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Document 62015CJ0404

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 5 de abril de 2016.
Pál Aranyosi e Robert Căldăraru.
Pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Hanseatisches Oberlandesgericht in Bremen.
Reenvio prejudicial — Cooperação policial e judiciária em matéria penal — Decisão Quadro 2002/584/JAI — Mandado de detenção europeu — Motivos de recusa de execução — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 4.° — Proibição dos tratos desumanos ou degradantes — Condições de detenção no Estado‑Membro de emissão.
Processos apensos C-404/15 e C-659/15 PPU.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:198

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

5 de abril de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Cooperação policial e judiciária em matéria penal — Decisão‑Quadro 2002/584/JAI — Mandado de detenção europeu — Motivos de recusa de execução — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 4.o — Proibição dos tratos desumanos ou degradantes — Condições de detenção no Estado‑Membro de emissão»

Nos processos apensos C‑404/15 e C‑659/15 PPU,

que têm por objeto dois pedidos de decisão prejudicial apresentados, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Hanseatisches Oberlandesgericht in Bremen (Tribunal Regional Superior de Bremen, Alemanha), por decisões de 23 de julho e 8 de dezembro de 2015, que deram entrada no Tribunal de Justiça, respetivamente, em 24 de julho e 9 de dezembro de 2015, nos processos relativos à execução de mandados de detenção europeus emitidos contra

Pál Aranyosi (C‑404/15),

Robert Căldăraru (C‑659/15 PPU),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

composto por: K. Lenaerts, presidente, A. Tizzano, vice‑presidente, L. Bay Larsen, T. von Danwitz e D. Šváby, presidentes de secção, A. Rosas, E. Juhász, A. Borg Barthet, J. Malenovský, M. Safjan (relator), M. Berger, A. Prechal, E. Jarašiūnas, M. Vilaras e E. Regan, juízes,

advogado‑geral: Y. Bot

secretário: M. Aleksejev, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 15 de fevereiro de 2016,

vistas as observações apresentadas:

em representação de P. Aranyosi, por R. Chekerov, Rechtsanwältin,

em representação de R. Căldăraru, por J. van Lengerich, Rechtsanwalt,

em representação do Generalstaatsanwaltschaft Bremen, por M. Glasbrenner, Oberstaatsanwalt,

em representação do Governo alemão, por T. Henze, M. Hellmann e J. Kemper, na qualidade de agentes,

em representação do Governo checo, por M. Smolek e J. Vláčil, na qualidade de agentes,

em representação da Irlanda, por E. Creedon, L. Williams, G. Mullan e A. Joyce, na qualidade de agentes,

em representação do Governo espanhol, por M. A. Sampol Pucurull, na qualidade de agente,

em representação do Governo francês, por F.‑X. Bréchot, D. Colas e G. de Bergues, na qualidade de agentes,

em representação do Governo lituano, por D. Kriaučiūnas e J. Nasutavičienė, na qualidade de agentes,

em representação do Governo húngaro, por M. Fehér, G. Koós e M. Bóra, na qualidade de agentes,

em representação do Governo neerlandês, por M. Bulterman e J. Langer, na qualidade de agentes,

em representação do Governo austríaco, por G. Eberhard, na qualidade de agente,

em representação do Governo romeno, por R. Radu e M. Bejenar, na qualidade de agentes,

em representação do Governo do Reino Unido, por V. Kaye, na qualidade de agente, assistida por J. Holmes, barrister,

em representação da Comissão Europeia, por W. Bogensberger e R. Troosters, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 3 março de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

Os pedidos de decisão prejudicial têm por objeto a interpretação dos artigos 1.°, n.o 3, 5.° e 6.°, n.o 1, da Decisão‑Quadro 2002/584/JAI do Conselho, de 13 de junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados‑Membros (JO L 190, p. 1), conforme alterada pela Decisão‑Quadro 2009/299/JAI do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009 (JO L 81, p. 24, a seguir «decisão‑quadro»).

2

Estes pedidos foram apresentados no âmbito da execução, na Alemanha, de dois mandados de detenção europeus emitidos, respetivamente, em 4 de novembro e 31 de dezembro de 2014 pelo juiz de instrução do Miskolci járásbíróság (Tribunal de Comarca de Miskolc, Hungria) contra P. Aranyiosi, e de um mandado de detenção europeu emitido em 29 de outubro de 2015 pelo Judecătoria Făgăraş (Tribunal de Primeira Instância de Fagaras, Roménia) contra R. Căldăraru.

Quadro jurídico

CEDH

3

Sob a epígrafe «Proibição da tortura», o artigo 3.o da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»), dispõe:

«Ninguém pode ser submetido a torturas, nem a penas ou tratamentos desumanos ou degradantes.»

4

O artigo 15.o da CEDH, sob a epígrafe «Derrogação em caso de estado de necessidade», prevê:

«1.   Em caso de guerra ou de outro perigo público que ameace a vida da nação, qualquer Alta Parte Contratante pode tomar providências que derroguem as obrigações previstas na presente Convenção, na estrita medida em que o exigir a situação, e em que tais providências não estejam em contradição com as outras obrigações decorrentes do direito internacional.

2.   A disposição precedente não autoriza nenhuma derrogação [...] aos artigos 3.° [...]

[...]»

5

O artigo 46.o da CEDH, sob a epígrafe «Força vinculativa e execução das sentenças», prevê, no seu n.o 2:

«A sentença definitiva do Tribunal [Europeu dos Direitos do Homem (a seguir ‘TEDH’)] será transmitida ao Comité de Ministros, o qual velará pela sua execução.»

Direito da União

Carta

6

Nos termos do artigo 1.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), sob a epígrafe «Dignidade do ser humano»:

«A dignidade do ser humano é inviolável. Deve ser respeitada e protegida.»

7

O artigo 4.o da Carta, sob a epígrafe «Proibição da tortura e dos tratos ou penas desumanos ou degradantes», enuncia:

«Ninguém pode ser submetido a tortura, nem a tratos ou penas desumanos ou degradantes.»

8

As Anotações relativas à Carta dos Direitos Fundamentais (JO 2007, C 303, p. 17, a seguir «anotações relativas à Carta») precisam que «[o] direito consagrado no artigo 4.o [da Carta] é o direito garantido pelo artigo 3.o, de igual teor, da CEDH [...] Em aplicação do n.o 3 do artigo 52.o da Carta, tem por conseguinte um sentido e um âmbito iguais aos daquele artigo».

9

O artigo 6.o da Carta, sob a epígrafe «Direito à liberdade e à segurança», prevê:

«Toda a pessoa tem direito à liberdade e segurança.»

10

O artigo 48.o da Carta, sob a epígrafe «Presunção de inocência e direitos de defesa», prevê, no seu n.o 1:

«Todo o arguido se presume inocente enquanto não tiver sido legalmente provada a sua culpa.»

11

O artigo 51.o da Carta, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», dispõe, no seu n.o 1:

«As disposições da presente Carta têm por destinatários as instituições, órgãos e organismos da União, na observância do princípio da subsidiariedade, bem como os Estados‑Membros, apenas quando apliquem o direito da União. [...]»

12

O artigo 52.o da Carta, sob a epígrafe «Âmbito e interpretação dos direitos e dos princípios», enuncia, no seu n.o 1:

«Qualquer restrição ao exercício dos direitos e liberdades reconhecidos pela presente Carta deve ser prevista por lei e respeitar o conteúdo essencial desses direitos e liberdades. Na observância do princípio da proporcionalidade, essas restrições só podem ser introduzidas se forem necessárias e corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União, ou à necessidade de proteção dos direitos e liberdades de terceiros.»

Decisão‑quadro

13

Os considerandos 5 a 8, 10 e 12 da decisão‑quadro têm a seguinte redação:

«(5)

[...] a instauração de um novo regime simplificado de entrega de pessoas condenadas ou suspeitas para efeitos de execução de sentenças ou de procedimento penal permite suprimir a complexidade e a eventual morosidade inerentes aos atuais procedimentos de extradição. [...]

(6)

O mandado de detenção europeu previsto na presente decisão‑quadro constitui a primeira concretização no domínio do direito penal, do princípio do reconhecimento mútuo, que o Conselho Europeu qualificou de ‘pedra angular’ da cooperação judiciária.

(7)

Como o objetivo de substituir o sistema de extradição multilateral baseado na Convenção europeia de extradição de 13 de dezembro de 1957 não pode ser suficientemente realizado pelos Estados‑Membros agindo unilateralmente e pode, pois, devido à sua dimensão e aos seus efeitos, ser melhor alcançado ao nível da União, o Conselho pode adotar medidas em conformidade com o princípio da subsidiariedade referido no artigo 2.o [UE] e no artigo 5.o [CE]. Em conformidade com o princípio da proporcionalidade estabelecido neste último artigo, a presente decisão‑quadro não excede o necessário para atingir aquele objetivo.

(8)

As decisões sobre a execução do mandado de detenção europeu devem ser objeto de um controlo adequado, o que implica que deva ser a autoridade judiciária do Estado‑Membro onde a pessoa procurada foi detida a tomar a decisão sobre a sua entrega.

[...]

(10)

O mecanismo do mandado de detenção europeu é baseado num elevado grau de confiança entre os Estados‑Membros. A execução desse mecanismo só poderá ser suspensa no caso de violação grave e persistente, por parte de um Estado‑Membro, dos princípios enunciados no n.o 1 do artigo 6.o [UE que passou, após alteração, a artigo 2.o TUE], verificada pelo Conselho nos termos do n.o 1 do artigo 7.o [UE que passou, após alteração, a artigo 7.o, n.o 2, TUE] e com as consequências previstas no n.o 2 do mesmo artigo.

[...]

(12)

A presente decisão‑quadro respeita os direitos fundamentais e observa os princípios reconhecidos pelo artigo 6.o [UE] e consignados na Carta […], nomeadamente o seu capítulo VI. Nenhuma disposição da presente decisão‑quadro poderá ser interpretada como proibição de recusar a entrega de uma pessoa relativamente à qual foi emitido um mandado de detenção europeu quando existam elementos objetivos que confortem a convicção de que o mandado de detenção europeu é emitido para mover procedimento contra ou punir uma pessoa em virtude do sexo, da sua raça, da sua religião, da sua ascendência étnica, da sua nacionalidade, da sua língua, da sua opinião política ou da sua orientação sexual, ou de que a posição dessa pessoa possa ser lesada por alguns desses motivos.

[…]»

14

O artigo 1.o da decisão‑quadro, sob a epígrafe «Definição de mandado de detenção europeu e obrigação de o executar», prevê:

«1.   O mandado de detenção europeu é uma decisão judiciária emitida por um Estado‑Membro com vista à detenção e entrega por outro Estado‑Membro de uma pessoa procurada para efeitos de procedimento penal ou de cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas de liberdade.

2.   Os Estados‑Membros executam todo e qualquer mandado de detenção europeu com base no princípio do reconhecimento mútuo e em conformidade com o disposto na presente decisão‑quadro.

3.   A presente decisão‑quadro não tem por efeito alterar a obrigação de respeito dos direitos fundamentais e dos princípios jurídicos fundamentais consagrados pelo artigo 6.o [UE].»

15

Os artigos 3.°, 4.° e 4.°‑A da decisão‑quadro enunciam os motivos de não execução obrigatória e facultativa do mandado de detenção europeu.

16

O artigo 5.o da decisão‑quadro, sob a epígrafe «Garantias a fornecer pelo Estado‑Membro de emissão em casos especiais», dispõe:

«A execução do mandado de detenção europeu pela autoridade judiciária de execução pode estar sujeita pelo direito do Estado‑Membro de execução a uma das seguintes condições:

[...]

2.

Quando a infração que determina o mandado de detenção europeu for punível com pena ou medida de segurança privativas da liberdade com caráter perpétuo, a execução do mandado de detenção europeu pode ficar sujeita à condição de que o Estado‑Membro de emissão preveja no seu sistema jurídico uma revisão da pena proferida — a pedido ou, o mais tardar, no prazo de 20 anos — ou a aplicação das medidas de clemência a que a pessoa tenha direito nos termos do direito ou da prática do Estado‑Membro de emissão, com vista a que tal pena ou medida não seja executada;

3.

Quando a pessoa sobre a qual recai um mandado de detenção europeu para efeitos de procedimento penal for nacional ou residente do Estado‑Membro de execução, a entrega pode ficar sujeita à condição de que a pessoa, após ter sido ouvida, seja devolvida ao Estado‑Membro de execução para nele cumprir a pena ou medida de segurança privativas de liberdade proferida contra ela no Estado‑Membro de emissão.»

17

Nos termos do artigo 6.o da decisão‑quadro, sob a epígrafe «Determinação das autoridades judiciárias competentes»:

«1.   A autoridade judiciária de emissão é a autoridade judiciária do Estado‑Membro de emissão competente para emitir um mandado de detenção europeu nos termos do direito desse Estado.

2.   A autoridade judiciária de execução é a autoridade judiciária do Estado‑Membro de execução competente para executar o mandato de detenção europeu nos termos do direito desse Estado.

3.   Cada Estado‑Membro informa o Secretariado‑Geral do Conselho da autoridade judiciária competente nos termos do respetivo direito nacional.»

18

O artigo 7.o da decisão‑quadro, sob a epígrafe «Recurso à autoridade central», tem a seguinte redação:

«1.   Cada Estado‑Membro pode designar uma autoridade central ou, quando o seu ordenamento jurídico o previr, várias autoridades centrais, para assistir as autoridades judiciárias competentes.

2.   Um Estado‑Membro pode, se a organização do seu sistema judiciário interno o exigir, confiar à sua autoridade central ou às suas autoridades centrais a transmissão e a receção administrativas dos mandados de detenção europeus bem como de qualquer outra correspondência oficial que lhes diga respeito.

O Estado‑Membro que pretender utilizar as possibilidades estabelecidas no presente artigo deve comunicar ao Secretariado‑Geral do Conselho as informações relativas à autoridade central ou às autoridades centrais designadas. Essas indicações vinculam todas as autoridades do Estado‑Membro de emissão.»

19

O artigo 12.o da decisão‑quadro, sob a epígrafe «Manutenção da pessoa em detenção», estabelece:

«Quando uma pessoa for detida com base num mandado de detenção europeu, a autoridade judiciária de execução decide se deve mantê‑la em detenção em conformidade com o direito do Estado‑Membro de execução. A libertação provisória é possível a qualquer momento de acordo com o direito nacional do Estado‑Membro de execução, na condição de a autoridade competente deste Estado‑Membro tomar todas as medidas que considerar necessárias a fim de evitar a fuga da pessoa procurada.»

20

O artigo 15.o da decisão‑quadro, sob a epígrafe «Decisão sobre a entrega», prevê:

«1.   A autoridade judiciária de execução decide da entrega da pessoa nos prazos e nas condições definidos na presente decisão‑quadro.

2.   Se a autoridade judiciária de execução considerar que as informações comunicadas pelo Estado‑Membro de emissão são insuficientes para que possa decidir da entrega, solicita que lhe sejam comunicadas com urgência as informações complementares necessárias, em especial, em conexão com os artigos 3.° a 5.° e o artigo 8.o, podendo fixar um prazo para a sua receção, tendo em conta a necessidade de respeitar os prazos fixados no artigo 17.o

3.   A autoridade judiciária de emissão pode, a qualquer momento, transmitir todas as informações suplementares úteis à autoridade judiciária de execução.»

21

O artigo 17.o da decisão‑quadro, sob a epígrafe «Prazos e regras relativos à decisão de execução do mandado de detenção europeu», dispõe:

«1.   Um mandado de detenção europeu deve ser tratado e executado com urgência.

2.   Nos casos em que a pessoa procurada consinta na sua entrega, a decisão definitiva sobre a execução do mandado de detenção europeu deve ser tomada no prazo de 10 dias a contar da data do consentimento.

3.   Nos outros casos, a decisão definitiva sobre a execução do mandado de detenção europeu deve ser tomada no prazo de 60 dias após a detenção da pessoa procurada.

4.   Em casos específicos, quando o mandado de detenção europeu não possa ser executado dentro dos prazos previstos nos n.os 2 ou 3, a autoridade judiciária de execução informa imediatamente a autoridade judiciária de emissão do facto e das respetivas razões. Neste caso, os prazos podem ser prorrogados por mais 30 dias.

5.   Enquanto não for tomada uma decisão definitiva sobre a execução do mandado de detenção europeu pela autoridade judiciária de execução, o Estado‑Membro de execução deve zelar por que continuem a estar reunidas as condições materiais necessárias para uma entrega efetiva da pessoa.

[...]

7.   Sempre que, em circunstâncias excecionais, um Estado‑Membro não possa observar os prazos fixados no presente artigo, deve informar a Eurojust do facto e das razões do atraso. Além disso, um Estado‑Membro que tenha sofrido, por parte de outro Estado‑Membro, atrasos repetidos na execução de mandados de detenção europeus, deve informar o Conselho do facto, com vista à avaliação, a nível dos Estados‑Membros, da aplicação da presente decisão‑quadro.»

22

Nos termos do artigo 23.o da decisão‑quadro, sob a epígrafe «Prazo para a entrega da pessoa»:

«1.   A pessoa procurada deve ser entregue o mais rapidamente possível, numa data acordada entre as autoridades interessadas.

2.   A entrega deve efetuar‑se no prazo máximo de 10 dias, a contar da decisão definitiva de execução do mandado de detenção europeu.

[...]

4.   A entrega pode ser temporariamente suspensa por motivos humanitários graves, por exemplo, se existirem motivos válidos para considerar que a entrega colocaria manifestamente em perigo a vida ou a saúde da pessoa procurada. A execução do mandado de detenção europeu deve ser efetuada logo que tais motivos deixarem de existir. A autoridade judiciária de execução informa imediatamente do facto a autoridade judiciária de emissão e acorda com ela uma nova data de entrega. Nesse caso, a entrega deve ser realizada no prazo de 10 dias a contar da nova data acordada.

5.   Se, findos os prazos referidos nos n.os 2 a 4, a pessoa ainda se encontrar detida, deve ser posta em liberdade.»

Direito alemão

23

A decisão‑quadro foi transposta para a ordem jurídica alemã pelos §§ 78 a 83 k da Lei da cooperação judiciária internacional em matéria penal (Gesetz über die internationale Rechtshilfe in Strafsachen), de 23 de dezembro de 1982, conforme alterada pela Lei do mandado de detenção europeu (Europäisches Haftbefehlsgesetz), de 20 de julho de 2006 (BGBl. 2006 I, p. 1721, a seguir «IRG»).

24

Nos termos do § 15 da IRG, sob a epígrafe «Detenção com vista à extradição»:

«1.   Após receção do pedido de extradição, a detenção do arguido para efeitos de extradição pode ser ordenada se:

1)

existir o risco de que eluda o processo de extradição ou a execução da extradição ou

2)

os factos concretos derem origem a uma forte suspeita de que o arguido vai dificultar a investigação da verdade no processo estrangeiro e no processo de extradição.

2.   O n.o 1 não se aplica quando a extradição parecer, à primeira vista, ilícita.»

25

O § 24 da IRG, sob a epígrafe «Anulação do mandado de detenção emitido para efeitos de extradição», prevê:

«1.   O mandado de detenção emitido para efeitos de extradição deve ser anulado quando cessem as condições da detenção provisória para efeitos de extradição ou da detenção para efeitos de extradição ou quando a extradição for declarada ilícita.

2.   O mandado de detenção emitido para efeitos de extradição deve também ser anulado a pedido do Ministério Público do Tribunal Regional Superior. Simultaneamente com o pedido, o Ministério Público ordena a libertação do arguido.»

26

Nos termos do § 29, n.o 1, da IRG, o Tribunal Regional Superior decide, a pedido do Ministério Público, quanto à licitude da extradição quando o arguido não tiver dado o seu acordo à extradição. A decisão é proferida por despacho, de acordo com o § 32 da IRG.

27

O § 73 da IRG enuncia:

«Na falta de um pedido nesse sentido, a cooperação judiciária e a transmissão de informações são ilícitas se infringirem princípios essenciais da ordem jurídica alemã. Em caso de pedido nos termos das partes oito, nove e dez, a cooperação judiciária é ilícita se infringir os princípios enunciados no artigo 6.o TUE.»

Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

Processo C‑404/15

28

P. Aranyosi é um cidadão húngaro nascido em 14 de julho de 1996 em Szikszó (Hungria).

29

O juiz de instrução do Miskolci járásbíróság (Tribunal Distrital de Miskolc) emitiu dois mandados de detenção europeus, respetivamente, em 4 de novembro e 31 de dezembro de 2014, contra P. Aranyosi, com vista à sua entrega às autoridades judiciárias húngaras para efeitos de procedimentos penais.

30

De acordo com o mandado de detenção europeu de 4 de novembro de 2014, P. Aranyosi introduziu‑se em 3 de agosto de 2014 numa habitação em Sajohidveg (Hungria). No decurso deste arrombamento, o arguido furtou, designadamente, 2500 euros e 100000 florins húngaros (HUF) (cerca de 313 euros) em dinheiro e diversos objetos de valor.

31

Por outro lado, de acordo com o mandado de detenção europeu de 31 de dezembro de 2014, P. Aranyosi é acusado de se ter introduzido, em 19 de janeiro de 2014, pela janela, numa escola de Sajohidveg e de ter, em seguida, danificado várias portas no interior do edifício e furtado dispositivos técnicos e dinheiro. O valor indicado do furto é de 244000 HUF (cerca de 760 euros) e o dos danos patrimoniais de 55000 HUF (cerca de 170 euros).

32

P. Aranyosi foi temporariamente detido em 14 de janeiro de 2015 em Bremen (Alemanha) devido a um aviso de procura introduzido no Sistema de Informação Schengen. Foi ouvido no mesmo dia pelo juiz de instrução preliminar do Amtsgericht Bremen (Tribunal de Comarca de Bremen, Alemanha).

33

P. Aranyosi declarou que era cidadão húngaro, que residia em Bremerhaven (Alemanha) com a sua mãe, que era solteiro, que tinha uma companheira e um filho de 8 meses. Contestou os factos de que era acusado e indicou que não consentia no processo de entrega simplificado.

34

O representante do procurador‑geral de Bremen ordenou a libertação de P. Aranyosi devido à inexistência de risco aparente de este eludir o processo de entrega. Em 14 de janeiro de 2015, o Generalstaatsanwaltschaft Bremen (Ministério Público de Bremen), referindo‑se a condições de detenção em determinados estabelecimentos penitenciários húngaros que não cumprem as normas mínimas europeias, perguntou ao Miskolci járásbíróság (Tribunal de Comarca de Miskolc) em que estabelecimento o arguido seria preso em caso de entrega.

35

Por carta de 20 de fevereiro de 2015, recebida por telecópia em 15 de abril de 2015 através do Ministério da Justiça húngaro, o Ministério Público da Comarca de Miskolc referiu que, no caso em apreço, a medida coerciva da detenção preventiva aplicada nos processos penais e o pedido de pena privativa da liberdade não eram indispensáveis.

36

O referido Ministério Público indicou que existiam, em direito penal húngaro, várias medidas coercivas menos restritivas do que a privação de liberdade e que podiam ser consideradas várias outras sanções que não implicavam nenhuma privação de liberdade. A medida coerciva pedida antes da decisão de acusação e a sanção pedida nessa decisão estão abrangidas pelo monopólio de acusação do Ministério Público, que é independente.

37

Ainda segundo o Ministério Público da Comarca de Miskolc, a determinação da infração e a escolha das sanções a aplicar são da competência das autoridades judiciárias húngaras. A este respeito, as leis húngaras preveem, para o processo penal, garantias equivalentes que assentam nos valores europeus.

38

Em 21 de abril de 2015, o Ministério Público de Bremen pediu que a entrega de P. Aranyosi à autoridade judiciária de emissão para efeitos de procedimentos penais fosse declarada lícita. Referiu, designadamente, que, embora o Ministério Público da Comarca de Miskolc não tenha indicado em que estabelecimento penitenciário o arguido seria preso em caso de entrega à Hungria, não existia, todavia, nenhum indício concreto de que, em caso de entrega, o arguido pudesse ser vítima de tortura ou de outros tratos cruéis, desumanos ou degradantes.

39

O advogado de P. Aranyosi pediu que fosse negado provimento ao pedido do Ministério Público de Bremen por o Ministério Público do distrito de Miskolc não ter indicado em que estabelecimento penitenciário o arguido seria preso. Alegou que, assim, era impossível verificar as condições de detenção.

40

O Hanseatisches Oberlandesgericht in Bremen (Tribunal Regional Superior de Bremen) salienta que o pedido apresentado pela Hungria respeita as condições a que estão sujeitos os pedidos de entrega no âmbito da IRG.

41

Os factos imputados a P. Aranyosi constituem, designadamente, uma infração penal nos termos tanto do artigo 370.o, n.o 1, do Código Penal húngaro como dos §§ 242, 243, n.o 1, ponto 1, e 244, n.o 1, ponto 3, do Código Penal alemão. Nos dois Estados‑Membros em causa esses factos são qualificados de crime punível com uma pena de, pelo menos, um ano de prisão, por força dos direitos húngaro e alemão.

42

Contudo, de acordo com o Hanseatisches Oberlandesgericht in Bremen (Tribunal Regional Superior de Bremen), há que declarar a entrega ilícita em caso de obstáculo a esta nos termos do § 73 da IRG. Ora, tendo em conta informações atualmente disponíveis, o órgão jurisdicional de reenvio está persuadido de que existem indícios probatórios de que, em caso de entrega à autoridade judiciária húngara, P. Aranyosi poderá ser sujeito a condições de detenção que violam o artigo 3.o da CEDH e os direitos fundamentais, bem como os princípios gerais do direito consagrados no artigo 6.o TUE.

43

Com efeito, o TEDH condenou a Hungria em razão da sobrelotação nas suas prisões (TEDH, Varga e outros c. Hungria, n.os 14097/12, 45135/12, 73712/12, 34001/13, 44055/13 e 64586/13, de 10 de março de 2015). O TEDH considerou demonstrado que o Estado húngaro tinha violado o artigo 3.o da CEDH ao prender os recorrentes em celas demasiado pequenas e sobrelotadas. O TEDH considerou esse processo um processo piloto depois de ter sido chamado a pronunciar‑se em 450 recursos semelhantes contra a Hungria relativamente a condições de detenção desumanas.

44

O Hanseatisches Oberlandesgericht in Bremen (Tribunal Regional Superior de Bremen) observa que resultam igualmente de um relatório elaborado pelo Comité Europeu para a Prevenção da Tortura e das Penas ou Tratamentos Desumanos ou Degradantes indícios concretos de que as condições de detenção a que P. Aranyosi estaria sujeito em caso de entrega às autoridades húngaras não cumprem as normas mínimas previstas pelo direito internacional. Esta apreciação refere‑se, em especial, à significativa sobrelotação prisional constatada aquando das visitas realizadas entre 2009 e 2013.

45

Com base nestas informações, o órgão jurisdicional de reenvio considera não estar em condições de se pronunciar quanto à licitude da entrega de P. Aranyosi às autoridades húngaras tendo em conta os limites fixados no § 73 da IRG e no artigo 1.o, n.o 3, da decisão‑quadro. A sua decisão depende, no essencial, da questão de saber se o obstáculo à entrega ainda pode ser ultrapassado ou não, em conformidade com a decisão‑quadro, pelas garantias dadas pelo Estado‑Membro de emissão. Caso este obstáculo não possa ser ultrapassado por tais garantias, a entrega será, então, ilícita.

46

Nestas condições, o Hanseatisches Oberlandesgericht in Bremen (Tribunal Regional Superior de Bremen) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 1.o, n.o 3, da [decisão‑quadro] ser interpretado no sentido de que a extradição para efeitos de procedimento penal é ilícita quando existirem indícios importantes no sentido de que as condições de detenção no Estado‑Membro de emissão violam os direitos fundamentais da pessoa em causa e os princípios gerais de direito previstos no artigo 6.o [TUE], ou deve ser interpretado no sentido de que o Estado de execução pode ou deve, nestes casos, fazer depender a decisão sobre a admissibilidade da extradição de uma garantia do cumprimento das condições de detenção? Pode ou deve o Estado de execução para este efeito formular em concreto os requisitos mínimos das condições de detenção a garantir?

2)

Devem os artigos 5.° e 6.°, n.o 1, da [decisão‑quadro] ser interpretados no sentido de que a autoridade judiciária de emissão também tem competência para [fornecer] garantias do cumprimento das condições de detenção ou deve aplicar‑se a este respeito o sistema de competências interno do Estado‑Membro [de emissão]?»

Processo C‑659/15 PPU

47

R. Căldăraru é um cidadão romeno nascido em 7 de dezembro de 1985 em Brașov (Roménia).

48

Por sentença do Judecătoria Făgăraş (Tribunal de Primeira Instância de Fagaras) de 16 de abril de 2015, P. Căldăraru foi condenado a uma pena privativa de liberdade global de um ano e oito meses por condução sem carta de condução.

49

De acordo com a fundamentação dessa sentença, conforme apresentada pelo órgão jurisdicional de reenvio no seu pedido de decisão prejudicial, a referida pena incluía uma pena de prisão suspensa de um ano, por condução sem carta de condução, proferida em 17 de dezembro de 2013 pelo Judecătoria Făgăraş (Tribunal de Primeira Instância de Fagaras).

50

Esta condenação transitou em julgado após um acórdão do Curtea de Apel Brașov (Tribunal de Segunda Instância de Brașov, Roménia), de 15 de outubro de 2015.

51

Em 29 de outubro de 2015, o Judecătoria Făgăraş (Tribunal de Primeira Instância de Fagaras) emitiu um mandado de detenção europeu contra R. Căldăraru e introduziu no Sistema de Informação Schengen um aviso de procura a seu respeito.

52

R. Căldăraru foi detido em Bremen, em 8 de novembro de 2015.

53

No mesmo dia, o Amtsgericht Bremen (Tribunal de Comarca de Bremen) emitiu um mandado de detenção contra R. Căldăraru. Na sua audição perante este órgão jurisdicional, R. Căldăraru declarou que não consentia no processo de entrega simplificado.

54

Em 9 de novembro de 2015, o Ministério Público de Bremen pediu a detenção de R. Căldăraru «com vista à extradição».

55

Por decisão de 11 de novembro de 2015, o Hanseatisches Oberlandesgericht in Bremen (Tribunal Regional Superior de Bremen) deu provimento a esse pedido. Esse órgão jurisdicional considerou que a detenção «com vista à extradição» de R. Căldăraru não parecia ser «à primeira vista, ilícita», na aceção do § 15, n.o 2, da IRG, e declarou a existência de um risco de R. Căldăraru eludir o processo de entrega às autoridades romenas, que justificava a sua detenção «com vista à extradição», em conformidade com o § 15, n.o 1, da IRG.

56

Em 20 de novembro de 2015, o Ministério Público de Bremen pediu que a entrega de R. Căldăraru às autoridades romenas fosse declarada lícita. Além disso, esta autoridade sublinhou que o Judecătoria Făgăraş (Tribunal de Primeira Instância de Fagaras) não estava em condições de indicar em que estabelecimento penitenciário R. Căldăraru devia ser preso na Roménia.

57

O Hanseatisches Oberlandesgericht in Bremen (Tribunal Regional Superior de Bremen) sublinha que o pedido apresentado pela Roménia cumpre os requisitos a que estão sujeitos os pedidos de entrega no âmbito da IRG.

58

Os factos imputados a R. Căldăraru constituem, designadamente, uma infração penal nos termos tanto do artigo 86.o da Lei romena n.o 195 de 2002 como do § 21 da Lei alemã relativa à circulação rodoviária (Straßenverkehrsgesetz). Nos dois Estados‑Membros em causa esses factos são qualificados de crime punível com uma pena de, pelo menos, quatro meses de prisão.

59

Contudo, de acordo com o Hanseatisches Oberlandesgericht in Bremen (Tribunal Regional Superior de Bremen), há que declarar a entrega ilícita em caso de obstáculo à entrega nos termos do § 73 da IRG. Ora, tendo em conta informações atualmente disponíveis, o órgão jurisdicional de reenvio refere que existem indícios probatórios de que, em caso de entrega, R. Căldăraru poderá ser sujeito a condições de detenção que violam o artigo 3.o da CEDH e os direitos fundamentais, bem como os princípios gerais do direito consagrados no artigo 6.o TUE.

60

Com efeito, em vários acórdãos proferidos em 10 de junho de 2014, o TEDH condenou a Roménia em razão da sobrelotação nas suas prisões (TEDH, Voicu c. Roménia, n.o 22015/10; Bujorean c. Roménia, n.o 13054/12; Constantin Aurelian Burlacu c. Roménia, n.o 51318/12, e Mihai Laurenţiu Marin c. Roménia, n.o 79857/12). O TEDH considerou demonstrado que o Estado romeno tinha violado o artigo 3.o da CEDH ao prender os recorrentes em celas demasiado pequenas e sobrelotadas, sem aquecimento suficiente, sujas e sem água quente para tomar banho.

61

O Hanseatisches Oberlandesgericht in Bremen (Tribunal Regional Superior de Bremen) salienta que resultam igualmente de um relatório elaborado pelo Comité Europeu para a Prevenção da Tortura e das Penas ou Tratamentos Desumanos ou Degradantes indícios concretos de que as condições de detenção a que R. Căldăraru estaria sujeito em caso de entrega às autoridades romenas não cumprem as normas mínimas previstas pelo direito internacional. Esta apreciação refere‑se, em especial, à significativa sobrelotação prisional constatada aquando de visitas realizadas entre 5 de junho e 17 de junho de 2014.

62

Com base nestas informações, o órgão jurisdicional de reenvio considera não estar em condições de se pronunciar sobre a licitude da entrega de R. Căldăraru às autoridades romenas tendo em conta os limites fixados no § 73 da IRG e no artigo 1.o, n.o 3, da decisão‑quadro. A sua decisão depende, no essencial, da questão de saber se o obstáculo à entrega ainda pode ser ultrapassado ou não, em conformidade com a decisão‑quadro, pelas garantias dadas pelo Estado‑Membro de emissão. Caso este obstáculo não possa ser ultrapassado por tais garantias, a entrega será, então, ilícita.

63

Nestas condições, o Hanseatisches Oberlandesgericht in Bremen (Tribunal Regional Superior de Bremen) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 1.o, n.o 3, da [decisão‑quadro] ser interpretado no sentido de que a extradição para efeitos de execução penal é ilícita quando existirem indícios importantes no sentido de que as condições de detenção no Estado‑Membro de emissão violam os direitos fundamentais da pessoa em causa e os princípios gerais de direito previstos no artigo 6.o [TUE], ou deve ser interpretado no sentido de que o Estado de execução pode ou deve, nestes casos, fazer depender a decisão sobre a admissibilidade da extradição de uma garantia do cumprimento das condições de detenção? Pode ou deve o Estado de execução para este efeito formular em concreto os requisitos mínimos das condições de detenção a garantir?

2)

Devem os artigos 5.° e 6.°, n.o 1, da [decisão‑quadro] ser interpretados no sentido de que a autoridade judiciária de emissão também tem competência para [fornecer] garantias do cumprimento das condições de detenção ou deve aplicar‑se a este respeito o sistema de competências interno Estado‑Membro [de emissão]?»

Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

Processo C‑404/15

64

O órgão jurisdicional de reenvio pediu que fosse aplicada a tramitação prejudicial urgente prevista no artigo 107.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

65

Em apoio do seu pedido, esse órgão jurisdicional referiu que P. Aranyosi tinha sido temporariamente detido com fundamento num mandado de detenção europeu emitido pelas autoridades húngaras, mas que não estava preso atualmente, uma vez que o Ministério Público de Bremen tinha, com efeito, ordenado a sua libertação por não existir a essa data risco de fuga do arguido em razão das suas ligações sociais.

66

Em 31 de julho de 2015, a Quarta Secção do Tribunal de Justiça, sob proposta do juiz‑relator, ouvido o advogado‑geral, decidiu que não havia que deferir o pedido do órgão jurisdicional de reenvio de submeter o processo C‑404/15 a tramitação prejudicial urgente.

67

Por decisão de 4 de agosto de 2015, o presidente do Tribunal de Justiça concedeu ao processo C‑404/15 tratamento prioritário.

Processo C‑659/15 PPU

68

O órgão jurisdicional de reenvio pediu que fosse aplicada a tramitação prejudicial urgente prevista no artigo 107.o do Regulamento de Processo.

69

Em apoio do seu pedido, esse órgão jurisdicional referiu que R. Căldăraru tinha sido temporariamente detido com fundamento num mandado de detenção europeu emitido pelas autoridades romenas e que se encontrava atualmente em detenção com base nesse mandado de detenção para efeitos da sua entrega a essas autoridades. Acrescentou que a procedência da prisão de R. Căldăraru dependia da resposta do Tribunal de Justiça às suas questões prejudiciais.

70

A este respeito, há que salientar que o reenvio prejudicial no processo C‑659/15 PPU tem por objeto a interpretação da decisão‑quadro, que pertence ao domínio que figura na terceira parte, do título V, do Tratado FUE, relativo ao espaço de liberdade, segurança e justiça. Por conseguinte, é suscetível de ser sujeito a tramitação prejudicial urgente. Além disso, R. Căldăraru está atualmente privado de liberdade e a sua manutenção em detenção depende da resposta do Tribunal de Justiça às questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio.

71

Nestas condições, a Terceira Secção do Tribunal de Justiça, sob proposta do juiz‑relator, ouvido o advogado‑geral, decidiu, em 16 de dezembro de 2015, deferir o pedido do órgão jurisdicional de reenvio no sentido de o reenvio prejudicial no processo C‑659/15 PPU ser sujeito a tramitação urgente.

72

Por outro lado, foi decidido remeter o processo C‑659/15 PPU, bem como, em razão da sua conexão com este último, o processo C‑404/15 ao Tribunal de Justiça para efeitos da respetiva atribuição à Grande Secção.

73

Dada esta conexão, confirmada na audiência de alegações, há que apensar os processos C‑404/15 e C‑659/15 PPU para efeitos do acórdão.

Quanto às questões prejudiciais

74

Com as suas questões, que há que analisar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 1.o, n.o 3, da decisão‑quadro deve ser interpretado no sentido de que, perante elementos sérios que demonstrem uma incompatibilidade das condições de detenção no Estado‑Membro de emissão com os direitos fundamentais, em especial com o artigo 4.o da Carta, a autoridade judiciária de execução pode ou deve recusar a execução do mandado de detenção europeu emitido contra uma pessoa para efeitos de procedimento penal ou de cumprimento de uma pena privativa de liberdade, ou se pode ou deve subordinar a entrega dessa pessoa à obtenção de informações do Estado‑Membro de emissão que lhe permitam assegurar‑se da conformidade dessas condições de detenção com os direitos fundamentais. Por outro lado, pergunta se os artigos 5.° e 6.°, n.o 1, da decisão‑quadro devem ser interpretados no sentido de que essas informações podem ser fornecidas pela autoridade judiciária do Estado‑Membro de emissão ou se o fornecimento dessas informações está abrangido pelo sistema de competências definido por esse Estado‑Membro.

75

A título preliminar, importa recordar que, como resulta em especial do seu artigo 1.o, n.os 1 e 2, e dos seus considerandos 5 e 7, a decisão‑quadro tem por objeto substituir o sistema de extradição multilateral baseado na Convenção europeia de extradição, de 13 de dezembro de 1957, por um sistema de entrega, entre autoridades judiciárias, das pessoas condenadas ou suspeitas, para efeitos da execução de sentenças ou de procedimento penal, baseando‑se este último sistema no princípio do reconhecimento mútuo (v. acórdãos West, C‑192/12 PPU, EU:C:2012:404, n.o 54; Melloni, C‑399/11, EU:C:2013:107, n.o 36; F., C‑168/13 PPU, EU:C:2013:358, n.o 34; e Lanigan, C‑237/15 PPU, EU:C:2015:474, n.o 27).

76

A decisão‑quadro pretende, assim, ao instituir um novo sistema simplificado e mais eficaz de entrega das pessoas condenadas ou suspeitas de ter infringido a lei penal, facilitar e acelerar a cooperação judiciária com vista a contribuir para realizar o objetivo, conferido à União, de se tornar um espaço de liberdade, segurança e justiça, baseando‑se no elevado grau de confiança que deve existir entre os Estados‑Membros (v. acórdãos Melloni, C‑399/11, EU:C:2013:107, n.o 37; F., C‑168/13 PPU, EU:C:2013:358, n.o 35; e Lanigan, C‑237/15 PPU, EU:C:2015:474, n.o 28).

77

O próprio princípio do reconhecimento mútuo, no qual se baseia o sistema do mandado de detenção europeu, assenta na confiança recíproca, entre os Estados‑Membros, em que as respetivas ordens jurídicas nacionais estão em condições de fornecer uma proteção equivalente e efetiva dos direitos fundamentais, reconhecidos ao nível da União, em particular, na Carta (v., neste sentido, acórdão F., C‑168/13 PPU, EU:C:2013:358, n.o 50, e, por analogia, no que respeita à cooperação judiciária em matéria civil, acórdão Aguirre Zarraga, C‑491/10 PPU, EU:C:2010:828, n.o 70).

78

Tanto o princípio da confiança mútua entre os Estados‑Membros como o princípio do reconhecimento mútuo têm, no direito da União, uma importância fundamental, dado que permitem a criação e a manutenção de um espaço sem fronteiras internas. Mais concretamente, o princípio da confiança mútua impõe, designadamente no que respeita ao espaço de liberdade, segurança e justiça, que cada um dos Estados‑Membros considere, salvo em circunstâncias excecionais, que todos os outros Estados‑Membros respeitam o direito da União e, muito em especial, os direitos fundamentais reconhecidos por esse direito (v., neste sentido, parecer 2/13, EU:C:2014:2454, n.o 191).

79

No domínio regido pela decisão‑quadro, o princípio do reconhecimento mútuo, que constitui, como resulta designadamente do considerando 6 da decisão‑quadro, a «pedra angular» da cooperação judiciária em matéria penal, é aplicado no artigo 1.o, n.o 2, da decisão‑quadro, nos termos do qual os Estados‑Membros estão em princípio obrigados a dar seguimento a um mandado de detenção europeu (v., neste sentido, acórdão Lanigan, C‑237/15 PPU, EU:C:2015:474, n.o 36 e jurisprudência referida).

80

Daí resulta que a autoridade judiciária de execução apenas pode recusar dar execução a tal mandado nos casos, exaustivamente enumerados, de não execução obrigatória, previstos no artigo 3.o da decisão‑quadro, ou de não execução facultativa, previstos nos artigos 4.° e 4.°‑A da decisão‑quadro. Além disso, a execução do mandado de detenção europeu apenas pode estar subordinada a uma das condições limitativamente previstas no artigo 5.o da decisão‑quadro (v., neste sentido, acórdão Lanigan, C‑237/15 PPU, EU:C:2015:474, n.o 36 e jurisprudência referida).

81

Neste contexto, há que sublinhar que o considerando 10 da decisão‑quadro enuncia que a execução do mecanismo de mandado de detenção europeu enquanto tal só poderá ser suspensa no caso de violação grave e persistente, por parte de um Estado‑Membro, dos valores referidos no artigo 2.o TUE e em conformidade com o processo previsto no artigo 7.o TUE.

82

Não deixa de ser verdade que, por um lado, o Tribunal de Justiça admitiu a possibilidade de limitar os princípios do reconhecimento e da confiança mútuos entre Estados‑Membros «em circunstâncias excecionais» (v., neste sentido, parecer 2/13, EU:C:2014:2454, n.o 191).

83

Por outro lado, como resulta do seu artigo 1.o, n.o 3, a decisão‑quadro não tem por efeito alterar a obrigação de respeito dos direitos fundamentais consagrados, designadamente, pela Carta.

84

A este propósito, há que sublinhar que o respeito do artigo 4.o da Carta relativo à proibição das penas e dos tratos desumanos ou degradantes se impõe, tal como resulta do seu artigo 51.o, n.o 1, aos Estados‑Membros e, por conseguinte, aos seus órgãos jurisdicionais, quando estes aplicam o direito da União, que é o caso quando a autoridade judiciária de emissão e autoridade judiciária de execução aplicam as disposições nacionais adotadas em execução da decisão‑quadro (v., por analogia, acórdãos Dereci e o., C‑256/11, EU:C:2011:734, n.o 72, e Peftiev e o., C‑314/13, EU:C:2014:1645, n.o 24).

85

Relativamente à proibição das penas ou dos tratos desumanos ou degradantes, prevista no artigo 4.o da Carta, esta reveste caráter absoluto na medida em que está estreitamente relacionada com o respeito da dignidade do ser humano referido no artigo 1.o da Carta (v., neste sentido, acórdão Schmidberger, C‑112/00, EU:C:2003:333, n.o 80).

86

O caráter absoluto do direito garantido pelo artigo 4.o da Carta é confirmado pelo artigo 3.o da CEDH, a que corresponde este artigo 4.o da Carta. Com efeito, como resulta do artigo 15.o, n.o 2, da CEDH, não é possível nenhuma derrogação ao artigo 3.o da CEDH.

87

Os artigos 1.° e 4.° da Carta e o artigo 3.o da CEDH consagram um dos valores fundamentais da União e dos seus Estados‑Membros. É a razão pela qual, em todas as circunstâncias, incluindo no caso da luta contra o terrorismo e o crime organizado, a CEDH proíbe em termos absolutos a tortura e as penas e tratos desumanos ou degradantes, qualquer que seja o comportamento da pessoa em causa (v. acórdão do TEDH Bouyid c. Bélgica, n.o 23380/90, de 28 de setembro de 2015, § 81 e jurisprudência referida).

88

Decorre daqui que, quando a autoridade judiciária do Estado‑Membro de execução dispõe de elementos que comprovem um risco real de trato desumano ou degradante das pessoas detidas no Estado‑Membro de emissão, à luz do padrão de proteção dos direitos fundamentais garantido pelo direito da União e, em especial, do artigo 4.o da Carta (v., neste sentido, acórdão Melloni, C‑399/11, EU:C:2013:107, n.os 59 e 63, e parecer 2/13, EU:C:2014:2454, n.o 192), deve apreciar a existência desse risco no momento de decidir sobre a entrega às autoridades do Estado‑Membro de emissão da pessoa a que o mandado de detenção europeu diz respeito. Com efeito, a execução desse mandado não pode conduzir a um trato desumano ou degradante dessa pessoa.

89

Para este efeito, a autoridade judiciária de execução deve, antes de mais, basear‑se em elementos objetivos, fiáveis, precisos e devidamente atualizados quanto às condições de detenção que prevalecem no Estado‑Membro de emissão e que demonstram a realidade das deficiências, quer sejam sistémicas ou generalizadas, quer afetem determinados grupos de pessoas ou ainda determinados centros de detenção. Estes elementos podem resultar, designadamente, de decisões judiciais internacionais, como acórdãos do TEDH, de decisões judiciais do Estado‑Membro de emissão e de decisões, de relatórios e de outros documentos elaborados pelos órgãos do Conselho da Europa ou pertencentes ao sistema das Nações Unidas.

90

A este respeito, resulta da jurisprudência do TEDH que o artigo 3.o da CEDH impõe às autoridades do Estado em cujo território tem lugar uma detenção uma obrigação positiva que consiste em garantir que qualquer prisioneiro é detido em condições que garantam o respeito da dignidade humana, que as modalidades de execução da medida não sujeitam a pessoa em causa a uma situação de desespero ou a dificuldades de uma intensidade que exceda o nível inevitável de sofrimento inerente à detenção e que, tendo em conta as exigências práticas da prisão, a saúde e o bem‑estar do prisioneiro sejam garantidos de maneira adequada (v. acórdão do TEDH, Torreggiani e outros c. Itália, n.os 43517/09, 46882/09, 55400/09, 57875/09, 61535/09, 35315/10 e 37818/10, de 8 de janeiro de 2013, § 65).

91

Todavia, a constatação da existência de um risco real de trato desumano ou degradante em razão das condições gerais de detenção no Estado‑Membro de emissão não pode conduzir, enquanto tal, à recusa da execução de um mandado de detenção europeu.

92

Com efeito, uma vez constatada a existência de tal risco, é ainda necessário, em seguida, que a autoridade judiciária de execução aprecie, de maneira concreta e precisa, se existem motivos sérios e comprovados para considerar que a pessoa em causa correrá esse risco em razão das condições de detenção que se prevê aplicar‑lhe no Estado‑Membro de emissão.

93

Com efeito, a mera existência de elementos que atestem deficiências, quer sejam sistémicas ou generalizadas, quer afetem determinados grupos de pessoas ou ainda determinados centros de detenção, no que respeita às condições de detenção no Estado‑Membro de emissão não implica necessariamente que, num caso concreto, a pessoa em causa seja sujeita a um trato desumano ou degradante em caso de entrega às autoridades desse Estado‑Membro.

94

Consequentemente, para garantir o respeito do artigo 4.o da Carta no caso individual da pessoa que é objeto do mandado de detenção europeu, a autoridade judiciária de execução, que é confrontada com elementos objetivos, fiáveis, precisos e devidamente atualizados que atestem a existência dessas deficiências, deve verificar se, nas circunstâncias do caso em apreço, existem motivos sérios e comprovados para considerar que, no seguimento da sua entrega ao Estado‑Membro de emissão, essa pessoa correrá um risco real de ser sujeita, nesse Estado‑Membro, a um trato desumano ou degradante, na aceção deste artigo.

95

Para o efeito, a referida autoridade deve, em aplicação do artigo 15.o, n.o 2, da decisão‑quadro, pedir à autoridade judiciária do Estado‑Membro de emissão o fornecimento com urgência de todas as informações complementares necessárias sobre as condições de detenção que se prevê aplicar à detenção da pessoa em causa nesse Estado‑Membro.

96

Este pedido pode igualmente abranger a existência, no Estado‑Membro de emissão, de eventuais procedimentos e mecanismos nacionais ou internacionais de fiscalização das condições de detenção relacionadas, por exemplo, com visitas aos estabelecimentos penitenciários, que permitam apreciar o estado atual das condições de detenção nesses estabelecimentos.

97

Em conformidade com o artigo 15.o, n.o 2, da decisão‑quadro, a autoridade judiciária de execução pode fixar um prazo para a receção das informações complementares solicitadas à autoridade judiciária de emissão. Este prazo deve ser adaptado ao caso em apreço de forma a deixar a esta última autoridade o tempo necessário para recolher as referidas informações, solicitando, se for necessário, para esse fim a assistência da autoridade central ou de uma das autoridades centrais do Estado‑Membro de emissão, na aceção do artigo 7.o da decisão‑quadro. Nos termos do artigo 15.o, n.o 2, da decisão‑quadro, o referido prazo deve, todavia, ter em conta a necessidade de respeitar os prazos fixados no artigo 17.o da decisão‑quadro. A autoridade judiciária de emissão deve transmitir todas essas informações à autoridade judiciária de execução.

98

Se, à luz das informações fornecidas em aplicação do artigo 15.o, n.o 2, da decisão‑quadro, bem como de quaisquer outras informações de que a autoridade judiciária de execução disponha, esta autoridade concluir que existe, relativamente à pessoa que é objeto do mandado de detenção europeu, um risco real de trato desumano ou degradante, como referido no n.o 94 do presente acórdão, a execução desse mandado deve ser adiada mas não pode ser abandonada (v., por analogia, acórdão Lanigan, C‑237/15 PPU, EU:C:2015:474, n.o 38).

99

Sempre que a referida autoridade decida esse adiamento, o Estado‑Membro de execução informa a Eurojust do facto, nos termos do artigo 17.o, n.o 7, da decisão‑quadro, e das razões do atraso. Além disso, de acordo com esta disposição, um Estado‑Membro que tenha sofrido, por parte de outro Estado‑Membro, atrasos repetidos na execução de mandados de detenção europeus, por motivos referidos no número anterior, deve informar o Conselho do facto, com vista à avaliação, a nível dos Estados‑Membros, da aplicação da decisão‑quadro.

100

Por outro lado, em conformidade com o artigo 6.o da Carta, a autoridade judiciária de execução só poderá decidir pela manutenção da detenção da pessoa em causa se o procedimento de execução do mandado de detenção europeu tiver sido realizado de modo suficientemente diligente e, portanto, se a duração da detenção não for excessiva (v., neste sentido, acórdão Lanigan, C‑237/15 PPU,EU:C:2015:474, n.os 58 a 60). Esta autoridade deve ter devidamente em conta, relativamente às pessoas que são objeto de um mandado de detenção europeu para efeitos de procedimento penal, o princípio de presunção de inocência garantido pelo artigo 48.o da Carta.

101

A este respeito, a autoridade judiciária de execução deve respeitar a exigência de proporcionalidade, prevista no artigo 52.o, n.o 1, da Carta, quanto à limitação de qualquer direito ou de qualquer liberdade por esta reconhecidos. Com efeito, a emissão de um mandado de detenção europeu não pode justificar a manutenção da detenção da pessoa em causa sem nenhum limite temporal.

102

Em todo o caso, se a autoridade judiciária de execução concluir, no termo do controlo mencionado nos n.os 100 e 101 do presente acórdão, que está obrigada a pôr termo à detenção da pessoa procurada, cabe‑lhe então, por força dos artigos 12.° e 17.°, n.o 5, da decisão‑quadro, fazer acompanhar a libertação provisória dessa pessoa de todas as medidas que considere necessárias para evitar a sua fuga e para garantir que as condições materiais necessárias à sua entrega efetiva continuam reunidas enquanto não for tomada uma decisão definitiva sobre a execução do mandado de detenção europeu (v. acórdão Lanigan, C‑237/15 PPUEU:C:2015:474, n.o 61).

103

Caso as informações recebidas pela autoridade judiciária de execução da autoridade judiciária de emissão conduzirem ao afastamento da existência de um risco real de que a pessoa em causa seja objeto de um trato desumano ou degradante no Estado‑Membro de emissão, a autoridade judiciária de execução deve adotar, nos prazos previstos pela decisão‑quadro, a sua decisão sobre a execução do mandado de detenção europeu, sem prejuízo da possibilidade de a pessoa em causa, uma vez entregue, explorar, na ordem jurídica do Estado‑Membro de emissão, as vias de recurso que lhe permitem contestar, se for caso disso, a legalidade das condições da sua detenção num estabelecimento penitenciário desse Estado‑Membro (v., neste sentido, acórdão F., C‑168/13 PPU, EU:C:2013:358, n.o 50).

104

Decorre de todas as considerações precedentes que há que responder às questões submetidas que os artigos 1.°, n.o 3, 5.° e 6.°, n.o 1, da decisão‑quadro devem ser interpretados no sentido de que, perante elementos objetivos, fiáveis, precisos e devidamente atualizados que confirmem a existência de deficiências, quer sejam sistémicas ou generalizadas, quer afetem determinados grupos de pessoas ou ainda determinados centros de detenção, no que respeita às condições de detenção no Estado‑Membro de emissão, a autoridade judiciária de execução deve verificar, de maneira concreta e precisa, se existem motivos sérios e comprovados para considerar que a pessoa objeto de um mandado de detenção europeu, emitido para efeitos de procedimento penal ou de cumprimento de uma pena privativa de liberdade, correrá, em razão das condições da sua detenção nesse Estado‑Membro, um risco real de trato desumano ou degradante, na aceção do artigo 4.o da Carta, em caso de entrega ao referido Estado‑Membro. Para o efeito, deve pedir o fornecimento de informações complementares à autoridade judiciária de emissão, que, depois de ter requerido, se necessário, a assistência da autoridade central ou de uma das autoridades centrais do Estado‑Membro de emissão, na aceção do artigo 7.o da decisão‑quadro, deve comunicar essas informações no prazo fixado nesse pedido. A autoridade judiciária de execução deve adiar a sua decisão quanto à entrega da pessoa em causa até obter as informações complementares que lhe permitam afastar a existência de tal risco. Se a existência desse risco não puder ser afastada num prazo razoável, esta autoridade deve decidir se há que pôr termo ao processo de entrega.

Quanto às despesas

105

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

 

Os artigos 1.°, n.o 3, 5.° e 6.°, n.o 1, da Decisão‑Quadro 2002/584/JAI do Conselho, de 13 de junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados‑Membros, conforme alterada pela Decisão‑Quadro 2009/299/JAI do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, devem ser interpretados no sentido de que, perante elementos objetivos, fiáveis, precisos e devidamente atualizados que confirmem a existência de deficiências, quer sejam sistémicas ou generalizadas, quer afetem determinados grupos de pessoas ou ainda determinados centros de detenção, no que respeita às condições de detenção no Estado‑Membro de emissão, a autoridade judiciária de execução deve verificar, de maneira concreta e precisa, se existem motivos sérios e comprovados para considerar que a pessoa objeto de um mandado de detenção europeu, emitido para efeitos de procedimento penal ou de cumprimento de uma pena privativa de liberdade, correrá, em razão das condições da sua detenção nesse Estado‑Membro, um risco real de trato desumano ou degradante, na aceção do artigo 4.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, em caso de entrega ao referido Estado‑Membro. Para o efeito, deve pedir o fornecimento de informações complementares à autoridade judiciária de emissão, que, depois de ter requerido, se necessário, a assistência da autoridade central ou de uma das autoridades centrais do Estado‑Membro de emissão, na aceção do artigo 7.o da referida decisão‑quadro, deve comunicar essas informações no prazo fixado nesse pedido. A autoridade judiciária de execução deve adiar a sua decisão quanto à entrega da pessoa em causa até obter as informações complementares que lhe permitam afastar a existência de tal risco. Se a existência desse risco não puder ser afastada num prazo razoável, esta autoridade deve decidir se há que pôr termo ao processo de entrega.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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