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Document 62013CJ0529

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 21 de janeiro de 2015.
    Georg Felber contra Bundesministerin für Unterricht, Kunst und Kultur.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgerichtshof.
    Reenvio prejudicial ― Política social ― Diretiva 2000/78/CE ― Artigos 2.°, n.os 1 e 2, alínea a), e 6.°, n.os 1 e 2 ― Diferença de tratamento em razão da idade ― Função pública ― Regime de pensões ― Legislação nacional que não toma em consideração os períodos de escolaridade cumpridos antes dos 18 anos de idade.
    Processo C-529/13.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2015:20

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

    21 de janeiro de 2015 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Política social — Diretiva 2000/78/CE — Artigos 2.°, n.os 1 e 2, alínea a), e 6.°, n.os 1 e 2 — Diferença de tratamento em razão da idade — Função pública — Regime de pensões — Legislação nacional que não toma em consideração os períodos de escolaridade cumpridos antes dos 18 anos de idade»

    No processo C‑529/13,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Verwaltungsgerichtshof (Áustria), por decisão de 16 de setembro de 2013, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 8 de outubro de 2013, no processo

    Georg Felber

    contra

    Bundesministerin für Unterricht, Kunst und Kultur,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

    composto por: R. Silva de Lapuerta, presidente de secção, K. Lenaerts, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Segunda Secção, J.‑C. Bonichot, A. Arabadjiev (relator) e J. L. da Cruz Vilaça, juízes,

    advogado‑geral: Y. Bot,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação do Governo austríaco, por C. Pesendorfer, na qualidade de agente,

    em representação da Comissão Europeia, por B.‑R. Killmann e D. Martin, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 21.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), bem como dos artigos 2.°, n.os 1 e 2, alínea a), e 6.°, n.os 1 e 2, da Diretiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional (JO L 303, p. 16).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe G. Felber à Bundesministerin für Unterricht, Kunst und Kultur (Ministra Federal do Ensino, da Arte e da Cultura, a seguir «Bundesministerin»), a propósito da recusa da Bundesministerin em ter em conta os períodos de escolaridade anteriores à entrada de G. Felber ao serviço, para o cálculo dos seus direitos de pensão.

    Quadro jurídico

    Diretiva 2000/78

    3

    Nos termos do seu artigo 1.o, a Diretiva 2000/78 «tem por objeto estabelecer um quadro geral para lutar contra a discriminação em razão da religião ou das convicções, de uma deficiência, da idade ou da orientação sexual, no que se refere ao emprego e à atividade profissional, com vista a pôr em prática nos Estados‑Membros o princípio da igualdade de tratamento».

    4

    O artigo 2.o dessa diretiva prevê:

    «1.   Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por ‘princípio da igualdade de tratamento’ a ausência de qualquer discriminação, direta ou indireta, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.o

    2.   Para efeitos do n.o 1:

    a)

    Considera‑se que existe discriminação direta sempre que, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.o, uma pessoa seja objeto de um tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou possa vir a ser dado a outra pessoa em situação comparável;

    [...]»

    5

    O artigo 3.o, n.os 1 e 3, da referida diretiva, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», prevê:

    «1.   Dentro dos limites das competências atribuídas à Comunidade, a presente diretiva é aplicável a todas as pessoas, tanto no sector público como no privado, incluindo os organismos públicos, no que diz respeito:

    [...]

    c)

    Às condições de emprego e de trabalho, incluindo o despedimento e a remuneração;

    [...]

    3.   A presente diretiva não é aplicável aos pagamentos de qualquer espécie efetuados pelos regimes públicos ou equiparados, incluindo os regimes públicos de segurança social ou proteção social.»

    6

    O artigo 6.o da mesma diretiva tem a seguinte redação:

    «1.   Sem prejuízo do disposto no n.o 2 do artigo 2.o, os Estados‑Membros podem prever que as diferenças de tratamento com base na idade não constituam discriminação se forem objetiva e razoavelmente justificadas, no quadro do direito nacional, por um objetivo legítimo, incluindo objetivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e de formação profissional, e desde que os meios para realizar esse objetivo sejam apropriados e necessários.

    Essas diferenças de tratamento podem incluir, designadamente:

    a)

    O estabelecimento de condições especiais de acesso ao emprego e à formação profissional, de emprego e de trabalho, nomeadamente condições de despedimento e remuneração, para os jovens, os trabalhadores mais velhos e os que têm pessoas a cargo, a fim de favorecer a sua inserção profissional ou garantir a sua proteção;

    b)

    A fixação de condições mínimas de idade, experiência profissional ou antiguidade no emprego para o acesso ao emprego ou a determinadas regalias associadas ao emprego;

    […]

    2.   Sem prejuízo do disposto no n.o 2 do artigo 2.o, os Estados‑Membros podem prever que não constitua discriminação baseada na idade, a fixação, para os regimes profissionais de segurança social, de idades de adesão ou direito às prestações de reforma ou de invalidez, incluindo a fixação, para esses regimes, de idades diferentes para trabalhadores ou grupos ou categorias de trabalhadores, e a utilização, no mesmo âmbito, de critérios de idade nos cálculos actuariais, desde que tal não se traduza em discriminações baseadas no sexo.»

    7

    O artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78, sob a epígrafe «Ação positiva e medidas específicas», prevê:

    «A fim de assegurar a plena igualdade na vida ativa, o princípio da igualdade de tratamento não obsta a que os Estados‑Membros mantenham ou adotem medidas específicas destinadas a prevenir ou compensar desvantagens relacionadas com qualquer dos motivos de discriminação referidos no artigo 1.o»

    Direito austríaco

    8

    Os §§ 53, 54 e 56 da Lei federal que regula os direitos a pensão dos funcionários federais, dos seus herdeiros e dos membros da sua família (Lei sobre as pensões de 1965) [Bundesgesetz über die Pensionsansprüche der Bundesbeamten, ihrer Hinterbliebenen und Angehörigen (Pensionsgesetz 1965)], de 18 de novembro de 1965 (BGBl., 340/1965, a seguir «PG 1965»), tinham, na versão em vigor à época dos factos do litígio no processo principal, a seguinte redação:

    «Períodos anteriores à entrada ao serviço a ter em consideração para efeitos da pensão de reforma

    § 53

    (1)   Os períodos equiparáveis são os que são enumerados nos n.os 2 a 4, na medida em que sejam anteriores à data a partir da qual começa a contagem do tempo de serviço federal suscetível de ser considerado para efeitos da pensão de reforma. Esses períodos são contabilizados com base num sistema de dedução.

    (2)   São contabilizados os períodos seguintes:

    [...]

    h)

    a duração de um ciclo de estudos completo, cumprido [...] numa escola básica ou secundária ou num estabelecimento de ensino superior ou equiparado, desde que o período mínimo de escolaridade não tenha sido ultrapassado,

    [...]

    Não consideração e renúncia

    § 54

    [...]

    (2)   Não são tomados em consideração os períodos equiparáveis seguintes:

    a)

    os períodos cumpridos pelo funcionário antes dos 18 anos de idade [...]

    [...]

    Contribuição extraordinária

    § 56

    (1)   O funcionário deve pagar uma contribuição extraordinária, na medida em que o Bund não recebe, para os períodos equiparáveis tidos em conta, o montante de transferência em conformidade com as regras do direito da segurança social [...]»

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    9

    G. Felber, nascido em 1956, é professor e funcionário ao serviço do Bund (Estado federal), desde 1991.

    10

    Para efeitos do cálculo dos seus direitos a pensão, os períodos equiparáveis, anteriores à sua entrada ao serviço da Administração, foram determinados por uma decisão tomada em 1992. Apenas os períodos de formação e de atividade profissional cumpridos após os 18 anos de idade foram tidos em conta para efeitos do cálculo dos direitos a pensão de G. Felber. Por conseguinte, o período de formação por este cumprido antes dos 18 anos, concretamente três anos de estudos, não foi contabilizado. Com base no acórdão Hütter (C‑88/08, EU:C:2009:381), G. Felber requereu que esse período fosse contabilizado ou pudesse ser comprado mediante o pagamento de uma contribuição extraordinária.

    11

    O Landesschulrat für Salzburg (Direção Escolar de Salzburgo) indeferiu o seu pedido, por decisão de 25 de novembro de 2010, com fundamento em que o § 54, n.o 2, alínea a), da PG 1965 exclui a contagem dos períodos de formação cumpridos antes dos 18 anos de idade, para os funcionários que, como G. Felber, estão abrangidos pelo § 88, n.o 1, da PG 1965 porque foram contratados antes de 1 de maio de 1995. G. Felber interpôs recurso desta decisão do Landesschulrat für Salzburg para a Bundesministerin, mas esta negou provimento ao seu recurso, por decisão de 1 de dezembro de 2011.

    12

    Seguidamente, G. Felber interpôs recurso dessa decisão para o Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional austríaco), que se considerou incompetente, por decisão de 5 de março de 2012, a favor do órgão jurisdicional de reenvio. Contudo, o Verfassungsgerichtshof considerou compatível com o princípio constitucional da igualdade de tratamento que as regras aplicáveis ao reconhecimento dos períodos de formação anteriores à entrada ao serviço, para efeitos do cálculo do montante das pensões de reforma, sejam diferentes das regras aplicáveis ao reconhecimento desses períodos com vista à determinação do montante da remuneração dos funcionários.

    13

    No entender do órgão jurisdicional de reenvio, o acórdão Hütter (EU:C:2009:381) exige que se proceda a um novo cálculo não discriminatório dos períodos de atividade profissional e dos períodos de formação cumpridos pelo agente em causa antes dos 18 anos de idade. Por conseguinte, interroga‑se sobre se importa proceder a esse novo cálculo não discriminatório não só para os direitos a remuneração mas também para os direitos a pensão.

    14

    Nestas condições, o Verwaltungsgerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Sem prejuízo do previsto no artigo 52.o, n.o 1, da [Carta] e no artigo 6.o da Diretiva [2000/78], constitui uma diferença de tratamento (direta) em razão da idade, no sentido do artigo 21.o, n.o 1, da Carta e/ou do artigo 2.o, n.os 1 e 2, alínea a), [dessa] diretiva, o facto de períodos de estudos numa escola básica ou secundária só serem considerados como períodos anteriores à entrada ao serviço para efeitos de reforma após os 18 anos de idade, sendo que os referidos períodos anteriores à entrada ao serviço para efeitos de reforma são relevantes não apenas para o direito à reforma mas também para o cálculo do seu montante e que a referida pensão (pensão total) é considerada, segundo o direito nacional, como continuação do pagamento da retribuição no âmbito de uma relação de trabalho de direito público que continua a existir mesmo após a passagem à reforma do funcionário público?

    2)

    No caso de resposta afirmativa — e na falta de justificação nos termos do artigo 52.o, n.o 1, da Carta e/ou do artigo 6.o da Diretiva [2000/78] (ver a este respeito a questão 3) — pode o funcionário invocar a aplicabilidade direta do artigo 21.o da Carta e/ou do artigo 2.o da Diretiva [2000/78] num processo em que pede a contagem de períodos anteriores à entrada ao serviço para efeitos de reforma mesmo que não esteja ainda reformado, embora, segundo o direito nacional, lhe possa vir a ser oposto o caráter definitivo do indeferimento desse pedido — no caso de a legislação ser a mesma no momento da passagem à reforma — numa ação em que seja pedida a consideração ou feito novo pedido de consideração desses períodos?

    3)

    No caso de resposta afirmativa, a diferença de tratamento em causa é justificada no sentido do artigo 52.o, n.o 1, da Carta e/ou do artigo 6.o, n.os 1 e/ou 2 da [Diretiva 2000/78]:

    a)

    pelo facto de conceder a pessoas cujo aniversário é posterior à data de início do ano escolar no ano de entrada para a escola e/ou que frequentem uma escola em que o ensino secundário vai além do 12.° ano e que, por essa razão, se veem obrigadas a frequentar a escola para finalizar os seus estudos para além dos seus 18 anos de idade, as mesmas condições de que beneficiam pessoas que terminam a sua formação escolar numa escola básica ou secundária antes dos 18 anos de idade, mesmo que a possibilidade de considerar períodos de escolaridade após os 18 anos de idade não se restrinja aos casos referidos;

    b)

    pelo facto de não considerar para efeitos de reforma os períodos em que, normalmente, não existe participação na vida ativa e nos quais, por conseguinte, não são feitos descontos; a justificação mantém‑se mesmo que relativamente a períodos de frequência de escolas básicas ou secundárias após os 18 anos de idade não tenham de ser feitos descontos e, quando considerados posteriormente, deem origem a um pagamento específico para efeitos de reforma;

    c)

    pelo facto de a exclusão da consideração de períodos anteriores à entrada ao serviço para efeitos de reforma anteriores aos 18 anos de idade equivaler à fixação da ‘idade de adesão’‘para os regimes profissionais de segurança social’, no sentido do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva [2000/78]?»

    Quanto às questões prejudiciais

    Observações preliminares

    15

    Com as suas questões, o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que interprete o princípio da não discriminação em razão da idade, como consagrado no artigo 21.o da Carta e materializado na Diretiva 2000/78.

    16

    Como decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça, quando adotam medidas que entram no âmbito de aplicação da Diretiva 2000/78, a qual, no domínio do emprego e do trabalho, concretiza o princípio da não discriminação em razão da idade, os Estados‑Membros devem agir no respeito dessa diretiva (v., nesse sentido, acórdãos Prigge e o., C‑447/09, EU:C:2011:573, n.o 48, e Tyrolean Airways Tiroler Luftfahrt, C‑132/11, EU:C:2012:329, n.o 22).

    17

    Nestas condições, há que apreciar as questões submetidas no âmbito do litígio no processo principal, que opõem um particular à Administração nacional, à luz unicamente da Diretiva 2000/78.

    Quanto à primeira e terceira questões

    18

    Com a sua primeira e a sua terceira questão, que importa apreciar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os artigos 2.°, n.os 1 e 2, alínea a), e 6.°, n.os 1 e 2, da Diretiva 2000/78 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional que exclui a tomada em consideração dos períodos de escolaridade cumpridos por um funcionário, antes dos 18 anos de idade, para efeitos da concessão do direito à pensão e do cálculo do montante da sua pensão de reforma, ao passo que esses períodos são tidos em conta quando são cumpridos depois de ter atingido essa idade.

    19

    Em primeiro lugar, há que verificar se a legislação nacional em causa no processo principal está abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2000/78. A este respeito, decorre do seu artigo 3.o, n.o 1, alíneas a) e c), que essa diretiva é aplicável, no âmbito das competências conferidas à União Europeia, «a todas as pessoas, tanto no sector público como no privado, incluindo os organismos públicos», no que se refere, por um lado, «[à]s condições de acesso ao emprego […] incluindo os critérios de seleção e as condições de contratação, seja qual for o ramo de atividade e a todos os níveis da hierarquia profissional» e, por outro, «[à]s condições de emprego e de trabalho, incluindo o despedimento e a remuneração».

    20

    O âmbito de aplicação da Diretiva 2000/78 deve, assim, ser entendido, à luz do artigo 3.o, n.os 1, alínea c), e 3, dessa diretiva, lido em conjugação com o seu considerando 13, no sentido de que não abrange os regimes de segurança social e de proteção social cujos benefícios não sejam equiparados a uma remuneração, na aceção dada a este termo para efeitos da aplicação do artigo 157.o, n.o 2, TFUE (v., neste sentido, acórdãos HK Danmark, C‑476/11, EU:C:2013:590, n.o 25, e Dansk Jurist‑ og Økonomforbund, C‑546/11, EU:C:2013:603, n.o 25).

    21

    O conceito de «remuneração», na aceção do artigo 157.o, n.o 2, TFUE, inclui todas as regalias pecuniárias ou em espécie, atuais ou futuras, desde que sejam pagas, ainda que indiretamente, pela entidade patronal ao trabalhador, em razão do emprego deste último (acórdãos HK Danmark, EU:C:2013:590, n.o 26, e Dansk Jurist‑ og Økonomforbund, EU:C:2013:603, n.o 26).

    22

    No processo principal, está em causa a não tomada em consideração, para efeitos do cálculo dos pontos para a reforma, dos períodos de escolaridade cumpridos por G. Felber antes dos 18 anos de idade e anteriores à sua entrada ao serviço do Bund.

    23

    Como resulta da decisão de reenvio, o montante da pensão de reforma depende dos períodos de serviço e dos períodos equiparáveis, bem como da remuneração auferida pelo funcionário. A prestação de reforma constitui um pagamento futuro em dinheiro, feito pelo empregador aos seus empregados, como consequência direta da relação laboral destes. Com efeito, essa pensão é considerada, segundo o direito nacional, como uma remuneração que continua a ser paga no âmbito de uma relação de trabalho de direito público que prossegue após a passagem do funcionário público à reforma. A referida pensão constitui, a esse título, uma remuneração na aceção do artigo 157.o, n.o 2, TFUE.

    24

    Decorre do exposto que, ao excluir, para efeitos do cálculo da referida pensão de reforma, uma parte dos funcionários do benefício da contagem dos períodos de escolaridade cumpridos antes dos 18 anos de idade, o § 54, n.o 2, alínea a), da PG 1965 afeta as condições de remuneração desses funcionários, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2000/78. Por conseguinte, esta aplica‑se a uma situação como a que está em causa no processo principal.

    25

    Quanto, em segundo lugar, à questão de saber se a legislação em causa no processo principal consagra uma diferença de tratamento em razão da idade, no que diz respeito ao emprego e à atividade profissional, há que observar que, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78, para efeitos desta, se entende por «princípio da igualdade de tratamento» a ausência de qualquer discriminação, direta ou indireta, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.o dessa diretiva, entre os quais figura a idade. O artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da mesma diretiva precisa que, para efeitos da aplicação do n.o 1 deste artigo, se considera que existe discriminação direta, sempre que, por qualquer dos motivos referidos no artigo 1.o da dita diretiva, uma pessoa seja objeto de um tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou possa vir a ser dado a outra pessoa em situação comparável.

    26

    Nos termos do § 53, n.o 2, alínea h), da PG 1965, deve ser tida em conta a duração do ciclo de estudos completo, cumprido pelo funcionário numa escola básica ou secundária ou num estabelecimento de ensino superior ou equiparado, desde que a duração mínima de escolaridade não tenha sido ultrapassada. O § 54, n.o 2, alínea a), da PG 1965 limita, contudo, esta tomada em consideração aos períodos que o funcionário cumpriu após os 18 anos de idade.

    27

    Como realça o órgão jurisdicional de reenvio, uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal favorece as pessoas que terminam ou iniciam esse ciclo de estudos após os 18 anos de idade, na medida em que apenas estas beneficiam da tomada em consideração dos períodos de escolaridade que cumpriram numa escola básica ou secundária, antes da sua entrada em funções ao serviço do Bund. Uma legislação desta natureza estabelece uma diferença de tratamento entre as pessoas em função da idade em que completaram a sua formação escolar. Este critério pode até levar a uma diferença de tratamento entre duas pessoas que tenham seguido a mesma formação escolar, exclusivamente em função da idade respetiva dessas pessoas. Tal disposição estabelece, portanto, uma diferença de tratamento diretamente baseada no critério da idade, na aceção do artigo 2.o, n.os 1 e 2, alínea a), da Diretiva 2000/78 (v., por analogia, acórdão Hütter, EU:C:2009:381, n.o 38).

    28

    Em terceiro lugar, importa examinar se essa diferença de tratamento é, contudo, suscetível de ser justificada à luz do disposto no artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78.

    29

    O primeiro parágrafo desta disposição precisa que os Estados‑Membros podem prever que as diferenças de tratamento com base na idade não constituam discriminação se forem objetiva e razoavelmente justificadas, no quadro do direito nacional, por um objetivo legítimo, nomeadamente objetivos legítimos de política de emprego, do mercado de trabalho e de formação profissional, e desde que os meios para realizar esse objetivo sejam apropriados e necessários.

    30

    No que toca, em primeiro lugar à questão de saber se o objetivo prosseguido pela legislação nacional em causa no processo principal é legítimo, o Tribunal de Justiça tem reiteradamente declarado que os Estados‑Membros dispõem de uma ampla margem de apreciação na escolha não só do prosseguimento de um determinado objetivo, entre outros, em matéria de política social e do emprego mas também na definição das medidas suscetíveis de o realizar (acórdão Specht e o., C‑501/12 a C‑506/12, C‑540/12 e C‑541/12, EU:C:2014:2005, n.o46 e jurisprudência referida).

    31

    A este respeito, resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que a tomada em consideração dos períodos anteriores à entrada do funcionário ao serviço, cumpridos por este fora da relação de serviço, é uma norma derrogatória que foi introduzida para não desfavorecer, em termos de aquisição de direitos a pensão, os funcionários que, antes da sua entrada em funções ao serviço do Bund, tenham completado uma formação superior, relativamente àqueles cujo recrutamento não está sujeito a nenhum requisito de formação especial e que, por conseguinte, puderam entrar em funções ao serviço do Bund a partir dos 18 anos. Assim, as regras do regime de pensões dos funcionários são concebidas de maneira a que a carreira global a ter em conta para efeitos do cálculo do montante da pensão de reforma remonte à idade mínima exigida para a entrada ao serviço do Estado. A legislação nacional em causa no processo principal visa uniformizar a data de início da contribuição para o regime de pensões e, portanto, a manutenção da idade de admissão à reforma. Nesse contexto, a não contagem dos períodos de formação escolar cumpridos antes dos 18 anos de idade justificar‑se‑ia pelo facto de o interessado não exercer, em princípio, durante esses períodos, nenhuma atividade remunerada que dê lugar ao pagamento de contribuições para o regime de pensões.

    32

    Na medida em que a prossecução desse objetivo permite assegurar o respeito do princípio da igualdade de tratamento para todas as pessoas de um determinado setor, relativamente a um elemento essencial da sua relação de trabalho, como o momento da passagem à reforma, esse objetivo constitui um objetivo legítimo da política de emprego (v., por analogia, acórdão Comissão/Hungria, C‑286/12, EU:C:2012:687, n.o 61).

    33

    Em segundo lugar, há que verificar, de acordo com a própria redação do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 2000/78, se, no quadro da ampla margem de apreciação reconhecida aos Estados‑Membros, recordada no n.o 30 do presente acórdão, os meios para realizar esse objetivo são apropriados e necessários.

    34

    Por outro lado, no que toca ao caráter apropriado do § 54, n.o 2, alínea a), da PG 1965, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que a idade mínima de recrutamento na função pública é de 18 anos e que, portanto, um funcionário só pode estar inscrito no regime de pensões dos funcionários e contribuir para esse regime a partir dessa idade.

    35

    Por conseguinte, a exclusão, por força dessa disposição, da contagem dos períodos de formação escolar cumpridos antes dos 18 anos de idade é adequada a alcançar o objetivo legítimo que consiste em adotar uma política de emprego que permita a todos os inscritos no regime de pensões dos funcionários começarem a quotizar com a mesma idade e adquirirem o direito de receber uma pensão de reforma completa e, assim, garanta a igualdade de tratamento entre os funcionários.

    36

    No que toca, por outro lado, à questão de saber se a legislação nacional em causa no processo principal não ultrapassa o necessário para atingir o objetivo prosseguido, importa recordar que, com o pedido que está na origem do litígio no processo principal, o que se pretende é a tomada em consideração não de períodos de emprego, à semelhança do processo que deu lugar ao acórdão Hütter (EU:C:2009:381), mas unicamente de períodos de formação cumpridos no ensino básico e secundário.

    37

    A este respeito, a legislação nacional em causa no processo principal afigura‑se coerente à luz da justificação adiantada pelo órgão jurisdicional de reenvio, concretamente excluir do cálculo da pensão de reforma os períodos em que o interessado não paga quotizações para o regime de pensões.

    38

    Com efeito, por um lado, os períodos de formação escolar como os que estão em causa não dão lugar ao pagamento dessas contribuições. Por outro lado, no tocante aos períodos de escolaridade cumpridos pelo funcionário após os 18 anos de idade, resulta da decisão de reenvio que os mesmos não são considerados períodos equiparáveis a anos de serviço e, portanto, só podem ser tidos em conta para efeitos do cálculo dos pontos para a reforma se for satisfeita a condição, que figura no § 56 da PG 1965, do pagamento, a favor do regime de pensões, de uma contribuição extraordinária correspondente às contribuições em falta. Resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que essa contribuição extraordinária constitui a contrapartida do não pagamento, pelo interessado, das quotizações obrigatórias para o regime de pensões, durante esses anos de escolaridade. A referida contribuição extraordinária tem, assim, uma função de compensação.

    39

    Nestas condições, atendendo à ampla margem de apreciação reconhecida aos Estados‑Membros não só na escolha da prossecução de um objetivo determinado em matéria de política social e de emprego mas também na definição das medidas suscetíveis de o realizar, uma medida como a prevista no § 54, n.o 2, alínea a), da PG 1965 é adequada a alcançar os objetivos visados nos n.os 31 e 32 do presente acórdão e não vai além do necessário para os alcançar.

    40

    Importa, por conseguinte, responder à primeira e à terceira questão que os artigos 2.°, n.os 1 e 2, alínea a), e 6.°, n.o 1, da Diretiva 2000/78 devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que exclui a contagem dos períodos de escolaridade cumpridos por um funcionário, antes dos 18 anos, de idade para efeitos da concessão do direito de pensão e do cálculo do montante da sua pensão de reforma, na medida em que, por um lado, seja objetiva e razoavelmente justificada por um objetivo legítimo relativo à política de emprego e do mercado de trabalho e, por outro, constitua um meio apropriado e necessário à realização desse objetivo.

    Quanto à segunda questão

    41

    Tendo em conta a resposta dada à primeira e à terceira questão, não cabe responder à segunda questão.

    Quanto às despesas

    42

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

     

    Os artigos 2.°, n.os 1 e 2, alínea a), e 6.°, n.o 1, da Diretiva 2000/78/CE do Conselho, de 27 de novembro de 2000, que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional, devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que exclui a tomada em consideração dos períodos de escolaridade cumpridos por um funcionário, antes dos 18 anos de idade, para efeitos da concessão do direito a pensão e do cálculo do montante da sua pensão de reforma, na medida em que, por um lado, seja objetiva e razoavelmente justificada por um objetivo legítimo relativo à política de emprego e do mercado de trabalho e, por outro, constitua um meio apropriado e necessário à realização desse objetivo.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: alemão.

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