Choose the experimental features you want to try

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 62015CJ0177

Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 23 de novembro de 2016.
Nelsons GmbH contra Ayonnax Nutripharm GmbH e Bachblütentreff Ltd.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesgerichtshof.
Reenvio prejudicial — Informação e proteção dos consumidores — Regulamento (CE) n.o 1924/2006 — Alegações nutricionais e de saúde sobre os alimentos — Medidas transitórias — Artigo 28.o, n.o 2 — Produtos que ostentam marcas de fabrico ou comerciais existentes antes de 1 de janeiro de 2005 — Preparações à base de “essências florais de Bach” — Marca da União Europeia RESCUE — Produtos comercializados como medicamentos antes de 1 de janeiro de 2005 e como alimentos depois dessa data.
Processo C-177/15.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:888

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

23 de novembro de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Informação e proteção dos consumidores — Regulamento (CE) n.o 1924/2006 — Alegações nutricionais e de saúde sobre os alimentos — Medidas transitórias — Artigo 28.o, n.o 2 — Produtos que ostentam marcas de fabrico ou comerciais existentes antes de 1 de janeiro de 2005 — Preparações à base de ‘essências florais de Bach’ — Marca da UE RESCUE — Produtos comercializados como medicamentos antes de 1 de janeiro de 2005 e como alimentos depois dessa data»

No processo C‑177/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Bundesgerichtshof (Tribunal Federal de Justiça, Alemanha), por decisão de 12 de março de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 21 de abril de 2015, no processo

Nelsons GmbH

contra

Ayonnax Nutripharm GmbH,

Bachblütentreff Ltd,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: L. Bay Larsen, presidente de secção, M. Vilaras, J. Malenovský, M. Safjan (relator) e D. Šváby, juízes,

advogado‑geral: M. Bobek,

secretário: M. Aleksejev, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 6 de abril de 2016,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Nelsons GmbH, por T. Salomon, B. Goebel e C. Alpers, Rechtsanwälte,

em representação da Ayonnax Nutripharm GmbH e da Bachblütentreff Ltd, por B. Ackermann, Rechtsanwältin,

em representação do Governo helénico, por A. Dimitrakopoulou, K. Karavasili, P. Paraskevopoulou, K. Nassopoulou e S. Lekkou, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por S. Grünheid, na qualidade de agente,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 22 de junho de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 4.o, n.o 3, 5.o, n.o 1, alínea a), 6.o, n.o 1, 10.o, n.o 3, e 28.o, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 1924/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de dezembro de 2006, relativo às alegações nutricionais e de saúde sobre os alimentos (JO 2006, L 404, p. 9, e retificação no JO 2007, L 12, p. 3), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 107/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de janeiro de 2008 (JO 2008, L 39, p. 8) (a seguir «Regulamento n.o 1924/2006»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Nelsons GmbH à Ayonnax Nutripharm GmbH, sociedade com sede na Alemanha, e à Bachblütentreff Ltd, sociedade com sede no Reino Unido, a respeito de preparações à base de essências florais, comercializadas pela Nelsons sob a marca da UE RESCUE.

Quadro jurídico

Direito da União

Regulamento (CE) n.o 178/2002

3

O artigo 2.o do Regulamento (CE) n.o 178/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de janeiro de 2002, que determina os princípios e normas gerais da legislação alimentar, cria a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos e estabelece procedimentos em matéria de segurança dos géneros alimentícios (JO 2002, L 31, p. 1), sob a epígrafe «Definição de ‘género alimentício’», prevê:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por ‘género alimentício’ (ou ‘alimento para consumo humano’) qualquer substância ou produto, transformado, parcialmente transformado ou não transformado, destinado a ser ingerido pelo ser humano ou com razoáveis probabilidades de o ser.

Este termo abrange bebidas, pastilhas elásticas e todas as substâncias, incluindo a água, intencionalmente incorporadas nos géneros alimentícios durante o seu fabrico, preparação ou tratamento. […]

O termo não inclui:

[…]

d)

medicamentos, na aceção das Diretivas 65/65/CEE [do Conselho, de 26 de janeiro de 1965, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas, respeitantes às especialidades farmacêuticas (JO 1965, 22, p. 369; EE 13 F1 p. 18)] e 92/73/CEE [do Conselho, de 22 de setembro de 1992, que alarga o âmbito de aplicação das Diretivas 65/65/CEE e 75/319/CEE, relativas à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes aos medicamentos e que estabelecem disposições complementares para os medicamentos homeopáticos (JO 1992, L 297, p. 8)];

[…]»

Regulamento n.o 1924/2006

4

Nos termos dos considerandos 1 e 4 do Regulamento n.o 1924/2006:

«(1)

Existe um número cada vez maior de alimentos rotulados e publicitados na [União] com alegações nutricionais e de saúde. Por forma a assegurar um elevado nível de proteção dos consumidores e a facilitar as suas escolhas, os produtos colocados no mercado, incluindo os que são importados, deverão ser seguros e devidamente rotulados. Um regime alimentar variado e equilibrado é uma condição indispensável para a manutenção da saúde e os produtos considerados individualmente têm uma importância relativa no contexto do regime alimentar geral.

[…]

(4)

O presente regulamento é aplicável a todas as alegações nutricionais e de saúde feitas em comunicações comerciais, nomeadamente na publicidade genérica dos alimentos e em campanhas de promoção, incluindo as patrocinadas total ou parcialmente pelas autoridades públicas. Não é aplicável às alegações que sejam feitas em comunicações não comerciais, como as orientações ou os conselhos dietéticos emanados das autoridades e organismos de saúde pública, nem em comunicações e informações não comerciais constantes da imprensa e de publicações científicas. O presente regulamento é igualmente aplicável às marcas de fabrico e outras marcas comerciais suscetíveis de ser interpretadas como alegações nutricionais ou de saúde.»

5

O artigo 1.o deste regulamento, sob a epígrafe «Objeto e âmbito de aplicação», dispõe:

«1.   O presente regulamento harmoniza as disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros em matéria de alegações nutricionais e de saúde, a fim de garantir o funcionamento eficaz do mercado interno, assegurando ao mesmo tempo um elevado nível de proteção dos consumidores.

2.   O presente regulamento é aplicável às alegações nutricionais e de saúde feitas em comunicações comerciais, quer na rotulagem, quer na apresentação ou na publicidade dos alimentos a fornecer como tais ao consumidor final.

[…]

3.   Uma marca de fabrico ou comercial ou uma denominação de fantasia que figure na rotulagem, na apresentação ou na publicidade de um alimento e que possa ser considerada uma alegação nutricional ou de saúde pode ser utilizada sem ser sujeita ao procedimento de autorização previsto no presente regulamento, desde que seja acompanhada de uma alegação nutricional ou de saúde associada na rotulagem, na apresentação ou na publicidade que cumpra o disposto no presente regulamento.

[…]»

6

O artigo 2.o do referido regulamento, com a epígrafe «Definições», prevê:

«1.   Para efeitos do presente regulamento, são aplicáveis:

a)

As definições de ‘género alimentício’ (no presente regulamento, ‘alimento’), ‘operador de uma empresa do setor alimentar’, ‘colocação no mercado’ e ‘consumidor final’ constantes do artigo 2.o e dos pontos 3, 8 e 18 do artigo 3.o do Regulamento [n.o 178/2002];

[…]

2.   São igualmente aplicáveis as seguintes definições:

1)

‘Alegação’, qualquer mensagem ou representação, não obrigatória nos termos da legislação [da União] ou nacional, incluindo qualquer representação pictórica, gráfica ou simbólica, seja qual for a forma que assuma, que declare, sugira ou implique que um alimento possui características particulares;

[…]

5)

‘alegação de saúde’, qualquer alegação que declare, sugira ou implique a existência de uma relação entre uma categoria de alimentos, um alimento ou um dos seus constituintes e a saúde;

[…]»

7

O artigo 4.o do mesmo regulamento, com a epígrafe «Condições de utilização das alegações nutricionais e de saúde», dispõe, no seu n.o 3:

«As bebidas com um título alcoométrico superior a 1,2% não devem ostentar alegações de saúde.

[…]»

8

O artigo 5.o do Regulamento n.o 1924/2006, com a epígrafe «Condições gerais», compreende um n.o 1 com o seguinte teor:

«A utilização de alegações nutricionais e de saúde só é permitida se estiverem preenchidas as seguintes condições:

a)

Ter sido demonstrado que a presença, a ausência ou o teor reduzido, num alimento ou numa categoria de alimentos, de um nutriente ou de outra substância objeto de alegação, têm um efeito nutricional ou fisiológico benéfico, estabelecido por provas científicas geralmente aceites;

b)

O nutriente ou outra substância objeto de alegação:

i)

Estar contido no produto final em quantidade significativa, como definida na legislação [da União] ou, sempre que tais normas não existam, numa quantidade que produza o efeito nutricional ou fisiológico alegado, estabelecido por provas científicas geralmente aceites […]

[…]»

9

O artigo 6.o deste regulamento, com a epígrafe «Fundamento científico das alegações», prescreve, no seu n.o 1:

«As alegações nutricionais e de saúde devem ser baseadas e fundamentadas em provas científicas geralmente aceites.»

10

O artigo 10.o do referido regulamento, relativo às alegações de saúde e com a epígrafe «Condições específicas», dispõe, nos seus n.os 1 e 3:

«1.   São proibidas as alegações de saúde que não cumpram os requisitos gerais do Capítulo II nem os requisitos específicos do presente capítulo e que não estejam autorizadas em conformidade com o presente regulamento nem incluídas nas listas das alegações permitidas previstas nos artigos 13.o e 14.o

[…]

3.   Só pode ser feita referência a efeitos benéficos gerais, não específicos do nutriente ou do alimento, para a boa saúde geral ou para o bem‑estar ligado à saúde se essa referência for acompanhada de uma alegação de saúde específica incluída nas listas previstas nos artigos 13.o ou 14.o»

11

O artigo 28.o do mesmo regulamento, com a epígrafe «Medidas transitórias», prevê, no seu n.o 2:

«Os produtos que ostentem marcas de fabrico ou comerciais existentes antes de 1 de janeiro de 2005 que não cumpram o disposto no presente regulamento podem continuar a ser comercializados até 19 de janeiro de 2022, após o que lhes são aplicáveis as disposições do presente regulamento.»

Direito alemão

12

Nos termos do § 3, n.o 1, da Gesetz gegen den unlauteren Wettbewerb (Lei relativa à concorrência desleal), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (BGBl. 2010 I, p. 254, a seguir «UWG»):

«São ilícitas as práticas comerciais desleais suscetíveis de afetar de forma sensível os interesses dos concorrentes, dos consumidores ou de outros operadores no mercado.»

13

O § 4 da UWG prevê:

«Exemplos de práticas comerciais desleais

Pratica um ato de concorrência desleal quem, designadamente,

[…]

11.

Violar uma disposição legal que se destine, entre outros, a regulamentar o comportamento no mercado no interesse dos operadores do mercado.»

14

O § 8, n.o 1, primeiro período, da UWG dispõe:

«Quem praticar um ato comercial ilícito na aceção do § 3 ou do § 7 pode ser demandado numa ação destinada à eliminação do ato ilícito ou, em caso de risco de repetição, numa ação inibitória.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

15

A Nelsons comercializa, através de farmácias na Alemanha, preparações à base de essências florais, chamadas «essências florais de Bach». Entre essas preparações contam‑se os produtos comummente chamados «RESCUE», que ostentam a denominação «bebidas espirituosas» e têm um título alcoolométrico de 27%.

16

Estas preparações são vendidas em frascos com pipeta, de 10 ml ou 20 ml, e em spray (a seguir «preparações em causa no processo principal»). As suas embalagens apresentam, respetivamente, a seguinte posologia:

«ORIGINAL RESCUE TROPFEN [GOTAS RESCUE ORIGINAIS]

Dissolver 4 gotas num copo de água e beber ao longo do dia ou, se necessário, ingerir quatro gotas não diluídas.»

e

«RESCUE NIGHT SPRAY [SPRAY DE NOITE RESCUE]

Aplicar duas pulverizações sobre a língua.»

17

Resulta da decisão de reenvio que, antes de 1 de janeiro de 2005, a Nelsons comercializava, na Alemanha, as preparações em causa no processo principal como medicamentos, sob a marca da UE RESCUE, então registada para medicamentos. Em 2007, a Nelsons obteve também o registo de RESCUE como marca da UE para alimentos.

18

Além disso, resulta do dossiê apresentado ao Tribunal de Justiça que, por acórdão de 21 de fevereiro de 2008, o Hanseatisches Oberlandesgericht Hamburg (Tribunal Regional Superior de Hamburgo, Alemanha) considerou que as preparações à base de «essências florais de Bach» não constituíam medicamentos, mas sim alimentos. Na sequência desse acórdão, a Nelsons, que não era parte no litígio nesse processo, começou a comercializar, na Alemanha, as preparações em causa no processo principal sem as alterar, mas vendendo‑as como alimentos, e não como medicamentos.

19

A Ayonnax Nutripharm e a Bachblütentreff, que também comercializam produtos à base de «essências florais de Bach» na Alemanha, propuseram uma ação no Landgericht München I (Tribunal Regional de Munique I, Alemanha) em que pediram, a título principal, uma proibição geral da comercialização de preparações à base dessas essências florais pela Nelsons por não ter autorização ou registo dessas preparações nos termos da legislação sobre medicamentos.

20

A título subsidiário, a Ayonnax Nutripharm e a Bachblütentreff impugnaram diversas mensagens publicitárias da Nelsons e a forma como esta apresentou as preparações em causa no processo principal no mercado alemão. Segundo aquelas sociedades, a Nelsons promoveu bebidas alcoólicas apresentando‑as ou como tendo efeitos benéficos para o estado de saúde ou como sendo isentas de riscos para a saúde, o que constitui atos de concorrência desleal.

21

Por sentença de 20 de setembro de 2011, o Landgericht München I (Tribunal Regional de Munique I) ordenou à Nelsons que cessasse a difusão de determinadas mensagens publicitárias com os termos «essências florais de Bach» e julgou improcedente a ação quanto ao restante.

22

A Ayonnax Nutripharm e a Bachblütentreff interpuseram recurso dessa sentença no Oberlandesgericht München (Tribunal Regional Superior de Munique, Alemanha). Por acórdão de 31 de janeiro de 2013, o referido órgão jurisdicional considerou que estas sociedades tinham o direito de obter, nos termos dos §§ 3, n.o 1, 4, ponto 11, e 8, n.o 1, da UWG, a cessação das práticas comerciais da Nelsons no que respeita às preparações em causa no processo principal, pelo facto de a promoção e a distribuição dessas preparações violarem o artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1924/2006.

23

A Nelsons interpôs recurso de «Revision» desse acórdão no órgão jurisdicional de reenvio, o Bundesgerichtshof (Tribunal Federal de Justiça, Alemanha).

24

Esse órgão jurisdicional refere, nomeadamente, que, na sua opinião, os termos «RESCUE TROPFEN» e «RESCUE NIGHT SPRAY» constituem «alegações de saúde» na aceção do artigo 2.o, n.o 2, ponto 5, do Regulamento n.o 1924/2006. Com efeito, o público visado, hoje familiarizado com a língua inglesa, conhece o significado de «RESCUE», termo que suscita entre os consumidores em questão a impressão de que a utilização dos produtos em causa no processo principal está indicada para «ser salvo» quando confrontados com determinados problemas de saúde. Por conseguinte, verifica‑se uma relação entre os termos «RESCUE TROPFEN» e «RESCUE NIGHT SPRAY», por um lado, e a melhoria do estado de saúde, por outro.

25

A este respeito, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, os termos «RESCUE TROPFEN» e «RESCUE NIGHT SPRAY» fazem referência a «efeitos benéficos gerais, não específicos, para o estado de saúde geral ou um bem‑estar ligado à saúde», na aceção do artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1924/2006. Por consequência, coloca‑se a questão de saber se os requisitos previstos nos artigos 5.o, n.o 1, alínea a), e 6.o, n.o 1, do referido regulamento devem ser preenchidos por uma alegação de saúde como a que está em causa no processo principal.

26

Por último, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 28.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1924/2006 é aplicável quando um produto tenha sido comercializado antes de 1 de janeiro de 2005, não como alimento, mas como medicamento, com a consequência de as disposições desse regulamento não serem aplicáveis às preparações em causa no processo principal no período transitório previsto nessa disposição.

27

Nestas condições, o Bundesgerichtshof (Tribunal Federal de Justiça) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

[Constituem os] líquidos com um título alcoométrico de 27%, [rotulados como] bebidas espirituosas e comercializados nas farmácias em [frascos] com pipeta […], de 10 [ml] e 20 ml, e [em] spray, […] bebidas com um título alcoométrico superior a 1,2%, na aceção do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento […] n.o 1924/2006, quando, nos termos da posologia indicada nas embalagen, [se deve]:

a)

[dissolver] quatro gotas do líquido num copo de água a beber ao longo do dia ou, se necessário, [ingerir] quatro gotas não diluídas,

b)

[aplicar] sobre a língua duas pulverizações do líquido comercializado [em] spray?

2)

Em caso de resposta negativa às alíneas a) e b) da primeira questão:

Em caso de referências a efeitos benéficos gerais, não específicos, na aceção do artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento […] n.o 1924/2006, é também necessária a apresentação de provas nos termos do artigo 5.o, n.o 1, alínea a), e do artigo 6.o, n.o 1, do referido regulamento?

3)

[É a] disposição do artigo 28.o, n.o 2, [primeiro período], do Regulamento n.o [1924/2006] aplicável quando, antes de 1 de janeiro de 2005, o produto em causa era comercializado, com a sua marca comercial, não como alimento, mas como medicamento?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à terceira questão

28

Com a sua terceira questão, que importa examinar em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 28.o, n.o 2, primeiro período, do Regulamento n.o 1924/2006 deve ser interpretado no sentido de que é aplicável numa situação em que um produto que ostenta uma marca de fabrico ou comercial era comercializado, antes de 1 de janeiro de 2005, como medicamento e, posteriormente a essa data, passou a ser comercializado como alimento, embora mantendo as mesmas características e a mesma marca de fabrico ou comercial.

29

Nos termos do artigo 28.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1924/2006, os produtos que ostentem marcas de fabrico ou comerciais existentes antes de 1 de janeiro de 2005 que não cumpram o disposto neste regulamento podem continuar a ser comercializados até 19 de janeiro de 2022, após o que lhes são aplicáveis as disposições do referido regulamento.

30

Esta disposição constitui, pois, uma medida transitória e derrogatória do artigo 1.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1924/2006, segundo o qual uma marca de fabrico ou comercial ou uma denominação de fantasia que figure na rotulagem, na apresentação ou na publicidade de um alimento e que possa ser considerada uma alegação nutricional ou de saúde pode ser utilizada sem ser sujeita ao procedimento de autorização previsto neste regulamento, desde que seja acompanhada de uma alegação nutricional ou de saúde associada na rotulagem, na apresentação ou na publicidade que cumpra o disposto no referido regulamento.

31

A este respeito, importa recordar que o artigo 28.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1924/2006 visa os produtos que ostentem marcas de fabrico ou comerciais que devam ser consideradas uma alegação nutricional ou de saúde na aceção desse regulamento (v., neste sentido, acórdão de 18 de julho de 2013, Green — Swan Pharmaceuticals CR, C‑299/12, EU:C:2013:501, n.o 36).

32

No presente caso, resulta da decisão de reenvio que, antes de 1 de janeiro de 2005, a Nelsons já comercializava as preparações em causa no processo principal como medicamentos, mediante a utilização da marca da UE RESCUE, então registada para medicamentos. Em 2007, a Nelsons registou também a RESCUE como marca da UE para alimentos.

33

Por acórdão proferido em 2008, como precisado no n.o 18 do presente acórdão, um tribunal alemão considerou que as preparações à base de «essências florais de Bach» não constituem medicamentos, mas sim alimentos.

34

Na sequência desse acórdão, a Nelsons iniciou a comercialização, na Alemanha, das preparações em causa no processo principal como alimentos, sem que esta alteração fosse acompanhada de uma modificação dessas preparações. Por conseguinte, como salientou o órgão jurisdicional de reenvio, relativamente à situação existente no dia considerado no artigo 28.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1924/2006, a saber, a véspera do dia 1 de janeiro de 2005, só a qualificação jurídica das preparações em causa no processo principal tinha sido alterada.

35

Além disso, na sua decisão, o órgão jurisdicional de reenvio afirma considerar que os termos «RESCUE TROPFEN» e «RESCUE NIGHT SPRAY» são alegações de saúde, na aceção do artigo 2.o, n.o 2, ponto 5, do Regulamento n.o 1924/2006, e que RESCUE constitui uma marca de fabrico ou comercial, na aceção do artigo 28.o, n.o 2, deste regulamento.

36

Por consequência, a questão que se coloca é saber se preparações como as que estão em causa no processo principal, que foram comercializadas antes de 1 de janeiro de 2005 como medicamentos e, depois dessa data, como alimentos, constituem «produtos», na aceção do artigo 28.o, n.o 2, do referido regulamento.

37

A este respeito, há que salientar que o termo «produtos», na aceção desta disposição, deve ser entendido como referência a «alimentos», na aceção do Regulamento n.o 1924/2006.

38

Com efeito, por um lado, como enuncia o próprio título, este regulamento diz respeito às alegações nutricionais e de saúde sobre os alimentos. Por outro lado, resulta nomeadamente do considerando 1 e do artigo 5.o, n.o 1, alínea b), i), do mesmo regulamento que este último não distingue expressamente «alimentos» de «produtos», sendo ambos os termos utilizados como sinónimos.

39

Nestas condições, o artigo 28.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1924/2006 deve ser entendido no sentido de que só se refere aos alimentos que ostentem uma marca de fabrico ou comercial que deva ser considerada uma alegação nutricional ou de saúde na aceção desse regulamento (v., neste sentido, acórdão de 18 de julho de 2013, Green — Swan Pharmaceuticals CR, C‑299/12, EU:C:2013:501, n.o 37).

40

No caso em apreço, segundo a Ayonnax Nutripharm, a Bachblütentreff, o Governo helénico e a Comissão Europeia, as preparações em causa no processo principal não são abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 28.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1924/2006, uma vez que foram comercializadas como medicamentos antes de 1 de janeiro de 2015, e não como alimentos.

41

A este respeito, importa salientar que, de acordo com o artigo 2.o do Regulamento n.o 178/2002, para o qual remete o artigo 2.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 1924/2006 com vista à definição do conceito de «alimentos», este não abrange os «medicamentos».

42

Por consequência, as preparações em causa no processo principal, cuja composição não foi alterada, não podem ser, nem ter sido, simultaneamente, «alimentos» e «medicamentos».

43

Assim, como referiu, em substância, o advogado‑geral no n.o 87 das suas conclusões, se as preparações em causa no processo principal constituíam «medicamentos», não podiam ser abrangidas pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 1924/2006.

44

Todavia, resulta da decisão de reenvio que o Tribunal de Justiça é questionado sobre uma hipótese diferente, na qual as referidas preparações são apresentadas como tendo constituído objetivamente «alimentos», na aceção desse regulamento, tanto durante o período pertinente à luz do artigo 28.o, n.o 2, do referido regulamento, isto é, antes de 1 de janeiro de 2005, como atualmente.

45

Nessa hipótese, as preparações em causa no processo principal devem, conforme resulta do n.o 39 do presente acórdão, ser qualificadas de «produtos», na aceção do artigo 28.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1924/2006.

46

Ora, esta disposição só é aplicável aos produtos com uma marca de fabrico ou comercial «existente» antes de 1 de janeiro de 2005.

47

Tendo em conta a redação da referida disposição, o termo «existente» deve ser entendido no sentido de que esses produtos já deviam dispor, antes dessa data, das mesmas características materiais e ostentar a mesma marca de fabrico ou comercial. Resulta da decisão de reenvio que é esse o caso do processo principal.

48

Tendo em conta as considerações anteriores, importa responder à terceira questão que o artigo 28.o, n.o 2, primeiro período, do Regulamento n.o 1924/2006 deve ser interpretado no sentido de que esta disposição é aplicável numa situação em que um alimento que ostenta uma marca de fabrico ou comercial era comercializado, antes de 1 de janeiro de 2005, como medicamento e, posteriormente a essa data, passou a ser comercializado como alimento, embora mantendo as mesmas características e a mesma marca de fabrico ou comercial.

Quanto à primeira e segunda questões

49

Considerando a resposta dada à terceira questão, e tendo em conta a natureza do processo principal, destinado à cessação imediata das práticas comerciais da Nelsons no que se refere às preparações em causa no processo principal, não há que responder à primeira e segunda questões.

Quanto às despesas

50

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

 

O artigo 28.o, n.o 2, primeiro período, do Regulamento (CE) n.o 1924/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de dezembro de 2006, relativo às alegações nutricionais e de saúde sobre os alimentos, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 107/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de janeiro de 2008, deve ser interpretado no sentido de que esta disposição é aplicável numa situação em que um alimento que ostenta uma marca de fabrico ou comercial era comercializado, antes de 1 de janeiro de 2005, como medicamento e, posteriormente a essa data, passou a ser comercializado como alimento, embora mantendo as mesmas características e a mesma marca de fabrico ou comercial.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

Top