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Document 62014CC0574

    Conclusões do advogado-geral Campos Sánchez-Bordona apresentadas em 14 de abril de 2016.
    PGE Górnictwo i Energetyka Konwencjonalna SA contra Prezes Urzędu Regulacji Energetyki.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Sąd Najwyższy.
    Reenvio prejudicial — Auxílios de Estado — Contratos de aquisição de energia de longo prazo — Compensações pagas em caso de cessação voluntária — Decisão da Comissão que declara a compatibilidade de um auxílio de Estado com o mercado interno — Verificação da legalidade de um auxílio pelo tribunal nacional — Ajustamento anual dos custos ociosos — Momento da tomada em consideração da pertença de um produtor de energia a um grupo de empresas.
    Processo C-574/14.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:261

    CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

    MANUEL CAMPOS SÁNCHEZ‑BORDONA

    apresentadas em 14 de abril de 2016 ( 1 )

    Processo C‑574/14

    PGE Górnictwo i Energetyka Konwencjonalna S.A.

    contra

    Prezes Urzędu Regulacji Energetyki

    [pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal de Justiça, Polónia)]

    «Mercado interno da eletricidade — Auxílios de Estado — Decisão da Comissão que declara a compatibilidade de um auxílio de Estado com o mercado comum — Artigo 107.o TFUE — Artigo 4.o, n.o 3, TUE — Decisão 2009/287/CE — Metodologia dos custos ociosos — Cálculo do ajustamento anual da compensação de custos ociosos — Situação do mercado relevante — Poderes das autoridades e dos órgãos jurisdicionais nacionais»

    1. 

    A Diretiva 96/92/CE ( 2 ), que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade, estabeleceu o princípio e as bases para a abertura à concorrência do setor da eletricidade dos Estados‑Membros. A transição progressiva para este novo regime foi acompanhada, em alguns desses Estados, de auxílios públicos a favor das suas empresas do setor da eletricidade.

    2. 

    Nesse contexto, a Comissão adotou, já no ano de 2001, uma metodologia para analisar a compatibilidade dos correspondentes auxílios estatais com o mercado interno. Em concreto, estabeleceu o método que devia reger o cálculo dos denominados custos ociosos, ou seja, os custos — compensáveis com auxílios públicos — decorrentes da inviabilidade económica de que padecem as empresas do setor no quadro do novo modelo aberto à concorrência pelo facto de deverem honrar os seus compromissos anteriores ou garantias de fornecimento de energia elétrica.

    3. 

    Seguidamente, em conformidade com essa metodologia, a Comissão teve de se pronunciar sobre alguns dos sistemas estatais de auxílio às empresas do setor da eletricidade. Um deles foi o implementado pela República da Polónia, que é objeto deste reenvio prejudicial.

    4. 

    Em 2007, a República da Polónia adotou uma lei destinada a compensar as empresas produtoras de eletricidade pelos custos ociosos em que as mesmas pudessem incorrer ( 3 ). Em concreto, as autoridades polacas fixaram nessa lei as condições para a cobertura dos custos causados aos produtores em consequência da cessação antecipada dos contratos celebrados para a compra e venda de energia elétrica a longo prazo. Na sua Decisão 2009/287/CE ( 4 ), a Comissão pronunciou‑se favoravelmente sobre a compatibilidade destes auxílios estatais com o mercado comum.

    5. 

    Em síntese, o debate suscitado circunscreve‑se a questão de saber se o pagamento dos auxílios estatais autorizados pela Comissão deve ser feito em função da situação «inicial» das empresas do setor da eletricidade beneficiárias (e das suas unidades de produção), como descrita na Lei de 2007, ou, antes, em função da situação existente no momento da sua execução (no caso em apreço, o exercício financeiro de 2009).

    6. 

    Em primeiro lugar, o presente reenvio prejudicial permitirá ao Tribunal de Justiça confirmar a sua doutrina sobre a competência exclusiva da Comissão para se pronunciar sobre a compatibilidade dos auxílios estatais com o mercado comum. Em segundo lugar, dever‑se‑á determinar qual das duas interpretações defendidas pelas partes no litígio (denominadas «interpretações estática e dinâmica») deve prevalecer para aplicar a Decisão 2009/287.

    I. Quadro jurídico

    A. Direito da União

    1. Comunicação da Comissão relativa à metodologia de análise dos auxílios estatais ligados a custos ociosos ( 5 )

    7.

    Em 26 de julho de 2001, a Comissão adotou uma Comunicação relativa à metodologia de análise dos auxílios estatais ligados a custos ociosos (a seguir «metodologia dos custos ociosos»).

    8.

    Segundo o ponto 2, sexto parágrafo, da metodologia dos custos ociosos, o seu objeto «é o de indicar as intenções da Comissão no que se refere à aplicação das regras do Tratado em matéria de auxílios estatais relativamente às medidas de auxílio destinadas a compensar o custo de compromissos ou de garantias suscetíveis de não serem honrados na sequência da [abertura à concorrência do setor europeu da eletricidade estabelecida pela] Diretiva 96/92/CE».

    9.

    O n.o 3 da metodologia dos custos ociosos define os compromissos ou garantias de funcionamento suscetíveis de serem qualificados de custos ociosos e o seu ponto 3, prevê:

    «Estes compromissos ou garantias de funcionamento devem ser suscetíveis de não poderem ser honrados na sequência das disposições da diretiva. Para constituir um custo ocioso, um compromisso ou uma garantia deve por conseguinte tornar‑se não económico devido aos efeitos da Diretiva 96/92/CE e afetar sensivelmente a competitividade da empresa em causa. Esta situação deve nomeadamente levar a empresa em questão a efetuar lançamentos contabilísticos (por exemplo, provisões) destinados a refletir o impacto previsível dessas garantias ou compromissos.

    Em especial, sempre que resultar destes compromissos ou garantias que, em caso de inexistência de auxílio ou de medidas transitórias, poderia ser posta em causa a viabilidade destas empresas, considera‑se que esses compromissos ou garantias preenchem as condições do parágrafo anterior.

    O efeito destes compromissos ou garantias sobre a competitividade ou viabilidade das empresas em causa será avaliado a nível das empresas consolidadas. Para que os compromissos ou garantias possam constituir custos ociosos, deve ser possível estabelecer uma relação de causa e efeito entre a entrada em vigor da Diretiva 96/92/CE e a dificuldade das empresas em causa em honrar ou fazer respeitar esses compromissos ou garantias. Para estabelecer essa relação de causa e efeito, a Comissão terá em conta as descidas de preço da eletricidade ou as perdas de quota de mercado das empresas em causa. Os compromissos ou garantias que não tiverem podido ser honrados independentemente da entrada em vigor da diretiva não constituem [auxílios ligados a custos ociosos].»

    10.

    O n.o 4 da metodologia dos custos ociosos é relativo ao cálculo dos auxílios estatais admissíveis e, no seu ponto 4.2, dispõe:

    «O dispositivo de pagamento do auxílio deve permitir ter em conta a evolução efetiva futura da concorrência. Esta evolução poderá ser avaliada nomeadamente através de fatores quantificáveis (preço, partes de mercado, outros fatores pertinentes indicados pelo Estado‑Membro). Uma vez que a evolução das condições de concorrência tem influência direta sobre o montante dos custos ociosos elegíveis, o montante do auxílio pago será necessariamente condicionado ao desenvolvimento de uma concorrência verdadeira e o cálculo dos auxílios pagos gradualmente no tempo deverá ter em conta a evolução dos fatores pertinentes para a avaliação do nível de concorrência atingido.»

    11.

    Nos termos do ponto 4.5 do n.o 4 da metodologia dos custos ociosos:

    «O montante máximo dos auxílios suscetíveis de serem pagos a uma empresa para compensar os custos ociosos deve ser indicado previamente e deve ter em conta os possíveis ganhos de produtividade para a empresa.

    Igualmente, as modalidades específicas de cálculo e de financiamento dos auxílios destinados a compensar custos ociosos, bem como a duração máxima durante a qual esses auxílios podem ser pagos devem ser especificadas previamente de forma clara. A notificação desses auxílios especificará, nomeadamente, de que modo o cálculo dos custos ociosos terá em conta a evolução dos diferentes fatores mencionados no ponto 4.2.»

    2. Decisão 2009/287

    12.

    O artigo 1.o da Decisão 2009/287 dispõe:

    «1.   Os contratos de aquisição de energia de longo prazo entre a Polskie Sieci Elektroenergetyczne S.A. [o operador estatal de rede de eletricidade polaca] e as empresas indicadas no anexo 1 à lei sobre as regras que regem a cobertura de custos incorridos por empresas em relação com a cessação antecipada dos contratos de aquisição de energia de longo prazo constituem um auxílio estatal a produtores de eletricidade, na aceção do n.o 1 do artigo 87.o do Tratado CE.

    2.   O auxílio estatal referido no n.o 1 do artigo 1.o foi concedido ilegalmente e é incompatível com o mercado comum.»

    13.

    Segundo o artigo 4.o da mesma decisão:

    «1.   A compensação prevista na [Lei de 2007] constitui um auxílio estatal na aceção do n.o 1 do artigo 87.o do Tratado CE aos produtores de eletricidade listados no apêndice 2 a essa lei.

    2.   O auxílio estatal referido no n.o 1 do artigo 4.o é compatível com o mercado comum com base na metodologia dos custos ociosos.

    3.   O montante máximo de compensação previsto na [Lei de 2007] é o montante após dedução das receitas totais geradas pelos ativos no âmbito dos CAE e que estão disponíveis para cobrir custos de investimento.»

    B.Direito nacional

    14.

    Em conformidade com o artigo 2.o, n.o 7, da Lei de 2007, entende‑se por «Produtor» a «empresa de energia que exerce uma atividade económica no domínio da produção de energia elétrica e celebrou um contrato a longo prazo, com exceção da Polskie Sieci Elektroenergetyczne S. A. com sede em Varsóvia».

    15.

    O artigo 2.o, n.o 12, da Lei de 2007, define «Custos ociosos» como as «despesas dos produtores, não cobertos pelas receitas provenientes da venda da energia elétrica produzida, de reservas de potência e de serviços de sistema no mercado concorrencial, incorridos após a cessação antecipada de um contrato a longo prazo, resultante de investimentos efetuados por esse produtor até 1 de maio de 2004, relacionados com a produção de energia elétrica».

    16.

    Em conformidade com o artigo 32.o, n.o 1, da Lei de 2007, «[c]aso o produtor que tenha celebrado um acordo de cessação de um contrato faça parte de um grupo, serão tidos em conta, no cálculo dos custos ociosos, os montantes descritos sob as alíneas ‘N’, ‘SD’. ‘R’ e ‘P’, a que o artigo 27.o, n.o 1, se refere, em relação a cada produtor e a cada empresa que integre o grupo e exerça uma atividade económica no domínio da produção de energia elétrica no território da Polónia nas unidades de produção elencadas no anexo 7 da [Lei de 2007]».

    17.

    O anexo 1 da Lei de 2007 inclui uma lista dos produtores que celebraram contratos de aquisição de energia elétrica a longo prazo, mencionando as unidades de produção em causa.

    18.

    O anexo 2 da Lei de 2007 estabelece os montantes máximos das compensações de custos ociosos para os diferentes produtores beneficiários dos auxílios, em 1 de janeiro de 2007.

    19.

    O anexo 7 da Lei de 2007 contém uma lista das unidades de produção tomadas em consideração para o cálculo dos custos ociosos dos produtores e que se têm em conta nos ajustamentos desses custos.

    II. Matéria de Facto

    20.

    Como resulta do despacho de reenvio e das observações apresentadas pelas partes, a sociedade PGE Górnictwo i Energetyka Konwencjonalna S.A. (a seguir «PGE») é uma empresa produtora de energia elétrica que, como sucessora da sociedade PGE Zespól Elektrowni Dolna Odra, se sub‑rogou na posição jurídica desta.

    21.

    Por sua vez, antes de 2007, a sociedade PGE Zespół Elektrowni Dolna Odra tinha celebrado com a Polskie Sieci Elektroenergetyczne S.A. alguns contratos de compra de energia elétrica a longo prazo, tendo‑se comprometido, em contrapartida, a realizar determinados investimentos.

    22.

    Nos termos dos referidos contratos, a sociedade PGE Zespół Elektrowni Dolna Odra (posteriormente PGE Górnictwo i Energetyka Konwencjonalna S.A.) obrigava‑se a criar novas capacidades de produção, a modernizar os seus equipamentos e a fornecer à Polskie Sieci Elektroenergetyczne S.A. uma quantidade mínima fixa de eletricidade. Por sua vez, esta sociedade (o operador estatal do sistema) comprometia‑se a adquirir, pelo menos, a quantidade mínima de eletricidade acordada a um preço baseado no princípio da repercussão dos custos sobre os clientes.

    23.

    Depois da adesão da República da Polónia à União Europeia e na vigência da Diretiva 96/92, foi aprovada, em 2007, a Lei de 2007, que estabelece um direito de compensação de custos ociosos. À data da aprovação dessa lei, a PGE fazia parte de um grupo de empresas, de que também fazia parte, para além de outros produtores de energia elétrica, a sociedade PGE Elektrownia Bełchatów S.A. (anteriormente designada Elektrownia Belchatów S.A.; a seguir «ELB»).

    24.

    No entanto, a PGE e a ELB não faziam parte do mesmo grupo de empresas quando a primeira celebrou os contratos de compra de eletricidade a longo prazo. Como já referi, as duas sociedades pertenciam ao mesmo grupo de empresas tanto à data da aprovação da Lei de 2007 como à data da adoção da Decisão 2009/287 (25 de setembro de 2009).

    25.

    A PGE e a ELB não constam como sociedades integradas num mesmo grupo de empresas nem nos anexos à Lei de 2007, nem nos da Decisão 2009/287.

    26.

    Na lista (anexo 7 da Lei de 2007) das unidades de produção de energia elétrica tomadas em consideração para a determinação dos custos ociosos, as centrais correspondentes à PGE encontram‑se separadas das da ELB. Por sua vez, esta última figura como fazendo parte da sociedade holding BOT Górnictwo i Energetyka S.A.

    27.

    O mecanismo de compensação da Lei de 2007 prevê o pagamento de um adiantamento ao produtor, cujo montante não deve ultrapassar o indicado na própria Lei de 2007, bem como uma liquidação anual realizada pelo presidente da Urzędu Regulacji Energetyki (entidade reguladora do setor da energia, a seguir «URE»), com base no resultado financeiro efetivo.

    28.

    O anexo 1 da Lei de 2007 refere a PGE como produtor, na aceção do artigo 2, n.o 7, da mesma lei. Segundo o anexo 2 da Lei de 2007, o montante máximo de compensação de custos ociosos para esta empresa ascende a 633496000 PLN.

    29.

    Por decisão de 30 de julho de 2010, o presidente da URE fixou em 24077793 PLN o montante da compensação anual a favor da PGE, para o ano de 2009. Fê‑lo tendo em conta o resultado financeiro da ELB, por considerar que, em 2009, esta sociedade pertencia ao mesmo grupo de empresas que a PGE.

    30.

    A PGE recorreu da decisão do presidente da URE para o Sąd Okręgowy w Warszawie (tribunal regional de Varsóvia), tendo alegado que o artigo 32.o, n.o 1, da Lei de 2007 só é aplicável no caso de as empresas figurarem como pertencentes ao mesmo grupo no anexo 7 da referida lei e que, de acordo com este anexo, a PGE não pertencia ao mesmo grupo de empresas que a ELB.

    31.

    O Sąd Okręgowy w Warszawie deu provimento ao recurso da PGE, por sentença proferida em 4 de junho de 2010, e fixou o montante da compensação anual de custos ociosos, para o ano de 2009, em 116985205 PLN.

    32.

    O Sąd Apelacyjny w Warszawie (tribunal de recurso de Varsóvia), por acórdão de 17 de janeiro de 2013, negou provimento ao recurso interposto pelo presidente da URE. Segundo o referido órgão jurisdicional, para que o resultado financeiro de outra empresa (ou seja, da ELB) seja tido em consideração, esta deveria, nos termos do anexo 7 da Lei de 2007, pertencer ao mesmo grupo que a PGE, o que não acontecia no caso em apreço.

    33.

    O presidente da URE interpôs recurso de cassação do acórdão do Sąd Najwyższy, para o Sąd Apelacyjny w Warszawie (Supremo Tribunal de Justiça), invocando uma alegada violação dos artigos 2.°, n.o 1, e 32.°, da Lei de 2007. Alegou que a referida lei deve ser interpretada em conformidade com a metodologia dos custos ociosos e que, segundo os pontos 3.3 e 4.2 desta metodologia, os custos ociosos devem ser calculados, para o ano da respetiva compensação, tendo em conta a pertença efetiva ao grupo dos produtores de energia abrangidos pela Lei de 2007.

    34.

    Neste contexto, o Sąd Najwyższy (Supremo Tribunal de Justiça) submeteu as seguintes questões prejudiciais.

    III. Questões prejudiciais submetidas

    35.

    As questões formuladas no pedido prejudicial que deu entrada no Tribunal de Justiça em 11 de dezembro de 2014 têm a seguinte redação:

    «1)

    Deve o artigo 107.o [TFUE], em conjugação com o artigo 4.o, n.o 3 [TUE] e o artigo 4.o, n.o 2, da Decisão da Comissão de 25 de setembro de 2007, ser interpretado no sentido de que, quando a Comissão Europeia [declara] que um auxílio estatal é compatível com o mercado comum, o órgão jurisdicional nacional não tem competência para verificar se as disposições nacionais que foram consideradas auxílios estatais autorizados são coerentes com as premissas da [metodologia dos custos ociosos]?

    2)

    Deve o artigo 107.o [TFUE], em conjugação com o artigo 4.o, n.o 3 [TUE] e [...] o artigo 4.o, n.os 1 e 2, da Decisão da Comissão [2009/287/CE], à luz dos pontos 3.3 e 4.2 da metodologia dos custos ociosos, ser interpretado no sentido de que, na aplicação de um [programa de] auxílios de Estado que a Comissão [declarou] compatível com o mercado comum, a adaptação anual dos custos ociosos para os produtores que pertencem a um grupo tem lugar no pressuposto de que apenas é decisiva a pertença do[…] produtor[…] ao grupo, na situação indicada nos anexos do ato jurídico verificado pela Comissão Europeia, ou no sentido de que se deve verificar, em cada ano em que é efetuada a adaptação dos custos ociosos, se o beneficiário do [programa de] auxílios estatais associado aos custos ociosos pertence efetivamente, nesse período, ao grupo que também integra os restantes produtores abrangidos pelo programa de auxílios?»

    IV. Tramitação processual no Tribunal de Justiça

    36.

    Intervieram no processo, tendo apresentado observações escritas, a PGE, o presidente da URE, o Governo polaco e a Comissão.

    37.

    Estiveram presentes na audiência, que teve lugar em 27 de janeiro de 2016, a PGE, o Governo polaco e a Comissão.

    V. Alegações

    A.Primeira questão prejudicial

    38.

    A PGE sustenta que, quando a Comissão tiver declarado um auxílio estatal compatível com o mercado comum, o órgão jurisdicional nacional não tem competência para verificar se esse auxílio é conforme com os princípios da metodologia dos custos ociosos. Caso contrário, estaria a atentar‑se contra a competência exclusiva da Comissão prevista no artigo 108.o TFUE e, no caso em apreço, o órgão jurisdicional nacional poderia ignorar de facto a Decisão 2009/287, o que está expressamente excluído pelos pontos 16, 17 e 20 da Comunicação da Comissão relativa à aplicação da legislação em matéria de auxílios estatais pelos tribunais nacionais ( 6 ). Sem prejuízo de o órgão jurisdicional nacional poder utilizar a metodologia dos custos ociosos como instrumento hermenêutico para resolver dúvidas acerca da interpretação da Decisão 2009/87, não lhe é permitido, nas suas decisões, pôr em causa a própria Decisão.

    39.

    O presidente da URE alega que os órgãos jurisdicionais nacionais devem interpretar as normas internas de modo a garantirem a plena efetividade do direito da União em matéria de auxílios públicos. Daí que, na sua opinião, no âmbito de um litígio relativo à concessão do auxílio estatal controvertido, o órgão jurisdicional nacional deve interpretar o direito interno tendo em conta o artigo 4.o da Decisão 2009/287 e os pontos 3.3 e 4.2 da metodologia dos custos ociosos.

    40.

    O Governo polaco, partindo da competência exclusiva da Comissão para se pronunciar sobre a compatibilidade de um auxílio com o mercado comum, admite também a eventualidade de, uma vez adotada a decisão da Comissão, surgirem circunstâncias que tornem mais difícil a sua execução, caso em que se imporia a elaboração de medidas conjuntas pela Comissão e pelas autoridades nacionais. Por esta razão, considera que, num caso como o presente, o órgão jurisdicional nacional tem competência para verificar se as disposições nacionais que instituem o auxílio autorizado respeitam os princípios da metodologia dos custos ociosos, estando mesmo obrigado a fazê‑lo. Deste modo, é assegurada uma correta execução da Decisão 2009/287 e, em última instância, a proteção das condições de concorrência no mercado comum.

    41.

    Por sua vez, a Comissão defende, em substância, a mesma posição que a PGE. Acrescenta que, depois de, na Decisão 2009/287, ter avaliado o sistema polaco de custos ociosos (ou seja, a Lei de 2007) com base nos pontos 3 e 4 da metodologia dos custos ociosos e declarado que esse sistema era compatível com o mercado interno, o órgão jurisdicional nacional não tem competência para verificar a conformidade da Lei de 2007 com a metodologia dos custos ociosos no momento do pagamento efetivo das compensações.

    B.Segunda questão prejudicial

    42.

    A PGE considera que o ajustamento anual da compensação deve ter em conta a situação vigente no momento em que a Comissão examinou o programa de auxílios previsto na Lei de 2007. Para a PGE, ao proceder à sua verificação, a Comissão teria analisado e aprovado o regime de custos ociosos previsto na Lei de 2007, incluindo as diferentes disposições da mesma. Dado que a Comissão autorizou o método de cálculo de compensações em termos de empresas consolidadas, na aceção do anexo 7 da Lei de 2007, a fim de determinar a pertença de cada produtor a um certo grupo de empresas, só caberia fazer referência única e exclusivamente às normas da própria Lei de 2007.

    43.

    O presidente da URE, o Governo polaco e a Comissão inclinam‑se, para efeitos do cálculo anual da compensação de custos ociosos, para uma «interpretação dinâmica» no que diz respeito à pertença de um produtor a um grupo de empresas. Em seu entender, os pontos 3.3 e 4.2 da metodologia dos custos ociosos fazem alusão à futura evolução efetiva da concorrência e, por conseguinte, às condições reais do mercado no momento do pagamento do auxílio estatal. Partindo desta premissa, concluem pela prevalência da composição real dos grupos de empresas durante o ano relativamente ao qual os ajustamentos são realizados. De outra forma, especifica a Comissão, se fosse adotada a «interpretação estática» defendida pela PGE, qualquer alteração da estrutura dos grupos de empresas deveria ser entendida como não abrangida pela Decisão 2009/287, de modo que, com base no artigo 108.o TFUE, o pagamento de compensações nesse novo contexto exigiria uma notificação prévia.

    VI. Apreciação

    A.Primeira questão prejudicial

    44.

    A primeira questão submetida tem por objeto saber se os artigos 107.° TFUE e 4.°, n.o 3, TUE, em conjugação com a Decisão 2009/287 e a metodologia dos custos ociosos, devem ser interpretados no sentido de que, uma vez declarada pela Comissão a compatibilidade de um auxílio estatal com o mercado comum, os órgãos jurisdicionais nacionais podem verificar, no momento da sua execução, se esse auxílio é coerente com a metodologia dos custos ociosos.

    45.

    Formulada nestes termos, que são os que o órgão jurisdicional de reenvio utiliza, a questão é demasiado abstrata para não merecer resposta negativa.

    46.

    Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a apreciação da compatibilidade de auxílios estatais com o mercado comum é da competência exclusiva da Comissão ( 7 ). Os tribunais nacionais não são totalmente alheios ao sistema de controlo dos auxílios de Estado, mas a sua missão limita‑se a garantir a eficácia do controlo preventivo dos projetos de auxílio estatal. Neste contexto, a Comissão e os órgãos jurisdicionais nacionais desempenham papéis «complementares mas distintos» ( 8 ), de modo que, enquanto «a apreciação da compatibilidade de medidas de auxílio com o mercado interno é da competência exclusiva da Comissão, que atua sob o controlo dos órgãos jurisdicionais da União, os órgãos jurisdicionais nacionais zelam pela salvaguarda, até à decisão final da Comissão, dos direitos dos particulares em caso de uma eventual violação, pelas autoridades estatais, da proibição prevista no artigo 108.o, n.o 3, TFUE» ( 9 ).

    47.

    Por conseguinte, os tribunais nacionais não são competentes para decidir sobre a compatibilidade de um auxílio estatal com o mercado interno nem para apreciar a validade das decisões adotadas pela Comissão nessa matéria ( 10 ).

    48.

    Na realidade, o órgão jurisdicional de reenvio não põe em causa esta jurisprudência, uma vez que a sua dúvida não pressupõe a possibilidade de apreciar a validade da Decisão 2009/287 em si mesma. Também não pergunta se deve reexaminar o seu conteúdo e pronunciar‑se de novo sobre a compatibilidade dos auxílios estatais com o mercado comum. De forma mais subtil, quer saber se, ao interpretar e aplicar ad casum a regulamentação nacional (a Lei de 2007) do programa de auxílios que foi objeto da Decisão 2009/287, pode «ajustar o valor do auxílio de Estado efetivamente atribuído ao produtor de energia com base na Lei de 2007 às premissas em que a decisão da Comissão se baseia» ( 11 ).

    49.

    Nas suas próprias palavras, o que o órgão jurisdicional de reenvio pergunta é se a regulamentação nacional «deve ser interpretada no sentido de que se deve considerar que o mecanismo de auxílio previsto na [Lei de 2007], cuja compatibilidade com o mercado comum foi verificada ainda antes da sua colocação em prática, a priori está em conformidade com a metodologia dos custos ociosos, pelo que esta verificação já não é necessária para efeitos da execução desse mecanismo, ou se os órgãos jurisdicionais e entidades nacionais devem verificar a conformidade, com esta metodologia, do auxílio de Estado concedido em aplicação da [Lei de 2007], sempre que é aplicada a Lei de 2007» ( 12 ).

    50.

    Portanto, tratar‑se‑ia de aplicar a Lei de 2007 a partir de um «modelo de interpretação» ( 13 ) que teria como «fundamento» a Decisão 2009/287, «juntamente com a metodologia dos custos ociosos» ( 14 ). Com a consequência de a aplicação do referido «modelo» poder dar origem a que um auxílio que não tivesse sido objeto de qualquer crítica por parte da Comissão, aquando da sua «avaliação geral dos mecanismos do programa de auxílio de Estado previstos [na Lei de 2007], devesse, porém, ser declarado incompatível com o mercado comum, no momento da sua execução» ( 15 ).

    51.

    Na minha opinião, esta abordagem não pode ser aceite.

    52.

    O regime de auxílios previsto na Lei de 2007 foi definitivamente autorizado a partir da adoção da Decisão 2009/287, em cujo artigo 4.o a Comissão, aplicando a metodologia dos custos ociosos, declarou que a compensação de custos ociosos era compatível com o mercado comum. Esta decisão não pode constituir, simplesmente, o «fundamento» para a construção de uma regra de interpretação ad hoc que, na realidade, seria a própria metodologia dos custos ociosos aplicada diretamente pelos tribunais nacionais para chegar a outros resultados. Tal operação implicaria que aqueles assumissem uma competência exclusiva da Comissão.

    53.

    Contudo, depois de a Comissão se pronunciar sobre o regime de auxílios estabelecido pela Lei de 2007, em concreto, é possível que, na prática posterior, circunstâncias supervenientes produzam efeitos que, se tivessem sido conhecidos ou previstos pela Comissão, a teriam levado a adotar outra decisão. Parece ser esta a preocupação subjacente à questões do órgão jurisdicional de reenvio, com vista a garantir o respeito do direito da União relativo aos auxílios estatais.

    54.

    Trata‑se de uma preocupação legítima, cuja solução não pode, porém, implicar uma atribuição de competências exclusivas da Comissão às autoridades nacionais. Pelo contrário, a solução deve ser procurada na delimitação dos papéis «complementares mas distintos» que, neste domínio, são atribuídos à Comissão e aos Estados‑Membros, nos termos expostos acima.

    55.

    Na realidade, é possível que a resposta à primeira questão prejudicial não seja muito útil, se for dissociada da apreciação sobre a segunda das questões apresentadas pelo órgão jurisdicional de reenvio, relativa à influência que poderia ter uma alteração superveniente dos pressupostos de facto em que a Comissão se baseou ao adotar a Decisão 2009/287.

    56.

    Em todo o caso, formulada a questão nos termos gerais ou abstratos em o foi, a sua resposta só pode ser negativa. Quando a Comissão decide que um auxílio estatal, nos termos de uma determinada lei nacional, é compatível com o mercado comum, o órgão jurisdicional nacional não tem competência para verificar se a lei que institui esse auxílio estatal respeita as indicações da metodologia dos custos ociosos.

    B. Segunda questão prejudicial

    57.

    O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se, para o cálculo anual (ou seja, para fixar o montante correspondente a cada ano em que o ajustamento for aplicado) da compensação de custos ociosos a pagar a uma empresa produtora de energia elétrica, o fator primordial deve ser: a) a pertença do produtor a um grupo de empresas, de acordo com a situação descrita nos anexos da Lei de 2007, ou, b) a efetiva pertença a um grupo de produtores, diferente daquele que consta dos referidos anexos, ou ao mesmo grupo, mas composto por outras empresas.

    58.

    A solução tem repercussões diretas no caso em apreço. Caso se aceite a segunda abordagem (favorável a uma «interpretação dinâmica» da integração nos grupos de empresas), o que seria relevante para o cálculo seriam os resultados financeiros do grupo no ano a que se refere a compensação. Esta é a tese defendida pela autoridade polaca reguladora do setor da energia no processo principal, ao ter decidido, em conformidade com a mesma, a redução do montante devido à PGE. A tese contrária é defendida pela PGE e apoiada pelos tribunais de primeira instância e de recurso, que apenas tomam em consideração a situação descrita no anexo 7 da Lei de 2007.

    59.

    A segunda questão é, pois, enunciada em termos que estão longe da abstração da primeira. A questão é, em síntese saber se, para o cálculo do ajustamento anual da compensação de custos ociosos que corresponde à PGE durante o ano de 2009 devem ser consideradas, estritamente, as unidades de produção e as empresas do setor da eletricidade, tal como figuram no anexo 7 da Lei de 2007, ou as que, no mesmo ano de 2009, faziam parte do grupo de empresas no qual a PGE estava integrada, mesmo que se trate de unidades incluídas no anexo 7 como pertencentes a um grupo diferente desta última.

    60.

    Temo contudo, que a resposta à segunda questão não resolva o problema central do litígio a quo, que, na realidade, versa mais sobre a exegese e a aplicação da Lei de 2007 do que sobre o direito da União. Como a PGE afirma nas suas observações (n.os 30 e 54), nem a Decisão 2009/87, nem a metodologia dos custos ociosos esclarecem, por si sós, as dúvidas suscitadas, cuja resposta depende, sobretudo, da aplicação dos artigos 2.° e 32.° da Lei de 2007, em conjugação com o seu anexo 7. São estas disposições que permitirão concluir se o resultado financeiro da ELB em 2009 pode ter influência na redução da compensação devida à PGE, apesar de, segundo o anexo 7 da Lei de 2007, os auxílios previstos não terem tomado em consideração essa circunstância.

    61.

    Da perspetiva do direito da União, a Decisão 2009/287 é uma mera «declaração de compatibilidade» dos auxílios com o mercado interno, enviada às autoridades polacas, para que estas, se o considerarem conveniente, entreguem os fundos estatais às empresas do setor da eletricidade, até um limite máximo de x milhões de PLN, em períodos anuais sucessivos. Se essas autoridades, nesses períodos ou exercícios anuais, optarem por interpretar a Lei de 2007 em termos que reduzam — e nunca que aumentem — o montante de «despesa» autorizado, o seu comportamento não pode dar origem a objeções baseadas na própria Decisão 2009/287. Esta, repito, não «impõe» nem exige a prestação do auxílio estatal e limita‑se a declarar a sua compatibilidade com o mercado interno.

    62.

    Sob esta reserva, na qual insistirei posteriormente, anuncio desde já que, das duas teses em presença, sou favorável, em termos gerais e em princípio, à segunda, ou seja, a uma «interpretação dinâmica», que tem em conta a alteração de circunstâncias. A Decisão 2009/287 permite que o ajustamento anual da compensação de custos ociosos corresponde à situação real do mercado no momento do seu pagamento, o que implica avaliar a evolução da concorrência e do próprio mercado. Deste ponto de vista, a composição dos grupos de empresas durante o ano a que se refere o ajustamento pode revelar um avanço ou um retrocesso das condições da concorrência reais do mercado da eletricidade, fator de ajustamento que a decisão não exclui.

    63.

    As disposições dos pontos 3.3 e 4.2 da metodologia dos custos ociosos apoiam a tomada em consideração de algumas das circunstâncias suscetíveis de alteração. De acordo com o ponto 3.3, «[p]ara estabelecer essa relação de causa e efeito, a Comissão terá em conta as descidas de preço da eletricidade ou as perdas de quota de mercado das empresas em causa». E segundo o ponto 4.2, «[o] dispositivo de pagamento do auxílio deve permitir ter em conta a evolução efetiva futura da concorrência». Evolução, esta, que «poderá ser avaliada nomeadamente através de fatores quantificáveis (preço, partes de mercado, outros fatores pertinentes indicados pelo Estado‑Membro)». Por último, em conformidade com o mesmo ponto, «o montante do auxílio pago será necessariamente condicionado ao desenvolvimento de uma concorrência verdadeira e o cálculo dos auxílios pagos gradualmente no tempo deverá ter em conta a evolução dos fatores pertinentes para a avaliação do nível de concorrência atingido».

    64.

    No entanto, deve presumir‑se que todos estes elementos de apreciação foram ponderados prospectivamente pela Comissão para adotar a Decisão 2009/287 e autorizar o regime de compensação estabelecido na Lei de 2007. A própria Comissão tinha consciência de que, ao examinar a compatibilidade dos auxílios relativos aos custos ociosos com o mercado interno, se pronunciava sobre um regime de compensação — o estabelecido na Lei de 2007 — destinado a ser aplicado a longo prazo e, portanto, sujeito a variações conjunturais. Os dados utilizados quando da aprovação da Lei de 2007 (que incluíam, entre outros, dados relativos à propriedade das unidades de produção e ao enquadramento das empresas em grupos de sociedades) não eram de natureza imutável.

    65.

    Em especial, no que aqui é relevante, a Comissão não podia, logicamente, ignorar a possibilidade de ocorrerem alterações posteriores na composição dos grupos consolidados e, com elas, uma alteração das condições de mercado suscetível de afetar o cálculo do ajustamento previsto na Lei de 2007. Embora o considerando 352 da Decisão 2009/287 dê nota de que «[a] Comissão [...] teve em conta o facto de o impacto dos custos ociosos ser calculado com referência aos grupos consolidados», a eventualidade de ocorrerem alterações na composição desses grupos não podia ser posta de parte.

    66.

    A posição da Comissão acerca da Lei de 2007, que foi adotada tomando como relevantes para o cálculo dos custos ociosos os dados que figuram no anexo 7 da mesma, não obsta, pois, a que alterações posteriores possam ter influência no ajustamento anual, caso afetem fatores previstos tanto na metodologia dos custos ociosos como na própria Decisão 2009/287.

    67.

    A situação concorrencial do setor da eletricidade era um desses fatores. Precisamente por esta razão, o ponto 4.3 da metodologia dos custos ociosos estabelece que «[o] Estado‑Membro deve assumir o compromisso de apresentar à Comissão o relatório anual destinado especialmente a especificar a evolução da situação concorrencial do seu mercado da eletricidade, indicando nomeadamente as oscilações verificadas a nível dos fatores quantificáveis pertinentes» ( 16 ). Segundo o considerando 369 da Decisão 2009/287, «[d]e acordo com o ponto 4.3 da metodologia dos custos ociosos, as autoridades polacas comprometeram‑se a apresentar à Comissão um relatório anual sobre a execução da [Lei de 2007]».

    68.

    Em meu entender, esta é a via idónea para adaptar o regime de compensação de custos ociosos previsto pela lei nacional às circunstâncias reais do mercado da eletricidade no momento de definir, em concreto, os sucessivos ajustamentos destes auxílios.

    69.

    As eventuais alterações verificadas na lista das unidades de produção atribuídas às empresas correspondentes (e, em consequência, aos grupos de empresas em que se integram), que constavam dos anexos à Lei de 2007, eram um dos «fatores quantificáveis» que o ponto 4.2 da metodologia dos custos ociosos considerava pertinentes para avaliar «a evolução efetiva futura da concorrência». Era, pois, um dado relevante para determinar o montante dos auxílios, cujo cálculo deveria ter em conta, «gradualmente no tempo[,] a evolução dos fatores pertinentes para a avaliação do nível de concorrência atingido».

    70.

    Considero que a Decisão 2009/287, na medida em que utiliza a metodologia dos custos ociosos, fornece o mecanismo para adequar, com o decurso do tempo, os auxílios estatais à evolução dos fatores que determinam o seu ajustamento anual. Se é verdade que a Decisão 2009/287 optou por uma «interpretação dinâmica» da composição dos grupos de empresas e das alterações verificadas na titularidade das unidades de produção, estabeleceu, para esse mesmo fim, a via da comunicação à Comissão, por parte dos Estados‑Membros, das alterações que podem sofrer os grupos consolidados referidos nos anexos da Lei de 2007.

    71.

    Enquanto as autoridades polacas não informassem a Comissão das alterações ocorridas em relação às unidades referidas no anexo 7 da Lei de 2007, teriam de respeitar o conteúdo desse anexo nos termos em que foi aprovado pela Comissão através da sua Decisão 2009/287. As referidas autoridades não podem aplicar elas próprias a metodologia dos custos ociosos quando realizam o ajustamento anual da compensação, sob pena de desvirtuarem a própria Decisão 2009/287.

    72.

    Na audiência, concluiu‑se que as autoridades polacas enviaram, oportunamente, o relatório anual a que se refere o ponto 4.3 da metodologia dos custos ociosos, do qual constavam as alterações verificadas na estrutura do mercado da eletricidade. A Comissão, segundo explicou o seu representante na audiência, tomou nota dessas alterações e considerou que, tendo as autoridades nacionais respeitado o limite máximo de pagamento fixado, não era adequado adotar nenhuma medida adicional, uma vez que a «interpretação dinâmica» da Decisão 2009/287 permitia, por si só, o ajustamento do cálculo da compensação.

    73.

    Uma vez aprovada pelas autoridades polacas a nova composição dos grupos de empresas e os seus efeitos na distribuição das centrais ou unidades de produção referidas nos anexos da Lei de 2007, a Comissão podia pronunciar‑se sobre a sua repercussão no cálculo do montante anual e, eventualmente, no exercício das suas competências exclusivas, adaptar as disposições da Decisão 2009/287 à nova situação do mercado. O pagamento de compensações, depois da alteração das circunstâncias constantes da Lei de 2007, não exige necessariamente a reabertura do procedimento de fiscalização prévia previsto no artigo 108.o TFUE. Tratar‑se‑ia, mais exatamente, de recorrer ao processo de ajustamento previsto na própria Decisão 2009/287, através do relatório anual a que se refere o seu considerando 369, que foi o que aconteceu no caso em apreço.

    74.

    Na minha opinião, os termos nos quais proponho que seja dada resposta à segunda questão prejudicial são compatíveis com a lógica do sistema do procedimento de autorização destes auxílios de Estado e, simultaneamente, respeitam, por um lado, a competência exclusiva da Comissão e, por outro, a melhor garantia de eficácia do próprio sistema, uma vez que asseguram a adequação do cálculo dos auxílios às circunstâncias existentes no momento em que são pagos.

    75.

    Importa precisar que a minha proposta diz exclusivamente respeito à dimensão comunitária do regime de auxílios previsto na Lei de 2007. Não compete ao Tribunal de Justiça interpretar o regime legal estabelecido na legislação polaca para fazer face aos problemas gerados pela transição para uma situação de concorrência no mercado da eletricidade nacional. As autoridades e os órgãos jurisdicionais polacos podem interpretar as suas próprias normas internas sobre auxílios relativos a custos ociosos no sentido que considerem conveniente, sob reserva, ou com o limite, de não ultrapassarem o montante dos auxílios estatais declarados compatíveis na Decisão 2009/287, nem desvirtuarem o seu conteúdo. Mais concretamente, nada impede que a sua interpretação da Lei de 2007, com base no conteúdo dos anexos ou com base na evolução das condições do mercado da eletricidade, tenha como consequência um maior ou menor montante anual de compensação de custos ociosos, desde que não seja ultrapassado o limite que referi.

    76.

    Quero com isto dizer que a Decisão 2009/287 apenas tem por objeto dar luz verde aos auxílios previstos pelas autoridades nacionais, uma vez declarada, pela Comissão, a sua compatibilidade com o mercado interno. Da perspetiva do artigo 107.o TFUE, não nasce um direito subjetivo à receção dos auxílios pelos seus eventuais beneficiários. Cabe às leis nacionais, conforme interpretadas pelos órgãos jurisdicionais competentes estabelecer se esse direito subjetivo existe e qual é o seu alcance.

    77.

    Por último, as autoridades polacas, mesmo autorizadas pela Comissão a concederem os auxílios controvertidos, poderiam, posteriormente, por razões estritamente internas e baseadas no seu direito nacional, reduzi‑los ou, mesmo, eliminá‑los, dentro dos limites impostos pelas suas próprias normas constitucionais. Paralelamente, uma decisão dos órgãos jurisdicionais nacionais que, ao interpretar a sua legislação interna, reduzisse os montantes de fundos públicos cujo pagamento às empresas do setor da eletricidade tivesse sido declarado compatível com o mercado interno (no caso em apreço, que ajustasse a compensação anual abaixo da que resulta da Decisão 2009/287) também não seria censurável à luz do artigo 107.o TFUE.

    78.

    Assim, proponho, que seja dada resposta à segunda questão prejudicial num duplo sentido: a) o artigo 107.o TFUE, em conjugação com o artigo 4.o, n.o 3, TUE, e o artigo 4.o, n.os 1 e 2, da Decisão 2009/287 e com os pontos 3.3 e 4.2 da metodologia dos custos ociosos, não se opõe a que o ajustamento anual dos custos ociosos seja realizado com base na situação dos grupos de empresas, como descrita na regulamentação nacional do regime de auxílios estatais autorizado pela Comissão, e b) compete ao órgão jurisdicional nacional interpretar o seu direito interno para solucionar, em conformidade com o mesmo, as consequências das alterações verificadas na composição dos grupos de empresas do setor da eletricidade beneficiárias dos auxílios estatais, desde que a fixação do montante desses auxílios, após o ajustamento provocado pelas novas circunstâncias, não ultrapasse o limite máximo indicado na Decisão 2009/287 nem a desvirtue.

    VII. Conclusão

    79.

    À luz das considerações expostas, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões submetidas, nos seguintes termos:

    «1)

    O artigo 107.o TFUE, em conjugação com o artigo 4.o, n.o 3, TUE e o artigo 4.o, n.o 2, da Decisão 2009/287/CE da Comissão, de 25 de setembro de 2007, relativa ao auxílio estatal concedido pela Polónia no âmbito de contratos de aquisição de energia de longo prazo e ao auxílio estatal que a Polónia tenciona conceder no âmbito de uma compensação a título da cessação voluntária dos contratos de aquisição de energia de longo prazo, deve ser interpretado no sentido de que, quando a Comissão Europeia declara que um auxílio estatal é compatível com o mercado interno, o órgão jurisdicional nacional não tem competência para verificar se as disposições internas que instituem aquele auxílio são conformes com as orientações da metodologia dos custos ociosos.

    2)

    O artigo 107.o TFUE, em conjugação com o artigo 4.o, n.o 3, TUE, e o artigo 4.o, n.os 1 e 2, da Decisão 2009/287 e com os pontos 3.3 e 4.2 da metodologia dos custos ociosos, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que o ajustamento anual dos custos ociosos seja realizado com base na situação dos grupos de empresas, como descrita na regulamentação nacional do programa de auxílios estatais autorizado pela Comissão. Compete ao órgão jurisdicional nacional interpretar o seu direito interno para solucionar, em conformidade com o mesmo, as consequências das alterações verificadas na composição dos grupos de empresas do setor da eletricidade beneficiárias dos auxílios estatais, desde que a fixação do montante desses auxílios, após o ajustamento provocado pelas novas circunstâncias, não ultrapasse os limites estabelecidos na Decisão 2009/287 nem a desvirtue.»


    ( 1 ) Língua original: espanhol.

    ( 2 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de dezembro de 1996 (JO L 27, p. 20).

    ( 3 ) Lei de 29 de junho de 2007, sobre as regras que regem a cobertura de custos incorridos pelos produtores com a cessação antecipada dos contratos de aquisição de energia a longo prazo (Ustawa o zasadach pokrywania kosztów powstałych u wytwórców w związku z przedterminowym rozwiązaniem umów długoterminowych sprzedaży mocy i energii elektrycznej, Dz. U. n.o 130, posição 905, conforme alterada, a seguir «Lei de 2007»).

    ( 4 ) Decisão da Comissão, de 25 de setembro de 2007, relativa ao auxílio estatal concedido pela Polónia no âmbito de contratos de aquisição de energia de longo prazo e ao auxílio estatal que a Polónia tenciona conceder no âmbito de uma compensação a título da cessação voluntária dos contratos de aquisição de energia de longo prazo (JO L 83, p. 1).

    ( 5 ) Documento da Comissão SG(2001) D/290869, de 6 de agosto de 2001, http://ec.europa.eu/competition/state_aid/legislation/specific_rules.html. A numeração da versão espanhola do seguinte texto difere da versão que existe em polaco (http://www.uokik.gov.pl/pomoc_publiczna_2.php#faq330).

    ( 6 ) JO 2009, C 85, p. 1.

    ( 7 ) Por todos, com caráter geral, acórdão Lucchini (C‑119/05, EU:C:2007:434, n.os 51 e 52).

    ( 8 ) Acórdão Deutsche Lufthansa (C‑284/12, EU:C:2013:755, n.o 27).

    ( 9 ) Acórdão Deutsche Lufthansa [C‑284/12, EU:C:2013:755, n.o 28, que faz referência aos acórdãos van Calster e o. (C‑261/01, EU:C:2003:571, n.o 75), e Transalpine Ölleitung in Österreich (C‑368/04, EU:C:2006:644, n.o 38)].

    ( 10 ) Como o Tribunal de Justiça recordou, no acórdão Lucchini (C‑119/05, EU:C:2007:434, n.o 53), «[e]mbora os órgãos jurisdicionais nacionais possam, em princípio, ser levados a examinar a validade de um ato comunitário, não são contudo competentes para por si próprios declarar a invalidade dos atos das instituições comunitárias (acórdão [...] Foto‑Frost, 314/85 [EU:C:1987:452], n.o 20). O Tribunal de Justiça é, portanto, o único competente para declarar a invalidade de um ato comunitário (acórdãos [...] Zuckerfabrik Süderdithmarschen e Zuckerfabrik Soest, C‑143/88 e C‑92/89 [EU:C:1991:65], n.o 17, e [...] IATA e ELFAA, C‑344/04 [EU:C:2006:10], n.o 27)».

    ( 11 ) Página 13 do original do pedido de reenvio.

    ( 12 ) Página 14 do original do pedido de reenvio.

    ( 13 ) Página 16 do original do pedido de reenvio.

    ( 14 ) Ibidem.

    ( 15 ) Página 11 do original do pedido de reenvio.

    ( 16 ) Este relatório, prossegue o referido ponto, «apresentará pormenorizadamente o cálculo dos custos ociosos tomados em conta no ano correspondente e especificará os montantes de auxílio pagos».

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