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Document 62014CC0301

Conclusões da advogada-geral E. Sharpston apresentadas em 10 de setembro de 2015.
Pfotenhilfe-Ungarn e. V. contra Ministerium für Energiewende, Landwirtschaft, Umwelt und ländliche Räume des Landes Schleswig-Holstein.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesverwaltungsgericht.
Reenvio prejudicial — Regulamento (CE) n.° 1/2005 — Artigo 1.°, n.° 5 — Proteção dos animais durante o transporte — Transporte de cães sem dono de um Estado‑Membro para outro efetuado por uma associação de proteção de animais — Conceito de ‘atividade económica’ — Diretiva 90/425/CEE — Artigo 12.° — Conceito de ‘operador que procede ao comércio intracomunitário’.
Processo C-301/14.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2015:589

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

ELEANOR SHARPSTON

apresentadas em 10 de setembro de 2015 ( 1 )

Processo C‑301/14

Pfotenhilfe‑Ungarn e.V.

contra

Ministerium für Energiewende, Landwirtschaft, Umwelt und ländliche Räume des Landes Schleswig‑Holstein

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesverwaltungsgericht (Alemanha)]

«Agricultura — Regulamento (CE) n.o 1/2005 — Proteção dos animais durante o transporte — Transporte de animais ‘em relação com atividades económicas’ — Diretiva 90/425/CEE — Controlos veterinários e zootécnicos no comércio intracomunitário — ‘Operadores que procedem ao comércio intracomunitário’ de animais — Associação sem fins lucrativos que transporta cães abandonados de um Estado‑Membro para outro, com vista à sua entrega a terceiros, mediante o pagamento de uma contribuição»

1. 

O presente pedido de decisão prejudicial surge no contexto de um processo pendente no Bundesverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Federal, Alemanha; a seguir «órgão jurisdicional de reenvio») entre a Pfotenhilfe‑Ungarn, uma associação alemã de proteção dos animais, e o Ministerium für Energiewende, Landwirtschaft, Umwelt und ländliche Räume des Landes Schleswig‑Holstein (Ministério das Energias Renováveis, da Agricultura, do Ambiente e dos Espaços Rurais do Land de Schleswig‑Holstein, a seguir «Ministério»). A Pfotenhilfe‑Ungarn transporta cães abandonados da Hungria para a Alemanha, com vista à sua entrega a terceiros, mediante o pagamento de uma contribuição. O Ministério trata o transporte e a entrega como atividades económicas. Consequentemente, considera que a Pfotenhilfe‑Ungarn desrespeitou os requisitos de notificação e registo impostos pela legislação alemã que transpõe a Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos ( 2 ), por um lado, e o Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte ( 3 ), por outro. A Pfotenhilfe‑Ungarn alega que esse transporte não tem fins lucrativos e que, por conseguinte, está sujeito ao regime menos rigoroso estabelecido no Regulamento relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia ( 4 ).

2. 

Em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pede esclarecimentos sobre a possibilidade de o transporte de animais sem fins lucrativos poder, ainda assim, ser efetuado «em relação com atividades económicas» e, por esse motivo, ser regido pelo Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte. O órgão jurisdicional de reenvio pergunta também se, numa situação como a do processo principal, uma associação como a Pfotenhilfe‑Ungarn é um «operador [...] que procede [...] ao comércio intracomunitário» de animais, na aceção da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos (em caso afirmativo, impendem sobre a associação as obrigações de notificação e registo estabelecidas na diretiva).

3. 

O presente pedido de decisão prejudicial oferece ao Tribunal de Justiça a oportunidade de esclarecer o âmbito de aplicação e os objetivos dos vários regimes da União Europeia que regulam o transporte de animais entre Estados‑Membros. Assim, começarei por salientar os requisitos impostos por esses diferentes regimes.

Direito da União

TFUE

4.

O artigo 13.o TFUE dispõe:

«Na definição e aplicação das políticas da União nos domínios da agricultura, da pesca, dos transportes, do mercado interno, da investigação e desenvolvimento tecnológico e do espaço, a União e os Estados‑Membros terão plenamente em conta as exigências em matéria de bem‑estar dos animais, enquanto seres sensíveis, respeitando simultaneamente as disposições legislativas e administrativas e os costumes dos Estados‑Membros, nomeadamente em matéria de ritos religiosos, tradições culturais e património regional.»

Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte

5.

De acordo com o considerando 6 do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte, o seu objetivo é prevenir a ocorrência e a propagação de doenças animais infeciosas e estabelecer requisitos mais estritos no sentido de evitar a dor e o sofrimento a fim de preservar o bem‑estar e a saúde dos animais durante e após o transporte. Nos termos do considerando 11, as disposições do regulamento devem ser interpretadas e aplicadas de acordo com o princípio de que os animais não devem ser transportados em condições suscetíveis de lhes causar lesões ou sofrimentos desnecessários ( 5 ).

6.

Segundo o considerando 12, o transporte para fins comerciais não se limita aos transportes que impliquem uma troca imediata de dinheiro, de bens ou de serviços, mas inclui nomeadamente os transportes que induzam ou tendam a produzir direta ou indiretamente um lucro.

7.

O Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte é aplicável ao transporte de animais vertebrados vivos (abrangendo, portanto, os cães) dentro da União Europeia (artigo 1.o, n.o 1), sem prejuízo da legislação da União no domínio veterinário (artigo 1.o, n.o 4). Porém, o artigo 1.o, n.o 5 especifica que o regulamento não se aplica, nomeadamente, ao transporte de animais que não seja efetuado em relação com atividades económicas ( 6 ).

8.

O artigo 2.o, alínea m) define «viagem de longo curso» como uma viagem que exceda oito horas contadas a partir do momento em que o primeiro animal da remessa é deslocado. De acordo com o artigo 2.o, alínea w), entende‑se por «transporte» a circulação de animais efetuada por um ou mais meios de transporte e as operações afins, incluindo o carregamento, o descarregamento, a transferência e o repouso, até ao final do descarregamento dos animais no local de destino. O artigo 2.o, alínea x) define «transportador» como qualquer pessoa singular ou coletiva que transporte animais por conta própria ou por conta de terceiros.

9.

Por força do artigo 3.o, primeiro parágrafo, ninguém pode proceder ou mandar proceder ao transporte de animais em condições suscetíveis de lhes causar lesões ou sofrimentos desnecessários. O segundo parágrafo estabelece um conjunto de condições gerais aplicáveis ao transporte de animais, destinadas a minimizar o fardo do transporte para os animais em questão.

10.

O Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte impõe igualmente requisitos que respeitam, designadamente: i) à documentação de transporte (artigo 4.o); ii) às obrigações de planeamento relativas ao transporte de animais (artigo 5.o); iii) à legitimidade para atuar como transportador, nomeadamente a autorização para efetuar viagens de longo curso (artigos 6.° e 10.° a 12.°); iv) à inspeção prévia e à aprovação dos meios de transporte, especialmente nas viagens de longo curso (artigo 7.o); v) às obrigações dos detentores de animais no local de partida, de transferência ou de destino de garantir a observância de certas normas técnicas relativas aos animais transportados e às obrigações dos detentores de animais num local de trânsito ou de destino de controlar todos os animais para determinar se são ou foram submetidos a uma viagem de longo curso (artigo 8.o); vi) aos controlos a efetuar pela autoridade competente em qualquer fase da viagem de longo curso, numa base aleatória ou orientada (artigo 15.o); e vii) à concessão de certificados de aprovação dos meios de transporte rodoviário utilizados para viagens de longo curso (artigo 18.o).

11.

Nos termos do artigo 6.o, n.o 3, os animais devem ser transportados de acordo com as normas técnicas estabelecidas no anexo I. Estas normas preveem, em especial, que os animais feridos ou que apresentem problemas fisiológicos ou patologias não podem ser considerados aptos a serem transportados (anexo I, capítulo I, ponto 2). Os meios de transporte, contentores e respetivos equipamentos devem ser concebidos, construídos, mantidos e utilizados de forma a evitar ferimentos e sofrimento e garantir a segurança dos animais; a proteger os animais das intempéries, temperaturas extremas e variações meteorológicas desfavoráveis; serem limpos e desinfetados; garantir a manutenção da qualidade e quantidade de ar adequadas à espécie transportada; e apresentarem uma superfície de chão que seja antiderrapante e que minimize os derrames de urina e fezes (anexo I, capítulo II, ponto 1.1). No interior do compartimento dos animais e em cada um dos seus níveis, deve ser previsto espaço suficiente para assegurar uma ventilação adequada acima dos animais, quando estes se encontrem naturalmente de pé, sem que de forma alguma sejam entravados os seus movimentos naturais (anexo I, capítulo II, ponto 1.2).

12.

As normas técnicas proíbem também, nomeadamente, que os animais sejam golpeados ou pontapeados, levantados ou arrastados pela cabeça, orelhas, cornos, patas, cauda ou velo ou que sejam utilizados aguilhões ou outros instrumentos pontiagudos (anexo I, capítulo III, ponto 1.8). Além disso, os animais de tamanhos ou idades significativamente diferentes, os machos e fêmeas sexualmente maduros e os animais hostis entre si devem ser manuseados e transportados separadamente (anexo I, capítulo III, ponto 1.12). Durante o transporte, os cães e gatos devem ser alimentados a intervalos que não excedam 24 horas e abeberados a intervalos que não excedam oito horas, em conformidade com instruções redigidas com clareza acerca da sua alimentação e abeberamento (anexo I, capítulo V, ponto 2.2).

Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos

13.

A Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos tem como objetivo a realização do mercado interno. Elimina os obstáculos à livre circulação dos animais e produtos agrícolas que resultavam dos controlos veterinários e zootécnicos efetuados pelas autoridades nacionais nas fronteiras internas da Comunidade ( 7 ), introduzindo um sistema harmonizado de controlos veterinários e zootécnicos no local de origem (ou de expedição) e no local de destino ( 8 ).

14.

Por força do artigo 1.o, primeiro parágrafo, os Estados‑Membros deixam de poder efetuar nas fronteiras os controlos veterinários dos animais vivos e dos produtos abrangidos, nomeadamente, pelas diretivas referidas no anexo A, ficando obrigados a efetuar esses controlos em conformidade com o disposto na Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos. O anexo A refere, em especial, a Diretiva 91/628/CEE do Conselho ( 9 ), que era aplicável aos cães. Atualmente, esta referência deve ser entendida como uma referência ao Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte, que revogou e substituiu a Diretiva 91/628/CEE e que também é aplicável aos cães ( 10 ). Consequentemente, a Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos aplica‑se aos cães.

15.

O artigo 1.o, quarto parágrafo dispõe que a diretiva não se aplica aos controlos veterinários relativos à deslocação entre Estados‑Membros, sem objetivo comercial, de animais de companhia que acompanhem pessoas por eles responsáveis durante essa deslocação.

16.

O artigo 2.o, n.o 3 define «comércio» como «o comércio entre Estados‑Membros, na aceção do n.o 2 do artigo 9.o do Tratado [CEE; atual artigo 28.o, n.o 2, TFUE] ( 11 ).

17.

Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, os Estados‑Membros estão obrigados a assegurar que os animais abrangidos pela diretiva só possam ser destinados ao comércio quando preencham determinadas condições. Em concreto, esses animais devem preencher os requisitos das diretivas pertinentes mencionadas no anexo A e devem provir de uma exploração, de um centro ou de um organismo que se encontre sujeito a controlos veterinários oficiais regulares. Além disso, durante o transporte, devem ser acompanhados dos certificados sanitários e/ou quaisquer outros documentos previstos nas diretivas pertinentes enumeradas no anexo A e emitidos pelo veterinário oficial responsável pela exploração, pelo centro ou pelo organismo de origem.

18.

De acordo com o artigo 4.o, n.o 1, os Estados‑Membros de expedição tomarão as medidas necessárias para garantir, em especial, que os animais abrangidos pela diretiva sejam controlados, do ponto de vista veterinário, de forma pelo menos tão cuidadosa como se fossem destinados ao mercado nacional, e que sejam transportados em meios de transporte adequados que satisfaçam as normas de higiene.

19.

Por força do artigo 5.o, n.o 1, alínea a), segundo período, a autoridade competente do Estado‑Membro de destino pode, nomeadamente, efetuar controlos durante o transporte dos animais caso disponha de elementos de informação que lhe permitam presumir uma infração a qualquer dos requisitos do artigo 3.o

20.

O artigo 12.o impõe aos Estados‑Membros, entre outras, a obrigação de providenciarem para que todos os operadores que procedem ao comércio intracomunitário de animais abrangidos pela Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos sejam obrigados, a pedido da autoridade competente, a efetuar um registo prévio num registo oficial e a manter um livro de registos das entregas.

Diretiva relativa à polícia sanitária no comércio de animais

21.

A Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos foi complementada pela Diretiva 92/65/CEE do Conselho, de 13 de julho de 1992, que define as condições de polícia sanitária que regem o comércio e as importações na Comunidade de animais, sémens, óvulos e embriões não sujeitos, no que se refere às condições de polícia sanitária, às regulamentações comunitárias específicas referidas na secção I do anexo A da Diretiva 90/425/CEE ( 12 ). Esta diretiva tem por objetivo a liberalização do comércio de animais e de produtos de origem animal, sem prejuízo do recurso a eventuais medidas de salvaguarda ( 13 ).

22.

Por força do artigo 1.o, primeiro parágrafo, a Diretiva relativa à polícia sanitária no comércio de animais define as regras de polícia sanitária que regem a colocação no mercado de animais que não sejam, designadamente, bovinos, suínos, ovinos e caprinos, equídeos, aves de capoeira, peixes e moluscos bivalves ( 14 ). Por conseguinte, aplica‑se à colocação de cães no mercado.

23.

O artigo 2.o, n.o 1, alínea a) dispõe que «comércio» tem o mesmo significado que lhe é dado no artigo 2.o, n.o 3, da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos ( 15 ).

24.

O artigo 3.o, n.o 1 exige aos Estados‑Membros que assegurem que o comércio dos animais abrangidos não seja proibido ou restringido por motivos de polícia sanitária que não sejam resultantes da aplicação da diretiva ou da legislação da União e, nomeadamente, das medidas de salvaguarda eventualmente tomadas.

25.

De acordo com os artigos 4.° e 10.°, n.o 2, os cães só podem ser objeto de comércio se estiverem satisfeitas determinadas condições. Concretamente, têm de estar preenchidos os requisitos estabelecidos no artigo 5.o do Regulamento relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia ( 16 ). O certificado que acompanha os animais deve comprovar a realização, 24 horas antes da expedição, por um veterinário habilitado pela autoridade competente, de um exame clínico cuja conclusão indique que os animais são saudáveis e estão aptos a suportar o transporte até ao local de destino. Além disso, os cães deverão ser provenientes de explorações ou estabelecimentos comerciais que se encontrem registados junto da autoridade competente. Tais explorações ou estabelecimentos comerciais comprometem‑se, em especial: i) a mandar examinar regularmente pela autoridade competente os animais detidos, nos termos do artigo 3.o, n.o 3, da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos; ii) a declarar à autoridade competente o aparecimento de determinadas doenças; iii) a só colocar no mercado, para efeitos de comércio, os animais que não apresentem qualquer sintoma de doença e que sejam provenientes de explorações ou de zonas que não sejam objeto de qualquer medida de proibição por razões de polícia sanitária; e iv) a respeitar as exigências destinadas a assegurar o bem‑estar dos animais detidos.

26.

O artigo 12.o, n.o 3, estabelece que, para efeitos de comércio, o disposto no artigo 12.o da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos passa a ser extensivo aos estabelecimentos comerciais que detenham, nomeadamente, cães em permanência ou a título ocasional.

Regulamento relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia

27.

O artigo 1.o do Regulamento relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia fixa as condições de polícia sanitária (saúde animal) a observar em matéria de circulação sem caráter comercial de animais de companhia, assim como as regras relativas ao controlo dessa circulação.

28.

O artigo 3.o, alínea a), define «animais de companhia» como «os animais das espécies referidas na lista do anexo I que acompanham o seu proprietário ou uma pessoa singular por eles responsável em nome do proprietário, aquando da sua circulação e que não sejam destinados a ser objeto de venda ou de transferência de propriedade». A parte A do anexo I respeita especificamente aos cães. De acordo com o artigo 3.o, alínea c), por «circulação» entende‑se «qualquer deslocação de um animal de companhia entre Estados‑Membros, a sua introdução ou reintrodução no território da Comunidade em proveniência de um país terceiro».

29.

Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, os animais de companhia devem, aquando da respetiva circulação, estar identificados por uma tatuagem claramente legível ou por um sistema de identificação eletrónica e estar acompanhados de um passaporte emitido por um veterinário habilitado pela autoridade competente, que comprove uma vacinação antirrábica.

Direito alemão

30.

O § 4 da Binnenmarkt‑Tierseuchenschutzverordnung (Regulamento relativo à prevenção de doenças animais infeciosas no mercado interno; a seguir «Verordnung»), que transpõe para o direito alemão o artigo 12.o, alínea a), da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos, estabelece essencialmente que quem pretenda, no âmbito de uma atividade comercial («gewerbsmäβig»), transportar animais na União ou importar animais para a União deverá notificar da sua intenção a autoridade competente. Seguidamente, a autoridade competente procederá ao registo dessa pessoa, à qual atribuirá um número de registo.

Matéria de facto, tramitação processual e questão prejudicial

31.

A Pfotenhilfe‑Ungarn é uma associação de proteção dos animais registada na Alemanha. Para efeitos da legislação fiscal alemã, constitui uma associação de utilidade pública.

32.

As atividades da Pfotenhilfe‑Ungarn compreendem a entrega de cães abandonados provenientes de organizações húngaras de proteção de animais a novos donos na Alemanha. No seu sítio Web, a Pfotenhilfe‑Ungarn publica anúncios sobre os cães que precisam de colocação. As pessoas interessadas em adotar um cão celebram com a Pfotenhilfe‑Ungarn um «contrato de proteção» por meio do qual se comprometem a cuidar do animal de forma responsável e a pagar uma contribuição (habitualmente 270 euros) à associação. Esta quantia representa uma contribuição para cobrir as despesas em que a Pfotenhilfe‑Ungarn incorre com a prestação de cuidados aos cães e com o transporte para os seus novos lares. Os membros da Pfotenhilfe‑Ungarn transportam os cães a colocar na Alemanha e entregam‑nos aos seus novos donos. Não se verifica uma transmissão da propriedade. Se o novo dono violar o contrato de proteção, a Pfotenhilfe‑Ungarn tem o direito de recuperar o animal. Na audiência, a Pfotenhilfe‑Ungarn explicou que o novo dono se compromete, nomeadamente, a mandar castrar o cão recebido e a não o entregar a quaisquer terceiros. Caso um cão doente ou idoso tenha de ser abatido, o novo dono deve contactar previamente a Pfotenhilfe‑Ungarn e obter a autorização desta.

33.

Em 29 de dezembro de 2009, a Pfotenhilfe‑Ungarn transportou um conjunto de 39 cães da Hungria para a Alemanha. Tendo detetado a falta do documento relativo à situação sanitária e de vacinação de um dos cães, o Ministério enviou uma circular aos serviços das autoridades regionais veterinárias competentes, ordenando que procedessem ao controlo de todos os animais da remessa em questão. Quando a Pfotenhilfe‑Ungarn contestou a circular, o Ministério respondeu que o transporte e a entrega dos cães efetuados pela associação eram uma atividade económica. Por conseguinte, a associação estava obrigada ao cumprimento dos requisitos de registo e notificação impostos pelo § 4 da Verordnung e das disposições do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte.

34.

As objeções da Pfotenhilfe‑Ungarn à decisão do Ministério são agora objeto de um recurso interposto no órgão jurisdicional de reenvio, que suspendeu a instância e apresentou um pedido de decisão prejudicial sobre as seguintes questões:

«1.

Constitui transporte de animais não efetuado no âmbito de atividades económicas, na aceção do artigo 1.o, n.o 5, do [Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte], o transporte efetuado por uma associação de proteção de animais reconhecida como de utilidade pública e destinada a entregar a terceiros cães abandonados, mediante o pagamento de determinada quantia («contribuição de proteção») que:

a)

não cobre ou cobre estritamente as despesas que a associação suportou com o animal, o transporte e a sua entrega,

b)

é superior a essas despesas, mas cujo lucro se destina a financiar as despesas em dívida feitas com outros animais abandonados e com a sua entrega, ou com outros projetos de proteção de animais?

2.

Constitui uma empresa que procede ao comércio intracomunitário na aceção do artigo 12.o da [Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos], uma associação de proteção dos animais reconhecida como de utilidade pública que introduz cães abandonados na Alemanha e os entrega a terceiros, mediante o pagamento de determinada quantia («contribuição de proteção») que:

a)

não cobre ou cobre estritamente as despesas que a associação suportou com o animal, o transporte e a sua entrega,

b)

é superior a essas despesas, mas cujo lucro se destina a financiar as despesas efetuadas com a entrega de outros animais abandonados ou outros projetos de proteção de animais que ficaram sem cobertura financeira?»

35.

Foram apresentadas observações escritas pela Pfotenhilfe‑Ungarn, pelo Ministério, pelos Governos austríaco e italiano, e pela Comissão Europeia. A Pfotenhilfe‑Ungarn, o Ministério e a Comissão apresentaram observações orais na audiência que teve lugar em 3 de junho de 2015.

Apreciação

Observações preliminares

36.

No essencial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se os conceitos de «atividades económicas», na aceção do artigo 1.o, n.o 5, do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte, e de «operador [...] que procede [...] ao comércio intracomunitário» de animais, na aceção do artigo 12.o da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos, implicam necessariamente a intenção de obter lucro.

37.

Para responder a esta questão de princípio, não é necessário que o Tribunal de Justiça determine com precisão o que é efetivamente coberto pela contribuição paga à Pfotenhilfe‑Ungarn por cada cão entregue. As questões prejudiciais sugerem que o valor da contribuição pode ser inferior ao das despesas em que a associação incorre com o acolhimento de cada cão, com a prestação de cuidados ao animal e com o transporte para o seu novo dono, ou que apenas cobre estas despesas. Também é possível que o valor da contribuição seja superior ao dessas despesas, servindo o excedente para ajudar a financiar as despesas em dívida feitas com outros animais abandonados e com a sua entrega, ou com outros projetos de proteção de animais. A apreciação desta questão de facto é matéria da competência do órgão jurisdicional nacional.

38.

Além disso, a Pfotenhilfe‑Ungarn alega que a resposta às questões prejudiciais é suscetível de afetar o seu estatuto de organização de utilidade pública ao abrigo da lei fiscal alemã. Porém, o único objetivo do presente pedido de decisão prejudicial é o de prestar ao órgão jurisdicional de reenvio as orientações necessárias para a eficaz resolução do litígio pendente ( 17 ). Para esse efeito, o que é necessário é esclarecer o âmbito de aplicação do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte e da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos, e não explorar as consequências que dessa interpretação podem advir para a Pfotenhilfe‑Ungarn fora do contexto do processo principal.

39.

Por último, os atos de direito derivado da União acima referidos ( 18 ) contemplam essencialmente dois tipos de situações, aplicando‑se a cada uma um regime distinto. A primeira respeita ao transporte de animais de companhia que acompanham os seus proprietários ou uma pessoa singular por eles responsável, em nome do proprietário, aquando da sua circulação. A este tipo de circulação aplica‑se o Regulamento relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia, salvo nos casos em que o transporte se destina à venda do animal ou à sua transferência para um novo proprietário ( 19 ). A segunda situação respeita à circulação transfronteiras de animais, no âmbito de transações de natureza comercial. A estas situações aplica‑se o regime muito mais rigoroso estabelecido pelo Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte, pela Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos e pela Diretiva relativa à polícia sanitária no comércio de animais.

40.

No meu entender, a lógica subjacente a esta distinção tem duas vertentes.

41.

Em primeiro lugar, conforme explicado pela Comissão na audiência, a circulação transfronteiras de animais com os seus proprietários habitualmente implica menor contacto com outros animais e outras pessoas do que o transporte de animais efetuado no âmbito de transações comerciais. Consequentemente, naqueles casos, o risco de propagação de doenças contagiosas é mais reduzido, não sendo necessário aplicar a esse transporte a Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos, nem a Diretiva relativa à polícia sanitária no comércio de animais ( 20 ).

42.

Em segundo lugar, existe a presunção de que o proprietário de um animal de companhia efetuará o seu transporte em condições que não lhe provoquem lesões ou sofrimentos desnecessários. Portanto, o legislador da União considerou não ser necessária, nesses casos, a aplicação do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte ( 21 ).

43.

É evidente que o legislador não contemplou especificamente o caso das associações sem fins lucrativos, como a Pfotenhilfe‑Ungarn, que se dedicam à proteção dos animais, procedendo ao seu transporte e entrega a novos donos, mediante o pagamento de uma contribuição.

44.

Parece‑me também claro que, independentemente da resposta às questões prejudiciais, esta lacuna legislativa terá provavelmente algumas consequências infelizes. Se for imposto o cumprimento dos requisitos específicos do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte e da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos, é muito possível que o acréscimo de encargos financeiros e administrativos limite a capacidade das associações como a Pfotenhilfe‑Ungarn de promoverem o bem‑estar dos animais, como fazem atualmente. Se tais requisitos não se aplicarem, corre‑se o risco de os animais serem transportados em condições que possibilitem a propagação de doenças e prejudiquem a saúde e o bem‑estar dos animais (e das pessoas).

Questão 1: transporte de animais «em relação com atividades económicas », na aceção do artigo 1.o, n.o 5, do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte

45.

O Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte é aplicável apenas ao transporte de animais efetuado «em relação com atividades económicas» ( 22 ). A atividade de entrega de animais realizada pela Pfotenhilfe‑Ungarn, quando considerada no seu todo (ou seja, a recolha de cães abandonados, a prestação dos cuidados necessários, o anúncio no seu sítio Web de cães disponíveis para entrega, a celebração dos contratos de proteção e o transporte dos cães até aos seus novos donos contra o pagamento de uma contribuição) constitui uma «atividade económica», ainda que seja exercida sem fins lucrativos?

46.

Não obstante o conceito de «atividade económica» não ter sempre exatamente o mesmo significado no direito da União ( 23 ), o Tribunal de Justiça já sustentou em repetidas ocasiões que uma atividade pode ter natureza económica mesmo que a pessoa que a prossegue não vise a obtenção de lucro.

47.

Portanto, é jurisprudência assente que as atividades que consistem na oferta de bens ou serviços num mercado estão abrangidas pelo âmbito de aplicação das regras de concorrência do Tratado ( 24 ). O facto de uma pessoa não visar a obtenção de lucro, mas oferecer no mercado bens ou serviços que concorram com os dos operadores que exercem atividades com fins lucrativos, não impede que essa pessoa se qualifique como uma «empresa» à qual se aplica, nomeadamente, a proibição de acordos anticoncorrenciais ou de auxílios estatais ( 25 ). Como afirmou o advogado‑geral F. G. Jacobs, o teste básico para verificar se uma atividade possui natureza económica e se, por conseguinte, está sujeita às regras de concorrência da UE, consiste em «verificar se essa atividade poderia ser, pelo menos em princípio, exercida por uma empresa privada com fins lucrativos» ( 26 ).

48.

O Tribunal de Justiça tem seguido uma abordagem idêntica noutros contextos. Por exemplo, o facto de um adjudicatário estar constituído sob a forma jurídica de uma associação de direito privado e não prosseguir fins lucrativos não exclui que possa exercer uma atividade económica. Por conseguinte, tais circunstâncias não são pertinentes para efeito da aplicação das regras do direito da União em matéria de contratos públicos ( 27 ). Do mesmo modo, o facto de uma pessoa exercer uma atividade sem fins lucrativos não é, em si mesmo, suficiente para privar essa atividade do seu caráter económico e excluí‑la do âmbito de aplicação das disposições do direito da União em matéria de livre prestação de serviços ( 28 ). Nem tão‑pouco dispensa essa pessoa do cumprimento dos requisitos do direito da União respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ( 29 ). Também resulta claramente do artigo 9.o, n.o 1, primeiro período, da Diretiva IVA ( 30 ) que, em princípio, esta diretiva é aplicável independentemente de a atividade económica ser ou não exercida com fins lucrativos. Nos termos desta disposição, entende‑se por «sujeito passivo»«qualquer pessoa que exerça, de modo independente e em qualquer lugar, uma atividade económica, seja qual for o fim ou o resultado dessa atividade». O artigo 132.o, n.o 1, alíneas l) e m), da Diretiva IVA, que isenta determinadas atividades exercidas por organismos sem fins lucrativos, vem reforçar aquele entendimento. Tais atividades não careceriam de uma isenção específica se não constituíssem atividades económicas ( 31 ).

49.

Tanto a letra e o contexto do artigo 1.o, n.o 5 como os objetivos do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte apoiam o entendimento de que ao conceito de «atividades económicas» nesta disposição não deve ser dado um significado diferente daquele que assume habitualmente no direito da União.

50.

Em primeiro lugar, ao estabelecer que o regulamento «não é aplicável ao transporte de animais que não seja efetuado em relação com atividades económicas», o artigo 1.o, n.o 5, não distingue entre atividades económicas que visam e que não visam lucros financeiros. Tão‑pouco recorre ao conceito de «transporte para fins comerciais».

51.

Em segundo lugar, o considerando 12 do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte limita‑se a explicar que o «transporte para fins comerciais» deve ser entendido em sentido lato, não fornecendo orientações úteis para a interpretação do conceito de «atividades económicas» do artigo 1.o, n.o 5, do regulamento.

52.

Por seu turno, o considerando 21 parece indicar que certas atividades que não visam a obtenção de lucro podem, ainda assim, constituir «atividades económicas» na aceção do artigo 1.o, n.o 5. Nas palavras deste considerando, os equídeos registados são frequentemente transportados «para fins não comerciais», designadamente, para competições, corridas, eventos culturais ou procriação. Este facto justifica a derrogação de certas disposições (mas não todas) do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte. Portanto, é evidente que o transporte de animais «para fins não comerciais» pode ser efetuado «em relação com atividades económicas». Caso contrário, não teria sido necessário estabelecer derrogações expressas.

53.

Além disso, a limitação do âmbito de aplicação do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte às atividades económicas com fins lucrativos pode obviamente comprometer o objetivo principal desse diploma, que é a proteção dos animais durante o transporte ( 32 ). Na situação que deu origem ao processo principal, numa remessa única, foi transportado um número significativo de cães através das fronteiras internas da União. Por conseguinte, estes animais foram potencialmente expostos a, pelo menos, alguns dos riscos para a saúde e para o bem‑estar dos animais que o Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte tem por objetivo minimizar ( 33 ). Uma vez que — como, no essencial, observaram na audiência a Pfotenhilfe‑Ungarn e a Comissão — os cães abandonados se encontram habitualmente em pior situação sanitária do que os outros cães, afigura‑se‑me que esses riscos não podem ser razoavelmente ignorados.

54.

Também não posso aceitar a observação da Pfotenhilfe‑Ungarn de que o Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte não deve ser aplicável à sua atividade de entrega de cães abandonados apenas porque o objetivo da associação consiste especificamente na proteção dos animais. Ainda que esse objetivo seja totalmente louvável, só por si não chega para eliminar a possibilidade de a associação (involuntariamente, sem dúvida) transportar animais em condições suscetíveis de lhes causar lesões ou sofrimentos desnecessários ou de inadvertidamente agravar uma doença não detetada.

55.

Finalmente, a referida interpretação do artigo 1.o, n.o 5, é consentânea com o artigo 13.o TFUE e também com a Convenção n.o 193 do Conselho da Europa sobre a proteção dos animais durante o transporte internacional (a seguir «convenção») que a União assinou ( 34 ) e à qual o preâmbulo do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte faz referência ( 35 ). Ainda que a circulação de animais entre os Estados‑Membros não seja, em si, regida pela convenção ( 36 ), esta e o Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte prosseguem essencialmente o mesmo objetivo de preservação do bem‑estar dos animais durante o transporte ( 37 ). Além disso, os dois instrumentos assentam nos mesmos princípios ( 38 ). O relatório explicativo da convenção, aprovado pelo Comité dos Ministros do Conselho da Europa em 11 de junho de 2003, afirma expressamente que o transporte abrangido pela convenção pode «prosseguir objetivos de natureza comercial ou não comercial».

56.

Por conseguinte, concluo que uma associação sem fins lucrativos efetua o transporte de animais «em relação com atividades económicas» na medida em que esse transporte seja parte de uma oferta de bens ou serviços num determinado mercado. Será esse o caso na situação em apreço?

57.

Afigura‑se‑me evidente que uma associação sem fins lucrativos opera no mercado de animais de companhia quando exerce uma atividade como a que está em apreço no processo principal. O facto de certos produtos ou serviços serem, numa certa medida, suscetíveis de satisfazer necessidades idênticas permite concluir que existe um certo grau de substituição entre eles ( 39 ) e que, por conseguinte, são oferecidos no mesmo mercado. Ainda que o contrato de proteção celebrado entre a Pfotenhilfe‑Ungarn e uma determinada pessoa não implique qualquer transferência de propriedade ( 40 ), depois de pagar a contribuição essa pessoa passa a ser o novo dono do cão e compromete‑se a cuidar dele de forma responsável. Nesse aspeto, a situação não difere fundamentalmente da aquisição de um cão numa loja de animais. Além disso, é normal que as associações como a Pfotenhilfe‑Ungarn ofereçam uma grande variedade de cães, de diferentes raças, idades e portes ( 41 ). Portanto, existe pelo menos um certo grau de sobreposição entre a atividade de entrega de cães a novos donos, mediante o pagamento de uma contribuição, como a que está em causa no processo principal, e a atividade de venda de cães exercida pelas lojas de animais ( 42 ).

58.

Por conseguinte, no meu entender, uma associação como a Pfotenhilfe‑Ungarn efetua o transporte de animais em relação com atividades económicas, na aceção do artigo 1.o, n.o 5, do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte, nos casos em que transporta animais entre Estados‑Membros, com vista à sua entrega a terceiros e contra o pagamento de uma contribuição, independentemente de tal atividade ter ou não fins lucrativos.

Questão 2: «comércio intracomunitário » de animais, na aceção da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos

59.

Com a segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pede esclarecimentos sobre o artigo 12.o da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos. Para dar uma resposta útil a esta questão, é necessário começar por apurar se a circulação de animais como a que está em apreço no processo principal se encontra sequer abrangida por esta diretiva. Conforme já expliquei, esta diretiva não se aplica aos controlos veterinários relativos à deslocação entre Estados‑Membros, sem objetivo comercial, de animais de companhia que acompanhem pessoas por eles responsáveis durante essa deslocação ( 43 ).

60.

Decorre claramente da letra do artigo 1.o, quarto parágrafo, da diretiva que esta disposição abrange apenas a deslocação de animais de companhia que: i) acompanhem ii) as pessoas [singulares] por eles responsáveis. A essa deslocação aplica‑se o regulamento relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia, desde que os animais não se destinem a ser objeto de venda ou de transferência de propriedade para outro proprietário. ( 44 ). Conforme salienta a Comissão, a derrogação compreendida nesta disposição não respeita, portanto, ao transporte efetuado sob a responsabilidade de uma pessoa coletiva (mesmo nos casos como o do processo principal, em que os cães são efetivamente transportados por uma pessoa singular). Cabe ao órgão jurisdicional nacional competente apreciar os factos, para decidir, se for caso disso, se a Pfotenhilfe‑Ungarn (que aparentemente é uma pessoa coletiva de direito alemão) permanecia responsável pelos cães durante o transporte e até ao momento da entrega aos seus novos donos, ou se tinha lugar uma transferência lícita da responsabilidade jurídica para a pessoa ou pessoas singulares que efetuavam o transporte e as operações subsequentes ( 45 ).

61.

Uma associação como a Pfotenhilfe‑Ungarn deve ser considerada como um operador que procede ao comércio intracomunitário de animais, na aceção do artigo 12.o da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos, quando efetua o transporte de cães entre Estados‑Membros para o efeito da sua entrega a terceiros, mediante o pagamento de determinada quantia, mas sem visar a obtenção de lucro?

62.

No que respeita à redação do artigo 12.o, a utilização da palavra «Unternehmer» (versão alemã), «επιχειρήσεις» (versão grega), «dealers» (versão inglesa), «handelaars» (versão neerlandesa) e «handlare» (versão sueca) não é determinante. Mesmo partindo do pressuposto de que cada uma destas palavras implica automaticamente a existência de uma intenção de lucro (o que, só por si, é duvidoso), esse não é manifestamente o caso em relação aos termos correspondentes noutras versões linguísticas em que esta disposição foi adotada em 1990 ( 46 ).

63.

O conceito de «comércio» na Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos tem o mesmo significado que lhe é atribuído nas disposições do Tratado em matéria de livre circulação de mercadorias ( 47 ). Estas disposições do Tratado constituem um aspeto fundamental do mercado interno, que é um dos alicerces da União Europeia. Do mesmo modo, o conceito de «comércio de mercadorias» no artigo 28.o TFUE deve ser interpretado em sentido lato. No acórdão Comissão/Itália, o Tribunal de Justiça definiu «mercadorias» de acordo com o significado atribuído no atual artigo 28.o TFUE, ou seja, «produtos avaliáveis em dinheiro e suscetíveis, como tal, de ser objeto de transações comerciais» ( 48 ). Portanto, em princípio, as disposições do Tratado em matéria de livre circulação de mercadorias aplicam‑se independentemente de os bens em causa serem transportados através das fronteiras nacionais para efeitos de venda ou revenda, ou para uso ou consumo pessoal ( 49 ).

64.

A fortiori, o facto de a circulação de «mercadorias» (incluindo os animais) fazer parte de uma transação com fins lucrativos não é pertinente para determinar se a esse transporte são aplicáveis as disposições do Tratado em matéria de liberdade de circulação e, consequentemente, o artigo 12.o da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos.

65.

O objetivo da diretiva de substituir o sistema anterior de controlos veterinários efetuados nas fronteiras internas da União por um sistema harmonizado de controlos realizados no Estado‑Membro de origem e no Estado‑Membro de destino corrobora esta tese. O sistema harmonizado, que assenta numa confiança reforçada nos controlos veterinários efetuados pelo Estado de origem ( 50 ), tem por objetivo tanto a realização do mercado interno como assegurar a proteção da saúde pública e animal ( 51 ).

66.

Os requisitos estabelecidos no artigo 12.o, que impõem a todos os operadores que procedem ao comércio intracomunitário de animais abrangidos pela diretiva a inscrição num registo oficial, a pedido da autoridade competente, e a manutenção de um livro de registo de entregas, são um contributo fundamental para a prossecução destes objetivos. Assim, por exemplo, impende sobre a autoridade competente no Estado‑Membro de origem a obrigação de inspecionar, nomeadamente, explorações, centros ou organismos, para assegurar que os animais e produtos destinados ao comércio respeitam os requisitos da União, nomeadamente as condições estabelecidas no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos ( 52 ). Em especial, apenas os animais provenientes de uma exploração, de um centro ou de um organismo que se encontre sujeito a controles veterinários oficiais regulares podem ser objeto de comércio ( 53 ). Neste contexto, é claramente necessário que a autoridade competente no Estado‑Membro de origem mantenha um registo de todos os locais onde está obrigada a efetuar regularmente os controlos veterinários.

67.

Além disso, a autoridade competente no Estado‑Membro de destino pode efetuar controlos por sondagem nos locais de destino, para verificar se os requisitos do artigo 3.o foram respeitados, ou efetuar controlos durante o transporte dos animais e dos produtos no seu território, caso disponha de elementos de informação que lhe permitam presumir uma infração ( 54 ). Se a autoridade competente verificar, por exemplo, a presença de uma zoonose ou de uma doença ou de qualquer outra causa que possa constituir um perigo grave para os animais ou para o homem, a Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos impõe a essa autoridade que ordene a colocação em quarentena do animal ou do lote de animais ou, se necessário, o seu abate ( 55 ). Essa autoridade tem o dever de comunicar imediatamente por escrito às autoridades competentes dos outros Estados‑Membros e à Comissão as verificações efetuadas, as decisões tomadas e os seus motivos ( 56 ). Além disso, contactará de imediato as autoridades competentes do Estado‑Membro de origem, para lhes permitir tomar todas as medidas necessárias ( 57 ). Se existir risco de epidemia, estas medidas podem compreender, nomeadamente, a quarentena dos animais na exploração de origem e a comunicação às autoridades competentes de todos os destinos para os quais tenham sido expedidos animais provenientes de tal exploração. Estes procedimentos sublinham a importância que assumem o registo oficial dos operadores e o livro de registo das entregas no sistema geral consagrado na Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos.

68.

Este sistema poderia ser prejudicado e os objetivos da diretiva comprometidos se o artigo 12.o não fosse aplicável às situações como as do processo principal. A distinção entre o transporte de lotes de animais de companhia efetuado em relação com atividades com fins lucrativos e sem fins lucrativos poderia também revestir dificuldades práticas (especialmente no âmbito dos controlos por sondagem) e, consequentemente, acarretar um risco de fraude. Aliás, o legislador da União reconheceu expressamente a existência de tal risco. O preâmbulo do Regulamento (UE) n.o 388/2010 da Comissão ( 58 ) refere que a experiência na aplicação do Regulamento relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia demonstrou que há um risco elevado de circulação de caráter comercial de cães, gatos e furões que é fraudulentamente dissimulada como circulação sem caráter comercial ( 59 ). Para evitar essas práticas, a Comissão decidiu aplicar à circulação de mais de cinco animais de companhia os requisitos e controlos estabelecidos na Diretiva relativa à polícia sanitária no comércio de animais. A mesma justificação é apontada no preâmbulo do Regulamento n.o 576/2013 ( 60 ), que prevê que à circulação de mais de cinco animais de companhia entre os Estados‑Membros se aplicam, em princípio, os requisitos estabelecidos na Diretiva relativa à polícia sanitária no comércio de animais e os controlos veterinários impostos pela Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos ( 61 ).

69.

Por conseguinte, concluo que uma associação como a Pfotenhilfe‑Ungarn é um operador que procede ao comércio intracomunitário de animais, na aceção do artigo 12.o da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos, quando efetua o transporte de cães entre Estados‑Membros para efeito da sua entrega a terceiros, mediante o pagamento de uma contribuição, independentemente de essa atividade visar ou não a obtenção de lucro.

70.

Dito isto, tenho sérias dúvidas de que essa disposição possa ser invocada contra a Pfotenhilfe‑Ungarn no processo principal, que respeita a um litígio entre esta associação e uma autoridade pública alemã. Constitui jurisprudência assente que uma diretiva não pode, por si própria, criar obrigações para os particulares e, deste modo, as disposições de uma diretiva não podem ser invocadas enquanto tais contra eles perante um órgão jurisdicional nacional ( 62 ). Consequentemente, uma autoridade nacional não pode invocar contra um particular uma disposição de uma diretiva cuja transposição para o direito nacional ainda não tenha sido (corretamente) efetuada ( 63 ). Esta jurisprudência tem por objetivo evitar que um Estado possa tirar proveito da sua inobservância do direito da União ( 64 ).

71.

O § 4 da Verordnung, que transpõe para o direito alemão o artigo 12.o, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos, aplica‑se apenas no âmbito de uma atividade comercial («gewerbsmäβig»). É jurisprudência assente que a obrigação de o juiz nacional ter em conta a letra e a finalidade da diretiva ao interpretar as normas pertinentes do seu direito nacional é limitada pelos princípios gerais de direito que fazem parte do direito da União e, em especial, os princípios da segurança jurídica e da não retroatividade. Essa obrigação não pode servir de fundamento a uma interpretação contra legem do direito nacional ( 65 ). Com base nos dados de que o Tribunal de Justiça dispõe parece‑me que as atividades da Pfotenhilfe‑Ungarn não se inserem no âmbito de uma atividade comercial e que a interpretação dessa expressão no sentido de a compatibilizar com a interpretação do âmbito de aplicação da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos que propugnei seria uma interpretação contra legem. Porém, estas são matérias que, em última instância, devem ser decididas pelo órgão jurisdicional nacional.

Posfácio

72.

Os factos que estiveram na origem do presente pedido de decisão prejudicial revelam com flagrante clareza a existência de uma lacuna na legislação da União que regulamenta a circulação transfronteiras de animais. Tenho profunda consciência, nas respostas que proponho ao Tribunal de Justiça, de que uma associação sem fins lucrativos que salva cães abandonados num Estado‑Membro e os entrega a novos donos noutro Estado‑Membro disporá de magros recursos para cumprir os requisitos específicos da legislação destinada a assegurar a proteção da saúde animal no âmbito das atividades comerciais com fins lucrativos. Poderá até pensar‑se que a aplicação dessa legislação a associações como a demandante no processo principal será quase uma perversidade. E, no entanto, também não seria correto aplicar simplesmente à situação em apreço a legislação muito menos rigorosa que rege a circulação transfronteiras sem caráter comercial de animais de companhia.

73.

Por vezes, é possível resolver um problema evidente através da leitura criativa de um texto já existente. Cheguei à conclusão de que, no caso em apreço, isso não é possível. Tão‑pouco creio que o Tribunal de Justiça esteja apto a estabelecer um (novo) equilíbrio adequado entre a promoção da livre circulação dos animais numa boa causa e a garantia de uma proteção adequada da saúde dos animais e das pessoas, acautelando simultaneamente a possibilidade de fraudes e abusos. Essa tarefa compete ao legislador. Tenho esperança de que o presente processo tenha evidenciado a necessidade de empreender essa tarefa.

Conclusão

74.

Por todos os motivos acima expostos, proponho que o Tribunal de Justiça se digne responder às questões suscitadas pelo Bundesverwaltungsgericht (Alemanha) nos seguintes termos:

1)

Uma associação de proteção de animais efetua o transporte de animais em relação com atividades económicas, na aceção do artigo 1.o, n.o 5, do Regulamento (CE) n.o 1/2005 do Conselho, de 22 de dezembro de 2004, relativo à proteção dos animais durante o transporte e operações afins e que altera as Diretivas 64/432/CEE e 93/119/CE e o Regulamento (CE) n.o 1255/97, quando transporta cães entre Estados‑Membros, com vista à sua entrega a terceiros mediante o pagamento de uma contribuição, independentemente de tal atividade ter ou não fins lucrativos.

2)

Além disso, nas circunstâncias descritas, tal associação constitui um operador que procede ao comércio intracomunitário de animais, na aceção do artigo 12.o da Diretiva 90/425/CEE do Conselho, de 26 de junho de 1990, relativa aos controlos veterinários e zootécnicos aplicáveis ao comércio intracomunitário de certos animais vivos e produtos, na perspetiva da realização do mercado interno. Compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se esta disposição pode ser invocada contra a Pfotenhilfe‑Ungarn no processo principal.


( 1 )   Língua original: inglês.

( 2 )   Diretiva 90/425/CEE do Conselho, de 26 de junho de 1990, relativa aos controlos veterinários e zootécnicos aplicáveis ao comércio intracomunitário de certos animais vivos e produtos, na perspetiva da realização do mercado interno (JO 1990, L 224, p. 29), na redação em vigor (a seguir «Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos»).

( 3 )   Regulamento (CE) n.o 1/2005 do Conselho, de 22 de dezembro de 2004, relativo à proteção dos animais durante o transporte e operações afins e que altera as Diretivas 64/432/CEE e 93/119/CE e o Regulamento (CE) n.o 1255/97 (JO 2005, L 3, p. 1) (a seguir «Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte»).

( 4 )   Regulamento (CE) n.o 998/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de maio de 2003, relativo às condições de polícia sanitária aplicáveis à circulação sem caráter comercial de animais de companhia e que altera a Diretiva 92/65/CEE do Conselho (JO 2003, L 146, p. 1) (a seguir «Regulamento relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia»). Este regulamento foi revogado pelo Regulamento (UE) n.o 576/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de junho de 2013, relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia (JO 2013, L 178, p. 1), que não se aplicava à data dos factos (v. n.o 33 infra). A versão do Regulamento relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia que é pertinente para os factos em apreço no processo principal é a que resulta da alteração introduzida pelo Regulamento (CE) n.o 898/2009 da Comissão, de 25 de setembro de 2009, que altera o anexo II do Regulamento (CE) n.o 998/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho no que diz respeito à lista de países e de territórios (JO 2009, L 256, p. 10).

( 5 )   V., também, artigo 3.o, primeiro parágrafo.

( 6 )   A redação do artigo 1.o, n.o 5, difere da proposta original da Comissão de limitar o âmbito de aplicação do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte ao transporte efetuado «para fins comerciais». V. artigo 1.o, n.o 1, da Proposta de Regulamento do Conselho relativo à proteção dos animais durante o transporte e operações afins e que altera as Diretivas 64/432/CEE e 93/119/CE, COM/2003/0425 final.

( 7 )   Segundo considerando da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos. O objetivo dos controlos veterinários é a proteção da saúde pública e animal, ao passo que os controlos zootécnicos visam, direta ou indiretamente, assegurar o melhoramento das raças animais. V. artigo 2.o, n.os 1 e 2, desta diretiva.

( 8 )   Quinto considerando.

( 9 )   De 19 de novembro de 1991, relativa à proteção dos animais durante o transporte e que altera as Diretivas 90/425/CEE e 91/496/CEE (JO 1991 L 340, p. 17).

( 10 )   Artigos 1.°, n.o 1, e 33.° do Regulamento relativo à proteção dos animais durante o transporte.

( 11 )   Segundo o artigo 28.o, n.o 2, TFUE, a abolição dos direitos aduaneiros de importação e de exportação e dos encargos de efeito equivalente (artigo 30.o TFUE), bem como o artigo 33.o TFUE, relativo à cooperação aduaneira, aplicam‑se «tanto aos produtos originários dos Estados‑Membros, como aos produtos provenientes de países terceiros que se encontrem em livre prática nos Estados‑Membros».

( 12 )   JO 1992, L 268, p. 54 (a seguir «Diretiva relativa à polícia sanitária no comércio de animais»), na última redação em vigor à data da prática dos factos do processo principal, que lhe foi dada pela Diretiva 2008/73/CE do Conselho, de 15 de julho de 2008, que simplifica procedimentos de elaboração de listas e de publicação de informações nos domínios veterinário e zootécnico e que altera as Diretivas 64/432/CEE, 77/504/CEE, 88/407/CEE, 88/661/CEE, 89/361/CEE, 89/556/CEE, 90/426/CEE, 90/427/CEE, 90/428/CEE, 90/429/CEE, 90/539/CEE, 91/68/CEE, 91/496/CEE, 92/35/CEE, 92/65/CEE, 92/66/CEE, 92/119/CEE, 94/28/CE, 2000/75/CE, a Decisão 2000/258/CE e as Diretivas 2001/89/CE, 2002/60/CE e 2005/94/CE (JO 2008 L 219, p. 40).

( 13 )   Nono considerando.

( 14 )   V., também, quarto e quinto considerandos.

( 15 )   V. n.o 16 supra.

( 16 )   V. n.o 29 infra.

( 17 )   V., entre outros, acórdãos Foglia, 244/80, EU:C:1981:302, n.o 18, e Pohotovosť, C‑470/12, EU:C:2014:101, n.o 29.

( 18 )   V. n.os 5 a 29 supra.

( 19 )   Artigo 3.o, alínea a), do Regulamento relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia.

( 20 )   Porém, saliento que atualmente o Regulamento n.o 576/2013 impõe à circulação sem fins comerciais de animais de companhia pertencentes a espécies suscetíveis à raiva (designadamente os cães) requisitos mais rigorosos em matéria de polícia sanitária do que os do Regulamento relativo à circulação sem caráter comercial de animais de companhia.

( 21 )   No entanto, as normas nacionais que sancionam os maus tratos infligidos a animais podem (e devem) aplicar‑se às situações em que uma pessoa singular transporte o animal de companhia de que é proprietário em condições que ilidam esta presunção.

( 22 )   Artigo 1.o, n.o 5.

( 23 )   Acórdão Meca‑Medina e Majcen/Comissão, C‑519/04 P, EU:C:2006:492, n.os 31 a 33. Ver a análise do conceito de «atividade económica» em várias políticas da UE, Odudu, O., Economic Activity as a Limit to Community Law, Barnard, C., Odudu, O. (Eds.), The Outer Limits of European Union Law, Oxford, Hart Publishing, 2009, pp. 225‑243.

( 24 )   V., entre outros, acórdãos Comissão/Itália, 118/85, EU:C:1987:283, n.o 3; Comissão/Itália, C‑35/96, EU:C:1998:303, n.o 36; e Pavlov e o., C‑180/98 a C‑184/98, EU:C:2000:428, n.o 75.

( 25 )   V., entre outros, acórdãos Albany, C‑67/96, EU:C:1999:430, n.o 85; Cassa di Risparmio di Firenze e o., C‑222/04, EU:C:2006:8, n.o 123; e Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, C‑1/12, EU:C:2013:127, n.o 57, e jurisprudência aí referida.

( 26 )   Conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs no processo AOK Bundesverband eo., C‑264/01, C‑306/01, C‑354/01 e C‑355/01, EU:C:2003:304, n.o 27 (o sublinhado é meu). O Tribunal de Justiça considerou que um sistema de seguro obrigatório de doença e maternidade não preenche essa condição, por se basear no princípio da solidariedade nacional e não ter qualquer fim lucrativo: v. acórdão Poucet e Pistre, C‑159/91 e C‑160/91, EU:C:1993:63, n.os 18 e 19.

( 27 )   V., mais recentemente, acórdão Centro Hospitalar de Setúbal e SUCH, C‑574/12, EU:C:2014:2004, n.o 33 e a jurisprudência aí referida.

( 28 )   V. acórdãos Schindler, C‑275/92, EU:C:1994:119, n.os 35 e 36; Smits e Peerbooms, C‑157/99, EU:C:2001:404, n.os 50 a 59; e Jundt, C‑281/06, EU:C:2007:816, n.o 33.

( 29 )   Acórdão Comissão/Reino Unido, C‑382/92, EU:C:1994:233, n.os 44 e 45.

( 30 )   Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1).

( 31 )   V., como exemplo recente, acórdão The Bridport and West Dorset Golf Club, C‑495/12, EU:C:2013:861.

( 32 )   V. acórdão Danske Svineproducenter, C‑316/10, EU:C:2011:863, n.o 44.

( 33 )   Tais riscos podem resultar, por exemplo, da utilização de um meio de transporte inadequado ou da violação das normas técnicas relativas ao espaço mínimo disponível para cada animal e à alimentação e abeberamento durante o transporte.

( 34 )   V. Decisão 2004/544/CE do Conselho, de 21 de junho de 2004, relativa à assinatura da Convenção Europeia sobre a proteção dos animais durante o transporte internacional (JO 2004 L 241, p. 21).

( 35 )   Considerando 4.

( 36 )   Artigo 1.o, n.o 1, da convenção.

( 37 )   V., em especial, artigo 4.o, n.o 1, da convenção.

( 38 )   V., por exemplo, as seguintes disposições da convenção: artigo 5.o (Autorização dos transportadores), artigo 6.o (Conceção e fabrico dos meios de transporte), artigo 7.o (Planeamento do transporte), artigo 9.o (Aptidão para o transporte) e artigo 11.o (Repouso, água e alimentos antes do carregamento).

( 39 )   V. acórdãos De Landtsheer Emmanuel, C‑381/05, EU:C:2007:230, n.o 30 e jurisprudência aí referida, e Lidl, C‑159/09, EU:C:2010:696, n.o 32.

( 40 )   V. n.o 32 supra.

( 41 )   É o que indica expressamente o sítio Web da Pfotenhilfe‑Ungarn: www.pfotenhilfe‑ungarn.de/zu_vermitteln.html.

( 42 )   Uma vez que a Pfotenhilfe‑Ungarn, ao invés de uma loja de animais, não visa obter qualquer lucro com a entrega de um cão, o novo dono paga um valor mais baixo pela aquisição do cão. Porém, como contrapartida do custo obviamente mais reduzido, existe a possibilidade de vir mais tarde a incorrer em custos adicionais, se um cão de proveniência incerta adoecer ou se a anterior experiência de abandono o tiver traumatizado.

( 43 )   N.o 15 supra.

( 44 )   V. artigo 3.o, alínea a), do Regulamento. Dos factos que deram origem ao processo principal afigura‑se que a propriedade dos cães não era formalmente transferida para os novos donos. Em cada caso, procedia‑se normalmente a um pagamento e o cão era então «transferido». Era com efeito esse o objetivo da toda a operação de recolha. Nestas circunstâncias, parece‑me que a transferência deve ser assimilada à «venda ou […] transferência de propriedade» na aceção daquela disposição.

( 45 )   Pelo motivo indicado nos n.os 70 e 71 infra, isso pode eventualmente não ser necessário no presente caso.

( 46 )   V., em especial, versões espanhola («agentes»), dinamarquesa («Ehrvervsdrivende»), francesa («opérateurs»), italiana («operatori») e portuguesa («operadores»). V., também, versão romena («operatorii»).

( 47 )   Artigo 2.o, n.o 3, da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos.

( 48 )   Acórdão Comissão/Itália, 7/68, EU:C:1968:51 (o sublinhado é meu). Esta definição abrange os animais de companhia. V., por exemplo, acórdão Comissão/Bélgica, C‑100/08, EU:C:2009:537, n.o 42.

( 49 )   Acórdão Schumacher, 215/87, EU:C:1989:111, n.o 22. V., também, conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs no processo Comissão/Bélgica, C‑2/90, EU:C:1991:344, n.o 15 e jurisprudência aí referida.

( 50 )   Quinto considerando.

( 51 )   Este último objetivo decorre de várias disposições da Diretiva relativa aos controlos veterinários e zootécnicos, em especial, os artigos 2.°, n.o 1; 8.°, n.o 1, alínea b); 9.°, n.o 1, sexto parágrafo; e 10.°, n.o 1, quarto parágrafo.

( 52 )   Artigo 3.o, n.o 3, primeiro parágrafo.

( 53 )   Artigo 3.o, n.o 1, alínea b).

( 54 )   Artigo 5.o, n.o 1, alínea a).

( 55 )   Artigo 8.o, n.o 1, alínea a), primeiro parágrafo.

( 56 )   Artigo 8.o, n.o 1, alínea a), terceiro parágrafo.

( 57 )   Artigo 9.o, n.o 1, primeiro parágrafo.

( 58 )   De 6 de maio de 2010, que aplica o Regulamento (CE) n.o 998/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho no que respeita ao número máximo de animais de companhia de certas espécies que podem circular sem caráter comercial (JO 2010, L 114, p. 3).

( 59 )   Considerando 6.

( 60 )   Considerando 11.

( 61 )   Artigo 5.o, n.o 4.

( 62 )   V., entre outros, acórdãos Marshall152/84, EU:C:1986:84, n.o 48; Kolpinghuis Nijmegen, 80/86, EU:C:1987:431, n.o 9; e Rieser Internationale Transporte, C‑157/02, EU:C:2004:76, n.o 22.

( 63 )   Acórdãos Kolpinghuis Nijmegen, 80/86, EU:C:1987:431, n.o 10, e Arcaro, C‑168/95, EU:C:1996:363, n.os 36 a 38.

( 64 )   Acórdão Faccini Dori, C‑91/92, EU:C:1994:292, n.o 22.

( 65 )   V., entre outros, acórdãos Kolpinghuis Nijmegen, 80/86, EU:C:1987:431, n.o 13, e Mono Car Styling, C‑12/08, EU:C:2009:466, n.o 61.

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