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Document 62015CC0002

Conclusões do advogado-geral P. Mengozzi apresentadas em 16 de março de 2016.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:168

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PAOLO MENGOZZI

apresentadas em 16 de março de 2016 ( 1 )

Processo C‑2/15

DHL Express (Austria) GmbH

contra

Post‑Control‑Kommission

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo, Áustria)]

«Reenvio prejudicial — Livre prestação de serviços — Serviços postais na União Europeia — Regulamentação de um Estado‑Membro que obriga todos os prestadores de serviços postais a contribuírem para os custos de funcionamento da autoridade reguladora do setor dos serviços postais»

1. 

A Diretiva 97/67/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de dezembro de 1997, relativa às regras comuns para o desenvolvimento do mercado interno dos serviços postais comunitários e a melhoria da qualidade de serviço ( 2 ), conforme alterada, em último lugar ( 3 ), pela Diretiva 2008/6/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 20 de fevereiro de 2008 ( 4 ) (a seguir «Diretiva 97/67»), permite que os Estados‑Membros obriguem todos os prestadores de serviços postais a contribuírem para o financiamento da autoridade reguladora nacional do setor dos serviços postais? É este o objeto do presente reenvio prejudicial.

I – Quadro jurídico

A – Diretiva 2008/6

2.

No considerando 27 da Diretiva 2008/6, afirma‑se que «[n]os casos em que esteja previsto um fundo de compensação, os prestadores dos serviços postais poderão ter de contribuir para o financiamento do serviço universal. A fim de determinar as empresas às quais se pode exigir que contribuam para um fundo de compensação, os Estados‑Membros deverão considerar se os serviços prestados por essas empresas podem, do ponto de vista do utilizador, ser considerados serviços abrangidos pelo âmbito do serviço universal por demonstrarem permutabilidade em grau suficiente com o serviço universal, tendo em conta as características dos serviços, designadamente o valor acrescentado, bem como a utilização a que se destinam e as tarifas aplicáveis. Estes serviços não têm de cobrir necessariamente todas as características do serviço universal, como, por exemplo, a entrega diária da correspondência ou a cobertura de todo o território nacional».

3.

No considerando 28 da Diretiva 2008/6 recorda‑se que, «[a] fim de respeitar o princípio da proporcionalidade ao determinar a contribuição solicitada a essas empresas para os custos da prestação do serviço universal num Estado‑Membro, os Estados‑Membros deverão basear‑se em critérios transparentes e não discriminatórios, como, por exemplo, a participação dessas empresas nas atividades abrangidas pelo âmbito do serviço universal nesse Estado‑Membro. Os Estados‑Membros podem requerer aos prestadores sujeitos à contribuição para um fundo de compensação que efetuem uma separação contabilística adequada para assegurar o funcionamento do fundo».

4.

No considerando 47 da Diretiva 2008/6 afirma‑se que «[a]s autoridades reguladoras nacionais continuarão muito provavelmente a ter um papel essencial, em particular nos Estados‑Membros onde o processo de transição para a concorrência não está ainda concluído. De acordo com o princípio da separação das funções de regulação e operacionais, os Estados‑Membros deverão garantir a independência das autoridades reguladoras nacionais, assegurando assim a imparcialidade das suas decisões. Este requisito de independência não prejudica a autonomia institucional e as obrigações constitucionais dos Estados‑Membros, nem o princípio, estabelecido no artigo [345.° TFUE], da neutralidade no que respeita à legislação aplicada nos Estados‑Membros ao regime da propriedade. As autoridades reguladoras nacionais deverão dispor de todos os recursos necessários em termos de pessoal, de competências e de meios financeiros para o desempenho das suas funções».

B – Diretiva 97/67

5.

O artigo 2.o da Diretiva 97/67 tem a seguinte redação:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

1)

Serviços postais, os serviços que consistem na recolha, triagem, transporte e entrega dos envios postais.

1‑A)

Prestador de serviços postais, a empresa que presta um ou vários serviços postais.

[…]

13)

Prestador de serviço universal, a entidade pública ou privada prestadora de serviço postal que presta um serviço postal universal ou partes deste num Estado‑Membro e cuja identidade foi notificada à Comissão, de acordo com o disposto no artigo 4.o

14)

Autorizações, permissões em que se definem os direitos e as obrigações específicos do setor postal e se permite às empresas a prestação de serviços postais e, eventualmente, o estabelecimento e/ou exploração das suas redes para a prestação desses serviços, sob a forma de “autorização geral” ou “licença individual”, a seguir definidas:

“autorização geral”, uma autorização que, independentemente de ser regida por uma “licença por categoria” ou pela legislação geral e de essas normas exigirem ou não procedimentos de registo ou declaração, não impõe ao prestador de serviços postais em causa a obtenção de uma decisão expressa da autoridade reguladora nacional antes de exercer os direitos decorrentes dessa autorização.

“licença individual”, uma autorização concedida por uma autoridade reguladora nacional que confere direitos específicos a um prestador de serviços postais, ou que submete as atividades desse prestador a obrigações específicas, complementando eventualmente a autorização geral, caso o prestador de serviços postais não esteja autorizado a exercer os direitos em causa antes de lhe ter sido comunicada a decisão da autoridade reguladora nacional.

[…]

18)

Autoridade reguladora nacional, em cada Estado‑Membro, o organismo ou organismos a quem o Estado‑Membro confia, entre outras, as funções reguladoras decorrentes da presente diretiva.

[…]»

6.

O artigo 9.o da Diretiva 97/67 tem a seguinte redação:

«1.   Para os serviços não abrangidos pelo conceito de serviço universal, os Estados‑Membros podem estabelecer autorizações gerais na medida necessária para garantir o cumprimento dos requisitos essenciais.

2.   Para os serviços abrangidos pelo conceito de serviço universal, os Estados‑Membros podem estabelecer procedimentos de autorização, incluindo licenças individuais, na medida necessária para garantir o cumprimento dos requisitos essenciais e assegurar a prestação do serviço universal.

A concessão de autorizações pode:

ser subordinada às obrigações do serviço universal,

se necessário, impor requisitos relativamente à qualidade, disponibilidade e desempenho dos serviços relevantes,

quando apropriado, ser subordinada à obrigação de contribuir financeiramente para os mecanismos de partilha de custos referidos no artigo 7.o, se a prestação do serviço universal implicar um custo líquido e representar um encargo não razoável para o prestador ou prestadores de serviço universal designados nos termos do artigo 4.o,

quando apropriado, ser subordinada à obrigação de contribuir financeiramente para os custos de funcionamento da autoridade reguladora nacional a que se refere o artigo 22.o,

quando apropriado, ser subordinada ao cumprimento de condições de trabalho fixadas pela legislação nacional ou impor esse cumprimento.

As obrigações e os requisitos referidos no primeiro travessão e no artigo 3.o só podem ser impostos aos prestadores do serviço universal designados.

[…]

3.   Os procedimentos, as obrigações e os requisitos referidos nos n.os 1 e 2 devem ser transparentes, acessíveis, não discriminatórios, proporcionados, exatos e inequívocos, publicados com a devida antecedência e baseados em critérios objetivos. Os Estados‑Membros devem assegurar que os motivos do indeferimento ou da revogação total ou parcial de uma autorização sejam comunicados ao requerente, e instituir um processo de recurso.»

C – Direito austríaco

1. PMG

7.

O artigo 24.o, n.o 1, da Bundesgesetz über die Regulierung des Postmarktes (Lei federal relativa aos serviços postais, a seguir «PMG») ( 5 ) prevê que «[q]ualquer pessoa tem o direito de propor e fornecer serviços postais nas condições estabelecidas na presente lei federal».

8.

O artigo 25.o, n.o 1, da PMG dispõe que «os prestadores de serviços postais devem declarar à autoridade reguladora a prestação de serviço postal que tenciona realizar, bem como as modificações da exploração e a cessação da mesma, antes do início, da modificação ou da cessação da exploração. […]».

9.

O artigo 26.o, n.o 1, da PMG dispõe que «[o] encaminhamento, em regime profissional, de remessas de correspondência até 50 g por conta de terceiros deve ser objeto de concessão».

10.

O artigo 37.o, n.o 2, da PMG dispõe que «[a] autoridade reguladora na aceção da presente lei e da Diretiva [97/67] é, no que respeita às atribuições referidas no artigo 40.o, a Post‑Control‑Kommission e, no que respeita a todas as outras atribuições, a Rundfunk und Telekom Regulierungs‑GmbH (RTR‑GmbH)».

2. KOG

11.

O artigo 34.o, n.o 3, da Bundesgesetz über die Einrichtung einer Kommunikationsbehörde Austria («KommAustria») und eines Bundeskommunikationssenates [Lei federal sobre a criação de uma autoridade reguladora das comunicações na Áustria («KommAustria») e de uma Secção de Fiscalização Jurisdicional da Regulação das Comunicações, a seguir «KOG»] ( 6 ) prevê que «[a]s contribuições financeiras são determinadas e cobradas com base na relação entre o volume de negócios de cada obrigado e o volume de negócios total específico do setor, devendo o cálculo basear‑se na totalidade dos volumes de negócios realizados no interior do país pela prestação de serviços de telecomunicações».

12.

O artigo 34.o A da KOG tem a seguinte redação:

«(1)   O financiamento dos custos suportados pela RTR‑GmbH no cumprimento das atribuições […] relativas ao setor “correio” é assegurado, por um lado, pelas contribuições financeiras e, por outro, por recursos orçamentais federais. A subvenção do orçamento federal, do montante anual de 200000 euros, é paga à RTR‑GmbH em duas prestações iguais […]. O montante total dos outros custos da RTR‑GmbH proveniente das contribuições financeiras pode atingir o máximo de 550000 euros por ano.

(2)   As contribuições financeiras provêm do “setor correio”. Este setor compreende os prestadores de serviços postais obrigados à declaração nos termos do artigo 25.o [da PMG] ou titulares de uma concessão nos termos do artigo 26.o dessa lei.

(3)   Aplica‑se por analogia o artigo 34.o, n.os 3 a 15, sendo a expressão “Telekom‑Control‑Kommission” substituída pela expressão “Post‑Control‑Kommission”».

II – Litígio no processo principal e questões prejudiciais

13.

A DHL Express (Austria) GmbH (a seguir «DHL Express»), filial austríaca do grupo Deutsche Post DHL, é uma empresa que opera no setor dos serviços de correio e de correio expresso e, nesta atividade, assegura nomeadamente a recolha, a triagem, o transporte e a distribuição de encomendas com um peso máximo de 31,5 quilogramas, bem como de impressos e documentos — serviços ligados a numerosas prestações de valor acrescentado (como por exemplo o cumprimento garantido de determinadas datas de entrega, a embalagem e a localização de envios).

14.

Por decisão de 23 de abril de 2012, a Post‑Control‑Kommission (Comissão de supervisão dos serviços postais, a seguir «PCK») reclamou à DHL Express uma contribuição para o financiamento da RTR‑GmbH, relativamente ao período de 1 de julho a 31 de dezembro de 2011. Na sua decisão, a PCK considerou que a DHL Express devia contribuir financeiramente para as atividades da autoridade reguladora do setor dos serviços postais. Com efeito, para além do financiamento parcial de origem pública, a legislação austríaca prevê também a obrigação de contribuição de todos os prestadores de serviços postais, quer estejam encarregados do serviço universal ou não. A PCK calculou, por isso, a parte da DHL Express no volume de negócios total do setor dos serviços postais com base no volume de negócios anual previsível desta última para 2011, tendo depois determinado a parte do financiamento da RTR‑GmbH que devia ser suportada pela DHL Express.

15.

A DHL Express interpôs recurso desta decisão para o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo). Alega que não presta nenhum serviço que faça parte do serviço universal, na aceção da Diretiva 97/67,e que o artigo 9.o, n.o 2, dessa diretiva alterada limita a faculdade dos Estados‑Membros de imporem aos prestadores de serviços postais a obrigação de contribuírem para o financiamento da autoridade reguladora do referido setor apenas aos prestadores que fornecem serviços abrangidos pelo serviço universal. Na sua opinião, a legislação nacional que impõe a todos os prestadores de serviços postais, sem distinção, a obrigação de contribuírem para o referido financiamento é, por isso, contrária à referida diretiva.

16.

Nestas circunstâncias, confrontado com uma dificuldade ligada à interpretação do direito da União, o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal administrativo) decidiu suspender a instância e, por decisão que deu entrada na respetiva Secretaria em 7 de janeiro de 2015, submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1.

A Diretiva [97/67/CE], na redação que lhe foi dada pela Diretiva [2008/6/CE], em particular o seu artigo 9.o, opõe‑se a uma legislação nacional nos termos da qual os prestadores de serviços postais, independentemente de serem ou não prestadores do serviço universal, estão obrigados a contribuir financeiramente para os custos de funcionamento da autoridade reguladora nacional?

2.

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

a)

Para a imposição de uma obrigação de financiamento é suficiente que o prestador em causa preste serviços postais que, segundo a legislação nacional, são qualificados de prestações do serviço universal, mas ultrapassam o conjunto mínimo de serviços no âmbito do serviço universal que devem ser obrigatoriamente prestados por força da diretiva?

b)

No cálculo da participação de cada empresa nas contribuições financeiras, deve‑se proceder da mesma forma que no cálculo das contribuições financeiras para o fundo de compensação previsto no artigo 7.o, n.o 4, da referida diretiva?

c)

A obrigação de respeitar os princípios da não discriminação e da proporcionalidade, na aceção do artigo 7.o, n.o 5, da referida diretiva, e a “consideração da permutabilidade com o serviço universal”, na aceção do vigésimo sétimo considerando da Diretiva [2008/6/CE] exigem então que as quotas do volume de negócios correspondentes aos serviços de valor acrescentado, ou seja, a serviços postais que não são abrangidos pelo conceito de serviço universal mas estão conexos com o mesmo, sejam excluídas do cálculo, não sendo tidas em consideração no apuramento da participação nas contribuições financeiras?»

III – Tramitação processual no Tribunal de Justiça

17.

Foram apresentadas observações escritas sobre o presente reenvio prejudicial pela recorrente no processo principal, pela recorrida no processo principal, pelos governos austríaco, belga, espanhol, francês e norueguês e pela Comissão Europeia.

IV – Análise jurídica

A – Quanto à primeira questão prejudicial

18.

Com a primeira questão prejudicial que submeteu ao Tribunal de Justiça, o órgão jurisdicional de reenvio pretende apurar, em substância, se a Diretiva 97/67 se opõe a que os Estados‑Membros obriguem todos os prestadores de serviços do setor dos serviços postais a contribuírem para o financiamento da autoridade reguladora do referido setor.

1. Tese da recorrente no processo principal

19.

A DHL Express, apoiada na sua argumentação pelo governo francês, sustenta que tanto a letra como a sistemática do artigo 9.o da Diretiva 97/67 impõem o dever de interpretar o artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, quarto travessão, da referida diretiva no sentido de que os Estados‑Membros só podem impor tal contribuição às empresas que prestem serviços abrangidos pelo serviço universal.

20.

Do ponto de vista literal, o artigo 9.o da Diretiva 97/67 estabelece as condições que regem a prestação dos serviços postais e o acesso à rede em geral. O seu n.o 2 é consagrado específica e exclusivamente aos serviços abrangidos pelo conceito de serviço universal. O artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva 97/67 prevê que a concessão de autorizações pode ser subordinada às obrigações do serviço universal enumeradas nos seus diferentes travessões. Ora, o termo «autorizações» é um termo que remete para o regime que se aplica apenas às empresas prestadoras de serviços abrangidos pelo serviço universal. Além disso, do ponto de vista sistemático, devia ser feito um paralelo entre a obrigação de contribuir para o financiamento da autoridade reguladora do serviço postal, referida no artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, quarto travessão, da Diretiva 97/67 e a obrigação de contribuir financeiramente para o fundo de compensação previsto pelo artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, terceiro travessão, da referida diretiva. O âmbito de aplicação pessoal desta última obrigação é precisado nos considerandos 27 e 28 da Diretiva 2008/6, do qual resulta que só são visadas as empresas que prestem serviços abrangidos pelo serviço universal. É esta, aliás, a abordagem adotada pela própria Comissão. Por conseguinte, dado que o artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, terceiro travessão, da Diretiva 97/67 só diz respeito às empresas que prestam serviços abrangidos pelo serviço universal, a mesma conclusão se deve tirar em relação aos outros elementos constantes do artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, incluindo, por conseguinte, em relação à obrigação de contribuir para o financiamento da autoridade reguladora do setor dos serviços postais. O artigo 9.o, n.o 2, terceiro parágrafo, da Diretiva 97/67, por seu turno, confirma que o segundo parágrafo do referido artigo é efetivamente consagrado às obrigações que podem ser impostas às empresas que prestam serviços abrangidos pelo serviço universal, quer sejam designadas ( 7 ) ou não.

2. Análise

21.

Resulta de jurisprudência reiterada do Tribunal de Justiça que, quando a interpretação literal não se mostra particularmente esclarecedora sobre o sentido a atribuir a uma disposição do direito da União constante de uma diretiva, se deve ter igualmente em conta, para interpretar essa disposição, o seu contexto, bem como a economia geral e a finalidade da diretiva da qual a referida disposição faz parte ( 8 ).

22.

Concedo de bom grado à recorrente no processo principal que o artigo 9.o da Diretiva 97/67 é uma disposição que tem uma redação de pobre qualidade e cuja interpretação se presta a confusão, se se atender apenas à sua letra. Por isso, o Tribunal de Justiça vai ter de fazer uma verdadeira operação de reconstrução, uma vez que o texto do artigo 9.o da Diretiva 97/67 não está — longe disso — redigido de modo a facilitar a sua compreensão imediata.

23.

Esta operação mostra‑se tanto mais necessária quanto atualmente, como indicam as observações escritas da Comissão, 18 Estados‑Membros obrigam todos os prestadores de serviços postais a contribuírem para o financiamento da sua autoridade reguladora nacional ( 9 ).

24.

A fim de revelar o alcance efetivo do artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, quarto travessão, da Diretiva 97/67, iniciarei em primeiro lugar a apreciação da referida disposição por uma análise da sua letra, e a seguir farei uma análise sistemática, que tentarei esclarecer recuando brevemente à génese desta disposição. Depois, num segundo tempo, terei de recordar quais são as atribuições da autoridade reguladora nacional do setor dos serviços postais e expor por que razão continuo convencido de que a analogia que a recorrente no processo principal tentou estabelecer entre as modalidades de financiamento da referida autoridade e as do fundo de compensação não é admissível.

a) Interpretação literal, sistemática e histórica

25.

O artigo 9.o da Diretiva 97/67 está inserido no capítulo dessa diretiva consagrado às condições que regem a prestação de serviços postais e o acesso à rede. O referido artigo subdivide‑se em três números.

26.

O n.o 1 do artigo 9.o da Diretiva 97/67 dispõe que, para os serviços não abrangidos pelo conceito de serviço universal, os Estados‑Membros podem estabelecer «autorizações gerais». O artigo 9.o, n.o 2, primeiro parágrafo, da referida diretiva prevê que, para os serviços abrangidos pelo conceito de serviço universal, os Estados‑Membros podem estabelecer «procedimentos de autorização, incluindo licenças individuais». O segundo parágrafo desse n.o 2 dispõe que a concessão da «autorizações» pode ser subordinada à observância de diversas condições, que são enumeradas nos cinco travessões deste parágrafo.

27.

À primeira vista, dado que a lista das diversas condições a que pode ser sujeita a concessão da «autorização» consta do n.o 2 do artigo 9.o, e que este n.o 2, no seu primeiro parágrafo, faz referência aos «serviços abrangidos pelo conceito de serviço universal», poder‑se‑ia deduzir daí que a «obrigação de contribuir financeiramente para os custos de funcionamento da autoridade reguladora nacional», referida no artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, quarto travessão, da Diretiva 97/67, só pode ser imposta aos prestadores de serviços abrangidos pelo serviço universal.

28.

Todavia, é interessante observar que o artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva 97/67 se refere ao conceito de «autorizações» sem outra precisão. Este parágrafo pode, por isso, ser lido, não isoladamente, mas pelo contrário, à luz do artigo 2.o, ponto 14, da Diretiva 97/67, que define o termo «autorizações». Ora, a leitura deste artigo mostra que se trata de um termo genérico, que visa «permissões em que se definem os direitos e obrigações específicos do setor postal e se permite às empresas a prestação de serviços postais e, eventualmente, o estabelecimento e/ou exploração das suas redes para a prestação desses serviços, sob a forma de «autorização geral» ou «licença individual» ( 10 ). O considerando 22 e o artigo 9.o, n.o 3, da Diretiva 97/67 são outros exemplos do uso do termo «autorização» ( 11 ), na sua aceção genérica, pelo legislador.

29.

Por isso, a interpretação literal proposta pela recorrente no processo principal parece‑me demasiado restritiva.

30.

Para sustentar a tese da DHL Express, também não se podem tirar argumentos do artigo 9.o, n.o 2, terceiro parágrafo, da Diretiva 97/67, nos termos do qual «as obrigações e os requisitos referidos no primeiro travessão [do artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, da referida diretiva] e no artigo 3.o só podem ser impostos aos prestadores do serviço universal designados». Apesar disso, tendo em conta a sistemática do artigo 9.o da Diretiva 97/67 entendido globalmente, a limitação dos outros travessões do artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, da referida diretiva não faria sentido.

31.

Reexaminemos os diferentes travessões em causa.

32.

O sentido do primeiro travessão é regulado pelo artigo 9.o, n.o 2, terceiro travessão, da Diretiva 97/67 que acabei de citar. As obrigações de serviço universal só podem, com toda a evidência, ser impostas aos prestadores do serviço universal designados, na aceção do artigo 4.o, n.o 2, desta diretiva.

33.

O segundo travessão prevê a possibilidade de subordinar as «autorizações» a requisitos de qualidade, de disponibilidade e de realização dos serviços correspondentes. Nada se opõe a que essas condições sejam impostas a todos os prestadores de serviços postais. A este propósito, observo que o artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 97/67 dispõe que os Estados‑Membros podem estabelecer autorizações gerais — para os serviços que não são abrangidos pelo serviço universal — se o considerarem necessário para «garantir o cumprimento dos requisitos essenciais». Estes requisitos, referidos no artigo 2.o, n.o 19, da Diretiva 97/67, abrangem «as razões de interesse geral e de natureza não económica que podem levar um Estado‑Membro a impor condições à prestação de serviços postais» ( 12 ), entre as quais, por exemplo, a confidencialidade da correspondência. Ora, posso perfeitamente admitir que obrigar os prestadores de serviços postais — mesmo que não universais —, na autorização geral que cobre o setor, a respeitar determinados padrões de qualidade, de disponibilidade ou de realização dos referidos serviços possa contribuir para a preservação e a perenidade de requisitos essenciais.

34.

O terceiro travessão refere‑se à possibilidade de submeter as «autorizações» ao cumprimento da obrigação de contribuir financeiramente para o fundo de compensação cuja criação é prevista pelo artigo 7.o, n.o 4, da Diretiva 97/67. Voltarei a esta obrigação um pouco mais adiante na minha análise, mas estou desde já inclinado a considerar que, em razão da conexão estabelecida expressamente ( 13 ) pelo legislador entre esta obrigação e apenas os prestadores de serviços abrangidos pelo serviço universal, este travessão deve ser interpretado no sentido de que não se aplica, em princípio, a todos os prestadores de serviços postais.

35.

O quarto travessão é o que constitui o objeto do presente reenvio prejudicial. A Diretiva 97/67 não contém nenhuma disposição expressa que permita concluir que o seu âmbito de aplicação se limita apenas às empresas que prestam serviços abrangidos pelo serviço universal.

36.

O quinto travessão visa a possibilidade de subordinar a concessão de «autorizações» à obrigação de respeitar as condições de trabalho previstas pelo direito nacional. Tenho dificuldade em crer que esta possibilidade seja também estritamente limitada às empresas que prestam serviços abrangidos pelo serviço universal. Também neste caso, a estrita interpretação proposta pela recorrente no processo principal levaria a considerar que os Estados‑Membros não têm o direito de exigir às empresas cuja atividade é regida por autorizações gerais — as emitidas para a prestação de serviços postais não abrangidos pelo serviço universal — que respeitem as condições de trabalho estabelecidas a nível nacional. Além disso, tal como o segundo travessão, o quinto travessão deve ser conjugado com o artigo 9.o, n.o 1, e com o artigo 2.o, n.o 19, da Diretiva 97/67. Ora, este último menciona expressamente como requisito essencial «o respeito pelos termos e condições de emprego».

37.

Uma interpretação do artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva 97/67 que não limite necessariamente aos prestadores de serviços abrangidos pelo serviço universal — sem prejuízo de disposição expressa contrária — a possibilidade de os Estados‑Membros condicionarem a concessão de autorizações ao cumprimento das obrigações aí enumeradas não é contrariada pela análise histórica da referida disposição.

38.

Nas suas observações escritas, a Comissão forneceu um certo número de informações sobre as condições em que o Conselho da União Europeia pretendeu, por iniciativa da Irlanda, introduzir o artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, quarto travessão, da Diretiva 97/67. Concordando com a Comissão, inclino‑me a considerar que, ao fazê‑lo, o legislador da União Europeia pretendeu abrir uma opção de financiamento suplementar para os Estados‑Membros e que o caráter facultativo das referidas opções abona a favor de uma interpretação preferencialmente ampla das disposições correspondentes. Realço também que, na diretiva original, ou seja, na Diretiva 97/67, o legislador já considerava o termo «autorização» na sua aceção genérica, de modo que as modificações introduzidas pela Diretiva 2008/6 não afetaram a definição inicial do termo «autorização» ( 14 ).

39.

Para além destes elementos relacionados com o texto, com o sistema e com a génese do artigo 9.o da Diretiva 97/67, a análise das atribuições conferidas às autoridades nacionais que regulam o setor dos serviços postais mostra que o seu papel foi concebido pelo legislador da União no sentido de não se limitar apenas aos serviços postais abrangidos pelo serviço universal.

b) Atribuições conferidas às autoridades reguladoras nacionais

40.

O artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, quarto travessão, da Diretiva 97/67 permite aos Estados‑Membros usar da faculdade de obrigar os prestadores de serviços postais a contribuírem para o financiamento da autoridade reguladora nacional. O artigo 22.o, n.o 1, da Diretiva 97/67 prevê que os Estados‑Membros designem «uma ou mais autoridades reguladoras nacionais para o setor postal» ( 15 ). O artigo 22.o, n.o 2, da referida diretiva precisa ainda as suas atribuições. Nos termos desta disposição, as referidas autoridades «têm como atribuição específica assegurar o cumprimento das obrigações decorrentes da presente diretiva, em especial estabelecendo procedimentos de acompanhamento e de regulação para garantir a prestação do serviço universal» ( 16 ). Apesar disso, esta atribuição relacionada com o serviço universal não é exclusiva, visto que o artigo 22.o, n.o 2, da Diretiva 97/67 prossegue, dispondo que as autoridades reguladoras nacionais «podem igualmente ter como atribuição assegurar o cumprimento das regras de concorrência no setor postal». Estas autoridades desempenham também um papel importante na recolha de informações para efeitos de verificação ou para efeitos estatísticos ( 17 ). Ora, também neste contexto, a obrigação dos prestadores de serviços postais de comunicarem estas informações às autoridades reguladoras nacionais não se limita aos prestadores de serviços abrangidos pelo serviço universal ( 18 ), como já se anunciava na nota justificativa da Diretiva 2008/6 ( 19 ).

41.

Além disso, se o papel das autoridades reguladoras nacionais é assegurar o cumprimento das obrigações decorrentes da diretiva, é útil recordar que o artigo 1.o da Diretiva 97/67, que define o objetivo e o âmbito de aplicação da mesma, prevê, nomeadamente, no seu primeiro travessão, que essa diretiva estabelece regras comuns relativas à prestação de um serviço postal universal.

42.

É necessário recordar também que a Diretiva 2008/6, que modificou substancialmente a Diretiva 97/67, marca uma mudança de paradigma na conceção comunitária do setor dos serviços postais. Ao adotar a Diretiva 2008/6, o legislador da União visa «dar o «último passo» em direção à abertura total do mercado (ATM) ao suprimir todos os direitos exclusivos ou especiais remanescentes em vigor para o(s) prestador(es) de serviço universal e todos os outros obstáculos à prestação de serviços postais» ( 20 ). É o fim de uma conceção monopolista para dar progressivamente lugar à livre concorrência ( 21 ).

43.

As autoridades reguladoras nacionais devem acompanhar esta mudança de paradigma. No considerando 47 da Diretiva 2008/6, o papel destas autoridades é qualificado como «essencial, em particular nos Estados‑Membros onde o processo de transição para a concorrência não está ainda concluído. […] As autoridades reguladoras nacionais deverão dispor de todos os recursos necessários em termos de pessoal, de competências e de meios financeiros para o desempenho das suas funções» ( 22 ). Estes meios podem, pois, necessitar da participação de todos os prestadores de serviços postais no financiamento das atividades das referidas autoridades.

44.

O papel das autoridades reguladoras nacionais, tal como foi concebido pelo legislador da União, não se limita apenas ao serviço universal. Nos termos da Diretiva 97/67, as referidas autoridades devem cuidar do interesse geral no setor dos serviços postais, verificando, nomeadamente, que os operadores do mercado em vias de abertura se comportam de modo compatível com as disposições da referida Diretiva 97/67 alterada.

45.

Além disso, também se deve reconhecer que o legislador da União deixou uma margem de apreciação consequente aos Estados‑Membros no que respeita à definição das funções e atribuição de competências às autoridades reguladoras nacionais. A Comissão sublinhou, no seu Relatório ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre a aplicação da Diretiva postal que «o mandato, os recursos e as competências das [autoridades reguladoras nacionais] variam consideravelmente de um Estado‑Membro para outro, e que há motivos para duvidar que todas as [autoridades reguladoras nacionais] estejam suficientemente equipadas para o cumprimento (efetivo) das suas tarefas» ( 23 ).

46.

Dado que o papel e as atribuições conferidas às autoridades reguladoras nacionais foram concebidos pelo legislador da União para beneficiarem todos os operadores do setor dos serviços postais, seria ilógico, ou até inutilmente discriminatório, como sustentam o governo norueguês e a Comissão, interpretar o artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, quarto travessão, da Diretiva 97/67 no sentido de que só as empresas que prestam serviços abrangidos pelo serviço universal podem ser sujeitas à obrigação de contribuir para o financiamento das atividades das referidas autoridades.

47.

Finalmente, é necessário recordar que, como alega a DHL Express, embora, na verdade, nos termos da jurisprudência Corbeau ( 24 ), os serviços de correio e correio expresso constituam serviços específicos com características que os distinguem fundamentalmente dos serviços postais universais, não deixa de ser verdade que o Tribunal de Justiça considerou que estes serviços de correio e de correio expresso fazem parte do setor dos serviços postais? Nestas condições, a contribuição para o financiamento da autoridade reguladora nacional que pode ser exigida a todos os prestadores de serviços postais deve, por conseguinte, poder ser imposta também às empresas de correio e de correio expresso.

48.

As considerações precedentes relativas ao papel e às atribuições conferidas às autoridades reguladoras nacionais levam‑me, por fim, a duvidar da pertinência dos argumentos invocados pela DHL Express e pelo governo francês quanto à analogia que alegadamente se deveria assumir entre o modo de financiamento das referidas autoridades e o modo de financiamento do fundo de compensação.

c) Impossibilidade de analogia com o modo de financiamento do fundo de compensação

49.

Ainda nessa perspetiva de mudança de paradigma, a Diretiva 2008/6 pretendeu suprimir progressivamente os direitos exclusivos ou especiais de que podiam beneficiar os prestadores designados do serviço universal ( 25 ), para dar preferência à consagração de uma obrigação de solidariedade sob a forma de um mecanismo de compensação ou de repartição do custo líquido das obrigações de serviço universal ( 26 ).

50.

Quando o Estado‑Membro em causa institui um mecanismo de partilha do custo líquido, pode «criar um fundo de compensação que pode ser financiado por taxas aplicáveis aos prestadores de serviço e/ou aos utilizadores […] Os Estados‑Membros podem subordinar a concessão de autorizações aos prestadores de serviços, ao abrigo do n.o 2 do artigo 9.o, à obrigação de uma contribuição financeira para esse fundo ou ao cumprimento das obrigações do serviço universal. […]» ( 27 ). O considerando 27 da Diretiva 2008/6 veio, no entanto, precisar que «[a] fim de determinar as empresas às quais se pode exigir que contribuam para um fundo de compensação, os Estados‑Membros deverão considerar se os serviços prestados por essas empresas podem, do ponto de vista do utilizador, ser considerados serviços abrangidos pelo âmbito do serviço universal, por demonstrarem permutabilidade em grau suficiente com o serviço universal, tendo em conta as características dos serviços, designadamente o valor acrescentado, bem como a utilização a que se destinam e as tarifas aplicáveis. Estes serviços não têm de cobrir necessariamente todas as características do serviço universal […]».

51.

Ao fazê‑lo, contrariamente ao que ocorre no financiamento da atividade das autoridades reguladoras nacionais, foi estabelecida uma relação entre o fundo de compensação e as empresas prestadoras de serviços abrangidos pelo serviço universal. Isto explica‑se pelo facto de os objetivos prosseguidos com a criação do fundo de compensação diferirem substancialmente dos prosseguidos pela instituição e pelo reforço do papel e das atribuições das autoridades reguladoras nacionais.

52.

Com efeito, como o seu nome indica, o fundo de compensação tem por objetivo compensar o desequilíbrio económico que pode ocorrer, ou seja, «compensar o prestador do serviço universal pela prestação de serviços que representem encargos financeiros não razoáveis» ( 28 ). Com toda a lógica, a obrigação de compensação devia, portanto, ser limitada aos prestadores de serviços abrangidos ou que pudessem ser abrangidos pelo serviço universal ( 29 ), visto que, contrariamente ao que demonstrei acima no que respeita às autoridades reguladoras nacionais, os benefícios do fundo de compensação limitam‑se ao serviço universal.

53.

Por conseguinte, a obrigação de contribuir para o fundo de compensação não é comparável à obrigação de contribuir para o financiamento das autoridades reguladoras nacionais e o que é verdade para uma não o é necessariamente para a outra. Contrariamente ao que sustenta a recorrente no processo principal, não há, pois, analogia possível entre elas.

d) Observação final

54.

Resulta da minha análise que, no artigo 9.o da Diretiva 97/67, nada se opõe a que um Estado‑Membro obrigue todos os prestadores de serviços postais, independentemente de prestarem serviços abrangidos ou não pelo serviço universal, a contribuírem para o financiamento das atividades da autoridade reguladora do serviço postal.

55.

Se o Tribunal de Justiça não viesse a mostrar‑se plenamente convencido pelos argumentos precedentes, quero ainda formular uma última observação.

56.

Mesmo que se interpretasse globalmente o artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva 97/67 no sentido de que apenas afeta os serviços abrangidos pelo serviço universal, isso não significaria, a contrario, que os Estados‑Membros não possam submeter os prestadores de serviços postais não abrangidos pelo serviço universal à obrigação de contribuírem para o financiamento das atividades das autoridades reguladoras nacionais.

57.

Explico:

58.

A situação dos prestadores de serviços não abrangidos pelo serviço universal continuaria a ser regida pelo artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 97/67. À luz do que o Tribunal de Justiça decidiu no que respeita aos procedimentos de tratamento das reclamações que a Diretiva 97/67 prevê ( 30 ), esta diretiva não harmonizou completamente as condições em que as autorizações gerais podem ser concedidas a estes prestadores. No silêncio do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 97/67, caberia na margem de apreciação dos Estados‑Membros decidir impor a todos os prestadores de serviços postais a obrigação de contribuírem para o financiamento das atividades da autoridade reguladora nacional. Seria, aliás, difícil censurá‑los por isso, tendo em conta o teor do considerando 47 da Diretiva 2008/6 ( 31 ).

e) Conclusão da análise

59.

À luz das considerações precedentes, resulta da minha análise que o artigo 9.o da Diretiva 97/67 não se opõe a uma regulamentação nacional que obriga os prestadores de serviços postais a contribuírem para o financiamento da autoridade reguladora nacional do setor dos serviços postais, independentemente de fornecerem ou não serviços abrangidos pelo serviço universal.

B – Quanto à segunda questão prejudicial

60.

Dado que o órgão jurisdicional de reenvio apenas submete a sua segunda questão prejudicial ao Tribunal de Justiça para o caso de este responder afirmativamente à primeira questão submetida, e tendo em conta a resposta que sugiro seja dada a essa primeira questão, o Tribunal de Justiça não tem de se pronunciar sobre essa segunda questão.

V – Conclusão

61.

À luz das considerações precedentes, sugiro ao Tribunal de Justiça que responda do modo seguinte à primeira questão prejudicial submetida pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo):

A Diretiva 97/67/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de dezembro de 1997, relativa às regras comuns para o desenvolvimento do mercado interno dos serviços postais comunitários e a melhoria da qualidade de serviço, conforme alterada pela Diretiva 2008/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de fevereiro de 2008, nomeadamente o seu artigo 9.o, não se opõe a uma regulamentação nacional que obriga os prestadores de serviços postais a contribuírem para o financiamento da autoridade reguladora nacional do setor dos serviços postais, independentemente de fornecerem ou não serviços abrangidos pelo serviço universal.


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) JO 1998, L 15, p. 14.

( 3 ) Antes da Diretiva 2008/6, a Diretiva 97/67 tinha sido também alterada pela Diretiva 2002/39/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 10 de junho de 2002 (JO L 176, p. 21), e pelo Regulamento (CE) n.o 1882/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de setembro de 2003 (JO L 284, p. 1).

( 4 ) JO L 52, p. 3.

( 5 ) BGBl. I n.o 123/2009, na redação publicada no BGBl. I n.o 111/2010.

( 6 ) BGBl. I n.o 32/2001, na redação publicada no BGBl. I n.o 50/2010.

( 7 ) Na aceção do artigo 4.o da Diretiva 97/67.

( 8 ) V., nomeadamente, acórdão CHEZ Razpredelenie Bulgaria (C‑83/14, EU:C:2015:480, n.o 55 e jurisprudência citada).

( 9 ) Qualquer que seja a forma de contribuição. O governo espanhol expôs, no que lhe diz respeito, o mecanismo específico do Reino de Espanha. A contribuição exigida tem a forma de uma imposição ou de uma taxa recebida no momento da inscrição ou da renovação da inscrição no registo das empresas de serviços postais.

( 10 ) O artigo 2.o, ponto 14 da Diretiva 97/67 prossegue com a definição das duas categorias especiais de «autorizações» que são as autorizações gerais e as licenças individuais (v. n.o 5 das presentes conclusões).

( 11 ) Nos termos deste considerando, «os Estados‑Membros devem poder regular, através de processos de autorização adequados, no respetivo território, a prestação dos serviços postais não reservados aos prestadores do serviço universal […]».

( 12 ) O sublinhado é meu. A referência à prestação de serviços postais em geral é importante.

( 13 ) V., nomeadamente, considerando 27 da Diretiva 2008/6. Quanto à falta de pertinência da analogia entre o modo de financiamento do fundo e o modo de financiamento da autoridade reguladora, v. n.os 49 e segs. das presentes conclusões.

( 14 ) V. artigo 2.o, n.o 14, da Diretiva 97/67 na sua versão inicial.

( 15 ) O sublinhado é meu.

( 16 ) O sublinhado é meu.

( 17 ) V. artigo 22.o‑ A da Diretiva 97/67.

( 18 ) V., por exemplo, artigo 22.o‑A, n.o 2, da Diretiva 97/67.

( 19 ) No ponto III, 2, alínea viii), da nota justificativa do Conselho da Posição Comum (CE) n.o 19/2007 adotada pelo Conselho em 8 de novembro de 2007 (JO C 307E, p. 22), o Conselho recordou que «[a]s autoridades reguladoras nacionais concentram‑se na supervisão dos mercados postais, designadamente através da prestação de informações por parte de todos os intervenientes no mercado» (o sublinhado é meu).

( 20 ) V. ponto II da nota justificativa do Conselho da Posição Comum n.o 19/2007.

( 21 ) Esta mudança de paradigma é exemplificada, nomeadamente, no considerando 23 da Diretiva 2008/6, nos termos do qual «[a] Diretiva 97/67/CE estabelece uma preferência pela prestação do serviço universal através da designação de prestadores do serviço universal.[…] Com o aumento da concorrência e uma maior escolha, os Estados‑Membros deverão ter mais flexibilidade para determinar o mecanismo mais adequado e eficiente para assegurar a disponibilidade do serviço universal, respeitando em simultâneo os princípios da objetividade, da transparência, da não discriminação, da proporcionalidade e da mínima distorção do mercado, necessários para assegurar a livre prestação de serviços postais no mercado interno. Os Estados‑Membros podem aplicar uma ou várias das seguintes possibilidades: prestação do serviço universal pelas forças do mercado, designação de uma ou mais empresas para a prestação de diferentes elementos do serviço universal ou para a cobertura de diferentes partes do território e contratos públicos de serviços. […]»

( 22 ) O Relatório da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre a aplicação da Diretiva postal [COM(2008) 884 final] confirmou que autoridades reguladoras nacionais funcionais […] são essenciais para a realização do mercado interno dos serviços postais» (v. n.o 6 do referido relatório).

( 23 ) COM(2008) 884 final.

( 24 ) C‑320/91, EU:C:1993:198.

( 25 ) V. artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 97/67.

( 26 ) V. artigo 7.o, n.o 3, da Diretiva 97/67.

( 27 ) V. artigo 7, n.o 4, da Diretiva 97/67.

( 28 ) Considerando 23 da Diretiva 97/67. O artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, terceiro travessão, da Diretiva 97/67 prevê a faculdade de subordinar a concessão de autorizações à obrigação de contribuir para o fundo de compensação «se a prestação do serviço universal implicar um custo líquido e representar um encargo não razoável para o prestador ou prestadores de serviço universal designados […]».

( 29 ) Ou seja, aos prestadores «dos serviços não reservados abrangidos pelo conceito de serviço universal», para reproduzir o vocabulário da Diretiva 97/67 na sua versão inicial (v., nomeadamente, artigo 9.o, n.o 2, da referida diretiva).

( 30 ) V. acórdão DHL International (C‑148/10, EU:C:2011:654, n.os 35 e 36 e jurisprudência citada).

( 31 ) V. n.os 4 e 43 das presentes conclusões.

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