercialização de licenças — Artigo 3.o — Anexo I — Conceito de ‘instalação’ — Atividade de combustão de combustíveis em instalações com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW»

No processo C‑457/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Verwaltungsgericht Berlim (Tribunal Administrativo de Berlim, Alemanha), por decisão de 12 de março de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 28 de agosto de 2015, no processo

Vattenfall Europe Generation AG

contra

Bundesrepublik Deutschland,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

composto por: A. Arabadjiev, presidente de secção, J.‑C. Bonichot (relator) e S. Rodin, juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Vattenfall Europe Generation AG, por M. Ehrmann, Rechtsanwalt,

em representação do Governo alemão, por T. Henze e K. Petersen, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por E. White e K. Herrmann, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do anexo I da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho (JO 2003, L 275, p. 32), conforme alterada pela Diretiva 2009/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009 (JO 2009, L 140, p. 63) (a seguir «Diretiva 2003/87»), e do artigo 19.o, n.o 2, da Decisão 2011/278/UE da Comissão, de 27 de abril de 2011, sobre a determinação das regras transitórias da União relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito nos termos do artigo 10.o‑A da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2011, L 130, p. 1).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Vattenfall Europe Generation AG (a seguir «Vattenfall») à Bundesrepublik Deutschland (República Federal da Alemanha), a respeito da determinação do momento a partir do qual uma instalação produtora de eletricidade está sujeita à obrigação de comunicação de informações e de devolução de licenças de emissão de gases com efeito de estufa (a seguir «licenças») prevista pela Diretiva 2003/87.

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva 2003/87

3

O artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2003/87 dispõe:

«A presente diretiva aplica‑se às emissões provenientes das atividades enumeradas no anexo I e aos gases com efeito de estufa enumerados no anexo II.»

4

O artigo 3.o desta diretiva tem a seguinte redação:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[...]

b)

‘Emissão’, a libertação de gases com efeito de estufa na atmosfera a partir de fontes existentes numa instalação [...];

[...]

e)

‘Instalação’, a unidade técnica fixa onde se realizam uma ou mais das atividades enumeradas no anexo I e quaisquer outras atividades diretamente associadas que tenham uma relação técnica com as atividades realizadas nesse local e que possam ter influência nas emissões e na poluição;

[...]

t)

‘Combustão’, qualquer oxidação de combustíveis, independentemente da forma de utilização da energia térmica, elétrica ou mecânica produzida por esse processo e quaisquer outras atividades diretamente associadas, incluindo a depuração de efluentes gasosos;

u)

‘Produtor de eletricidade’, uma instalação que, a partir de 1 de janeiro de 2005, produza eletricidade para venda a terceiros e na qual não seja desenvolvida qualquer atividade enumerada no anexo I para além da ‘combustão de combustíveis’».

5

O artigo 4.o da Diretiva 2003/87 dispõe:

«Os Estados‑Membros devem assegurar que, a partir de 1 de janeiro de 2005, nenhuma instalação exerça qualquer atividade enumerada no anexo I de que resultem emissões especificadas em relação a essa atividade, salvo se o respetivo operador possuir um título emitido pela autoridade competente nos termos dos artigos 5.° e 6.° ou a instalação estiver excluída do regime comunitário nos termos do artigo 27.o O mesmo se aplica às instalações contempladas nos termos do artigo 24.o»

6

Nos termos do artigo 6.o da Diretiva 2003/87:

«1.   O título de emissão de gases com efeito de estufa, pelo qual é permitida a emissão de gases com efeito de estufa de uma parte ou da totalidade de uma instalação, é emitido pela autoridade competente mediante prova de que o operador é capaz de monitorizar e comunicar as emissões.

[...]

2.   Os títulos de emissão de gases com efeito de estufa devem incluir os seguintes elementos:

a)

Nome e endereço do operador;

b)

Descrição das atividades e emissões da instalação;

[...]

e)

A obrigação de devolver licenças de emissão, com exclusão das licenças de emissão concedidas ao abrigo do capítulo II, equivalentes ao total das emissões da instalação em cada ano civil, verificadas em conformidade com o artigo 15.o, no prazo de quatro meses a contar do termo do ano em causa.»

7

O artigo 10.o‑A, n.o 3, desta diretiva prevê:

«Sem prejuízo dos n.os 4 e 8 e não obstante o disposto no artigo 10.o‑C, não podem ser atribuídas licenças de emissão a título gratuito a produtores de eletricidade, a instalações de captura de CO2, a condutas para o transporte de CO2 ou a locais de armazenamento de CO2

8

O artigo 12.o, n.o 3, da referida diretiva tem a seguinte redação:

«Os Estados‑Membros devem assegurar a devolução pelo operador de cada instalação, até 30 de abril de cada ano, de um número de licenças de emissão, com exclusão das licenças de emissão concedidas ao abrigo do capítulo II, equivalente ao total das emissões provenientes dessa instalação durante o ano civil anterior, tal como verificadas nos termos do artigo 15.o, e a sua consequente anulação.»

9

O artigo 14.o da Diretiva 2003/87 estabelece que:

«1.   Até 31 de dezembro de 2011, a Comissão aprova um regulamento relativo à vigilância e comunicação de informações relativas a emissões [...], que se deve basear nos princípios de vigilância e comunicação de informações estabelecidos no anexo IV e especificar o potencial de aquecimento global de cada gás com efeito de estufa nos requisitos de vigilância e comunicação de informações relativas a esse gás.

Essa medida, que tem por objeto alterar elementos não essenciais da presente diretiva, completando‑a, é aprovada pelo procedimento de regulamentação com controlo a que se refere o n.o 3 do artigo 23.o

[...]

3.   Os Estados‑Membros asseguram que o operador da instalação ou o operador de aeronaves vigiem e comuniquem anualmente à autoridade competente as informações relativas às emissões da instalação ou, a partir de 1 de janeiro de 2010, de cada aeronave que opera, após o termo de cada ano civil, nos termos do regulamento a que se refere o n.o 1.

[...]»

10

O anexo I da Diretiva 2003/87 enumera as categorias de atividades por ela abrangidas. Entre essas atividades consta, nomeadamente, a «[c]ombustão de combustíveis em instalações com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW (exceto em instalações de incineração de resíduos perigosos ou resíduos urbanos)».

Decisão 2011/278

11

O considerando 31 da Decisão 2011/278 enuncia:

«Uma vez que a partir de 2013 a venda exclusivamente em leilão deverá constituir a regra no setor da eletricidade, tendo em conta a sua capacidade para repercutir o aumento do custo do dióxido de carbono e o facto de que não devem ser atribuídas licenças de emissão a título gratuito para a produção da eletricidade, exceto no caso da atribuição transitória de licenças de emissão a título gratuito com vista à modernização da produção de eletricidade e no caso da eletricidade produzida a partir de gases residuais, a presente decisão não deve abranger a atribuição gratuita de licenças de emissões relativas à produção ou ao consumo de eletricidade. No entanto, nos termos do artigo 10.o‑A, n.o 6, da Diretiva [2003/87], os setores ou subsetores considerados expostos a um risco significativo de fugas de carbono podem ser compensados pelos custos relacionados com as emissões de gases com efeito de estufa repercutidos no preço da eletricidade através de medidas financeiras aprovadas pelos Estados‑Membros, em conformidade com as normas aplicáveis e a aprovar pela Comissão em matéria de auxílios estatais neste domínio.»

12

O artigo 1.o dessa decisão prevê:

«A presente decisão estabelece as regras transitórias da União relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito nos termos da Diretiva [2003/87], a partir de 2013.»

13

O artigo 19.o dessa mesma decisão, intitulado «Atribuição de licenças de emissão a novos operadores», dispõe:

«1.   Para efeitos da atribuição de licenças de emissão a novos operadores, com exceção das atribuições às instalações mencionadas no terceiro travessão do artigo 3.o, alínea h), da Diretiva [2003/87], os Estados‑Membros devem calcular o número anual preliminar de licenças de emissão atribuídas a título gratuito, a partir do início do funcionamento normal da instalação, em relação a cada subinstalação separadamente, da seguinte forma:

[...]

c)

Para cada subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a combustíveis, o número anual preliminar de licenças de emissão atribuídas a título gratuito corresponderá ao valor do parâmetro de referência, mencionado no anexo I, relativo ao combustível em causa, multiplicado pelo nível de atividade com este relacionado;

[...]

2.   Serão atribuídas licenças adicionais para as emissões do novo operador, verificadas independentemente, que tenham ocorrido antes do início do funcionamento normal, com base nas emissões históricas expressas em toneladas de equivalente de dióxido de carbono.

[...]»

Regulamento (UE) n.o 601/2012

14

O artigo 5.o, primeiro parágrafo, do Regulamento (UE) n.o 601/2012 da Comissão, de 21 de junho de 2012, relativo à monitorização e comunicação de informações relativas às emissões de gases com efeito de estufa nos termos da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2012, L 181, p. 30), prevê:

«A monitorização e a comunicação de informações devem ser exaustivas e abranger a totalidade das emissões de processo e de combustão de todas as fontes de emissão e de fluxos‑fonte pertencentes às atividades enumeradas no anexo I da Diretiva [2003/87] e a outras atividades pertinentes abrangidas nos termos do artigo 24.o dessa [d]iretiva, bem como todos os gases com efeito de estufa especificados em relação a essas atividades, evitando a dupla contagem.»

15

O artigo 20.o, n.o 1, deste regulamento dispõe:

«O operador deve definir as fronteiras de monitorização de cada instalação.

Dentro dessas fronteiras, o operador deve incluir todas as emissões de gases com efeito de estufa relevantes a partir de todas as fontes de emissão e de todos os fluxos‑fonte pertencentes às atividades realizadas na instalação e enumeradas no anexo I da Diretiva [2003/87], bem como das atividades e gases com efeito de estufa incluídos por um Estado‑Membro nos termos do artigo 24.o da Diretiva [2003/87].

O operador deve igualmente incluir as emissões de operações normais e de ocorrências anormais, incluindo o início e o termo das emissões, bem como as situações de emergência registadas durante o período de informação, com exceção das emissões de máquinas móveis para transporte.»

Direito alemão

16

O § 2, n.o 1, da Gesetz über den Handel mit Berechtigungen zur Emission von Treibhausgasen (Lei sobre o comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa), de 27 de julho de 2011 (BGBl. I 2011, p. 3154, a seguir «TEHG», prevê:

«A presente lei aplica‑se à emissão dos gases com efeito de estufa referidos no anexo 1, parte 2, produzidos no exercício das atividades aí referidas.

[...]»

17

O anexo 1, parte 2, da TEGH tem a seguinte redação:

«1

Unidades para a combustão de combustíveis em instalações com uma potência térmica nominal total igual ou superior a 20 MW, salvo as previstas nos números seguintes.

2

Instalações para a produção de eletricidade, vapor, água quente, calor industrial ou gases de escape aquecidos através da utilização de combustíveis numa instalação de combustão (como uma central elétrica, central térmica, central de aquecimento, instalação de turbina a gás, instalação de motor a combustão e outras instalações de combustão), incluindo as respetivas caldeiras de vapor, com uma potência calorífica igual ou superior a 50 MW.»

18

O § 18, n.o 4, do Verordnung über die Zuteilung von Treibhausgas‑Emissionsberechtigungen in der Handelsperiode 2013 bis 2020 (Regulamento sobre a atribuição de licenças de emissão de gases com efeito de estufa no período de negociação de 2013 a 2020), de 26 de setembro de 2011 (BGBl. I 2011, 1921), prevê:

«Para as emissões dos elementos de atribuição produzidas antes da entrada em funcionamento normal, são atribuídas licenças adicionais para a nova instalação com base nessas emissões, expressas em toneladas de equivalente dióxido de carbono.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

19

Resulta da decisão de reenvio que a Vattenfall é a operadora de uma nova central elétrica construída em Moorburg, perto de Hamburgo (Alemanha). A potência térmica de combustão de carvão dessa central ascende a 3700 MW.

20

Por duas cartas, de 7 de agosto e de 3 de setembro de 2013, a Vattenfall comunicou à Deutsche Emissionshandelsstelle im Umweltbundesamt (autoridade alemã do comércio de licenças de emissões do Gabinete Federal do Ambiente, a seguir «autoridade do comércio de licenças») que, na medida em que a central de Moorburg se encontrava ainda em fase de construção, não estava sujeita às obrigações de comercialização e de devolução das licenças resultantes do regime estabelecido pela Diretiva 2003/87 (a seguir «regime de comércio de licenças»).

21

A autoridade do comércio de licenças rejeitou, por carta de 18 de setembro de 2013, essa interpretação, pelo que a Vattenfall intentou uma ação no Verwaltungsgericht Berlin (Tribunal Administrativo de Berlim, Alemanha), pedindo que fosse declarado que a obrigação de comercialização de licenças de emissão só se constituía no início dos ensaios efetuados pelo operador.

22

A Vattenfall considera, com efeito, que resulta, nomeadamente, do artigo 3.o, alínea u), da Diretiva 2003/87 que esta só visa as instalações produtoras de eletricidade a partir do momento em que produzam eletricidade para venda a terceiros. A TEHG está, portanto, em conformidade com esta disposição, na medida em que, no seu anexo 1, parte 2, n.o 2, não sujeita ao regime de comércio de licenças as emissões emitidas por centrais elétricas antes da produção de corrente elétrica. A obrigação de comercialização de licenças de emissão só se constitui a partir da receção da instalação pronta a funcionar pelo operador, quando este inicia os ensaios de funcionamento. Esta interpretação é compatível com o anexo 1, parte 2, n.o 1, da TEHG que visa apenas garantir que todos os tipos de instalações são abrangidos pelo seu âmbito de aplicação, mas que não fornece indicações relativas ao seu âmbito de aplicação ratione temporis.

23

Pelo contrário, a República Federal da Alemanha defende que a central de Moorburg, devido à sua potência térmica superior a 20 MW, está sujeita à obrigação de comercialização de licenças desde o momento em que começou a emitir gases com efeito de estufa ligados à sua atividade, independentemente da finalidade da combustão. Com efeito, a atividade de uma instalação inicia‑se com os primeiros ensaios de funcionamento e, consequentemente, com a emissão de gases com efeito de estufa pela instalação, seja qual for a sua razão. Esta regra resulta da TEHG, cujo anexo 1, parte 2, n.o 1, prevê que todas as emissões que resultam de uma combustão devem ser tidas em conta. Está em conformidade quer com o conceito de combustão que figura no artigo 3.o, alínea t), da Diretiva 2003/87 quer com os limites temporais da monitorização das emissões previstos no artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento n.o 601/2012.

24

O órgão jurisdicional de reenvio salienta, a este respeito, que nem o direito alemão nem o direito da União regulam expressamente o momento a partir do qual as instalações que entrem em funcionamento durante o período de comercialização que vai de 2013 a 2020 estão sujeitas à obrigação de comercialização de licenças. Todavia, uma resposta a esta questão poderia ser encontrada no anexo I da Diretiva 2003/87, que visa a «[c]ombustão de combustíveis em instalações com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW», e no artigo 19.o, n.o 2, da Decisão 2011/278. Em particular, mesmo que esta última decisão não seja aplicável às instalações destinadas a produzir eletricidade, pode concluir‑se do seu artigo 19.o, n.o 2, relativo aos novos operadores, que a obrigação de comercialização de licenças se constitui antes do início do funcionamento normal dessas instalações. Em contrapartida, se esta obrigação só se constitui a partir do início do funcionamento normal, a Vattenfall devolveu um número de licenças demasiado elevado.

25

Nestas circunstâncias, o Verwaltungsgericht Berlin (Tribunal Administrativo de Berlim) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

A inclusão da categoria [de atividade ‘C]ombustão de combustíveis em instalações com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW’ no anexo I da Diretiva 2003/87[...] implica que a obrigação de comercialização de licenças de emissão para uma instalação de produção de eletricidade se constitui no momento da primeira emissão de gases com efeito de estufa e, assim, possivelmente antes do momento da primeira produção de eletricidade por essas instalações?

2)

Em caso de resposta negativa à primeira questão:

Deve o artigo 19.o, n.o 2, da Decisão 2011/278[...], ser interpretado no sentido de que a emissão de gases com efeito de estufa ocorrida antes do início do funcionamento normal de uma instalação abrangida pelo [a]nexo I da Diretiva 2003/87[...] gera, logo no momento da primeira emissão durante a fase de construção das instalações, a obrigação do respetivo operador de comunicar informações e de [devolver] licenças de emissão?

3)

Em caso de resposta afirmativa à segunda questão:

Deve o artigo 19.o, n.o 2, da Decisão [2011/278] ser interpretado no sentido de que se opõe à aplicação da disposição nacional de transposição prevista no § 18, n.o 4, do [...] [regulamento de atribuição de licenças de emissão de [2013 a] 2020] às instalações de produção de eletricidade, para determinar o início da obrigação de comercialização de licenças de emissão?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

26

Com a sua primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o anexo I da Diretiva 2003/87, na medida em que inclui a «[c]ombustão de combustíveis em instalações com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW» na lista das categorias de atividade a que se aplica essa diretiva, deve ser interpretado no sentido de que a obrigação de comercialização de licenças de uma instalação destinada a produzir eletricidade se constitui no momento da primeira emissão de gases com efeito de estufa e, assim, possivelmente antes mesmo da primeira produção de eletricidade por essas instalações.

27

Há que lembrar que a economia geral da Diretiva 2003/87 assenta numa contabilidade rigorosa da concessão, detenção, transferência e anulação das licenças. Esta contabilidade precisa é inerente ao próprio objeto dessa diretiva, isto é, a criação de um regime de comércio de licenças, que visa reduzir as emissões desses gases na atmosfera para um nível que evite uma perturbação antrópica perigosa do clima e cujo objetivo último consiste na proteção do ambiente (v., neste sentido, acórdão de 29 de abril de 2015, Nordzucker, C‑148/14, EU:C:2015:287, n.o 28).

28

Para efeitos da aplicação desse regime, o artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2003/87 prevê que o seu âmbito de aplicação se estende às emissões provenientes das atividades enumeradas no anexo I e aos gases com efeito de estufa enumerados no anexo II, entre os quais, nomeadamente, o dióxido de carbono.

29

Além disso, resulta do artigo 4.o dessa mesma diretiva que os Estados‑Membros têm de assegurar que nenhuma instalação exerça qualquer atividade enumerada no anexo I de que resultem emissões especificadas em relação a essa atividade, sem que o respetivo operador possua um título emitido pela autoridade competente nos termos das condições previstas por essa mesma diretiva.

30

De acordo com o artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 2003/87, a emissão de tal título está sujeita à observância, nomeadamente, da obrigação referida no artigo 12.o, n.o 3, da mesma, segundo a qual os operadores têm de devolver, até 30 de abril do ano em curso, para anulação, um número de licenças equivalente ao total das suas emissões durante o ano civil anterior (v., neste sentido, acórdão de 29 de abril de 2015, Nordzucker, C‑148/14, EU:C:2015:287, n.o 29).

31

Conforme resulta do artigo 14.o, n.o 3, da Diretiva 2003/87, esta obrigação de devolução baseia‑se nos relatórios elaborados pelos operadores de cada unidade, em conformidade com as regras enunciadas no regulamento cuja adoção incumbe à Comissão nos termos do artigo 14.o, n.o 1, dessa diretiva (v., neste sentido, acórdão de 29 de abril de 2015, Nordzucker, C‑148/14, EU:C:2015:287, n.o 31).

32

Com base nesta última disposição, a Comissão adotou o Regulamento n.o 601/2012, cujo artigo 20.o, n.o 1, segundo parágrafo, prevê que, dentro das fronteiras de monitorização definidas para cada instalação pelo operador, este deve incluir todas as emissões de gases com efeito de estufa relevantes a partir de todas as fontes de emissão e de todos os fluxos‑fonte pertencentes às atividades realizadas na instalação e enumeradas no anexo I da Diretiva 2003/87.

33

O artigo 20.o, n.o 1, terceiro parágrafo, do Regulamento n.o 601/2012 precisa que esta obrigação visa não apenas as emissões de operações normais, mas também as que são geradas aquando de ocorrências anormais, como o arranque e a paragem de uma instalação. Uma vez que esta enumeração não é exaustiva, as emissões geradas aquando de outras ocorrências anormais, como as que têm lugar durante o período de ensaio de uma instalação, devem também ser tidas em conta para efeitos da monitorização e da comunicação das emissões.

34

Além disso, deve ser recordado que o artigo 3.o, alínea e), da Diretiva 2003/87 define instalação, para efeitos desta diretiva, como a unidade técnica fixa onde se realizam uma ou mais das atividades enumeradas no seu anexo I e quaisquer outras atividades diretamente associadas que tenham uma relação técnica com as atividades realizadas nesse local e que possam ter influência nas emissões e na poluição (acórdão de 9 de junho de 2016, Elektriciteits Produktiemaatschappij Zuid‑Nederland EPZ, C‑158/15, EU:C:2016:422, n.o 25).

35

Entre as atividades referidas no anexo I dessa mesma diretiva consta a combustão de combustíveis em instalações com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW, exceto em instalações de incineração de resíduos perigosos ou resíduos urbanos.

36

Quanto ao conceito de combustão, esta é definida no artigo 3.o, alínea t), da Diretiva 2003/87 como sendo qualquer oxidação de combustíveis, independentemente da forma de utilização da energia térmica, elétrica ou mecânica produzida por esse processo e quaisquer outras atividades diretamente associadas.

37

É, portanto, irrelevante a circunstância de, num primeiro período de ensaio durante o qual foram libertados gases com efeito de estufa na atmosfera, uma central elétrica abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2003/87 não produzir eletricidade, uma vez que é necessário, relativamente à obrigação de devolução de licenças, que o calor resultante da combustão de combustíveis seja utilizado para esse fim.

38

Resulta do exposto que uma instalação destinada a produzir eletricidade pela combustão de combustíveis cuja capacidade de rendimento ultrapassa o valor previsto no anexo I da Diretiva 2003/87 está sujeita às obrigações que o regime de comércio das licenças implica e, em particular, à obrigação de comunicação das emissões a partir de todas as fontes de emissão e de todos os fluxos‑fonte pertencentes às atividades realizadas na instalação, incluindo as emissões geradas num período de ensaio prévio à entrada em funcionamento normal dessa instalação.

39

Esta interpretação da Diretiva 2003/87 é conforme com o seu objetivo principal, isto é, a proteção do ambiente através de uma redução das emissões de gases com efeito de estufa (v., neste sentido, acórdão de 28 de abril de 2016, Borealis Polyolefine e o., C‑191/14, C‑192/14, C‑295/14, C‑389/14 e C‑391/14 a C‑393/14, EU:C:2016:311, n.o 79) e não pode ser infirmada pelo facto de a qualificação de uma instalação de produtor de eletricidade, na aceção do artigo 3.o, alínea u), dessa diretiva, estar sujeita à condição de produção de eletricidade destinada à venda a terceiros.

40

Com efeito, esta disposição não se destina a definir o âmbito de aplicação da Diretiva 2003/87, mas contribui para a aplicação de uma distinção importante para a determinação da quantidade anual máxima de licenças na aceção do artigo 10.o‑A, n.o 5, dessa diretiva (v., neste sentido, acórdão de 28 de abril de 2016, Borealis Polyolefine e o., C‑191/14, C‑192/14, C‑295/14, C‑389/14 e C‑391/14 a C‑393/14, EU:C:2016:311, n.os 64 a 70).

41

Como o Tribunal de Justiça já decidiu, nos termos do artigo 10.o‑A, n.o 1, terceiro parágrafo, e do artigo 10.o‑A, n.os 3 a 5, da Diretiva 2003/87, há que distinguir as instalações abrangidas pelo artigo 10.o‑A, n.o 3, desta diretiva das outras instalações que geram emissões de gases com efeito de estufa. Entre as primeiras figuram, nomeadamente, os produtores de eletricidade na aceção do artigo 3.o, alínea u), da referida diretiva (acórdão de 28 de abril de 2016, Borealis Polyolefine e o., C‑191/14, C‑192/14, C‑295/14, C‑389/14 e C‑391/14 a C‑393/14, EU:C:2016:311, n.o 70).

42

Além disso, há que precisar que a circunstância de essas obrigações se dirigirem ao operador de uma instalação não significa que as emissões geradas aquando dos ensaios efetuados pelo seu construtor não devam ser tidas em conta. Com efeito, por um lado, e como afirmou a Comissão, o conceito de «produtor de eletricidade» referido no artigo 3.o, alínea u), da Diretiva 2003/87 não é relevante para efeitos da constituição da obrigação de comercialização de licenças de emissões. Por outro lado, a obrigação de declaração e de devolução do operador respeita também a essas emissões, uma vez que o regime de comércio de licenças se aplica, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, dessa diretiva, a todas as emissões provenientes das atividades enumeradas no seu anexo I.

43

Tendo em conta o exposto, há que responder à primeira questão que o anexo I da Diretiva 2003/87, na medida em que inclui a «[c]ombustão de combustíveis em instalações com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW» na lista das categorias de atividade a que se aplica essa diretiva, deve ser interpretado no sentido de que a obrigação de comercialização de licenças de uma instalação destinada a produzir eletricidade se constitui no momento da primeira emissão de gases com efeito de estufa e, assim, possivelmente antes mesmo da primeira produção de eletricidade por essas instalações.

Quanto à segunda e terceira questões

44

Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, não há que responder à segunda e terceira questões.

Quanto às despesas

45

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sexta Secção) declara:

 

O anexo I da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho, conforme alterada pela Diretiva 2009/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, na medida em que inclui a «[c]ombustão de combustíveis em instalações com uma potência térmica nominal total superior a 20 MW» na lista das categorias de atividade a que se aplica essa Diretiva 2003/87, conforme alterada, deve ser interpretado no sentido de que a obrigação de comercialização de licenças de uma instalação destinada a produzir eletricidade se constitui no momento da primeira emissão de gases com efeito de estufa e, assim, possivelmente antes mesmo da primeira produção de eletricidade por essas instalações.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua de processo: alemão.

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