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Document 62015CC0378
Opinion of Advocate General Saugmandsgaard Øe delivered on 29 June 2016.
Conclusões do advogado-geral H. Saugmandsgaard Øe apresentadas em 29 de junho de 2016.
Conclusões do advogado-geral H. Saugmandsgaard Øe apresentadas em 29 de junho de 2016.
Court reports – general
ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:484
HENRIK SAUGMANDSGAARD ØE
apresentadas em 29 de junho de 2016 ( 1 )
Processo C‑378/15
Mercedes Benz Italia SpA
contra
Agenzia delle Entrate Direzione Provinciale Roma 3
[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Commissione tributaria regionale di Roma (comissão tributária regional de Roma, Itália)]
«Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Imposto sobre o valor acrescentado — Sexta Diretiva 77/388/CEE — Artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo — Dedução do imposto pago a montante — Dedução pro rata — Cálculo»
Introdu
I – ção
1. |
O pedido de decisão prejudicial apresentado pela Commissione Tributaria Regionale di Roma (comissão tributária regional de Roma, Itália) incide sobre a interpretação do artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva 77/388/CEE ( 2 ), que autoriza os Estados‑Membros a derrogar a regra geral de cálculo do pro rata de dedução prevista no segundo parágrafo desse número e no artigo 19.o dessa diretiva. |
2. |
A principal questão deste pedido de decisão prejudicial diz respeito ao âmbito de aplicação da referida derrogação. Será que esta se aplica apenas, como é o caso das outras derrogações previstas no terceiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva, aos «bens e serviços de uso misto», ou seja, aos bens e os serviços que são utilizados para efetuar não só operações com direito à dedução mas também operações sem direito à dedução, ou tem um âmbito mais amplo do que aquelas, abrangendo assim todos os bens e serviços adquiridos por um «sujeito passivo misto», ou seja, um sujeito passivo que efetue não só operações com direito à dedução como também operações sem direito à dedução? Coloca‑se igualmente a questão de saber quais os métodos de cálculo que, nos termos desta derrogação, podem ser impostos pelos Estados‑Membros. |
3. |
Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Mercedes Benz Italia SpA (a seguir «Mercedes Benz») às autoridades tributárias italianas a propósito do direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) dessa sociedade. |
II – Quadro jurídico
A – Direito da União
4. |
Através da sua questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio questiona o Tribunal de Justiça sobre a interpretação dos artigos 168.o e 173.o a 175.o da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado ( 3 ). |
5. |
Decorre, contudo, da decisão de reenvio que o litígio no processo principal diz respeito ao direito da Mercedes Benz à dedução relativamente ao exercício fiscal de 2004. Por conseguinte, como salienta a Comissão Europeia, os factos relevantes do litígio no processo principal não são abrangidos, rationae temporis, pela Diretiva 2006/112, que revogou e substituiu a Sexta Diretiva com efeitos apenas a partir de 1 de janeiro de 2007 ( 4 ). |
6. |
Assim, há que aplicar a Sexta Diretiva, o que, todavia, não tem qualquer incidência no conteúdo da resposta a dar à questão colocada pelo órgão jurisdicional de reenvio, dado que as disposições relevantes das duas diretivas são substancialmente idênticas ( 5 ). |
7. |
O artigo 17.o da Sexta Diretiva, intitulado «Origem e âmbito do direito à dedução», n.os 1, 2 e 5, na versão que resulta do artigo 28.o‑F desta, tem a seguinte redação: «1. O direito à dedução surge no momento em que o imposto dedutível se torna exigível. 2. Desde que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das próprias operações tributáveis, o sujeito passivo está autorizado a deduzir do imposto de que é devedor:
[…] 5. No que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo, não só para operações com direito à dedução, previstas nos n.o os 2 e 3, como para operações sem direito à dedução, a dedução só é concedida relativamente à parte do imposto sobre o valor acrescentado proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações. Este pro rata é determinado nos termos do artigo 19.o, para o conjunto das operações efetuadas pelo sujeito passivo. Todavia, os Estados‑Membros podem:
|
8. |
O artigo 19.o, n.os 1 e 2, da Sexta Diretiva prevê: «1. O pro rata de dedução, previsto no n.o 5, primeiro parágrafo, do artigo 17.o, resultará de uma fração que inclui:
O pro rata é determinado numa base anual e fixado em percentagem arredondada para a unidade imediatamente superior. 2. Em derrogação do disposto no n.o 1, no cálculo de pro rata de dedução, não se toma em consideração o montante do volume de negócios relativo às entregas de bens de investimento utilizados pelo sujeito passivo na respetiva empresa. Não é igualmente tomado em consideração o montante do volume de negócios relativo às operações acessórias imobiliárias e financeiras […]» |
B – Direito italiano
9. |
O artigo 19.o, n.o 5, do Decreto del Presidente della Repubblica n.o 633 — istituzione e disciplina dell’imposta sul valore aggiunto (Decreto do Presidente da República Italiana n.o 633, que institui e regula o imposto sobre o valor acrescentado), de 26 de outubro de 1972 (a seguir «DPR n.o 633/72»), prevê: «[O]s sujeitos passivos que exerçam simultaneamente atividades que originem operações com direito à dedução e atividades que originem operações isentas […] apenas têm direito à dedução do imposto na parte proporcional à primeira categoria de operações, sendo o respetivo montante calculado por aplicação do pro rata de dedução referido no artigo 19.o‑A.» |
10. |
O artigo 19.o‑A do DPR n.o 633/72 tem a seguinte redação: «1. O pro rata de dedução previsto no artigo 19.o, n.o 5, é calculado com base na relação entre o montante das operações com direito à dedução efetuadas nesse ano e o mesmo montante acrescido das operações isentas efetuadas no mesmo ano. O pro rata de dedução é arredondado para a unidade superior ou inferior, consoante a parte decimal ultrapasse ou não as cinco décimas. […] 2. Para calcular o pro rata de dedução previsto no n.o 1, não são tidas em conta […] as operações isentas referidas nos n.os 1) a 9) [do artigo 10.o do DPR n.o 633/1972], quando não façam parte da atividade principal do sujeito passivo ou sejam acessórias das operações tributáveis, sem prejuízo do caráter não dedutível do imposto relativo aos bens e serviços utilizados exclusivamente para efetuar estas operações.» |
III – Litígio no processo principal, questão prejudicial e processo no Tribunal de Justiça
11. |
Na sequência de uma fiscalização tributária, a Agenzia delle Entrate Direzione Provinciale Roma 3 (Administração fiscal, direção regional de Roma, Itália, a seguir «Agenzia») enviou à Mercedes Benz uma nota de liquidação adicional de IVA, relativa ao exercício fiscal de 2004, com vista à recuperação de um montante de 1755882 euros, acrescido dos valores correspondentes a coimas e juros. A nota de liquidação fundamentava‑se no facto de os juros cobrados pela Mercedes Benz sobre os empréstimos concedidos às suas filiais, no montante total de 41878647 euros, terem sido indevidamente excluídos do cálculo do pro rata previsto no artigo 19.o‑A do DPR n.o 633/72. |
12. |
Na sua declaração de IVA relativa ao exercício fiscal de 2004, a Mercedes Benz qualificou as suas atividades financeiras, ou seja, a concessão de empréstimos, como acessórias das suas atividades tributáveis, o que justificara a exclusão dos juros auferidos sobre esses empréstimos do cálculo do pro rata. De acordo com a Agenzia, a concessão de tais empréstimos era uma das atividades principais da Mercedes Benz, tendo a Agenzia referido que os juros em causa representavam 71,64% do volume de negócios total da sociedade. |
13. |
A Mercedes Benz recorreu da nota de liquidação da Agenzia para a Commissione Tributaria Provinciale di Roma (comissão fiscal provincial de Roma, Itália), que negou provimento ao recurso. A sociedade interpôs então recurso desta decisão para o órgão jurisdicional de reenvio. |
14. |
No âmbito do litígio no processo principal, a Mercedes Benz invoca, em primeiro lugar, o caráter acessório das operações de financiamento e, em segundo lugar, os efeitos de distorção do regime do IVA italiano em benefício das autoridades tributárias italianas, em função da aplicação de um método de pro rata«matemático», baseado num critério exclusivamente formal (a composição do volume de negócios do sujeito passivo), e não de um método de pro rata«material», baseado na apreciação efetiva da quota‑parte das aquisições destinadas à realização de operações tributáveis. A este respeito, a Mercedes Benz apresentou dois pareceres de peritos que concluíram pela incidência mínima dos custos suportados pela sociedade em 2004 na aquisição dos bens e serviços sobre as suas operações isentas, ou seja, as suas atividades financeiras ( 6 ). |
15. |
É ponto assente entre as partes que o método de determinação do direito à dedução, previsto no artigo 19.o, n.o 5, do DPR n.o 633/72, se aplica a todos os bens e serviços adquiridos por um sujeito passivo misto num exercício fiscal. |
16. |
A sociedade alega que o legislador italiano transpôs incorretamente os artigos 173.o a 175.o da Diretiva 2006/112 ao prever, no artigo 19.o, n.o 5, do DPR n.o 633/72, que o cálculo do pro rata de dedução, referido no artigo 19.o‑A do DPR n.o 633/72, se aplica a todos os bens e serviços adquiridos por sujeitos passivos mistos. Tal método de cálculo não permite determinar com precisão qual a parte do IVA suscetível de ser imputada às operações com direito à dedução. De acordo com a sociedade, os referidos artigos dessa diretiva especificam que a aplicação do pro rata está limitada aos bens e aos serviços que sejam utilizados pelo sujeito passivo para efetuar, simultaneamente, operações com direito à dedução e operações sem direito à dedução. |
17. |
Por seu lado, a Agenzia reafirma a legalidade das cobranças fiscais efetuadas, reproduzindo os fundamentos formulados na sua nota de liquidação. |
18. |
A Commissione tributaria regionale di Roma decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a questão prejudicial seguinte: «Para efeitos do exercício do direito à dedução, a legislação italiana (mais precisamente, o artigo 19.o, n.o 5, e o artigo 19.o‑A do DPR n.o 633/72) e a prática da administração fiscal nacional, que impõem a tomada em conta da composição do volume de negócios do operador, designadamente para identificar as operações ditas acessórias, sem prever um método de cálculo que se baseie na composição e no destino efetivo das aquisições e que reflita objetivamente a quota de imputação real das despesas suportadas em cada uma das atividades — tributadas e não tributadas — realizadas pelo sujeito passivo, estão em contradição com a interpretação dos artigos 168.o e 173.o a 175.o da Diretiva 2006/112/CE, assente nos princípios da proporcionalidade, da efetividade e da neutralidade, consagrados no direito da União?» |
19. |
Foram apresentadas observações escritas pela Mercedes Benz, pelo Governo italiano e pela Comissão, que participaram igualmente na audiência realizada em 14 de abril de 2016. |
IV – Apreciação jurídica
A – Quanto ao teor da questão prejudicial
20. |
Através do seu pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio questiona o Tribunal de Justiça sobre a interpretação do artigo 19.o, n.o 5, e do artigo 19.o‑A do DPR n.o 633/72, bem como sobre a prática da administração fiscal nacional, com vista a determinar se esses artigos e essa prática estão em conformidade com os artigos 168.o e 173.o a 175.o da Diretiva 2006/112. |
21. |
Há que salientar que o Tribunal de Justiça, quando chamado a decidir um pedido no âmbito do artigo 267.o TFUE, é competente para se pronunciar sobre a interpretação dos Tratados, bem como sobre a validade e a interpretação dos atos adotados pelas instituições da União Europeia. A competência do Tribunal de Justiça está limitada à análise unicamente das disposições de direito da União. Compete ao tribunal nacional apreciar o alcance das disposições nacionais e o modo como devem ser aplicadas ( 7 ). |
22. |
Além disso, como é referido nos n.os 5 e 6 das presentes conclusões, os factos relevantes do litígio no processo principal são abrangidos, rationae temporis, pela Sexta Diretiva e não pela Diretiva 2006/112. |
23. |
Por conseguinte, deve considerar‑se que a questão prejudicial visa determinar se o artigo 17.o, n.o os 2 e 5, e o artigo 19.o da Sexta Diretiva devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional e a uma prática da administração fiscal nacional, como as que estão em causa no processo principal, que impõem que os sujeitos passivos que efetuem não só operações com direito à dedução mas também operações sem direito à dedução determinem o montante do IVA dedutível através da aplicação de um pro rata, estabelecido nos termos do artigo 19.o dessa diretiva, relativamente a todos os bens e serviços adquiridos, designadamente os bens e os serviços exclusivamente utilizados para efetuar quer operações com direito à dedução quer operações sem direito à dedução. |
B – Observações introdutórias
24. |
A título preliminar, há que recordar sucintamente os princípios essenciais que enquadram o direito à dedução do IVA. |
25. |
Decorre do artigo 17.o, n.o 2, da Sexta Diretiva que o sujeito passivo tem o direito de deduzir o IVA «uma vez que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das próprias operações tributáveis». Assim, o direito à dedução determina‑se atribuindo os custos suportados a montante às operações efetuadas a jusante ( 8 ). |
26. |
Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o direito à dedução previsto nos artigos 17.o e seguintes dessa diretiva constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA, que não pode, em princípio, ser limitado, e é exercido imediatamente no que diz respeito a todos os impostos que tenham onerado as operações a montante ( 9 ). |
27. |
Este regime visa, segundo o Tribunal de Justiça, liberar inteiramente o empresário do ónus do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante, por conseguinte, a perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas atividades, na condição de as referidas atividades estarem, em princípio, elas próprias, sujeitas ao IVA ( 10 ). |
28. |
Quando os bens ou os serviços adquiridos por um sujeito passivo sejam utilizados para efeitos de operações isentas ou não abrangidas pelo âmbito de aplicação do IVA, não pode haver cobrança do IVA a jusante, nem dedução do IVA a montante ( 11 ). |
29. |
De forma lógica, o artigo 17.o, n.o 5, primeiro parágrafo, da Sexta Diretiva prevê que, no que diz respeito aos bens e serviços de uso misto ( 12 ), a dedução do IVA só é concedida «relativamente à parte do IVA proporcional ao montante respeitante [às operações com direito à dedução]». De acordo com o segundo parágrafo, esta parte proporcional é determinada nos termos do artigo 19.o da mesma diretiva, cujo n.o 1 prevê, no essencial, o cálculo do pro rata de dedução a partir de uma fração em que o numerador corresponde ao volume de negócios relativo às operações que conferem direito à dedução do IVA e o denominador ao montante do volume de negócios total ( 13 ). |
30. |
O cálculo do pro rata de dedução previsto no artigo 19.o, n.o 1, da Sexta Diretiva implica uma aproximação da parte do IVA respeitante às operações tributáveis do sujeito passivo, uma vez que, regra geral, seria difícil, senão impossível, determinar com precisão em que medida os bens e os serviços de uso misto são utilizados para efetuar as referidas operações ( 14 ). Esse cálculo assenta no pressuposto de que a composição dos bens e dos serviços de uso misto corresponde à composição do volume de negócios do sujeito passivo. Por outras palavras, a regra geral de cálculo do pro rata parte do princípio de que os bens e os serviços de uso misto são utilizados pelo sujeito passivo nas suas atividades tributáveis e nas suas atividades isentas de forma proporcional ao volume de negócios de cada uma delas. |
31. |
Nos termos do terceiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva, os Estados‑Membros podem, todavia, derrogar a regra geral de cálculo do pro rata, prevista no artigo 19.o dessa diretiva, autorizando ou obrigando o sujeito passivo a determinar o montante dedutível aplicando pro ratas especiais, designadamente um dos outros métodos de cálculo elencados nesse parágrafo, alíneas a) a e) ( 15 ). |
32. |
No presente processo, o Governo italiano declarou que, ao adotar a legislação controvertida, ou seja, o artigo 19.o, n.o 5, e o artigo 19.o‑A do DPR n.o 633/72, o legislador italiano exerceu a faculdade prevista no artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva ( 16 ). Por outro lado, parece evidente que essa legislação não pode ser justificada ao abrigo das outras derrogações previstas nesse mesmo parágrafo, alíneas a) a e), que permitem determinar um pro rata diferente para cada setor de atividade [alíneas a) e b)], efetuar a dedução com base na utilização real da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços numa determinada atividade [alínea c)] e não tomar em consideração montantes não dedutíveis insignificantes [alínea e)] ( 17 ). Por conseguinte, limitar‑me‑ei, na apreciação que se segue, a analisar a derrogação prevista no artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva. |
33. |
A questão que se coloca é, portanto, a de saber se esta derrogação, prevista no artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva [a seguir «derrogação prevista na alínea d)»] autoriza uma legislação como a aplicável no processo principal, que impõe que os sujeitos passivos mistos determinem o montante dedutível através da aplicação de um pro rata, estabelecido nos termos do artigo 19.o da Sexta Diretiva, relativamente a todos os bens e serviços adquiridos a montante, seja qual for a sua utilização. |
34. |
Esta questão abrange dois aspetos que analisarei sucessivamente. Em primeiro lugar, é necessário saber qual o âmbito de aplicação da derrogação prevista na alínea d) e, nomeadamente, se esta se aplica apenas a bens e serviços de uso misto, ao contrário da regra geral do pro rata de dedução e das outras derrogações previstas, respetivamente, no primeiro e terceiro parágrafos do artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva. Em segundo lugar, coloca‑se a questão de saber quais os métodos de cálculo autorizados pela derrogação prevista na alínea d). |
C – Quanto ao âmbito de aplicação do artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva
1. Quanto às diferentes interpretações propostas
35. |
De acordo com a redação do artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva, os Estados‑Membros podem «autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efetuar a dedução, em conformidade com a regra estabelecida no primeiro parágrafo deste número, relativamente aos bens e serviços utilizados nas operações aí referidas». |
36. |
No que diz respeito à expressão «relativamente aos bens e serviços utilizados nas operações aí referidas», no presente processo são propostas duas interpretações diferentes. |
37. |
O Governo italiano e a Comissão ( 18 ) consideram que esta expressão deve ser entendida no sentido de que se refere a todos os bens e serviços que sejam utilizados quer nas operações com direito à dedução quer nas operações sem direito à dedução. Tal interpretação leva a incluir no âmbito de aplicação da derrogação prevista na alínea d) todos os bens e serviços adquiridos por um sujeito passivo misto num exercício fiscal. |
38. |
Em contrapartida, a Mercedes Benz alega que esta expressão deve ser interpretada no sentido de que se refere unicamente aos bens e serviços de uso misto adquiridos pelo sujeito passivo num exercício fiscal. |
39. |
Reconheço que a redação do artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva não prima pela clareza ( 19 ). Todavia, pelas razões que passarei a expor, subscrevo a interpretação preconizada pela Mercedes Benz, uma vez que a interpretação proposta pelo Governo italiano e pela Comissão é, na minha opinião, contrária à jurisprudência do Tribunal de Justiça e incompatível com objetivo prosseguido pelas derrogações previstas no artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, da Sexta Diretiva ( 20 ). |
2. Quanto à jurisprudência do Tribunal de Justiça
40. |
O princípio geral do pro rata previsto no primeiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva limita‑se, indubitavelmente, aos bens e serviços de uso misto, como decorre do próprio texto desta disposição ( 21 ). |
41. |
O regime do pro rata de dedução, instaurado pelo artigo 17.o, n.o 5, desta diretiva, estabelece assim uma distinção consoante a utilização dos bens e dos serviços, e não consoante o sujeito passivo. Evidentemente, apenas os sujeitos passivos mistos são afetados pela regra do pro rata de dedução, uma vez que são os únicos sujeitos passivos a efetuar aquisições de bens e serviços de uso misto na aceção da referida diretiva ( 22 ). Porém, o critério determinante, no que respeita à aplicação desse artigo, é a natureza dos bens e dos serviços e não a natureza do sujeito passivo em causa. |
42. |
O Tribunal de Justiça afirmou igualmente que os sujeitos passivos mistos são tratados exatamente da mesma forma que as pessoas que prosseguem exclusivamente atividades tributáveis ou isentas ( 23 ), no sentido de que podem deduzir a totalidade do IVA pago nas aquisições de bens e serviços exclusivamente utilizados nas suas operações tributáveis e não podem deduzir nenhuma parte do IVA pago nas aquisições de bens e serviços exclusivamente utilizados nas suas operações isentas. |
43. |
No que diz respeito às derrogações previstas no terceiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva, o Tribunal de Justiça pronunciou‑se expressamente, no acórdão Portugal Telecom ( 24 ), sobre o seu âmbito de aplicação, concluindo:
|
44. |
Assim, o Tribunal de Justiça não estabeleceu qualquer distinção entre as diferentes derrogações previstas no terceiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva. Esta abordagem, que foi posteriormente confirmada pela jurisprudência do Tribunal de Justiça ( 25 ), exclui, na minha opinião, a interpretação de acordo com a qual a derrogação prevista na alínea d) permite a aplicação de um pro rata de dedução relativamente a todos os bens e serviços adquiridos por um sujeito passivo misto. |
45. |
O reconhecimento deste facto é suficiente, em princípio, para concluir que o artigo 17.o, n.os 2 e 5, da Sexta Diretiva se opõe a uma legislação como a que é aplicável no processo principal, que impõe que um grande número de sujeitos passivos que desenvolvem atividades mistas determinem o montante dedutível através da aplicação de um pro rata relativamente a todos os bens e serviços adquiridos pelo sujeito passivo. Nas considerações que se seguem, procurarei demonstrar que uma interpretação teleológica do artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), dessa diretiva conduz à mesma conclusão a que o Tribunal de Justiça chegou no acórdão Portugal Telecom ( 26 ). |
3. Quanto à interpretação teleológica do artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva
46. |
Tendo em conta o caráter derrogatório do artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva, considero que a conclusão que resulta do acórdão Portugal Telecom ( 27 ), de que esta disposição abrange apenas os bens e os serviços de uso misto, é perfeitamente lógica, na medida em que, geralmente, as derrogações não têm um âmbito de aplicação mais amplo do que a regra geral que é suposto derrogarem ( 28 ). |
47. |
Esta conclusão é igualmente sustentada pela finalidade prosseguida pelas derrogações elencadas no terceiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva. |
48. |
Assim, decorre dos trabalhos preparatórios da Sexta Diretiva ( 29 ) que este terceiro parágrafo «visa evitar desigualdades na aplicação do imposto. Tais desigualdades podem ser prejudiciais ou vantajosas para o sujeito passivo, uma vez que o caráter fixo do pro rata geral poderia implicar deduções inferiores ou superiores às que a afetação real permite. A este respeito, os Estados têm a faculdade de autorizar ou obrigar o sujeito passivo a determinar pro rata especiais e a efetuar a dedução com base na afetação real da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços à atividade tributada, uma vez que o sujeito passivo pode demonstrar essa afetação mantendo contabilidades distintas». |
49. |
As desigualdades referidas nos trabalhos preparatórios revelam‑se quando os proveitos resultantes de cada uma das atividades do sujeito passivo não sejam proporcionais à incidência dos custos, designadamente do IVA, suportados na aquisição dos bens e dos serviços de uso misto. Em tal caso, o pro rata geral, estabelecido nos termos do artigo 19.o da Sexta Diretiva, ou seja, com base no volume de negócios, não reflete de forma adequada a parte do IVA respeitante às operações tributáveis, na medida em que esse pro rata se baseia numa presunção falsa ( 30 ). |
50. |
A título de exemplo, quando um sujeito passivo misto obtenha a maior parte do seu volume de negócios a partir das suas operações isentas (por exemplo, de serviços financeiros ou de seguros), sem direito à dedução, e os bens e os serviços de uso misto adquiridos pelo sujeito passivo sejam principalmente utilizados em operações tributáveis com direito à dedução, o pro rata de dedução, calculado nos termos do artigo 19.o da Sexta Diretiva com base na composição do volume de negócios do sujeito passivo, conduz necessariamente a um montante dedutível inferior ao determinado com base na utilização real desses bens e serviços. |
51. |
Pelo contrário, se a maior parte do volume de negócios provier de operações tributáveis, quando os bens e os serviços de uso misto adquiridos sejam principalmente utilizados em operações isentas, o montante dedutível que resulta da aplicação do pro rata geral é «demasiado elevado» em relação à utilização real dos referidos bens e serviços. Em ambos os casos, o valor do pro rata, determinado segundo o método de cálculo previsto no artigo 19.o da Sexta Diretiva, é falseado, uma vez que a composição do volume de negócios do sujeito passivo misto não corresponde à utilização real dos bens e dos serviços de uso misto ( 31 ). |
52. |
Para evitar estas desigualdades e assim assegurar a neutralidade do IVA, as derrogações elencadas no artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea a) a d), da Sexta Diretiva permitem que os Estados‑Membros autorizem ou obriguem o sujeito passivo a aplicar um dos outros métodos de cálculo para determinar o montante dedutível ( 32 ). |
53. |
Enquanto o método de cálculo geral previsto no artigo 19.o da Sexta Diretiva tem como objetivo simplificar a determinação da «parte do [IVA] proporcional ao montante respeitante às [operações tributadas]», na aceção do primeiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, dessa diretiva, o terceiro parágrafo deste número visa reduzir as desigualdades criadas por esse mesmo instrumento de simplificação ( 33 ). De harmonia com esses princípios, o Tribunal de Justiça declarou que este parágrafo se destina a permitir que os Estados‑Membros apliquem outros métodos de cálculo a fim de obterem resultados mais precisos na determinação do alcance do direito à dedução ( 34 ). |
54. |
Ora, no que diz respeito aos bens e serviços exclusivamente utilizados para efetuar quer operações tributáveis quer operações isentas, o montante dedutível pode ser facilmente determinado com precisão sem recorrer aos instrumentos de simplificação. Por conseguinte, quanto a esses bens e serviços, o pro rata de dedução é, em qualquer caso, de 100% e de 0%, respetivamente. Por esta razão, o objetivo de simplificação não se aplica aos referidos bens e serviços e não justifica, assim, qualquer determinação do montante dedutível por aproximação. |
55. |
Em contrapartida, a aplicação aos referidos bens e serviços de um método de cálculo por aproximação viola o princípio da neutralidade do IVA. Em primeiro lugar, priva os sujeitos passivos mistos do direito, consagrado na Sexta Diretiva, de deduzir a totalidade do IVA pago a montante nas aquisições de bens e serviços exclusivamente utilizados em operações tributáveis. Em segundo lugar, permite deduções não pretendidas por esta diretiva, na medida em que autoriza a dedução de uma parte do IVA pago nas aquisições de bens e serviços exclusivamente utilizados em operações isentas. |
56. |
Como o Tribunal de Justiça declarou, só são permitidas derrogações ao direito à dedução nos casos expressamente previstos na Sexta Diretiva ( 35 ). Tenho sérias dúvidas de que derrogações tão amplas como as descritas supra, preconizadas pelo Governo italiano e pela Comissão, tenham sido desejadas pelo legislador da União. |
57. |
Nem o texto da Sexta Diretiva nem os trabalhos preparatórios que a antecederam contêm qualquer indicação de tal intenção por parte do legislador ( 36 ). Em contrapartida, o facto de a derrogação prevista na alínea d) constar do terceiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva mostra bem, na minha opinião, que se trata precisamente de uma derrogação ao cálculo do pro rata geral, previsto no segundo parágrafo desse número e no artigo 19.o dessa diretiva, e não de uma derrogação ao princípio mais geral, consagrado no artigo 17.o, n.o 2, da referida diretiva, de acordo com o qual o sujeito passivo está autorizado a deduzir do IVA de que é devedor, «[d]esde que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das próprias operações tributáveis». |
58. |
Contrariamente ao que alega o Governo italiano, considero que a faculdade concedida ao sujeito passivo misto pela legislação italiana ( 37 ) de optar pela separação das suas atividades, de forma a que, ao exercer esta opção, tenha, de acordo com o Governo italiano, o direito de deduzir integralmente o IVA pago nas aquisições relativas às suas operações tributáveis, mas não possa deduzir o IVA pago nas aquisições relativas às suas operações isentas ou não tributáveis, não tem qualquer influência na apreciação da compatibilidade desta legislação com a Sexta Diretiva. |
59. |
Tal opção de caráter meramente facultativo faz depender a dedução prevista na Sexta Diretiva de uma escolha efetuada pelo sujeito passivo, o que não é compatível com o objetivo desta diretiva, que é assegurar a harmonização extensiva das regras em matéria de IVA ( 38 ). |
60. |
Com base nas considerações que antecedem, considero que o Tribunal de Justiça está, em princípio, perfeitamente habilitado a responder à questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio no sentido de que o artigo 17.o, n.os 2 e 5, da Sexta Diretiva se opõe a uma legislação nacional que impõe que os sujeitos passivos mistos determinem o montante do IVA dedutível através da aplicação de um pro rata, estabelecido nos termos do artigo 19.o dessa diretiva, relativamente a todos os bens e serviços adquiridos pelo sujeito passivo, seja qual for a sua utilização. |
61. |
Todavia, para todos os efeitos e para ser exaustivo, formularei as observações que se seguem sobre os métodos de cálculo que podem ser impostos pelos Estados‑Membros nos termos do artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva. Essas observações permitem igualmente refutar o argumento apresentado pelo Governo italiano de que a interpretação que preconizo quanto ao âmbito de aplicação desta disposição vem esvaziá‑la do seu sentido, na medida em que, se fosse acolhida, se limitaria a repetir o que, de qualquer forma, é imposto pelo primeiro parágrafo desse número. |
D – Quanto aos métodos de cálculo autorizados pelo artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva
62. |
De acordo com a sua redação, o artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva prevê que a dedução se efetue «em conformidade com a regra estabelecida no primeiro parágrafo». |
63. |
Admito que esta referência ao princípio geral do pro rata prevista no primeiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva suscite dificuldades de interpretação, nomeadamente no que diz respeito aos métodos de cálculo autorizados pelo artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), desta diretiva. |
64. |
Contudo, a jurisprudência do Tribunal de Justiça oferece, a este respeito, dois esclarecimentos úteis. |
65. |
Em primeiro lugar, embora a Sexta Diretiva não preveja, especificamente, os métodos de cálculo que podem ser utilizados pelos Estados‑Membros por força das derrogações que constam do artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alíneas a) a d), da Sexta Diretiva, essas derrogações permitem a aplicação de métodos de cálculo que não os previstos no artigo 19.o desta diretiva, o que encontra apoio na jurisprudência do Tribunal de Justiça ( 39 ). |
66. |
Daqui decorre, em consequência, contrariamente ao que alegam o Governo italiano e a Comissão ( 40 ), que a referência feita no artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva ao primeiro parágrafo desse número, não visa o método de cálculo previsto no segundo parágrafo desse número e no artigo 19.o desta diretiva, mas tão‑só o princípio geral do pro rata, de acordo com o qual a dedução só é concedida relativamente à parte do IVA proporcional ao montante respeitante às operações com direito à dedução ( 41 ). |
67. |
Por conseguinte, considero que a derrogação prevista na alínea d) permite aplicar outros pro rata para além do pro rata«padrão», estabelecido nos termos do artigo 19.o desta diretiva ( 42 ). Embora esta derrogação permita aos Estados‑Membros determinar livremente um método de cálculo, não pode autorizar uma legislação, como a que é aplicável no processo principal, que torna extensível o método previsto nesse artigo 19.o para além do âmbito de aplicação do regime do pro rata de dedução, ou seja, aos bens e aos serviços exclusivamente utilizados para efetuar operações tributáveis ou isentas. |
68. |
Em segundo lugar, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, da Sexta Diretiva permite aos Estados‑Membros ter em conta as caraterísticas específicas próprias de certas atividades dos sujeitos passivos para atingirem resultados mais precisos na determinação do âmbito do direito à dedução ( 43 ). Daqui decorre igualmente que os Estados‑Membros devem, no exercício dos poderes que essa disposição lhes confere, respeitar o efeito útil do artigo 17.o, n.o 5, primeiro parágrafo, da Sexta Diretiva e os princípios subjacentes ao sistema comum do IVA, nomeadamente os princípios da neutralidade fiscal e da proporcionalidade ( 44 ). |
69. |
Uma legislação como a descrita pelo órgão jurisdicional de reenvio não cumpre nenhuma das exigências impostas pelo Tribunal de Justiça. Assim, ao obrigar os sujeitos passivos mistos a determinar o montante dedutível através da aplicação de um pro rata aproximado ( 45 ), estabelecido nos termos do artigo 19.o da Sexta Diretiva, relativamente a todos os bens e serviços adquiridos pelo sujeito passivo, ou seja, numa base mais ampla do que a prevista na Sexta Diretiva, tal legislação implica necessariamente resultados menos precisos do que os decorrentes da aplicação do pro rata«padrão» ( 46 ). Além disso, o método previsto nessa legislação produz, como se exemplificou supra ( 47 ), resultados incompatíveis com o princípio da neutralidade do IVA. |
70. |
Em conclusão, a análise dos métodos de cálculo autorizados no artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva permite igualmente concluir que uma legislação como a que está em causa no processo principal não é compatível com esta diretiva. |
V – Conclusão
71. |
Tendo em conta as considerações que antecedem, proponho que o Tribunal de Justiça responda à questão prejudicial submetida pela Commissione tributaria regionale di Roma da seguinte forma: O artigo 17.o, n.os 2 e 5, e o artigo 19.o da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme, alterada pela Diretiva 91/680/CEE do Conselho, de 16 de dezembro de 1991, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional e a uma prática da administração fiscal nacional, como as que estão em causa no processo principal, que impõem que os sujeitos passivos que efetuem não só operações com direito à dedução mas também operações sem direito à dedução determinem o montante do imposto sobre o valor acrescentado dedutível através da aplicação de um pro rata, estabelecido nos termos do artigo 19.o dessa diretiva, relativamente a todos os bens e serviços adquiridos, designadamente os bens e os serviços exclusivamente utilizados para efetuar quer operações com direito à dedução quer operações sem direito à dedução. |
( 1 ) Língua original: francês.
( 2 ) Sexta Diretiva do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme (JO 1977, L 145, p. 1, EE 09 F1 p. 54), alterada pela Diretiva 91/680/CEE do Conselho, de 16 de dezembro de 1991 (JO 1991, L 376, p. 1) (a seguir «Sexta Diretiva»).
( 3 ) JO 2006, L 347, p. 1.
( 4 ) V. artigo 411.o, n.o 1, e artigo 413.o da Diretiva 2006/112.
( 5 ) O artigo 17.o, n.os 2 e 5, e o artigo 19.o da Sexta Diretiva contêm assim disposições que correspondem, mutatis mutandis, aos artigos 168.o e 173.o a 175.o da Diretiva 2006/112.
( 6 ) Decorre da decisão de reenvio que um desses pareceres concluiu por uma incidência de 0,22% e o outro por uma incidência igual a zero.
( 7 ) Acórdão de 1 de junho de 2006, Innoventif (C‑453/04, EU:C:2006:361, n.o 29), e despacho de 25 de janeiro de 2007, Koval’ský (C‑302/06, não publicado, EU:C:2007:64, n.o 17 e jurisprudência aí referida).
( 8 ) V., no mesmo sentido, conclusões do advogado‑geral F. Jacobs no processo que deu origem ao acórdão Kretztechnik (C‑465/03, EU:C:2005:111, n.o 71).
( 9 ) V. acórdão de 9 de julho de 2015, Salomie e Oltean (C‑183/14, EU:C:2015:454, n.o 56 e jurisprudência aí referida). Para que o IVA seja dedutível, as operações efetuadas a montante devem apresentar um nexo direto e imediato com operações a jusante com direito à dedução e fazer parte dos elementos constitutivos do preço dessas operações. Porém, admite‑se igualmente o direito à dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo direto e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito à dedução, quando os custos dos serviços em causa façam parte das suas despesas gerais e sejam, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens fornecidos ou dos serviços prestados pelo sujeito passivo. V., acórdão de 16 de julho de 2015, Larentia + Minerva e Marenave Schiffahrt (C‑108/14 e C‑109/14, EU:C:2015:496, n.os 23 e 24 e jurisprudência aí referida).
( 10 ) V. acórdão de 9 de julho de 2015, Salomie e Oltean (C‑183/14, EU:C:2015:454, n.o 57 e jurisprudência aí referida).
( 11 ) V. acórdão de 18 de dezembro de 2008, Royal Bank of Scotland (C‑488/07, EU:C:2008:750, n.o 16 e jurisprudência aí referida).
( 12 ) Os bens e os serviços de uso misto são frequentemente despesas gerais que estão ligadas tanto às operações tributadas como às operações isentas do sujeito passivo.
( 13 ) V., igualmente, conclusões do advogado‑geral F. Jacobs no processo que deu origem ao acórdão Abbey National (C‑408/98, EU:C:2000:207, n.o 10). As operações que não são abrangidas pelo âmbito de aplicação da Sexta Diretiva e que não conferem, portanto, direito à dedução devem ser excluídas do cálculo do pro rata de dedução previsto nos artigos 17.o e 19.o da Sexta Diretiva. V. acórdão de 29 de abril de 2004, EDM (C‑77/01, EU:C:2004:243, n.o 54 e jurisprudência aí referida).
( 14 ) V., igualmente, conclusões do advogado‑geral P. Cruz Villalón no processo que deu origem ao acórdão BLC Baumarkt (C‑511/10, EU:C:2012:245, n.o 33), que salienta que a regra geral para o cálculo do pro rata, prevista no artigo 19.o da Sexta Diretiva, «possibilit[a], em princípio, um cálculo equitativo e razoavelmente preciso do montante que virá a ser dedutível». V., igualmente, conclusões do advogado‑geral P. Mengozzi no processo que deu origem ao acórdão Wolfgang und Wilfried Rey Grundstücksgemeinschaft GbR (C‑332/14, EU:C:2015:777, n.o 92).
( 15 ) O caráter derrogatório do terceiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva decorre da expressão introdutória desse parágrafo («Todavia, os Estados‑Membros podem»). Os Estados‑Membros não estão obrigados a limitar‑se apenas a um dos métodos elencados no referido artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo. V. acórdão de 13 de março de 2008, Securenta (C‑437/06, EU:C:2008:166, n.o 38).
( 16 ) Que corresponde ao atual artigo 173.o, n.o 2, da Diretiva 2006/112. De acordo com o Governo italiano, o texto do artigo 174.o da Diretiva 2006/112 (artigo 19.o da Sexta Diretiva) é reproduzido, no essencial, no artigo 19.o‑A do DPR n.o 633/72.
( 17 ) V., nesse sentido, acórdão de 18 de dezembro de 2008, Royal Bank of Scotland (C‑488/07, EU:C:2008:750, n.o 19). Observo, a propósito, que o significado da fórmula «prevejam a exclusão do direito à dedução mediante certas condições», utilizada pelo Tribunal de Justiça no número referido e no n.o 23 do mesmo acórdão, não é clara. Todavia, foi retomada no acórdão de 12 de setembro de 2013, Le Crédit Lyonnais (C‑388/11, EU:C:2013:541, n.o 31).
( 18 ) Parece‑me que a posição da Comissão se foi modificando ao longo do processo no Tribunal de Justiça. Nas suas observações escritas, considerou que o regime italiano em causa era manifestamente contrário ao princípio da neutralidade do IVA, na medida em que obrigava o sujeito passivo a aplicar o método do pro rata, qualquer que fosse a utilização dos bens e dos serviços adquiridos.
( 19 ) Por um lado, a utilização da expressão «aí referidas» no referido artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), pode militar a favor da interpretação sustentada pelo Governo italiano e pela Comissão, de acordo com a qual essa expressão está relacionada com as «operações» efetuadas pelo sujeito passivo, e não com os «bens e serviços» adquiridos por este. Por outro lado, a expressão «todos os bens e serviços» pode indicar apenas que a derrogação prevista na alínea d) não autoriza, ao contrário das previstas nas alíneas a) a c) desse terceiro parágrafo, a aplicação de um pro rata diferente para cada setor de atividades do sujeito passivo ou para uma parte dos bens e dos serviços de uso misto, mas autoriza a aplicação de um pro rata apenas para o conjunto desse bens e serviços. A comparação entre as diferentes versões linguísticas da Sexta Diretiva não permite esclarecer esta questão.
( 20 ) Recordo que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, para interpretar uma disposição do direito da União, convém ter‑se em conta tanto a sua redação e o seu objetivo como o contexto dessa disposição e os objetivos prosseguidos pela regulamentação em que se integra. V. acórdão de 12 de junho de 2014, Lukoyl Neftohim Burgas (C‑330/13, EU:C:2014:1757, n.o 59).
( 21 ) Nos termos do referido artigo 17.o, n.o 5, primeiro parágrafo, este aplica‑se «[n]o que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo, não só para operações com direito à dedução […] como para operações sem direito à dedução».
( 22 ) Observo que, embora o Tribunal de Justiça tenha decidido, no seu acórdão de 6 de outubro de 2005, Comissão/Espanha (C‑204/03, EU:C:2005:588, n.o 25), que o artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva «só abrange o caso dos sujeitos passivos mistos», resulta de uma leitura atenta desse acórdão que esta afirmação foi proferida num contexto em que o Tribunal de Justiça concluiu que esse número não permite uma limitação do direito à dedução dos «sujeitos passivos integrais», ou seja, dos sujeitos passivos que apenas efetuem operações tributadas.
( 23 ) V. acórdãos de 8 de junho de 2000, Midland Bank (C‑98/98, EU:C:2000:300, n.o 26), de 22 de fevereiro de 2001, Abbey National (C‑408/98, EU:C:2001:110, n.o 38), e de 23 de abril de 2009, Puffer (C‑460/07, EU:C:2009:254, n.o 60).
( 24 ) Acórdão de 6 de setembro de 2012 (C‑496/11, EU:C:2012:557, n.os 39 a 41).
( 25 ) V. acórdão de 16 de julho de 2015, Larentia + Minerva e Marenave Schiffahrt (C‑108/14 e C‑109/14, EU:C:2015:496, n.o 26).
( 26 ) Acórdão de 6 de setembro de 2012 (C‑496/11, EU:C:2012:557).
( 27 ) Acórdão de 6 de setembro de 2012 (C‑496/11, EU:C:2012:557).
( 28 ) As correlações estreitas entre a derrogação prevista na alínea d) e o princípio geral do pro rata previsto no primeiro parágrafo do artigo 71.o, n.o 5, da Sexta Diretiva resultam igualmente da referência expressa que a primeira derrogação faz «à regra estabelecida no primeiro parágrafo».
( 29 ) Exposição de motivos da proposta inicial da Sexta Diretiva, de 29 de junho de 1973, Boletim das Comunidades Europeias, Suplemento 11/73, p. 19. Na redação proposta, o terceiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, continha apenas três exceções, que correspondiam às exceções constantes das alíneas a) a c) da diretiva adotada. Não existe nenhum motivo para supor que o objetivo do terceiro parágrafo tenha sido modificado pelas exceções suplementares previstas nas disposições das alíneas d) e e), que foram acrescentadas durante o procedimento legislativo.
( 30 ) V. n.o 30 das presentes conclusões.
( 31 ) Em certa medida, o n.o 2 do artigo 19.o da Sexta Diretiva é suscetível de reduzir essas desigualdades, ao prever que não seja tomado em consideração, para efeitos do cálculo do pro rata referido no n.o 1 desse artigo, o montante do volume de negócios respeitante a determinadas operações acessórias. V., nesse sentido, acórdão de 29 de abril de 2004, EDM (C‑77/01, EU:C:2004:243, n.o 75). Todavia, isso não resolve as desigualdades decorrentes de um volume de negócios elevado nas operações isentas, o que é ilustrado pelo caso em apreço.
( 32 ) V. acórdão de 18 de dezembro de 2008, Royal Bank of Scotland (C‑488/07, EU:C:2008:750, n.o 19).
( 33 ) Não comungo da opinião do Governo italiano de que as derrogações previstas no artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, da Sexta Diretiva visam igualmente simplificar a determinação do montante dedutível. V., igualmente, conclusões do advogado‑geral P. Cruz Villalón no processo que deu origem ao acórdão BLC Baumarkt (C‑511/10, EU:C:2012:245, n.o 42).
( 34 ) V. acórdão de 10 de julho de 2014, Banco Mais (C‑183/13, EU:C:2014:2056, n.o 29). V., igualmente, acórdãos de 18 de dezembro de 2008, Royal Bank of Scotland (C‑488/07, EU:C:2008:750, n.o 24), e de 8 de novembro de 2012, BLC Baumarkt (C‑511/10, EU:C:2012:689, n.o 18).
( 35 ) V. acórdão de 6 de setembro de 2012, Portugal Telecom (C‑496/11, EU:C:2012:557, n.o 35 e jurisprudência aí referida).
( 36 ) Efetivamente, a derrogação prevista na alínea d) não constava da proposta inicial da Comissão de 29 de junho de 1973 (Proposta de Sexta Diretiva do Conselho relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios ‑ Sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme) [COM(73)950 final] nem da proposta alterada de 26 de julho de 1974 (Alterações à proposta de Sexta Diretiva do Conselho relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado: «Matéria coletável Uniforme») [COM(74)795 final]. Foi acrescentada, sem qualquer explicação, antes da adoção da diretiva pelo Conselho. O artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva baseia‑se na regra do pro rata prevista no artigo 11.o, n.o 2, terceiro parágrafo, e no n.o 3, da Segunda Diretiva 67/228/CEE do Conselho, de 11 de abril de 1967, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios ‑ estrutura e modalidades de aplicação do sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado (JO 1967, 71, p. 1303, EE 09 F1 p. 6), que deixou aos Estados‑Membros a responsabilidade de fixar os critérios de determinação do montante dedutível.
( 37 ) Artigo 36, n.o 3, do DPR n.o 633/72. Observo que o órgão jurisdicional de reenvio não faz qualquer referência a esta disposição nacional que permite a aplicação separada do imposto relativo a determinadas atividades do sujeito passivo.
( 38 ) Acrescento que a possibilidade prevista no artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea a), desta diretiva, de autorizar a aplicação de um pro rata diferente para cada setor de atividades do sujeito passivo, abrange apenas os bens e os serviços de uso misto, pelo que não justifica a legislação italiana, que se destina a todos os bens e serviços adquiridos.
( 39 ) V. acórdãos de 18 de dezembro de 2008, Royal Bank of Scotland (C‑488/07, EU:C:2008:750, n.o 19), e de 8 de novembro de 2012, BLC Baumarkt (C‑511/10, EU:C:2012:689, n.o 15), e despacho de 13 de dezembro de 2012, Debiasi (C‑560/11, EU:C:2012:802, n.o 39).
( 40 ) A este respeito, a Comissão baseia‑se no acórdão de 8 de novembro de 2012, BLC Baumarkt (C‑511/10, EU:C:2012:689, n.o 20). Admito que esse acórdão possa gerar confusão quanto ao método de cálculo que pode ser aplicado por força do artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, alínea d), da Sexta Diretiva, na medida em que o Tribunal de Justiça parece estabelecer uma distinção entre a derrogação prevista na alínea d) e as outras derrogações previstas no mesmo parágrafo. Embora esta distinção tenha sido retomada no acórdão de 12 de setembro de 2013, Le Crédit Lyonnais (C‑388/11, EU:C:2013:541, n.o 51), não se encontra, contudo, na jurisprudência anterior (v. acórdão de 18 de dezembro de 2008, Royal Bank of Scotland, C‑488/07, EU:C:2008:750, n.o 21), nem na jurisprudência mais recente (v. acórdão de 10 de julho de 2014, Banco Mais, C‑183/13, EU:C:2014:2056, n.o 25).
( 41 ) Esta distinção entre o princípio do pro rata e a regra de cálculo do pro rata é mais visível na Diretiva 2006/112, que revogou e substituiu a Sexta Diretiva, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2007. O artigo 173.o, n.o 2, alínea d), dessa diretiva remete assim, especificamente, para a «regra estabelecida no primeiro parágrafo do n.o 1», que corresponde ao primeiro parágrafo do artigo 17.o, n.o 5, da Sexta Diretiva, e não para o n.o 1 no seu todo, o que incluiria igualmente a regra de cálculo do pro rata.
( 42 ) V., nesse sentido, conclusões do advogado‑geral P. Cruz Villalón no processo que deu origem ao acórdão BLC Baumarkt (C‑511/10, EU:C:2012:245, n.o 29), que salienta que a derrogação prevista na alínea d) implica a «possibilidade de outros pro rata». V., igualmente, conclusões do advogado‑geral P. Cruz Villalón no processo que deu origem ao acórdão Le Crédit Lyonnais (C‑388/11, EU:C:2013:120, n.o 59).
( 43 ) V. n.o 53 e nota 34 das presentes conclusões.
( 44 ) V. acórdão de 8 de novembro de 2012, BLC Baumarkt (C‑511/10, EU:C:2012:689, n.o 16). V., igualmente, acórdãos de 12 de setembro de 2013, Le Crédit Lyonnais (C‑388/11, EU:C:2013:541, n.o 52), e de 10 de julho de 2014, Banco Mais (C‑183/13, EU:C:2014:2056, n.o 27).
( 45 ) V. n.o 30 das presentes conclusões.
( 46 ) Não posso subscrever o argumento apresentado pela Comissão, de que a derrogação prevista na alínea d) permite tal legislação, na medida em que essa legislação tem um caráter meramente derrogatório e conduz a resultados mais precisos do que o pro rata«padrão» previsto no artigo 17.o, n.o 5, primeiro parágrafo, da Sexta Diretiva. Na minha opinião, tal legislação conduz necessariamente a resultados menos precisos e, consequentemente, contraria o objetivo de neutralidade fiscal prosseguido pelas derrogações estabelecidas no artigo 17.o, n.o 5, terceiro parágrafo, dessa diretiva.
( 47 ) V. n.os 54 e 55 das presentes conclusões.