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Document 62014TJ0752

Acórdão do Tribunal Geral (Segunda Secção) de 19 de julho de 2017.
Combaro SA contra Comissão Europeia.
União aduaneira — Acordo de associação entre a Comunidade Europeia e a República da Letónia — Artigo 239.o do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 — Reembolso e dispensa do pagamento dos direitos de importação — Importação de tecido de linho da Letónia — Cláusula de equidade — Situação especial — Artifício ou negligência manifesta — Decisão da Comissão que declara não justificada a dispensa do pagamento dos direitos de importação.
Processo T-752/14.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2017:529

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

19 de julho de 2017 ( *1 )

«União aduaneira — Acordo de associação entre a Comunidade Europeia e a República da Letónia — Artigo 239.o do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 — Reembolso e dispensa do pagamento dos direitos de importação — Importação de tecido de linho da Letónia — Cláusula de equidade — Situação especial — Artifício ou negligência manifesta — Decisão da Comissão que declara não justificada a dispensa do pagamento dos direitos de importação»

No processo T‑752/14,

Combaro SA, com sede em Lausanne (Suíça), representada por D. Ehle, advogada,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por A. Caeiros e B.‑R. Killmann, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um recurso ao abrigo do artigo 263.o TFUE em que é pedida a anulação da Decisão C(2014) 4908 final da Comissão, de 16 de julho de 2014, que indeferiu o pedido da recorrente de dispensa de direitos à importação no montante de 461415,12 euros,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção),

composto por: M. Prek, presidente, F. Schalin (relator) e M. J. Costeira, juízes,

secretário: S. Bukšek Tomac, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 6 de dezembro de 2016,

profere o presente

Acórdão

Antecedentes do litígio

Regime aplicável às importações de têxteis e acordo de associação: importações da recorrente

1

A Decisão C(2014) 4908 final da Comissão, de 16 de julho de 2014, que declarou que a dispensa do pagamento dos direitos de importação não estava justificada num caso concreto (REM 05/2013) (a seguir «decisão impugnada»), tem por objeto os direitos de importação sobre tecido de linho que foi importado para a União Europeia através da Alemanha entre 10 de dezembro de 1999 e 10 de junho de 2002 (a seguir «período de referência») e cuja origem preferencial letã não foi provada.

2

O tecido de linho, enquanto têxtil, está sujeito a algumas restrições à importação. Assim, durante o período de referência, existiam algumas medidas restritivas aplicáveis, nomeadamente, às importações da China e da Rússia, de acordo com o Regulamento (CEE) n.o 3030/93 do Conselho, de 12 de outubro de 1993, relativo ao regime comum aplicável às importações de certos produtos têxteis originários de países terceiros (JO 1993, L 275, p. 1).

3

Os têxteis de origem preferencial letã não estavam sujeitos às restrições à importação referidas no n.o 2 supra. Esta isenção decorria do Acordo europeu que cria uma associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a República da Letónia, por outro (JO 1998, L 26, p. 3, a seguir «acordo de associação»).

4

Como outros produtos de origem preferencial letã, os têxteis só beneficiavam da isenção aduaneira se o importador fizesse prova do caráter originário dos mesmos às autoridades aduaneiras do Estado‑Membro de importação, através de um certificado de circulação de mercadorias EUR.1 emitido pelas autoridades aduaneiras letãs no momento da exportação.

5

A recorrente, Combaro SA, é uma empresa de comércio de têxteis e de outros bens, com sede na Suíça desde 1978.

6

A recorrente comprava tecido de linho a duas empresas letãs. As entregas feitas por essas duas empresas à recorrente eram acompanhadas de certificados de circulação de mercadorias que atestavam que o tecido de linho fornecido era de origem preferencial letã.

7

Os certificados de circulação de mercadorias indicavam como exportador uma das duas empresas letãs e como importador a recorrente, respetivamente, mas a Áustria como país de destino. Os locais de emissão indicados nos certificados de circulação de mercadorias eram Jelgava (Letónia) e Bauska (Letónia), respetivamente.

8

Durante o período de referência, a recorrente importou, em seguida, esse tecido de linho para a União. A mesma procedeu à sua introdução em livre prática na Alemanha e, apresentando certificados de circulação de mercadorias, entre os quais os 51 certificados de circulação de mercadorias em causa no presente processo (a seguir «certificados controvertidos»), requereu uma isenção de direitos de importação nos termos do acordo de associação. As autoridades aduaneiras alemãs procederam ao desalfandegamento dos produtos em conformidade com o pedido da recorrente.

Controlo e procedimento de cobrança a posteriori

9

Em 18 de julho de 2002, o Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) elaborou um relatório sobre uma missão de inquérito que tinha efetuado na Letónia (a seguir «relatório do OLAF»). Segundo o relatório do OLAF, em fevereiro de 2002, a Administração Aduaneira dinamarquesa tinha participado ao OLAF as suas dúvidas quanto à origem preferencial letã de tecido de linho importado da Letónia, apesar da apresentação de certificados de circulação de mercadorias que atestavam a sua proveniência. O relatório do OLAF precisava que, no final da missão de inquérito, o OLAF e as autoridades aduaneiras letãs tinham concluído que os certificados de circulação de mercadorias apresentados para a importação na Dinamarca não estavam inscritos nos registos das autoridades aduaneiras letãs. Tinha sido igualmente concluído que o funcionário cuja assinatura figurava nos referidos certificados tinha prestado uma declaração escrita segundo a qual a assinatura constante desses certificados não era a sua. Por último, no relatório do OLAF era indicado que as investigações relativas aos cunhos dos carimbos que figuravam nos certificados em causa ainda não estavam concluídas.

10

Na sequência do relatório do OLAF, em 11 de setembro de 2002, a Comissão Europeia enviou aos Estados‑Membros um pedido de assistência mútua, solicitando um controlo de todas as importações de tecidos de linho provenientes da Letónia.

11

As autoridades aduaneiras alemãs solicitaram, então, às autoridades aduaneiras letãs um controlo a posteriori dos certificados controvertidos (a seguir «controlo a posteriori»). Em 7 de abril, 2 de maio e 7 de maio de 2003, as autoridades aduaneiras letãs responderam aos pedidos formulados pelas autoridades aduaneiras alemãs nos seguintes termos:

«[Os] certificados [controvertidos] não foram inscritos no registo aduaneiro. Não foram emitidos pelas alfândegas letãs e, consequentemente, devem ser considerados não válidos.»

12

Estas respostas eram assinadas pelo diretor‑adjunto das autoridades aduaneiras letãs, R., o qual veio a ser posteriormente condenado penalmente e a ser objeto de processos disciplinares por não ter cobrado dívidas fiscais a uma empresa letã.

13

Tendo as autoridades aduaneiras letãs declarado não válidos os certificados controvertidos, as autoridades aduaneiras alemãs consideraram que as importações de tecidos de linho provenientes da Letónia feitas pela recorrente já não podiam beneficiar de tratamento preferencial e, por decisão de 3 de julho de 2003, decidiram dar início a um procedimento de cobrança a posteriori dos direitos de importação correspondentes (a seguir «procedimento de cobrança a posteriori»). Além disso, as autoridades aduaneiras alemãs instauraram um procedimento criminal contra dois diretores executivos da recorrente, com base numa suspeita de fraude relativa aos direitos de importação. O processo foi arquivado no que dizia respeito a um deles e, em relação ao outro, correu termos no Landgericht München (Tribunal Regional de Munique, Alemanha).

14

Entretanto, por iniciativa do OLAF, foram realizadas peritagens aos certificados de circulação de mercadorias apresentados para as importações na Dinamarca, que incidiram na comparação de cunhos de carimbos e nas assinaturas. Para realizar essas peritagens, o OLAF teve de obter material de comparação que se encontrava na Letónia. Nos relatórios das peritagens em causa, foi declarado que alguns cunhos de carimbos eram os mesmos que os dos carimbos autênticos das autoridades aduaneiras letãs, enquanto, por falta de material de referência, outros cunhos de carimbos apenas tinham podido ser objeto de uma avaliação geral da imagem, da qual resultava que eram provavelmente autênticos.

15

No que diz respeito às peritagens às assinaturas, o relatório correspondente concluiu que a avaliação da autenticidade da assinatura constante dos certificados de circulação de mercadorias examinados apresentava algumas dificuldades, dado que a comparação devia ser feita com base em cópias dessa assinatura, uma vez que não existia qualquer assinatura autêntica do funcionário em causa, a saber, O., que datasse do período em que as assinaturas tinham sido feitas e que o método que consiste em pedir assinaturas a posteriori para efeitos de peritagem colocava um problema de fiabilidade. Por conseguinte, o relatório da peritagem concluiu que a assinatura constante dos certificados examinados era, com uma probabilidade ligeiramente predominante, a de O.

16

Para efeitos da defesa dos seus interesses nos processos pendentes perante as autoridades criminais e aduaneiras alemãs, a recorrente dirigiu‑se às autoridades aduaneiras letãs e ao OLAF. Por carta de 26 de junho de 2007, as autoridades aduaneiras letãs, em resposta aos pedidos formulados pela recorrente, confirmaram a resposta que tinham enviado, em 7 de maio de 2003, às autoridades aduaneiras alemãs, segundo a qual os certificados controvertidos «d[eviam] ser considerados não válidos», e o OLAF informou a recorrente do estado das suas investigações.

17

Por último, a recorrente também remeteu à Comissão um pedido de acesso à correspondência trocada entre esta e as autoridades aduaneiras letãs. Esse pedido foi parcialmente indeferido. A recorrente não recorreu desta recusa parcial de acesso à correspondência em causa.

18

Por despacho de 30 de abril de 2009, o Landgericht München (Tribunal Regional de Munique) pôs termo ao processo penal contra o diretor executivo da recorrente. Nos termos desse despacho, não era possível imputar sem a menor dúvida ao referido diretor ter‑se subtraído deliberadamente ao pagamento dos direitos de importação. Mais precisamente, resultava desse despacho que possivelmente teriam sido cometidas algumas irregularidades no seio da Administração Aduaneira letã. O Landgericht München (Tribunal Regional de Munique) também expressou dúvidas quanto à vontade de o referido diretor se furtar fraudulentamente, em benefício da sociedade que representava, ou seja, a recorrente, ao pagamento dos direitos de importação, independentemente da questão de saber se os critérios objetivos relativos à obrigação de pagamento desses direitos podiam, ou não, ser declarados verificados.

19

O procedimento de cobrança a posteriori foi submetido à apreciação do Finanzgericht München (Tribunal Tributário de Munique, Alemanha). Nessa sede, a recorrente alegou, em especial, que lhe devia ser concedida a dispensa do pagamento da sua dívida, em conformidade com o artigo 239.o do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO 1992, L 302, p. 1, a seguir «CAC»).

20

Por decisão de 28 de novembro de 2012, o Finanzgericht München (Tribunal Tributário de Munique) declarou, no essencial, que devia ser «seriamente» ponderada uma dispensa do pagamento dos direitos de importação devidos pela recorrente, por existirem elementos que permitiam considerar que os certificados controvertidos tinham sido deliberadamente emitidos de forma irregular pelos funcionários das autoridades aduaneiras letãs, por um lado, e a Comissão não ter controlado de modo adequado o respeito pela Letónia do regime preferencial em vigor, por outro. O Finanzgericht München (Tribunal Tributário de Munique) declarou igualmente que não existia qualquer intenção fraudulenta ou negligência manifesta por parte da recorrente. Por conseguinte, o Finanzgericht München (Tribunal Tributário de Munique) suspendeu o procedimento de cobrança a posteriori e ordenou que as autoridades aduaneiras alemãs apresentassem à Comissão um pedido de dispensa do pagamento dos referidos direitos.

Procedimento REM 05/2013

21

Na sequência da decisão do Finanzgericht München (Tribunal Tributário de Munique), o Bundesministerium der Finanzen (Ministério Federal das Finanças, Alemanha) pediu à recorrente o seu parecer e, em 3 de setembro de 2013, apresentou à Comissão um pedido de dispensa do pagamento dos direitos de importação nos termos do artigo 239.o do CAC. A Comissão iniciou, então, o procedimento REM 05/2013.

22

No âmbito do procedimento REM 05/2013, a Comissão, com fundamento no artigo 906.o‑A do Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de 2 de julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do CAC (JO 1993, L 253, p. 1, a seguir «regulamento de aplicação»), e no direito de ser ouvido, informou a recorrente, por carta de 14 de março de 2014, das suas objeções e da sua intenção de adotar uma decisão que lhe era desfavorável, dando‑lhe a possibilidade de apresentar as suas observações. A recorrente apresentou observações sobre a decisão que a Comissão considerava adotar no seu caso.

23

Em 16 de julho de 2014, a Comissão adotou a decisão impugnada.

24

No considerando 32 da decisão impugnada, a Comissão explicou que não existia qualquer situação especial, na aceção do artigo 239.o do CAC, que se devesse a um incumprimento por parte das autoridades aduaneiras letãs, dado que não lhe era possível concluir que as referidas autoridades tivessem participado na emissão dos certificados controvertidos.

25

A Comissão examinou igualmente a questão de saber se tinha, ela própria, incorrido em qualquer incumprimento no quadro da vigilância da aplicação correta do acordo de associação. Nos considerandos 36 a 41 da decisão impugnada, concluiu que o seu comportamento não dava origem a uma situação especial.

26

Nos considerandos 42 a 44 da decisão impugnada, a Comissão considerou que também não podia ser censurado às autoridades aduaneiras alemãs qualquer incumprimento no âmbito do procedimento de cobrança a posteriori.

27

Tendo a Comissão, no considerando 45 da decisão impugnada, concluído que, não existindo uma situação especial na aceção do artigo 239.o do CAC, não se justificava uma dispensa do pagamento dos direitos de importação, acrescentou, nos considerandos 48 a 52 da mesma decisão, que a recorrente não tinha demonstrado a diligência exigida.

28

Em 4 de setembro de 2014, a decisão impugnada foi notificada à recorrente.

Tramitação processual e pedidos das partes

29

Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de novembro de 2014, a recorrente interpôs o presente recurso.

30

Em 17 de fevereiro de 2015, a Comissão apresentou, na Secretaria do Tribunal Geral, a contestação.

31

Em 2 de abril e em 18 de maio de 2015, foram entregues, na Secretaria do Tribunal Geral, a réplica e a tréplica, respetivamente.

32

Em 12 de outubro de 2016, sob proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Segunda Secção) decidiu dar início à fase oral do processo e, no quadro das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, por carta de 19 de outubro seguinte, colocou à Comissão algumas questões escritas, convidando‑a a responder até 3 de novembro de 2016. A Comissão respondeu às questões do Tribunal Geral dentro do prazo fixado. O Tribunal Geral pediu à Comissão, nomeadamente, que fornecesse algumas explicações acerca dos relatórios que continham os resultados de controlos anuais que lhe incumbia realizar por força do acordo de associação e que indicasse em quais dos anexos apresentados ao Tribunal Geral figuravam ou, sendo esse o caso, que lhe fornecesse cópia dos mesmos. Além disso, o Tribunal Geral pediu à Comissão que lhe fornecesse a Comunicação COM(97) 402, de 23 de julho de 1997, invocada pela recorrente no n.o 106 da petição. Por último, o Tribunal Geral perguntou à Comissão se tinha sido realizada uma peritagem aos cunhos dos carimbos e às assinaturas que figuravam nos certificados controvertidos e que lhe fornecesse os resultados da mesma ou, sendo esse o caso, que explicasse por que razão essa peritagem não tinha sido realizada.

33

As partes foram ouvidas na audiência que teve lugar em 6 de dezembro de 2016, tendo apresentado alegações e respondido às questões colocadas pelo Tribunal Geral.

34

A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

anular a decisão impugnada;

condenar a Comissão nas despesas.

35

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar a recorrente nas despesas.

Questão de direito

36

No seu recurso, a recorrente invoca um fundamento único, relativo a uma violação do artigo 239.o do CAC.

Quanto à aplicação do artigo 239.o, n.o 1, segundo travessão, do CAC

37

A recorrente alega que a Comissão cometeu um erro na apreciação das condições relativas à existência de uma situação especial e às circunstâncias que não impliquem nem artifício nem negligência manifesta, na aceção do artigo 905.o do regulamento de aplicação, em conjugação com o artigo 239.o do CAC.

38

A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

39

A título preliminar, importa recordar que o artigo 905.o do regulamento de aplicação, disposição que precisa e desenvolve a regra prevista no artigo 239.o do CAC, segundo a qual se pode proceder ao reembolso ou à dispensa do pagamento dos direitos de importação em situações especiais decorrentes de circunstâncias que não envolvam qualquer artifício ou negligência manifesta por parte do interessado, constitui uma cláusula geral de equidade, destinada a cobrir, nomeadamente, situações excecionais que, em si, não se enquadram em nenhum dos casos previstos nos artigos 900.o a 904.o do regulamento de aplicação (acórdão de 25 de fevereiro de 1999, Trans‑Ex‑Import, C‑86/97, EU:C:1999:95, n.o 18). Resulta da letra do artigo 905.o do regulamento de aplicação que o reembolso dos direitos de importação depende da verificação de duas condições cumulativas, a saber, primeiro, a existência de uma situação especial e, segundo, a inexistência de negligência manifesta e de artifício por parte do interessado (acórdão de 12 de fevereiro de 2004, Aslantrans/Comissão, T‑282/01, EU:T:2004:42, n.o 53). Por conseguinte, basta que uma das duas condições se não verifique para que a dispensa de pagamento dos direitos de importação deva ser recusada (acórdãos de 5 de junho de 1996, Günzler Aluminium/Comissão, T‑75/95, EU:T:1996:74, n.o 54, e de 12 de fevereiro de 2004, Aslantrans/Comissão, T‑282/01, EU:T:2004:42, n.o 53).

40

Para determinar se as circunstâncias do caso em apreço são constitutivas de uma situação especial que não envolva qualquer negligência manifesta ou artifício por parte do interessado, na aceção do artigo 239.o do CAC, a Comissão deve proceder à apreciação do conjunto dos elementos de facto relevantes (v., neste sentido, acórdão de 15 de maio de 1986, Oryzomyli Kavallas e Oryzomyli Agiou Konstantinou/Comissão, 160/84, EU:C:1986:205, n.o 16).

41

Esta obrigação implica, num caso como o do processo principal, em que o devedor invocou, em apoio do seu pedido de reembolso ou de dispensa dos direitos de importação, a existência de determinadas faltas por parte das autoridades aduaneiras letãs e alemãs, bem como da Comissão, no âmbito da aplicação do acordo de associação, que a Comissão fará incidir a sua apreciação, ao examinar este pedido, no conjunto dos factos relativos aos certificados controvertidos de que tomou conhecimento no quadro da sua função de vigilância e de controlo da aplicação correta do referido acordo (v., neste sentido, acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 90).

42

Esta conclusão é, aliás, reforçada pelo artigo 904.o, alínea c), do regulamento de aplicação, que prevê que não é concedido o reembolso ou a dispensa do pagamento de direitos de importação quando o «único motivo» invocado em apoio do pedido de reembolso ou de dispensa do pagamento for a apresentação, ainda que de boa‑fé, para a concessão de um tratamento pautal preferencial, de documentos que posteriormente se verificou serem falsos, falsificados ou não válidos para a concessão desse tratamento. Por outras palavras, a apresentação de certificados falsos, falsificados ou não válidos não é constitutiva, em si mesma, de uma situação especial na aceção do artigo 239.o do CAC (acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 91).

43

Ao invés, outras circunstâncias invocadas em apoio de um pedido de reembolso ou de dispensa dos direitos de importação, como o controlo deficiente por parte da Comissão da aplicação correta do acordo de associação, podem constituir essa situação especial (v., neste sentido, acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 92).

44

Ora, embora a Comissão disponha de uma margem de apreciação no que respeita à aplicação do artigo 239.o do CAC, não pode abstrair‑se do seu dever de ponderar efetivamente, por um lado, o interesse da União no pleno respeito das disposições da regulamentação aduaneira, seja da União ou vinculativa para esta, e, por outro, o interesse do importador de boa‑fé em não suportar os prejuízos que ultrapassem o risco comercial normal (acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 93).

45

Esta ponderação encontra‑se subjacente à economia do artigo 239.o do CAC, que constitui uma cláusula geral de equidade. Por consequência, quando examina um pedido de reembolso ou de dispensa dos direitos de importação, a Comissão não pode validamente contentar‑se em avaliar o comportamento e as atuações do importador e do exportador. Deve ainda ter em conta, designadamente, a incidência do seu próprio comportamento na situação concreta do caso, no âmbito do seu dever de vigilância e de controlo (acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 94).

46

Sendo as condições do artigo 239.o do CAC cumulativas, cabe examinar, antes de mais, a primeira condição, relativa à existência de uma situação especial, e, em seguida, caso se revele necessário, a segunda, relativa à inexistência de artifício ou de negligência manifesta.

Quanto à condição relativa à existência de uma situação especial

47

A recorrente dividiu a primeira parte do fundamento único, respeitante a uma violação da condição relativa à existência de uma situação especial, em várias críticas. No entanto, o Tribunal Geral considera conveniente que essas críticas sejam tratadas conjuntamente.

48

A título de observação preliminar, importa recordar que já foi decidido que, para avaliar a existência de omissões por parte das autoridades de países terceiros e da Comissão, as quais seriam suscetíveis de constituir situações especiais na aceção do artigo 239.o do CAC, há que examinar, em cada caso concreto, a natureza real das obrigações atribuídas a essas autoridades e à Comissão, respetivamente, pela regulamentação aplicável (v., neste sentido, acórdão de 11 de julho de 2002, Hyper/Comissão, T‑205/99, EU:T:2002:189, n.o 117).

49

A este respeito, importa assinalar que a argumentação da recorrente para apoiar a primeira parte do fundamento único se baseia essencialmente na tese segundo a qual as autoridades aduaneiras letãs teriam efetivamente emitido os certificados controvertidos. Os vários incumprimentos que a recorrente censura às autoridades aduaneiras letãs constituiriam indícios da procedência da sua tese. Deste modo, a recorrente alega que a situação especial em que se encontra resulta do conjunto de circunstâncias do caso em apreço, nomeadamente as relativas às falhas que imputa às autoridades aduaneiras letãs.

50

A recorrente censura igualmente à Administração Aduaneira alemã um incumprimento das suas obrigações decorrentes dos protocolos adicionais ao acordo de associação e do Regulamento (CE) n.o 515/97 do Conselho, de 13 de março de 1997, relativo à assistência mútua entre as autoridades administrativas dos Estados‑Membros e à colaboração entre estas e a Comissão, tendo em vista assegurar a correta aplicação das regulamentações aduaneira e agrícola (JO 1997, L 82, p. 1). Tendo em conta, mais especificamente, o conteúdo das cartas de 7 de abril e de 7 de maio de 2003 e os relatórios do serviço responsável pela inspeção aduaneira alemã, censura às autoridades aduaneiras alemãs terem qualificado, de ânimo leve, os certificados controvertidos de «falsos». Considera que as autoridades aduaneiras alemãs se abstiveram de esclarecer os factos, quer diretamente junto da Administração Aduaneira letã quer por intermédio do OLAF.

51

Tendo em conta estas circunstâncias, a recorrente alega que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação, dado que concluiu que, no caso em apreço, não existia uma situação especial. A recorrente sustenta também, no essencial, que a Comissão não cumpriu a sua obrigação de vigilância, nos termos do acordo de associação, e que, por força de determinadas disposições desse acordo, deveria ter atuado a fim de esclarecer os factos do presente caso.

52

Os indícios e os argumentos invocados pela recorrente são, em especial, os seguintes.

53

Em primeiro lugar, a recorrente sustenta que os cunhos dos carimbos que figuram nos certificados controvertidos apresentam uma «conformidade evidente» com os cunhos dos carimbos utilizados pelas autoridades aduaneiras letãs. Por outro lado, as peritagens efetuadas aos certificados de circulação de mercadorias apresentados em relação às importações para a Dinamarca demonstravam que, no mínimo, era provável que os cunhos dos carimbos e as assinaturas que figuravam nos mesmos fossem autênticos.

54

Em segundo lugar, a recorrente sustenta, em substância, que as respostas remetidas, no quadro do controlo a posteriori, pelas autoridades aduaneiras letãs eram irregulares e ambíguas. A este respeito, a recorrente afirma que o facto de as autoridades aduaneiras letãs terem indicado que os certificados controvertidos eram «não válidos» demonstra que as referidas autoridades participaram na emissão desses certificados. Para a recorrente, não é coerente que as autoridades aduaneiras letãs se tenham pronunciado sobre a validade dos certificados controvertidos ao mesmo tempo que afirmavam que, nos seus registos, os referidos certificados não existiam. Por outro lado, mesmo que os certificados controvertidos não constassem dos registos das autoridades aduaneiras letãs, isso não demonstrava que os mesmos eram falsos. Com efeito, segundo a recorrente, as autoridades aduaneiras letãs não eram obrigadas a manter registos. Além disso, de acordo com a mesma, nas respostas fornecidas pelas autoridades aduaneiras letãs, esses registos não foram especificados.

55

Em terceiro lugar, o facto de as respostas dadas pelas autoridades aduaneiras letãs terem sido assinadas pelo diretor‑adjunto das autoridades aduaneiras letãs, R., que viria a ser posteriormente condenado penalmente por algumas atuações no desempenho das suas funções, punha em causa a força probatória destas respostas. A este respeito, a recorrente faz referência a alguns artigos de imprensa, segundo os quais R. e outra pessoa altamente colocada dentro das autoridades aduaneiras letãs foram condenados penalmente por atuações ilegais no âmbito das suas funções.

56

A recorrente sublinha igualmente que, durante o período de referência, no seio da Administração Aduaneira letã reinava um clima de corrupção. Invoca, a esse respeito, vários relatórios da Comissão que referiam o estado de corrupção na Letónia (a seguir «relatórios da Comissão»).

57

Em quarto lugar, a recorrente alega que já não é possível esclarecer os factos. Afirma que as autoridades aduaneiras letãs não responderam aos pedidos formulados pelo OLAF de que lhe fossem fornecidos alguns documentos, ou fizeram‑no intempestivamente, o que resultava da respetiva troca de correspondência. Segundo a recorrente, as autoridades aduaneiras letãs destruíram deliberadamente os cunhos dos carimbos para eliminar provas que as implicavam na emissão dos certificados controvertidos.

58

Além disso, segundo a recorrente, o facto de as autoridades aduaneiras letãs ou o Ministério Público letão não terem realizado uma investigação demonstra que as autoridades aduaneiras letãs estavam implicadas na emissão dos certificados controvertidos.

59

A Comissão contesta os argumentos da recorrente. Considera, em síntese, que os indícios invocados pela recorrente não demonstram que as autoridades aduaneiras letãs tenham participado na emissão dos certificados controvertidos. Por outro lado, considera que cumpriu as suas obrigações de vigilância e de controlo da aplicação correta do acordo de associação. Alega que, ao contrário do que a recorrente afirma, o acordo de associação não lhe permitia desenvolver, junto da Administração Aduaneira letã, ações que implicassem uma vigilância por funcionários aduaneiros fiáveis ou a implementação de um sistema centralizado de emissão de certificados de origem e a organização de visitas especiais com vista a assegurar uma boa aplicação do acordo de associação.

60

A Comissão não contesta que existia uma «conformidade» entre os cunhos dos carimbos que figuravam nos certificados controvertidos e os utilizados pelas autoridades aduaneiras letãs. Contudo, a Comissão sublinha que as peritagens realizadas aos cunhos dos carimbos, bem como às assinaturas que figuravam nos certificados apresentados em relação às importações para a Dinamarca, não foram efetuadas aos certificados controvertidos e não deram origem a conclusões definitivas, mas indicaram apenas que provavelmente se tratava de cunhos de carimbos e de assinaturas autênticas. As semelhanças entre os cunhos dos carimbos e os resultados das peritagens não permitiriam tirar uma conclusão definitiva quanto à autenticidade ou ao caráter falso dos certificados controvertidos.

61

No que diz respeito às respostas dadas pelas autoridades aduaneiras letãs no quadro do controlo a posteriori, a Comissão considera que as mesmas eram claras e sem ambiguidades.

62

Quanto à condenação penal do diretor‑adjunto das autoridades aduaneiras letãs, R., a Comissão sublinha que não tem qualquer ligação com a emissão dos certificados controvertidos. Essa circunstância não permitiria concluir, pois, que as autoridades aduaneiras letãs tivessem emitido ou participado na emissão dos certificados controvertidos. Além disso, a Comissão salienta que as respostas remetidas pelas autoridades aduaneiras letãs numa data posterior e assinadas por outro funcionário aduaneiro (v. n.o 16 supra) confirmaram as cartas de R.

63

No que diz respeito aos relatórios da Comissão que faziam referência a um clima de corrupção no seio das autoridades aduaneiras letãs, a Comissão considera que essa situação não permite presumir que os certificados controvertidos tenham sido emitidos pelas autoridades aduaneiras letãs. Além disso, a corrupção a que esses relatórios aludiam não teria qualquer ligação com o tratamento pautal preferencial.

64

Por último, a Comissão sustenta que, ao contrário do que a recorrente afirma, as autoridades aduaneiras letãs deram prova de uma boa colaboração com o OLAF e com as autoridades aduaneiras alemãs. Com efeito, no âmbito do controlo a posteriori e da investigação do OLAF na Letónia, as mesmas teriam respondido aos pedidos das autoridades aduaneiras alemãs e aos da Comissão. As cartas invocadas pela recorrente punham em evidência que as autoridades aduaneiras letãs responderam num prazo razoável às questões colocadas. A Comissão alega que, embora as autoridades aduaneiras letãs tenham explicado que se encontravam impossibilitadas de enviar cunhos de carimbos autênticos, nada indica que isso se devesse a uma vontade da sua parte de encobrir um comportamento ilegal.

65

À luz destas considerações, a Comissão sustenta, em síntese, que as autoridades aduaneiras letãs respeitaram o acordo de associação e que enviaram respostas satisfatórias e dentro dos prazos ao OLAF e às autoridades aduaneiras alemãs. Portanto, a Comissão não teria tido qualquer motivo para efetuar investigações mais aprofundadas no que diz respeito aos certificados controvertidos. Sustenta igualmente que cumpriu a sua obrigação de vigilância quanto à boa aplicação do acordo de associação e recorda que as regras relativas à origem de produtos assentam numa confiança mútua entre as autoridades dos Estados‑Membros de importação e as do Estado de exportação.

66

Da mesma forma, a Comissão sustenta que as autoridades aduaneiras alemãs também não deixaram de cumprir as suas obrigações. Com efeito, as mesmas estavam vinculadas pelas respostas fornecidas pelas autoridades aduaneiras letãs no âmbito do controlo a posteriori. Resultava igualmente de uma carta enviada pelas autoridades aduaneiras alemãs em resposta a um pedido da recorrente que as mesmas tinham esclarecido os factos.

67

Deve recordar‑se que a Comissão, enquanto guardiã do Tratado e dos acordos celebrados ao abrigo deste, está obrigada a assegurar‑se da correta aplicação por um país terceiro das obrigações que contraiu por força de um acordo concluído com a União, através dos meios previstos pelo acordo ou pelas decisões adotadas nos termos deste (v., neste sentido, acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 95).

68

Esta obrigação resulta também do acordo de associação e dos protocolos anexos. O artigo 110.o do acordo de associação dispõe que o Conselho de Associação, constituído por membros da Comissão, pelo Conselho da União Europeia e por membros nomeados pelo Governo da Letónia, supervisionará a aplicação desse acordo. Resulta do artigo 113.o do acordo de associação que qualquer das duas partes pode submeter à apreciação do Conselho de Associação qualquer litígio relativo à aplicação ou interpretação do referido acordo. Por outro lado, do artigo 14.o do Protocolo n.o 5 do acordo de associação, relativo à assistência mútua entre autoridades administrativas em matéria aduaneira, intitulado «Aplicação», decorre o seguinte:

«A gestão do presente protocolo será confiada às autoridades aduaneiras centrais da Letónia, por um lado, e aos serviços competentes da Comissão […] e, se for caso disso, às autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros, por outro. Essas autoridades decidirão de todas as medidas e disposições necessárias para a respetiva aplicação, tomando devidamente em consideração a regulamentação em matéria de proteção de informações, podendo recomendar ao Conselho de Associação alterações que considerem devam ser introduzidas no presente protocolo.»

69

Importa igualmente referir que, no âmbito da sua obrigação de vigilância e de controlo da aplicação correta do acordo de associação, a Comissão dispõe de determinados poderes.

70

Assim, a Comissão pode pedir às autoridades aduaneiras letãs, em conformidade com o disposto no artigo 3.o, n.o 1, do Protocolo n.o 5 do acordo de associação, todos os esclarecimentos úteis para permitir assegurar a correta aplicação da legislação aduaneira (v., por analogia, acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 100).

71

A Comissão pode igualmente, nos termos do artigo 3.o, n.o 3, alínea a), do Protocolo n.o 5 do acordo de associação, pedir às autoridades aduaneiras letãs que tomem as medidas necessárias para exercer uma vigilância sobre as pessoas singulares ou coletivas relativamente às quais existam motivos razoáveis para supor que estejam a infringir ou tenham infringido a legislação aduaneira (v., por analogia, acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 101).

72

Além disso, de acordo com o artigo 7.o, n.os 3 e 4, do Protocolo n.o 5 do acordo de associação, os funcionários da Comissão devidamente autorizados podem recolher informações, nas estâncias respetivas das autoridades aduaneiras letãs, relativas às operações contrárias à legislação aduaneira ou estar presentes aquando da realização das investigações efetuadas no território letão, com o acordo dessas autoridades e nas condições previstas pelas mesmas (v., por analogia, acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 102).

73

Aliás, o mesmo resulta do artigo 31.o, n.o 2, do Protocolo n.o 3 do acordo de associação, conforme alterado pela Decisão n.o 4/98 do Conselho de Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a República da Letónia, por outro, de 2 de dezembro de 1998, que adota alterações ao Protocolo n.o 3 do acordo de associação, previstas na Decisão n.o 1/97 do Comité Misto, em virtude do Acordo sobre Comércio Livre e Matérias Conexas entre a Comunidade Europeia, a Comunidade Europeia da Energia Atómica e a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, por um lado, e a República da Letónia, por outro (JO 1999, L 6, p. 10, a seguir «Decisão n.o 4/98»), nos termos do qual, «[a] União e a Letónia prestar‑se‑ão reciprocamente assistência para assegurar a correta aplicação do presente protocolo, por intermédio das administrações aduaneiras competentes, no controlo da autenticidade dos certificados de circulação EUR.1 ou das declarações na fatura e da exatidão das menções inscritas nesses documentos» (v., por analogia, acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 103).

74

Daí decorre que compete à Comissão exercer plenamente os poderes de que dispõe em virtude das disposições do acordo de associação e das decisões e dos protocolos adotados para a sua aplicação, a fim de cumprir as suas obrigações de vigilância e de controlo da aplicação correta do referido acordo (v., por analogia, acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 104).

75

Este exercício impõe‑se por maioria de razão no caso em apreço, perante indícios de uma possível implicação das autoridades aduaneiras letãs na emissão dos certificados controvertidos, a saber:

o controlo a posteriori dos certificados controvertidos foi realizado na sequência do inquérito do OLAF relativo às importações de tecido de linho na Dinamarca;

o relatório do OLAF dá conta de um trânsito muito breve de tecido de linho num entreposto aduaneiro letão, para dissimular a origem das mercadorias em causa;

as peritagens efetuadas aos cunhos dos carimbos e às assinaturas que figuram nos certificados utilizados para as importações na Dinamarca, posteriormente ao relatório do OLAF, demonstram que se tratava provavelmente de cunhos de carimbos e de assinaturas autênticos;

os cunhos dos carimbos que figuram nos certificados controvertidos apresentam uma grande semelhança com os cunhos dos carimbos autênticos das autoridades aduaneiras letãs;

o diretor‑adjunto das autoridades aduaneiras letãs, R., signatário dos certificados controvertidos e das cartas enviadas no âmbito do controlo a posteriori, foi condenado por atuações ilegais no âmbito das suas funções;

as autoridades aduaneiras letãs foram incapazes de fornecer os cunhos dos carimbos originais utilizados pelas estâncias aduaneiras em causa, a saber, as estâncias aduaneiras de Jelgava e de Bauska;

os relatórios da Comissão referem um clima de corrupção, em especial, no seio das autoridades aduaneiras letãs;

as importações de tecidos de linho provenientes da Letónia aumentaram e ultrapassaram as capacidades de produção desse país.

76

Com efeito, à luz destes indícios, as respostas das autoridades aduaneiras letãs revelam‑se insuficientes para determinar se os certificados controvertidos tinham caráter autêntico ou falso. Seguramente, é verdade que, como a Comissão faz notar, os indícios fornecidos pela recorrente não permitem concluir que as autoridades aduaneiras letãs tenham participado na emissão dos certificados controvertidos. Ora, à luz do conjunto de indícios referidos no n.o 75 supra, deve considerar‑se que a Comissão deveria ter exercido os seus poderes para efeitos da correta aplicação do acordo de associação e procedido a uma verificação mais aprofundada do que aquela que foi realizada neste caso.

77

Por conseguinte, incumbia à Comissão pedir algumas explicações quanto às investigações que tinham sido realizadas pelas autoridades aduaneiras letãs com vista a esclarecer os factos do caso.

78

Em primeiro lugar, a Comissão deveria ter perguntado a que documentos correspondiam os números que figuravam nos certificados controvertidos, se as assinaturas constantes dos certificados controvertidos correspondiam às pessoas que trabalhavam para as autoridades aduaneiras letãs e, em caso afirmativo, se essas pessoas tinham efetivamente assinado os certificados controvertidos.

79

Em segundo lugar, resulta das trocas de correspondência entre o OLAF e as autoridades aduaneiras letãs que estas não estavam em condições de fornecer cunhos de carimbos autênticos relativos aos certificados controvertidos, pelo facto de os terem destruído.

80

No entanto, ainda que as autoridades aduaneiras letãs não tivessem obrigação de os conservar, é relevante fazer notar que é a comunicação dos espécimes dos cunhos dos carimbos e das assinaturas utilizados nas estâncias aduaneiras em causa que permite efetuar uma vigilância efetiva quanto ao respeito das normas aduaneiras relativas às preferências pautais (v., neste sentido, acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 117).

81

A obrigação que incumbe à Comissão de garantir que o acordo de associação seja corretamente aplicado exige que a Comissão, e através dela as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros, disponha sempre de todos os elementos que lhe permitam proceder a um controlo eficaz, constituindo indiscutivelmente esses elementos os espécimes dos cunhos dos carimbos e das assinaturas (v., neste sentido, acórdão de 25 de julho de 2008, C.A.S./Comissão, C‑204/07 P, EU:C:2008:446, n.o 118).

82

Ora, no presente caso, a Comissão não recebeu os cunhos dos carimbos solicitados no quadro do controlo a posteriori e não solicitou nem examinou as assinaturas que constam dos certificados controvertidos.

83

Em terceiro lugar, cabe salientar que não resulta dos autos que as autoridades aduaneiras letãs tenham procedido, ou não, a fiscalizações junto dos exportadores. A este respeito, deve recordar‑se que resulta do artigo 32.o, n.o 3, do Protocolo n.o 3 do acordo de associação, conforme alterado pela Decisão n.o 4/98, que as autoridades aduaneiras do país de exportação «podem exigir a apresentação de quaisquer documentos comprovativos e fiscalizar a contabilidade do exportador ou efetuar qualquer outro controlo que considerem adequado». Por conseguinte, a Comissão, sobretudo num caso em que não era possível proceder a um exame dos cunhos dos carimbos e das assinaturas, deveria ter perguntado às autoridades aduaneiras letãs se esses controlos tinham sido efetuados e, se não, por que razão.

84

É certo que, com efeito, o artigo 32.o, n.o 3, do Protocolo n.o 3, relativo à definição do conceito de «produtos originários» e aos métodos de cooperação administrativa, do acordo de associação não impõe, de forma pormenorizada, o modo como o Estado de exportação deve efetuar um controlo a posteriori dos certificados de circulação. Todavia, essa disposição implica que, tendo em conta as consequências económicas para o importador e as circunstâncias do caso, a Comissão deveria ter assegurado que esse controlo fosse efetuado de forma fiável e conscienciosa, tanto mais que, no ponto 4 do relatório do OLAF, intitulado «Conclusões», é afirmado o seguinte:

«Este processo revelou, uma vez mais, que, no âmbito de casos de fraudes complexas, é mais útil e mais eficaz não confiar exclusivamente nos procedimentos administrativos aplicáveis (como, neste caso, o procedimento de controlo a posteriori), mas tentar clarificar todos os aspetos do caso in loco e em estreita colaboração com as autoridades competentes do país terceiro em causa. Dessa forma de atuar resulta que, nomeadamente, os vários países aprendam o modo adequado de proceder no quadro desses inquéritos e conheçam as informações e os documentos necessários para o esclarecimento e repressão das infrações na Comunidade, com vista a estarem mais aptos para avaliar as necessidades dos Estados‑Membros em caso de acontecimentos similares e, consequentemente, a poderem conduzir os seus próprios inquéritos.»

85

Decorre de todas as considerações precedentes que a Comissão não cumpriu as suas obrigações de vigilância e de controlo da aplicação correta do acordo de associação. Com efeito, se a Comissão tivesse exercido plenamente os poderes de que dispunha no âmbito do acordo de associação com vista à aplicação correta do referido acordo, o caráter autêntico ou falso dos certificados controvertidos poderia ter sido determinado com mais certeza.

86

É certo que o Tribunal de Justiça já decidiu que o sistema de cooperação administrativa estabelecido por um protocolo que enuncia, no anexo a um acordo concluído entre a União e um Estado terceiro, as regras relativas à origem dos produtos assenta na confiança mútua entre as autoridades dos Estados‑Membros de importação e as do Estado de exportação (v. acórdão de 15 de dezembro de 2011, Afasia Knits Deutschland, C‑409/10, EU:C:2011:843, n.o 28 e jurisprudência aí referida).

87

No entanto, tendo em conta as circunstâncias do presente caso (v. n.o 75 supra), a Comissão deveria ter exercido os seus poderes com vista à aplicação correta do acordo de associação, não obstante as respostas dadas pelas autoridades aduaneiras letãs no quadro do controlo a posteriori. Com efeito, a Comissão dispunha de informações que suscitavam algumas questões importantes quanto à origem dos certificados controvertidos.

88

Na falta de respostas a essas questões, a Comissão não se podia validamente pronunciar sobre a situação do caso em apreço. Assim, as respostas fornecidas pelas autoridades aduaneiras letãs no âmbito do controlo a posteriori eram apenas afirmações sucintas que não permitiam que a Comissão tirasse conclusões quanto à implicação, ou não, de funcionários das autoridades aduaneiras letãs na emissão dos certificados controvertidos. Isto é igualmente válido quanto à confirmação da resposta enviada pelas autoridades aduaneiras letãs à recorrente (v. n.o 16 supra), a qual, como resulta dos autos, não teve origem num verdadeiro reexame do processo aberto pelas autoridades aduaneiras letãs relativamente aos certificados controvertidos. Com efeito, resulta dessa resposta que o referido processo já tinha sido enviado ao OLAF.

89

A este respeito, importa recordar que a Comissão poderia ter, nomeadamente, realizado peritagens aos cunhos dos carimbos e às assinaturas que figuram nos certificados controvertidos e, sendo esse o caso, pedido explicações quanto ao modo como o controlo a posteriori tinha sido efetuado, com vista a determinar se dispunha de informação suficiente para se pronunciar sobre a situação do caso em apreço ou se deveria aprofundar as suas investigações.

90

Foi, pois, erradamente que a Comissão concluiu, no ponto 37 da decisão impugnada, que dispunha de informação suficiente que lhe permitia avaliar a situação.

91

Foi também erradamente que a Comissão declarou, no ponto 38 da decisão impugnada, que «[tinha respeitado] todas as obrigações gerais de vigilância que lhe incumbiam por força do acordo de associação ao ter realizado controlos anuais, cujos resultados [tinham sido] publicados nos relatórios [da Comissão]». Com efeito, neste caso, incumbia‑lhe adotar medidas concretas.

92

A este respeito, cabe rejeitar os argumentos da Comissão segundo os quais a investigação relativa aos certificados controvertidos era da responsabilidade das autoridades aduaneiras alemãs e que estas não tinham recorrido ao OLAF. Com efeito, resulta dos autos que a Comissão estava informada da investigação realizada pelas autoridades aduaneiras alemãs e que, portanto, lhes poderia ter solicitado que fizessem investigações adicionais ou ter conduzido, ela própria, essas investigações a fim de se assegurar de que dispunha de um processo que continha informação suficiente para avaliar a situação especial da recorrente na aceção do artigo 239.o do CAC.

93

Em todo o caso, o facto de as autoridades aduaneiras nacionais que conduziram as investigações não terem adotado algumas diligências de instrução não implica que a Comissão tenha podido concluir, sem essas diligências, que a recorrente não se encontrava numa situação especial na aceção do artigo 239.o do CAC.

94

Resulta do exposto que a primeira parte do fundamento único, respeitante a uma violação da condição relativa à existência de uma situação especial, deve ser acolhida.

95

Tendo em conta a natureza cumulativa das condições constantes do artigo 239.o do CAC, cabe examinar agora a segunda condição, relativa à inexistência de artifício e de negligência manifesta por parte da recorrente.

Quanto à condição relativa à inexistência de artifício ou de negligência manifesta por parte do importador

96

A recorrente sustenta que celebrou os contratos com os exportadores letões de acordo com as práticas comerciais correntes e que procedeu às importações controvertidas em conformidade. Sublinha que o ónus da prova da negligência manifesta recai sobre a Comissão.

97

A recorrente alega também que não possuía qualquer experiência de importações provenientes de países que beneficiam de um regime preferencial. Contudo, faz notar que nunca afirmou que as disposições do acordo de associação, incluindo protocolos e anexos, fossem complexas e incompreensíveis para si. Observa que não dispunha de qualquer direito de controlo sobre o modo como as autoridades aduaneiras letãs competentes aplicavam, em concreto, o acordo de associação na sua prática quotidiana. Ignorava, além disso, se, e em que medida, a Comissão controlava, em conformidade com as suas obrigações, a correta aplicação do acordo de associação na Letónia. A recorrente afirma que os graves incumprimentos e omissões das autoridades competentes que mais tarde foram declarados escapavam ao seu conhecimento e à sua influência e que o aviso de liquidação de direitos aduaneiros a tinha surpreendido.

98

A recorrente considera que demonstrou a diligência exigida. Sustenta que não tinha a menor dúvida quanto à regularidade das exportações da Letónia realizadas ao abrigo do regime preferencial e que por esta razão as investigações criminais abertas contra os seus dois gestores por falsificação de documentos e fraude fiscal se revelaram injustificadas. A recorrente alega, em especial, na réplica, que a menção «origem Rússia» («origin Russia») constante de uma carta relativa ao tecido de linho importado ao abrigo dos certificados controvertidos não demonstra que tenha havido qualquer negligência manifesta por sua parte. Com efeito, a Comissão teria feito essa menção fora de contexto. As notas de entrega das mercadorias em causa não deixavam qualquer dúvida quanto à sua origem letã. No que diz respeito à menção «origem Rússia» que constava dessa carta, tratava‑se de um erro cometido por um empregado da recorrente. Além disso, segundo a recorrente, essa menção era um modo habitual de designar, no comércio, uma qualidade específica de tecidos de linho.

99

A Comissão alega que a recorrente estava ao corrente do facto de o tecido de linho que importava ser de origem russa e não de origem letã. Isto resultava do despacho de 30 de abril de 2009 do Landgericht München (Tribunal Regional de Munique), proferido no processo penal contra o diretor executivo da recorrente. Podia, deste modo, ser imputada à recorrente uma negligência manifesta. A Comissão não se poderia pronunciar sobre a veracidade da explicação dada pela recorrente para a menção «origem Rússia». A Comissão considera que, em qualquer hipótese, a recorrente não demonstrou a diligência exigida, dado que existiam indícios que lhe permitiam suspeitar que as mercadorias em causa não eram de origem letã e que, apesar disso, a mesma não tinha verificado a origem das mercadorias, tendo, pelo contrário, continuado a importá‑las reclamando para as mesmas a franquia aduaneira ao abrigo do regime preferencial.

100

Importa recordar que, como o Tribunal Geral declarou, quando as autoridades aduaneiras concluíram que não se podia demonstrar que o operador económico tinha feito prova de artifício ou de negligência manifesta, incumbe à Comissão, quando esta decide distanciar‑se da tomada de posição das autoridades nacionais, provar, com base em elementos factuais pertinentes, a existência de um comportamento manifestamente negligente do referido operador (v. acórdão de 19 de março de 2013, Firma Van Parys/Comissão, T‑324/10, EU:T:2013:136, n.o 86 e jurisprudência aí referida). No presente caso, as autoridades aduaneiras alemãs indeferiram o pedido de dispensa do pagamento dos direitos de importação formulado pela recorrente, unicamente com base na condição relativa à situação especial. Em seguida, esta decisão de indeferimento foi objeto de recurso para o Finanzgericht München (Tribunal Tributário de Munique), o qual concluiu que a recorrente não tinha violado o seu dever de diligência (v. n.o 20 supra). Consequentemente, por aplicação da jurisprudência acima referida, o ónus da prova recai sobre a Comissão.

101

Para efeitos do exame das condições previstas no artigo 239.o do CAC, em conjugação com o artigo 905.o, n.o 3, do regulamento de aplicação, e conforme recordado no n.o 40 supra, a Comissão deve analisar todos os elementos relevantes, incluindo os relativos ao comportamento do operador em causa, em especial, a sua experiência profissional, a sua boa‑fé e a diligência que o mesmo demonstrou.

102

A este respeito, cabe recordar a jurisprudência constante segundo a qual, para apreciar se há negligência manifesta, na aceção do artigo 239.o do CAC, há que ter em conta, nomeadamente, a complexidade das disposições cuja inexecução deu origem à dívida aduaneira, bem como a experiência profissional e a diligência do operador em causa (v. acórdão de 27 de setembro de 2005, Common Market Fertilizers/Comissão, T‑134/03 e T‑135/03, EU:T:2005:339, n.o 135 e jurisprudência aí referida).

103

À luz destes princípios, devem ser examinados os elementos tomados em consideração pela Comissão na sua análise relativa à segunda condição constante do artigo 239.o do CAC.

104

Resulta da decisão impugnada que, segundo a Comissão, a recorrente tinha violado o seu dever de diligência pelo facto de ter importado as mercadorias em causa, quando alegadamente sabia que as mesmas eram de origem diferente da letã. Na decisão impugnada, também é feita referência a uma reunião do grupo de peritos, que teve lugar em 8 de maio de 2014 no âmbito do Comité do CAC, secção «Dívida aduaneira e garantias», de acordo com o artigo 907.o do regulamento de aplicação, durante a qual tinha sido discutido o caso da recorrente (a seguir «reunião do grupo de peritos»). Segundo a decisão impugnada, a Letónia teria declarado que não tinha emitido os certificados controvertidos e que existiam elementos «sólidos» que demonstravam que as mercadorias em causa não eram de origem letã. A esse respeito, no decurso da reunião do grupo de peritos, as autoridades aduaneiras letãs teriam afirmado que o transporte de tecido de linho tinha sido realizado em várias etapas unicamente para encobrir a origem real das mercadorias e para utilizar documentos de transporte emitidos na Letónia com vista a certificar, de forma enganosa, que as mercadorias eram de origem letã.

105

À luz do exposto, há que concluir que a Comissão não procedeu a qualquer análise do comportamento da recorrente. Com efeito, a demonstração de que a recorrente alegadamente sabia que as mercadorias que importava não eram de origem letã não resulta da decisão impugnada. Esta questão é, aliás, a principal questão colocada no presente processo, na medida em que a recorrente afirma que não sabia que as mercadorias em causa eram de origem diferente da letã. O facto de esta ter pretendido beneficiar do regime preferencial não demonstra que tenha agido com negligência manifesta.

106

Do mesmo modo, a declaração feita pelas autoridades aduaneiras letãs na reunião do grupo de peritos também não demonstra que a recorrente tenha agido com negligência manifesta. Com efeito, deve salientar‑se que a referida reunião teve lugar em 8 de maio de 2014, ou seja, mais de doze anos decorridos sobre o termo do período de referência, o que permite duvidar que as condições de importação durante o período de referência, e, em especial, as relativas às importações da recorrente, tenham sido examinadas em concreto no presente processo.

107

Além disso, o facto de as mercadorias em causa terem transitado por vários entrepostos aduaneiros na Letónia, como as autoridades aduaneiras letãs teriam afirmado na reunião do grupo de peritos, não é um facto relevante, na medida em que só foi referido no relatório do OLAF, ou seja, depois do período de referência. Por outro lado, esse facto, mesmo que se admita demonstrado, apenas prova a existência de irregularidades que tanto podem ser imputadas às autoridades aduaneiras letãs como à recorrente ou a outros operadores envolvidos.

108

Além disso, a Comissão não forneceu qualquer elemento que permita corroborar ou verificar a declaração feita pelas autoridades aduaneiras letãs na reunião do grupo de peritos. Deve salientar‑se, aliás, que, na carta de 14 de março de 2014, na qual a Comissão informava a recorrente da sua intenção de adotar uma decisão que lhe era desfavorável, figura uma declaração idêntica (v. n.o 22 supra). No entanto, nessa carta, a Comissão refere como fonte, não as autoridades aduaneiras letãs, mas o despacho de 30 de abril de 2009 do Finanzgericht München (Tribunal Tributário de Munique), que, por sua vez, remete para o relatório do OLAF.

109

Portanto, a Comissão, na decisão impugnada, não demonstrou que o comportamento da recorrente tenha constituído uma falta de diligência por sua parte.

110

Quanto ao argumento alegado pela Comissão na sua defesa, segundo o qual a recorrente teria sido manifestamente negligente pelo facto de um dos seus empregados ter mencionado «origem Rússia» numa carta, há que declarar que esta observação constitui uma tentativa de fundamentação intempestiva da decisão impugnada e, por conseguinte, inadmissível perante o Tribunal Geral. Com efeito, segundo jurisprudência constante, a fundamentação deve, em princípio, ser comunicada ao interessado ao mesmo tempo que o ato que lhe é lesivo, não podendo a sua falta ser sanada pelo facto de o interessado tomar conhecimento dos fundamentos do ato no decurso do processo perante o juiz da União (acórdãos de 26 de novembro de 1981, Michel/Parlamento, 195/80, EU:C:1981:284, n.o 22; de 28 de junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, EU:C:2005:408, n.o 463; e de 12 de dezembro de 2006, Organisation des Modjahedines du peuple d’Iran/Conselho, T‑228/02, EU:T:2006:384, n.o 139).

111

Em todo o caso, esse facto, por si só, não permite demonstrar a existência de negligência manifesta por parte da recorrente.

112

Não tendo a Comissão produzido prova da falta de diligência da recorrente e, por conseguinte, da sua negligência manifesta, como a jurisprudência referida nos n.os 100 e 102 supra exige, a segunda parte do fundamento único, respeitante a uma violação da condição relativa à falta de negligência manifesta por parte do importador, também deve, pois, ser acolhida.

113

Resulta das considerações precedentes que deve ser dado provimento ao recurso interposto pela recorrente e, por consequência, anulada a decisão impugnada.

Quanto às despesas

114

Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

115

Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com o pedido da recorrente.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

decide:

 

1)

A Decisão C(2014) 4908 final da Comissão, de 16 de julho de 2014, que indeferiu o pedido da Combaro SA de dispensa de direitos à importação no montante de 461415,12 euros, é anulada.

 

2)

A Comissão Europeia suporta as suas próprias despesas e as realizadas pela Combaro.

 

Prek

Schalin

Costeira

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 19 de julho de 2017.

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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