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Document 62014CJ0465

Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 27 de outubro de 2016.
Raad van bestuur van de Sociale verzekeringsbank contra F. Wieland e H. Rothwangl.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Centrale Raad van Beroep.
Reenvio prejudicial — Artigos 18.° e 45.° TFUE — Segurança social dos trabalhadores migrantes — Regulamento (CEE) n.° 1408/71 — Artigos 3.° e 94.° — Regulamento (CE) n.° 859/2003 — Artigos 2.°, n.os 1 e 2 — Seguro de velhice e seguro por morte — Antigos marítimos nacionais de um Estado terceiro que se tornou membro da União Europeia em 1995 — Exclusão do direito às prestações de velhice.
Processo C-465/14.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:820

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

27 de outubro de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Artigos 18.° e 45.° TFUE — Segurança social dos trabalhadores migrantes — Regulamento (CEE) n.o 1408/71 — Artigos 3.° e 94.° — Regulamento (CE) n.o 859/2003 — Artigos 2.°, n.os 1 e 2 — Seguro de velhice e seguro por morte — Antigos marítimos nacionais de um Estado terceiro que se tornou membro da União Europeia em 1995 — Exclusão do direito às prestações de velhice»

No processo C‑465/14,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Centrale Raad van Beroep (Tribunal Superior da Segurança Social, Países Baixos), por decisão de 6 de outubro de 2014, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 9 de outubro de 2014, no processo

Raad van bestuur van de Sociale verzekeringsbank

contra

F. Wieland,

H. Rothwangl,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: A. Tizzano, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de presidente da Primeira Secção, M. Berger (relatora), A. Borg Barthet, S. Rodin e F. Biltgen, juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 16 de setembro de 2015,

vistas as observações apresentadas:

em representação do Raad van bestuur van de Sociale verzekeringsbank, por H. van der Most e T. Theele, na qualidade de agentes,

em representação do Governo espanhol, por M. García‑Valdecasas Dorrego, na qualidade de agente,

em representação do Governo neerlandês, por M. Noort, M. Bulterman e H. Stergiou, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por D. Martin e G. Wils, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 4 de fevereiro de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 18.o e do artigo 45.o, n.o 2, TFUE, dos artigos 3.° e 94.° do Regulamento (CEE) n.o 1408/71 do Conselho, de 14 de junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na sua versão alterada e atualizada pelo Regulamento (CE) n.o 118/97 do Conselho, de 2 de dezembro de 1996 (JO 1997, L 28, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 647/2005 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de abril de 2005 (JO 2005, L 117, p. 1) (a seguir «Regulamento n.o 1408/71»), bem como do artigo 2.o, n.os 1 e 2, do Regulamento (CE) n.o 859/2003 do Conselho, de 14 de maio de 2003, que torna extensivas as disposições do Regulamento n.o 1408/71 e (CEE) n.o 574/72 aos nacionais de Estados terceiros que ainda não estão abrangidos por estas disposições por razões exclusivas de nacionalidade (JO 2003, L 124, p. 1).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de dois litígios distintos que opõem o Raad van bestuur van de Sociale verzekeringsbank (conselho de administração do Banco dos Seguros Sociais, a seguir «SVB») a F. Wieland e H. Rothwangl, a propósito da recusa do SVB de conceder a estes últimos uma pensão de velhice.

Quadro jurídico

Direito da União

Regulamento n.o 1408/71

3

O primeiro considerando do Regulamento n.o 1408/71 enuncia:

«[...] as normas de coordenação das legislações nacionais sobre segurança social se inscrevem no âmbito da livre circulação das pessoas e que devem, por isso, contribuir para a melhoria do nível de vida e das condições de emprego».

4

O artigo 1.o deste regulamento tem a seguinte redação:

«Para efeitos de aplicação do presente regulamento:

a)

As expressões ‘trabalhador assalariado’ [...] designam [...] qualquer pessoa:

i)

que esteja abrangida por um seguro obrigatório ou facultativo continuado contra uma ou mais eventualidades correspondentes aos ramos de um regime de segurança social aplicável aos trabalhadores assalariados ou não assalariados [...]

[...]

j)

O termo ‘legislação’ designa, em relação a cada Estado‑Membro, as leis, os regulamentos, as disposições estatuárias e quaisquer outras medidas de execução existentes ou futuras, respeitantes aos ramos e regimes de segurança social previstos nos n.os 1 e 2 do artigo 4.o [...]

[...]

r)

A expressão ‘períodos de seguro’ designa os períodos de contribuições, de emprego ou de atividade não assalariada definidos ou considerados como perí[o]dos de seguro pela legislação ao abrigo da qual foram cumpridos, bem como quaisquer períodos equiparados na medida em que sejam considerados por essa legislação como equivalentes a períodos de seguro; os períodos cumpridos ao abrigo de um regime especial dos funcionários públicos são igualmente considerados períodos de seguro;

[...]

s

a) A expressão ‘períodos de residência’ designa os períodos definidos ou considerados como tais pela legislação ao abrigo da qual foram cumpridos ou são considerados como cumpridos;

[...]»

5

O artigo 2.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Pessoas abrangidas», dispõe, no seu n.o 1:

«O presente regulamento aplica‑se aos trabalhadores assalariados ou não assalariados e aos estudantes que estejam ou tenham estado sujeitos à legislação de um ou vários Estados‑Membros e sejam nacionais de um dos Estados‑Membros, ou sejam apátridas ou refugiados residentes no território de um dos Estados‑Membros, bem como aos membros e membros sobrevivos da sua família.»

6

O artigo 3.o deste mesmo regulamento, sob a epígrafe «Igualdade de tratamento», dispõe, no seu n.o 1:

«As pessoas às quais se aplicam as disposições do presente regulamento estão sujeitas às obrigações e beneficiam da legislação de qualquer Estado‑Membro, nas mesmas condições que os nacionais deste Estado, sem prejuízo das disposições especiais constantes do presente regulamento.»

7

Nos termos do artigo 4.o do Regulamento n.o 1408/71, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação material»:

«1.   O presente regulamento aplica‑se a todas as legislações relativas aos ramos de segurança social que respeitam a:

[...]

b)

Prestações de invalidez, incluindo as que são destinadas a manter ou a melhorar a capacidade de ganho;

c)

Prestações de velhice;

[...]»

8

O artigo 13.o deste regulamento, sob a epígrafe «Regras gerais», prevê, no seu n.o 2:

«Sem prejuízo do disposto nos artigos 14.° a 17.°:

[...]

c)

A pessoa que exerça a sua atividade profissional a bordo de um navio com pavilhão de um Estado‑Membro está sujeita à legislação desse Estado;

[...]»

9

O artigo 44.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Disposições gerais relativas à liquidação das prestações quando o trabalhador assalariado ou não assalariado tenha estado sujeito à legislação de dois ou mais Estados‑Membros», dispõe, no seu n.o 1:

«Os direitos a prestações de um trabalhador assalariado ou não assalariado que tenha estado sujeito à legislação de dois ou mais Estados‑Membros, ou dos seus sobreviventes, são determinados em conformidade com as disposições do presente Capítulo.»

10

Nos termos do artigo 45.o do Regulamento n.o 1408/71, a instituição competente do Estado‑Membro do requerente deve ter em conta os períodos de seguro ou de residência cumpridos ao abrigo da legislação de qualquer outro Estado‑Membro. Embora a instituição competente tenha de calcular as prestações em função de períodos de seguro ou de residência totalizados em conformidade com as regras previstas neste artigo 45.o, as prestações concedidas a título da prestação de velhice são liquidadas em conformidade com o artigo 46.o, n.o 2, deste regulamento.

11

O artigo 94.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Disposições transitórias em relação aos trabalhadores assalariados», prevê, nos seus n.os 1 e 2:

«1.   O presente [r]egulamento não confere qualquer direito em relação a um período anterior a 1 de outubro de 1972 ou à data da sua aplicação no território do Estado‑Membro em causa ou em parte do seu território.

2.   Qualquer período de seguro, bem como, se for caso disso, qualquer período de emprego ou de residência cumprido ao abrigo da legislação de um Estado‑Membro antes de 1 de outubro de 1972 ou antes da data da aplicação do presente [r]egulamento no território desse Estado‑Membro ou em parte do seu território será tido em consideração para a determinação do direito a prestações conferido nos termos do presente [r]egulamento.»

Regulamento n.o 859/2003

12

O artigo 1.o do Regulamento n.o 859/2003 dispõe:

«Sob reserva do disposto no anexo do presente regulamento, as disposições do Regulamento (CEE) n.o 1408/71 e [do Regulamento] (CEE) n.o 574/72 são aplicáveis aos nacionais de Estados terceiros que ainda não estejam abrangidos pelas suas disposições por razões exclusivas da sua nacionalidade, bem como aos seus familiares e sobreviventes, desde que residam legalmente num Estado‑Membro e se encontrem numa situação cujos elementos não envolvam apenas um único Estado‑Membro.»

13

De acordo com o artigo 2.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 859/2003:

«1.   O presente regulamento não confere qualquer direito em relação ao período anterior a 1 de junho de 2003.

2.   Qualquer período de seguro, bem como, se for caso disso, qualquer período de emprego, de atividade não assalariada ou de residência cumprido ao abrigo da legislação de um Estado‑Membro antes de 1 de junho de 2003 será tido em conta para a determinação dos direitos conferidos por força do presente regulamento.»

Direito neerlandês

14

O artigo 2.o da Algemene Ouderdomswet (Lei relativa ao regime geral das pensões de velhice, Stb. 1956, n.o 281, a seguir «AOW»), na sua versão aplicável aos factos no processo principal, prevê:

«Entende‑se por residente, para efeitos da presente lei, a pessoa que reside nos Países Baixos.»

15

O artigo 3.o da AOW, na sua redação aplicável até à entrada em vigor da Lei de 30 de julho de 1985 (Stb. 347, n.o 882), enunciava:

«1.   O local de residência de uma pessoa [...] é determinado em função das circunstâncias de cada caso.

[...]

3.   Para efeitos de aplicação do n.o 1, são considerados como parte do Reino, relativamente à tripulação, os navios que têm o seu porto de registo neste país.»

16

O artigo 3.o da AOW, na sua versão que resulta da Lei de 30 de julho de 1965, tem a seguinte redação:

«1.   O local de residência de uma pessoa [...] é determinado consoante as circunstâncias de cada caso.

2.   Para efeitos de aplicação do n.o 1, são considerados como parte do Reino, relativamente à tripulação, os navios e as aeronaves que têm o seu porto de registo neste país.

[...]»

17

O artigo 6.o do AOW, na sua versão que resulta da Lei de 25 de maio de 1962 (Stb. 1962, p. 205) e que entrou retroativamente em vigor a partir de 1 de outubro de 1959, dispunha:

«1.   É segurada em conformidade com as disposições da presente lei, qualquer pessoa com idade superior a 15 anos de idade, mas que ainda não tenha atingido os 65 anos de idade e desde que:

a)

seja residente;

[...]

4.   As disposições do n.o 1 podem ser derrogadas por ou devido a uma medida geral de administração:

a)

relativamente aos estrangeiros;

b)

relativamente às pessoas às quais se aplica um regime semelhante fora do Reino;

c)

relativamente às pessoas que apenas residem temporariamente ou que apenas trabalham temporariamente no país;

d)

relativamente aos cônjuges e aos outros membros do agregado [...] das pessoas referidas no presente número, alíneas b) e c);

e)

relativamente aos cônjuges dos cidadãos [que não estão segurados pela presente lei] nos termos de um acordo ou de um regime de segurança social aplicável entre os Países Baixos e um ou vários outros Estados.»

18

O artigo 6.o da AOW, na sua versão que resulta da Lei de 30 de julho de 1965, tem a seguinte redação:

«1.   É segurada em conformidade com as disposições da presente lei qualquer pessoa com idade superior a 15 anos de idade, mas que ainda não tenha atingido os 65 anos de idade e desde que:

a)

seja residente;

[...]

3.   As disposições do n.o 1 podem ser derrogadas por ou devido a uma medida geral de administração:

a)

relativamente aos estrangeiros;

b)

relativamente às pessoas às quais se aplica um regime semelhante de outra parte do Reino, de outro Estado ou de uma organização internacional;

c)

relativamente às apenas pessoas que residem temporariamente ou que apenas trabalham temporariamente no país;

d)

relativamente aos cônjuges e aos outros membros do agregado das pessoas referidas no presente número, alíneas a), b) e c);

e)

relativamente aos cônjuges dos cidadãos que não estão segurados pela presente lei nos termos de um acordo ou de um regime de segurança social celebrado entre os Países Baixos e um ou vários outros Estados.»

19

Nos termos do artigo 7.o da AOW, na sua versão aplicável aos factos no processo principal:

«Têm direito a uma pensão de velhice, em conformidade com as disposições da presente lei, as pessoas:

a)

que tenham atingido 65 anos de idade e

b)

que, em conformidade com a presente lei, estejam seguradas durante o período compreendido entre o dia em que atingiram 15 anos de idade e o dia em que atingiram 65 anos de idade.»

20

Com base no artigo 6.o da AOW, foram sucessivamente adotadas medidas gerais de administração, entre as quais figuram, relativamente aos períodos em causa no processo principal, o Besluit uitbreiding en beperking kring verzekerden volksverzekeringen (Decreto relativo à extensão e à limitação do número de beneficiários do regime geral da segurança social), de 10 de julho de 1959 (Stb.1959, n.o 230, a seguir «Decreto Real 230»), e o Besluit uitbreiding en beperking kring verzekerden volksverzekeringen (Decreto relativo à extensão e à limitação do número de beneficiários do regime geral da segurança social), de 1 de janeiro de 1963 (Stb. 1963, n.o 24, a seguir «Decreto Real 24»).

21

O artigo 2.o, frase introdutória e alínea k), do Decreto Real 230 assim como o artigo 2.o, frase introdutória e alínea k), do Decreto Real 24 previam, em termos idênticos, o seguinte:

«[...] em derrogação ao artigo 6.o, n.o 1, da [AOW], ao artigo 7.o da lei relativa ao seguro geral das viúvas e dos órfãos e ao artigo 6.o da lei geral do abono de família, não estão segurados:

[...]

k)

os estrangeiros que fazem parte da tripulação de um navio com porto de registo no Reino, desde que residam a bordo do referido navio».

22

O artigo 2.o, alínea k), do Decreto Real 24 passou, após alteração deste último pelo Decreto de 11 de agosto de 1965 (Stb. 373), a artigo 2.o, alínea m).

23

Nos termos do artigo 16.o, n.o 1, da AOW, na redação aplicável aos factos no processo principal, a pensão de velhice tem início no primeiro dia do mês em que o beneficiário preencha as condições exigidas para ter direito a essa pensão.

Litígios no processo principal e questões prejudiciais

24

F. Wieland nasceu em 20 de março de 1943 na Áustria e tem a nacionalidade austríaca por nascimento. De 11 de outubro de 1962 a 7 de março de 1966, trabalhou a bordo de navios que pertenciam à Holland‑Amerika Lijn (a seguir «HAL»), sociedade de direito neerlandês que explora uma ligação marítima entre os Países Baixos e os Estados Unidos da América.

25

Durante o ano de 1966, F. Wieland instalou‑se nos Estados Unidos e obteve, em 29 de agosto de 1969, a nacionalidade americana, perdendo, por esse facto, a nacionalidade austríaca.

26

Em abril de 2008, F. Wieland pediu ao SVB que lhe fosse paga uma pensão de velhice a partir da data do aniversário dos seus 65 anos.

27

Por decisão de 15 de abril de 2008, o SVB indeferiu este pedido por, durante o período compreendido entre o aniversário dos seus 15 anos e o aniversário dos seus 65 anos, F. Wieland não ter estado segurado nos termos da AOW. Em 3 de outubro de 2008, o interessado informou o SVB que, a partir dessa data, a sua residência principal se situava na Áustria.

28

H. Rothwangl nasceu em 7 de dezembro de 1943 e tem a nacionalidade austríaca. De 6 de novembro de 1962 a 23 de abril de 1963 trabalhou a bordo de navios que pertenciam à HAL.

29

Em 12 de janeiro de 2009, H. Rothwangl pediu ao SVB que lhe fosse paga uma pensão de velhice. Nesta data, residia na Áustria, país no qual, de acordo com os dados do SVB, tinha estado legalmente segurado contra o risco de velhice durante um período total de 469 meses, compreendido entre o mês de abril de 1958 e o mês de julho de 1998.

30

H. Rothwangl beneficiou, a partir de 1 de março de 1998, de uma pensão de invalidez austríaca (Erwerbsunfähigkeitspension) e, a partir de 1 de setembro de 1998, de uma pensão de invalidez suíça. Entre 29 de novembro de 1998 e 1 de dezembro de 2008, recebeu uma prestação nos termos da Wet op de arbeidsongeschiktheidsverzekering (Lei relativa ao seguro de incapacidade para o trabalho) de um montante de 1,08 euros brutos por dia.

31

Por decisão de 26 de maio de 2009, o SVB recusou a H. Rothwangl a concessão da pensão de velhice requerida por, durante o período compreendido entre o aniversário dos seus 15 anos e o aniversário dos seus 65 anos, não ter estado segurado a título da AOW.

32

F. Wieland e H. Rothwangl contestaram com sucesso as decisões do SVB no Rechtank Amsterdam (Tribunal de Primeira Instância de Amesterdão, Países Baixos). O SVB interpôs recurso da decisão para o órgão jurisdicional de reenvio.

33

Na decisão de reenvio, o Centrale Raad van Beroep (Tribunal Superior da Segurança Social, Países Baixos) faz referência ao acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem de 4 de junho de 2002, Wessels‑Bergervoet c. Países Baixos (CE:ECHR:2002:1112JUD003446297), em que este último órgão jurisdicional considerou que a decisão da instituição neerlandesa de pagar apenas a uma mulher casada, com fundamento na AOW, uma pensão de velhice reduzida era constitutiva de uma violação do artigo 14.o da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»), lido em conjugação com o artigo 1.o do Protocolo adicional à CEDH, assinado em Paris, em 20 de março de 1952.

34

O órgão jurisdicional de reenvio explica que, embora os órgãos jurisdicionais neerlandeses tenham, nos casos em que estão em causa direitos a pensão de velhice de marítimos, aplicado o raciocínio seguido pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem no acórdão de 4 de junho de 2002, Wessels‑Bergervoet c. Países Baixos (CE:ECHR:2002:1112JUD003446297), considera, porém, que a situação de F. Wieland e H. Rothwangl se distingue destes casos e que a diferença de tratamento em razão da nacionalidade, estabelecida pelas autoridades neerlandesas competentes nos processos principais, é justificada à luz do artigo 14.o da CEDH. Interroga‑se sobre se o Regulamento n.o 1408/71, lido em conjugação com o Regulamento n.o 859/2003, bem como com os artigos 18.° e 45.° TFUE, pode ser pertinente nestes processos.

35

Relativamente a H. Rothwangl, o referido órgão jurisdicional considera que, devido às suas atividades profissionais durante os anos 60, este deve ser atualmente qualificado de trabalhador na aceção não só do Tratado FUE mas também do Regulamento n.o 1408/71. Além disso, considera que o facto de o interessado não ter tido a nacionalidade de um Estado‑Membro entre 6 de novembro de 1962 e 23 de abril de 1966, período durante o qual trabalhava para a HAL, não se opõe a que este regulamento se aplique às atividades profissionais exercidas durante este período, uma vez que H. Rothwangl preenche a condição de nacionalidade imposta pelo referido regulamento devido à adesão, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 1995, da República da Áustria à União Europeia.

36

O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se quanto à questão de saber se o período durante o qual H. Rothwangl trabalhava como marítimo para a HAL deve ser considerado um período de seguro na aceção do artigo 94.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1408/71. A este respeito, considera que há que tomar em consideração os artigos 18.° e 45.° TFUE, bem como o artigo 3.o do Regulamento n.o 1408/71.

37

No que respeita a F. Wieland, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se a resposta à questão da aplicabilidade do Regulamento n.o 1408/71 deve ser a mesma que foi dada no caso de H. Rothwangl, uma vez que a livre circulação dos trabalhadores não se aplica aos nacionais de Estados terceiros e que F. Wieland já não tem, desde 29 de agosto de 1969, a nacionalidade austríaca.

38

Nestas circunstâncias, o Centrale Raad van Beroep (Tribunal Superior da Segurança Social) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Devem os artigos 3.° e 94.°, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1408/71 ser interpretados no sentido de que se opõem a que seja parcialmente indeferido o pedido de uma pensão de velhice (parcial) de um antigo marítimo que fazia parte da tripulação de um navio registado num porto de um Estado‑Membro, que não tinha residência em terra e que não era nacional de um Estado‑Membro, depois de o Estado da nacionalidade do marítimo ter aderido à (antecessora da) União ou de o Regulamento n.o 1408/71 se ter tornado aplicável a esse Estado, com o fundamento exclusivo de que este antigo marítimo não tinha a nacionalidade do (primeiro) Estado‑Membro no período do (alegado) seguro?

2)

Devem os artigos 18.° e 45.° […] TFUE ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado‑Membro com base na qual um marítimo que fazia parte da tripulação de um navio registado num porto deste Estado‑Membro, que não tinha residência em terra e que não é nacional de um Estado‑Membro, é excluído do seguro de pensão de velhice quando, nos termos desta legislação, um marítimo nacional do Estado‑Membro do porto de registo do navio e que se encontra, quanto ao mais, nas mesmas circunstâncias é segurado, se entretanto, à data da determinação da pensão, o Estado de que é nacional o primeiro marítimo […] tiver aderido à (antecessora da) União ou se o Regulamento n.o 1408/71 se tiver tornado aplicável a esse Estado?

3)

Devem a [primeira e segunda questões] ser respondidas da mesma forma no caso de um (antigo) marítimo que, à data do exercício do seu trabalho, tinha a nacionalidade de um Estado que aderiu num momento posterior à (antecessora da) União, mas que, à data dessa adesão ou da entrada em vigor do Regulamento n.o 1408/71 nesse Estado e à data em que foi invocado o direito a uma pensão de velhice, deixou de ser nacional de um Estado‑Membro, embora aquele [r]egulamento lhe seja aplicável, nos termos do artigo 1.o do Regulamento n.o 859/2003?»

Quanto às questões prejudiciais

Observações preliminares

39

Há que observar que, no momento em que F. Wieland e H. Rothwangl trabalhavam para a HAL, a coordenação dos regimes de segurança social dos Estados‑Membros, relativamente aos trabalhadores migrantes ao nível da Comunidade Económica Europeia, era regida pelo Regulamento n.o 3 do Conselho, de 25 de setembro de 1958, relativo à segurança social dos trabalhadores migrantes (JO 1958, 30, p. 561). Este último regulamento não se aplicava, todavia, aos marítimos.

40

Esta situação não era incompatível com as regras internacionais aplicáveis aos marítimos em vigor à época, dado que, em conformidade com o artigo 2.o da Convenção (n.o 71) da Organização Internacional do Trabalho, de 28 de junho de 1946, sobre as Pensões dos Marítimos, ratificada pelo Reino dos Países Baixos em 27 de agosto de 1957 e que entrou em vigor em 10 de outubro de 1962, todos os Estados‑Membros da Organização Internacional do Trabalho tinham a obrigação de instituir ou de garantir a instituição, em conformidade com a sua legislação nacional, de um regime de pensões dos marítimos que se reformam do serviço no mar, sendo especificado que as pessoas que não residiam no território do Estado‑Membro em causa e as pessoas que não eram nacionais podiam, todavia, ser excluídas deste regime.

41

A partir de 1 de abril de 1967, o Regulamento n.o 47/67/CEE do Conselho, de 7 de março de 1967, que altera e completa certas disposições dos Regulamentos n.os 3 e 4 relativos à segurança social dos trabalhadores migrantes (marítimos) (JO 1967, 44, p. 641), introduziu regras específicas relativamente aos marítimos que respeitavam, designadamente, à determinação do direito aplicável e à pensão de velhice. Estas regras foram incorporadas, posteriormente, no Regulamento n.o 1408/71.

42

Daí resulta que, durante os períodos durante os quais F. Wieland e H. Rothwangl trabalhavam para a HAL, a inscrição dos marítimos nos regimes de segurança social era exclusivamente regida pelas regulamentações nacionais.

43

Em contrapartida, F. Wieland e H. Rothwangl apresentaram os seus pedidos de pensão de velhice numa data em que o Regulamento n.o 1408/71 era aplicável.

44

Nos termos do primeiro considerando deste último regulamento, o seu objetivo principal é coordenar os sistemas nacionais de segurança social a fim de pôr em prática o princípio da livre circulação de pessoas no território da União.

45

A este respeito, embora os Estados‑Membros conservem a sua competência para organizarem as condições de inscrição nos seus sistemas de segurança social, devem, no entanto, no exercício dessa competência, respeitar o direito da União e, em particular, as disposições do Tratado relativas à livre circulação de trabalhadores (acórdão de 17 de janeiro de 2012, Salemink, C‑347/10, EU:C:2012:17, n.o 39 e jurisprudência referida).

46

Consequentemente, por um lado, estas condições não podem ter por efeito excluir do âmbito de aplicação de uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, as pessoas às quais, por força do Regulamento n.o 1408/71, esta mesma legislação é aplicável e, por outro lado, os regimes de inscrição nos seguros obrigatórios devem ser compatíveis com as disposições dos artigos 18.° e 45.° TFUE (acórdão de 17 de janeiro de 2012, Salemink, C‑347/10, EU:C:2012:17, n.o 40).

47

É à luz destas considerações que as questões prejudiciais devem ser examinadas.

Quanto à primeira questão

48

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 94.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1408/71 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro que não toma em consideração, na determinação dos direitos a prestações de velhice, um período de seguro alegadamente cumprido ao abrigo da sua própria legislação por um trabalhador estrangeiro quando, como no processo principal que diz respeito a H. Rothwangl, o Estado de que este trabalhador é nacional tenha aderido à União posteriormente ao cumprimento deste período.

49

Para responder a esta questão, há que determinar se e, se for caso disso, em que condições um nacional de um Estado‑Membro, no momento da apresentação do seu pedido de pensão de velhice, que não era, porém, nacional de um Estado‑Membro durante o período de emprego cumprido no estrangeiro antes da entrada em vigor do Regulamento n.o 1408/1971, adquire o direito a tomar em conta períodos de seguro realizados durante este período no território de outro Estado‑Membro com vista à constituição de uma pensão de reforma.

50

No caso em apreço, há que examinar se o interessado adquiriu, nos termos do artigo 94.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1408/71, em matéria de seguro de velhice, direitos que se devem juntar aos que já pode exigir na Áustria.

51

A este respeito, relativamente ao artigo 94.o, n.o 1, do referido regulamento, que enuncia que este último não confere nenhum direito relativamente a um período anterior a 1 de outubro de 1972 ou à data da sua aplicação no território do Estado‑Membro interessado, ou numa parte do território do Estado‑Membro interessado, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, esta disposição increve-se plenamente no quadro do princípio da segurança jurídica, que se opõe a que um regulamento seja aplicado retroativamente, independentemente dos efeitos favoráveis ou desfavoráveis eventualmente resultantes para o interessado de tal aplicação, exceto no caso de uma indicação suficientemente clara, quer nos termos quer nos objetivos, que permita concluir que determinado regulamento não dispõe apenas para o futuro. Assim, embora valha apenas para o futuro, a lei nova aplica‑se também, salvo derrogação, segundo um princípio geralmente reconhecido, aos efeitos futuros das situações nascidas na vigência da lei antiga (v., neste sentido, acórdão de 18 de abril de 2002, Duchon, C‑290/00, EU:C:2002:234, n.os 21, 22 e jurisprudência referida).

52

No mesmo sentido, para permitir a aplicação do Regulamento n.o 1408/71 aos efeitos futuros de situações nascidas na vigência da lei antiga, o artigo 94.o, n.o 2, do referido regulamento prevê a obrigação de tomar em consideração, para a determinação dos direitos à prestação, qualquer período de seguro, emprego ou residência cumprido ao abrigo da legislação de qualquer Estado‑Membro «antes de 1 de outubro de 1972 ou antes da data da aplicação do [...] regulamento no território desse Estado‑Membro». Desta disposição decorre, pois, que um Estado‑Membro não tem o direito de se recusar a tomar em conta períodos de seguro cumpridos no território de outro Estado‑Membro, com vista à constituição de uma pensão de reforma, unicamente pelo facto de terem sido cumpridos antes da entrada em vigor, no que lhe respeita, do regulamento (acórdãos de 18 de abril de 2002, Duchon, C‑290/00, EU:C:2002:234, n.o 23 e jurisprudência referida, e de 5 de novembro de 2014, Somova, C‑103/13, EU:C:2014:2334, n.o 52).

53

A este respeito, há que verificar se os períodos durante os quais H. Rothwangl trabalhou para a HAL constituem períodos de seguro cumpridos ao abrigo da legislação de um Estado‑Membro antes da data de aplicação do Regulamento n.o 1408/71 no território deste Estado‑Membro, na aceção do artigo 94.o, n.o 2, deste regulamento.

54

Dado que o momento a partir do qual uma pessoa pode alegar eventuais direitos a uma pensão de velhice a título da AOW, baseando‑se em períodos de seguro cumpridos anteriormente, corresponde ao primeiro dia do mês em que esta pessoa atinge os 65 anos de idade, o pedido de H. Rothwangl não pode ser considerado como respeitante a um direito conferido por um período anterior à entrada em vigor do Regulamento n.o 1408/71 ou à data de aplicação deste regulamento no território do Estado‑Membro interessado, na aceção do artigo 94.o, n.o 1, do referido regulamento.

55

Em contrapartida, coloca‑se a questão de saber se pode ser conferido um direito a H. Rothwangl em razão de períodos de seguro, bem como, se for o caso disso, de períodos de emprego ou de residência cumpridos ao abrigo da legislação de um Estado‑Membro antes de 1 de outubro de 1972 ou antes da data de aplicação do Regulamento n.o 1408/71 no território deste Estado‑Membro.

56

Com efeito, para poder validamente invocar o benefício do artigo 94.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1408/71, um requerente deve poder identificar um período de seguro cumprido, bem como, se for caso disso, períodos de emprego ou de residência cumpridos ao abrigo da legislação de um Estado‑Membro antes de 1 de outubro de 1972 ou, relativamente a Estados‑Membros que aderiram à União posteriormente a esta data, antes da data de aplicação deste regulamento no território do Estado‑Membro interessado. No caso da República da Áustria, esta data é 1 de janeiro de 1995.

57

No que respeita à condição relativa à existência de períodos de emprego ou de residência cumpridos ao abrigo da legislação de um Estado‑Membro, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que H. Rothwangl a preenche incontestavelmente.

58

Pelo contrário, no que respeita à existência da condição de um período de seguro cumprido ao abrigo da legislação de um Estado‑Membro, há que salientar, por um lado, que a regulamentação em causa no processo principal constitui uma legislação na aceção do artigo 1.o, alínea j), do Regulamento n.o 1408/71.

59

Por outro lado, a expressão «período de seguro», que figura no artigo 94.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1408/71, é definida na alínea r) do artigo 1.o do mesmo regulamento como designando «os períodos de contribuições, de emprego ou de atividade não assalariada definidos ou considerados como períodos de seguro pela legislação ao abrigo da qual foram cumpridos, bem como quaisquer períodos equiparados na medida em que sejam considerados por essa legislação como equivalentes a períodos de seguro» (acórdão de 7 de fevereiro de 2002, Kauer, C‑28/00, EU:C:2002:82, n.o 25).

60

Esta remissão para a legislação interna demonstra claramente que o Regulamento n.o 1408/71, designadamente para efeitos de totalização dos períodos de seguro, remete para as condições a que o direito interno condiciona o reconhecimento de determinado período como equivalente aos períodos de seguro propriamente ditos. Contudo, tal reconhecimento deve ser feito no respeito pelas disposições do Tratado FUE relativas à livre circulação de pessoas (acórdão de 7 de fevereiro de 2002, Kauer, C‑28/00, EU:C:2002:82, n.o 26 e jurisprudência referida).

61

No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio constatou que H. Rothwangl não estava segurado contra o risco de velhice durante o seu período de emprego na HAL, na medida em que, em conformidade com a regulamentação nacional aplicável aos factos no processo principal, os nacionais de países terceiros que fazem parte da tripulação de um navio e que residem a bordo desse navio estavam excluídos do seguro no que respeita às prestações de velhice.

62

Uma vez que esta exclusão assentava, designadamente, na nacionalidade de H. Rothwangl, há que examinar se este pode, nos termos da proibição de discriminação em razão da nacionalidade que figura no artigo 3.o do Regulamento n.o 1408/71, exigir que seja tratado como tendo cumprido um período de seguro nos Países Baixos, mesmo se, na realidade, não preenche esta condição essencial enunciada no artigo 94.o, n.o 2, deste regulamento.

63

A este respeito, é verdade que o Tribunal de Justiça declarou que, para que as disposições transitórias previstas no artigo 94.o, n.os 1 a 3, do Regulamento n.o 1408/71 produzissem efeitos, era necessário ter em conta períodos de seguro cumpridos antes da entrada em vigor deste regulamento (v., neste sentido, acórdãos de 7 de fevereiro de 2002, Kauer, C‑28/00, EU:C:2002:82, n.o 52, e de 18 de abril de 2002, Duchon, C‑290/00, EU:C:2002:234, n.o 23). Nos processos que deram origem a estes dois acórdãos, os interessados que tinham solicitado a concessão de uma pensão austríaca tinham estado segurados ao abrigo da regulamentação nacional pertinente. O Tribunal de Justiça declarou, assim, que havia que apreciar a legalidade das medidas nacionais em causa à luz do direito da União conforme aplicável na sequência da adesão da República da Áustria à União (acórdão de 18 de abril de 2002, Duchon, C‑290/00, EU:C:2002:234, n.o 28) e que, consequentemente, a instituição competente devia aplicar os princípios relativos à livre circulação de trabalhadores e as disposições transitórias do artigo 94.o, n.os 1 a 3, deste regulamento (v., neste sentido, acórdãos de 7 de fevereiro de 2002, Kauer, C‑28/00, EU:C:2002:82, n.os 45 e 50, e de 18 de abril de 2002, Duchon, C‑290/00, EU:C:2002:234, n.o 32).

64

Todavia, como salientou a advogada‑geral no n.o 52 das suas conclusões, o facto de H. Rothwangl ter, mesmo antes da adesão da República da Áustria à União, exercido direitos de livre circulação quando trabalhava para a HAL não é suficiente para que possa ser tratado como se tivesse cumprido um período de seguro de velhice nos Países Baixos. Com efeito, diferentemente da situação dos requerentes nos processos que deram origem aos acórdãos de 7 de fevereiro de 2002, Kauer (C‑28/00, EU:C:2002:82), e de 18 de abril de 2002, Duchon (C‑290/00, EU:C:2002:234), a regulamentação neerlandesa excluía H. Rothwangl do benefício deste seguro quando trabalhava para a HAL, por ser nacional de um país terceiro e residir a bordo dos navios de cuja tripulação era membro. Essa exclusão, ainda que em razão da nacionalidade, não era proibida pelo direito da União à época dos factos em causa no processo principal, dado que a República da Áustria ainda não tinha aderido à União.

65

Além disso, os autos submetidos ao Tribunal de Justiça não permitem decidir a questão de saber se H. Rothwangl estava inscrito no sistema austríaco de segurança social durante os seus períodos de emprego na HAL. Ora, é unicamente em caso de resposta afirmativa a esta questão que estes períodos devem ser tomados em consideração pela autoridade competente austríaca.

66

À luz das considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o artigo 94.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1408/71 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro que não toma em consideração, na determinação dos direitos a prestações de velhice, um período de seguro alegadamente cumprido ao abrigo da sua própria legislação por um trabalhador estrangeiro, quando, como no processo principal que diz respeito a H. Rothwangl, o Estado de que este trabalhador é nacional aderiu à União posteriormente ao cumprimento desse período.

Quanto à segunda questão

67

Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 18.o TFUE, que consagra o princípio da proibição da discriminação, e o artigo 45.o TFUE, que garante a livre circulação dos trabalhadores, devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado‑Membro, como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual um marítimo que fez parte, durante um período determinado, da tripulação de um navio registado num porto no território deste Estado‑Membro e que residia a bordo deste navio está excluído do benefício do seguro de velhice a título deste período por não ser nacional de um Estado‑Membro durante o referido período.

68

A este respeito, há que salientar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o ato de adesão de um novo Estado‑Membro se baseia essencialmente no princípio geral da aplicação imediata e integral das disposições do direito da União ao referido Estado, só sendo admissíveis derrogações expressamente previstas em disposições transitórias (acórdão de 21 de dezembro de 2011, Ziolkowski e Szeja, C‑424/10 e C‑425/10, EU:C:2011:866, n.o 56 e jurisprudência referida).

69

Neste sentido, o artigo 2.o do Ato relativo às condições de adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 1994, C 241, p. 21, e JO 1995, L 1, p. 1, a seguir «ato de adesão») prevê que, a partir da adesão, as disposições dos Tratados originários vinculam os novos Estados‑Membros e são aplicáveis nesses Estados nas condições previstas por esses Tratados e pelo ato de adesão.

70

Uma vez que este ato de adesão não contém disposições transitórias relativas à aplicação dos artigos 7.° e 48.° do Tratado CE (que passaram a artigos 12.° e 39.° CE, os quais, por sua vez, passaram a artigos 18.° e 45.° TFUE), estes artigos devem ser considerados de aplicação imediata e vinculativos para a República da Áustria desde a data da sua adesão, a saber, 1 de janeiro de 1995. Daí resulta que, a partir desta data, os outros Estados‑Membros deviam considerar os nacionais austríacos cidadãos da União.

71

No entanto, não resulta do referido ato de adesão nenhuma obrigação para os Estados‑Membros existentes de tratar os cidadãos austríacos da mesma maneira que tratavam os cidadãos de outros Estados‑Membros antes da adesão da Áustria à União (v., por analogia, acórdãos de 26 de maio de 1993, Tsiotras, C‑171/91, EU:C:1993:215, n.o 12, e de 15 de junho de 1999, Andersson e Wåkerås‑Andersson, C‑321/97, EU:C:1999:307, n.o 46).

72

Deste modo, H. Rothwangl não pode exigir que o Reino dos Países Baixos o trate como se tivesse estado abrangido pela pensão de velhice se tivesse beneficiado dos direitos resultantes das disposições que regem a livre circulação dos trabalhadores durante os seus períodos de emprego na HAL. Com efeito, como se observou nos n.os 70 e 71 do presente acórdão, tal não era o caso.

73

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à segunda questão que os artigos 18.° e 45.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que não se opõem à legislação de um Estado‑Membro, como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual um marítimo que fez parte, durante um período determinado, da tripulação de um navio registado num porto no território deste Estado‑Membro e que residia a bordo deste navio está excluído do benefício do seguro de velhice a título deste período por não ser nacional de um Estado‑Membro durante o referido período.

Quanto à terceira questão

74

Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 859/2003 deve ser interpretado no sentido de que se opõe à regulamentação de um Estado‑Membro nos termos da qual um período de emprego cumprido ao abrigo da legislação deste Estado‑Membro por um trabalhador que, como no processo principal que diz respeito a F. Wieland, não era nacional de um Estado‑Membro durante este período, mas que, no momento em que requer o pagamento de uma pensão de velhice, está abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 1.o deste regulamento, não é tomado em consideração, por este Estado‑Membro, na determinação dos direitos a pensão deste trabalhador.

75

A este respeito, há que recordar que, nos termos do artigo 1.o do Regulamento n.o 859/2003, as disposições do Regulamento n.o 1408/71 são aplicáveis aos nacionais de Estados terceiros que ainda não estejam abrangidos por estas disposições por razões exclusivas da sua nacionalidade, bem como aos seus familiares e sobreviventes, desde que residam legalmente num Estado‑Membro e se encontrem numa situação cujos elementos não envolvam apenas um único Estado‑Membro.

76

No caso em apreço, F. Wieland preenche as condições exigidas no artigo 1.o do Regulamento n.o 859/2003, na medida em que é um nacional americano que reside legalmente na Áustria, os elementos da situação em que se encontra não envolvem apenas um único Estado‑Membro e ainda não está abrangido pelas disposições do Regulamento n.o 1408/71 por razões exclusivas da sua nacionalidade. Por conseguinte, está abrangido pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 859/2003.

77

Ora, há que constatar que o artigo 2.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 859/2003 está formulado em termos análogos aos utilizados no artigo 94.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1408/71.

78

Daí resulta que, tendo em conta a resposta dada à primeira questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio, F. Wieland, apesar da circunstância de residir nos Países Baixos durante o período durante o qual trabalhava para a HAL, não estava, pelas mesmas razões que H. Rothwangl, segurado a título da pensão de velhice nos termos da legislação neerlandesa.

79

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à terceira questão que o artigo 2.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 859/2003 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe à regulamentação de um Estado‑Membro nos termos da qual um período de emprego cumprido ao abrigo da legislação deste Estado‑Membro por um trabalhador que, como no processo principal que diz respeito a F. Wieland, não era nacional de um Estado‑Membro durante esse período, mas que, no momento em que requer o pagamento de uma pensão de velhice, está abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 1.o deste regulamento, não é tomado em consideração por esse Estado‑Membro na determinação dos direitos a pensão deste trabalhador.

Quanto às despesas

80

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

 

1)

O artigo 94.o, n.os 1 e 2, do Regulamento (CEE) n.o 1408/71 do Conselho, de 14 de junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na sua versão alterada e atualizada pelo Regulamento (CE) n.o 118/97 do Conselho, de 2 de dezembro de 1996, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 647/2005 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de abril de 2005, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro que não toma em consideração, na determinação dos direitos a prestações de velhice, um período de seguro alegadamente cumprido ao abrigo da sua própria legislação por um trabalhador estrangeiro, quando o Estado de que este trabalhador é nacional aderiu à União Europeia posteriormente ao cumprimento desse período.

 

2)

Os artigos 18.° e 45.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que não se opõem à legislação de um Estado‑Membro, como a que está em causa no processo principal, nos termos da qual um marítimo que fez parte, durante um período determinado, da tripulação de um navio registado num porto no território deste Estado‑Membro e que residia a bordo deste navio está excluído do benefício do seguro de velhice a título deste período por não ser nacional de um Estado‑Membro durante o referido período.

 

3)

O artigo 2.o, n.os 1 e 2, do Regulamento (CE) n.o 859/2003 do Conselho, de 14 de maio de 2003, que torna extensivas as disposições do Regulamento n.o 1408/71 e (CEE) n.o 574/72 aos nacionais de Estados terceiros que ainda não estão abrangidos por estas disposições por razões exclusivas de nacionalidade, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe à regulamentação de um Estado‑Membro nos termos da qual um período de emprego cumprido ao abrigo da legislação deste Estado‑Membro por um trabalhador que não era nacional de um Estado‑Membro durante esse período, mas que, no momento em que requer o pagamento de uma pensão de velhice, está abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 1.o deste regulamento, não é tomado em consideração por esse Estado‑Membro na determinação dos direitos a pensão deste trabalhador.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.

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