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Document 62013CC0461

    Conclusões do advogado-geral N. Jääskinen apresentadas em 23 de outubro de 2014.
    Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland eV contra Bundesrepublik Deutschland.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesverwaltungsgericht.
    Reenvio prejudicial — Ambiente — Política da União Europeia no domínio da água — Diretiva 2000/60/CE — Artigo 4.°, n.° 1 — Objetivos ambientais relativos às águas de superfície — Deterioração do estado de uma massa de águas de superfície — Projeto de ampliação de uma via navegável — Obrigação dos Estados‑Membros de não autorizar um projeto suscetível de provocar uma deterioração do estado de uma massa de águas de superfície — Critérios determinantes para apreciar a existência de uma deterioração do estado de uma massa de águas.
    Processo C-461/13.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2014:2324

    CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

    NIILO JÄÄSKINEN

    apresentadas em 23 de outubro de 2014 ( 1 )

    Processo C‑461/13

    Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland e.V.

    contra

    Bundesrepublik Deutschland

    [pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesverwaltungsgericht (Alemanha)]

    «Ambiente — Artigo 4.o da Diretiva 2000/60/CE — Política da União Europeia no domínio da água — Objetivos ambientais relativos às águas de superfície — Deterioração do estado de uma massa de água de superfície — Projeto de melhoria de uma via navegável — Obrigação eventual dos Estados‑Membros de proibir todos os projetos que tenham, ou sejam suscetíveis de ter, consequências negativas sobre o estado das águas de superfície»

    I – Introdução

    1.

    As presentes questões prejudiciais submetidas pelo Bundesverwaltungsgericht (Alemanha) têm origem num litígio relativo à ampliação do rio Weser, um dos grandes rios da Alemanha. O litígio submetido ao órgão jurisdicional de reenvio opõe o Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland e.V. (Federação para o ambiente e para a proteção da natureza, a seguir «BUND»), uma organização sem fins lucrativos, à Bundesrepublik Deutschland, na sua qualidade de promotor de um projeto de aprofundamento do Weser, que visa permitir a passagem de maiores porta‑contentores nos portos de Bremerhaven (Alemanha), Brake (Alemanha) e Bremen (Alemanha). No âmbito deste litígio, foram suscitadas as questões das alterações físicas importantes e das consequências hidrológicas e morfológicas negativas geradas pelo referido projeto para o ecossistema do Weser.

    2.

    Neste contexto, o Tribunal de Justiça é chamado a determinar o alcance dos conceitos de «objetivos ambientais» e de «deterioração» do estado das massas de água, previstos no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2000, que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da política da água ( 2 ) (a seguir «DQA»).

    3.

    Ora, a interpretação destes conceitos impõe vários desafios ao Tribunal de Justiça, sendo os principais os seguintes.

    4.

    Em primeiro lugar, embora a DQA tenha pretendido estabelecer uma base comum essencial para coordenar o mosaico de textos legislativos comunitários e nacionais em vigor, não deixa de ser verdade que a DQA é um ato complexo e particularmente elaborado cuja compreensão é invulgarmente difícil ( 3 ). Nomeadamente, a técnica legística que consiste na utilização de muitas remissões de uma disposição para outra disposição e para outros atos, bem como na criação de várias derrogações cujo alcance não é claramente identificável, suscita dificuldades múltiplas ( 4 ). É sintomático, a este respeito, que o sistema de gestão da água que resulta da DQA tenha conduzido à adoção de um número impressionante de atos explicativos ( 5 ), à criação de bases de dados especializadas ( 6 ), bem como a trabalhos de investigação sobre a água no âmbito do 7.° programa‑quadro de investigação da União Europeia ( 7 ).

    5.

    Em segundo lugar, juntamente com as dificuldades acima referidas, o presente processo revela uma confrontação entre duas visões completamente antinómicas da DQA. A primeira abordagem poderia ser qualificada de minimalista, na medida em que a DQA seria reduzida a um instrumento de planeamento, em grande escala, da gestão das águas. Em contrapartida, em conformidade com uma segunda abordagem, que partilho, a DQA corresponderia a uma nova metodologia da gestão das águas, abrangendo não só o nível do planeamento como também o da execução dos objetivos ambientais vinculativos, que se traduz na adoção de medidas concretas destinadas a assegurar o bom estado das águas e a evitar uma deterioração do estado das águas. Consequentemente, a resposta às questões submetidas exige uma análise aprofundada dos termos, dos métodos e dos parâmetros puramente técnicos, ou mesmo científicos, que constituem a base do sistema que permite identificar o estado das águas.

    6.

    Por fim, há que recordar que a DQA respeita o princípio do desenvolvimento sustentável, segundo o qual «as necessidades da atual geração devem ser satisfeitas sem comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem as suas próprias necessidades». Trata‑se de um objetivo fundamental da União Europeia, consagrado no Tratado, e que se impõe a todas as atividades e políticas da União ( 8 ). A interpretação da DQA, que deve respeitar o direito fundamental à proteção do ambiente, consagrado no artigo 37.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, exige, portanto, um exame a vários níveis, atendendo ao seu objetivo final de proteção da água como bem comum, que se traduz na conservação, melhoria e proibição da deterioração do ambiente aquático da União ( 9 ).

    II – Quadro jurídico

    7.

    Atendendo à complexidade do sistema estabelecido pela DQA, é essencial apresentar os seus conceitos‑chave.

    8.

    O artigo 1.o da DQA prevê:

    «O objetivo da presente diretiva é estabelecer um enquadramento para a proteção das águas de superfície interiores, das águas de transição, das águas costeiras e das águas subterrâneas, que:

    a)

    Evite a continuação da degradação e proteja e melhore o estado dos ecossistemas aquáticos, e também dos ecossistemas terrestres e zonas húmidas diretamente dependentes dos ecossistemas aquáticos, no que respeita às suas necessidades em água;

    […]»

    9.

    Para este efeito, todas as águas abrangidas pelo âmbito de aplicação da DQA ( 10 ) se inserem numa das unidades previstas pela DQA, a saber, uma bacia hidrográfica, uma região hidrográfica bem como uma massa de água. O conceito de bacia hidrográfica é definido no artigo 2.o, ponto 13, da DQA como a área terrestre a partir da qual todas as águas fluem para o mar. O conceito de região hidrográfica, previsto no referido artigo 2.o, ponto 15, corresponde a uma área constituída por várias bacias hidrográficas e que constitui uma unidade principal para efeitos da sua gestão.

    10.

    Em contrapartida, o conceito de massa de água tem por objetivo a identificação de todas as características bem como a determinação do estado atual das águas. Assim, nos termos do artigo 2.o, ponto 10, da DQA, uma massa de águas de superfície ( 11 ) corresponde a uma parte distinta e significativa de águas de superfície, como por exemplo um lago, uma albufeira, um ribeiro, rio ou canal, um troço de ribeiro, rio ou canal, águas de transição ou uma faixa de águas costeiras. A DQA refere‑se também ao conceito de massa de água fortemente modificada, que consiste, nos termos do seu artigo 2.o, ponto 9, numa massa de água que, em resultado de alterações físicas derivadas da atividade humana, adquiriu um caráter substancialmente diferente.

    11.

    As massas de águas de superfície compreendidas numa região hidrográfica devem, portanto, numa primeira fase, inserir‑se numa das categorias (rios, lagos, águas de transição, costeiras e subterrâneas) ( 12 ). Numa segunda fase, é efetuada, quanto a cada categoria de águas de superfície, uma repartição por tipos das massas da região em questão, em conformidade com os sistemas, A ou B, definidos no ponto 1.2 do anexo II, da DQA. O sistema A, rígido, é baseado em «eco‑regiões» e em parâmetros impostos, ao passo que o sistema B é flexível, com vários parâmetros opcionais.

    12.

    O conceito de estado das águas de superfície é definido no artigo 2.o, ponto 17, da DQA como expressão do estado de uma massa de águas, definido em função do pior dos dois estados, ecológico ou químico, dessas águas. A DQA define no seu artigo 2.o, ponto 18, o bom estado de uma massa de águas de superfície como a situação em que os seus estados ecológico e químico são considerados, pelo menos, bons. Os conceitos de estado ecológico, de bom estado ecológico e de bom estado químico são, por sua vez, definidos no artigo 2.o, respetivamente nos pontos 21, 22 e 24, da DQA ( 13 ).

    13.

    O artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da DQA, intitulado «Objetivos ambientais» dispõe:

    «1.   Ao garantir a operacionalidade dos programas de medidas especificados nos planos de gestão de bacias hidrográficas:

    a)

    Para as águas de superfície

    i)

    Os Estados‑Membros aplicarão as medidas necessárias para evitar a deterioração do estado de todas as massas de águas de superfície, em aplicação dos n.os 6 e 7 e sem prejuízo do disposto no n.o 8;

    ii)

    Os Estados‑Membros protegerão, melhorarão e recuperarão todas as massas de águas de superfície, sob reserva de aplicação da alínea iii) para as massas de água artificiais e fortemente modificadas, com o objetivo de alcançar um bom estado das águas de superfície 15 anos, o mais tardar, a partir da entrada em vigor da presente diretiva nos termos do anexo V, sob reserva da aplicação das prorrogações determinadas nos termos do n.o 4 e da aplicação dos n.os 5, 6 e 7 e sem prejuízo do disposto no n.o 8;

    iii)

    Os Estados‑Membros protegerão e melhorarão o estado de todas as massas de água artificiais e fortemente modificadas, a fim de alcançar um bom potencial ecológico e um bom estado químico das águas de superfície 15 anos, o mais tardar, a partir da entrada em vigor da presente diretiva, nos termos do disposto no anexo V, sem prejuízo da aplicação das prorrogações determinadas nos termos do n.o 4 e da aplicação dos n.os 5, 6 e 7, bem como do n.o 8; […]

    14.

    O artigo 4.o da DQA estabelece, nos seus n.os 4, 5, 6 e 7, uma série de derrogações relativamente aos objetivos assim definidos. Em especial, o artigo 4.o, n.o 7, da DQA prevê as condições de uma derrogação em caso de alterações recentes das características físicas de uma massa de águas de superfície ou de alterações do nível de massas de águas subterrâneas, ou de novas atividades humanas de desenvolvimento sustentável.

    15.

    O artigo 11.o, n.o 1, da DQA visa a criação dos programas de medidas, que constituem um instrumento de planeamento de base para cada região hidrográfica ou para a parte de qualquer região hidrográfica internacional que pertença ao território de um Estado‑Membro. Os programas devem ter em conta os resultados das análises previstas no artigo 5.o da DQA, para a prossecução dos objetivos definidos no seu artigo 4.o

    16.

    O artigo 13.o da DQA visa os planos de gestão de bacia hidrográfica elaborados em conformidade com o seu anexo VII. Deste resulta, nomeadamente, que tal plano de gestão contém uma lista dos objetivos ambientais estabelecidos no artigo 4.o da DQA bem como a identificação dos casos em que tenha havido recurso aos n.os 4 a 7 do artigo 4.o O plano de gestão contém um resumo do programa ou programas de medidas adotados nos termos do artigo 11.o da DQA, incluindo os modos pelos quais os objetivos estabelecidos no referido artigo 4.o deverão ser alcançados por seu intermédio.

    III – Factos do litígio no processo principal, questões prejudiciais e tramitação processual no Tribunal de Justiça

    17.

    Através da decisão de aprovação de 15 de julho de 2011 (a seguir «decisão de aprovação»), a Wasser‑ und Schiffahrtsdirektion Nordwest (Direção das Águas e da Navegação do Noroeste), uma autoridade administrativa federal, aprovou três projetos relativos à ampliação do rio Weser, uma via navegável com estatuto federal.

    18.

    O primeiro projeto visa a ampliação do Weser exterior, do alto mar até Bremerhaven. Prevê‑se, a este respeito, um aprofundamento do seu canal navegável de 1,16 metros, no máximo, de forma a permitir que os grandes porta‑contentores com um calado máximo de 13,5 metros possam aceder ao porto de Bremerhaven independentemente das marés.

    19.

    O segundo projeto respeita à ampliação do Weser inferior a montante de Bremerhaven até Brake, através de um aprofundamento do canal navegável de um metro no máximo, para que os navios com um calado máximo de 12,8 metros possam aceder a este porto com maré favorável.

    20.

    O terceiro projeto visa a ampliação do Weser inferior a montante de Brake até Bremen. Neste troço do rio, prevê‑se um aprofundamento do canal navegável para permitir o acesso ao porto de Bremen, consoante a maré, de navios com um calado máximo de 11,1 metros. Atualmente, o porto de Bremen só permite o acesso com maré favorável a navios com um calado máximo de 10,7 metros.

    21.

    A realização dos projetos implica a dragagem do leito do rio nos canais navegáveis. Após o aprofundamento inicial até à profundidade desejada no âmbito da ampliação, serão necessárias dragagens periódicas de manutenção. Prevê‑se que a maior parte dos resíduos de dragagem resultantes da ampliação e da manutenção sejam descarregados em zonas do Weser exterior e do Weser inferior que já eram anteriormente utilizadas para este efeito.

    22.

    Além das repercussões diretas das dragagens e das descargas, os projetos envolvem, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, outras consequências hidrológicas e morfológicas para os troços do rio afetados. Assim, nomeadamente, a velocidade da corrente será mais forte tanto na maré vazante como na enchente; os níveis da preia‑mar serão mais elevados; os níveis da baixa‑mar serão mais baixos; a salinidade aumentará em certas partes do Weser inferior e o limite das águas salobras do Weser inferior será deslocado para montante; e, por fim, o assoreamento do leito do rio aumentará fora do canal navegável.

    23.

    Entre as massas de água afetadas, as «águas de transição do rio Weser» e a «zona de marés acima de Brake» foram classificadas como «fortemente modificadas», na aceção do artigo 2.o, ponto 9, da DQA. A região do Weser exterior é definida como uma massa de água natural na medida em que faz parte das águas costeiras. Além disso, são também afetadas diversas massas de água na zona dos afluentes, algumas das quais estão classificadas como naturais e outras como «fortemente modificadas».

    24.

    No âmbito do exame destes projetos, a autoridade competente concluiu que não havia risco de deterioração, na aceção da DQA, no que respeita às águas costeiras. Em contrapartida, considerou que o estado atual das massas de água «Weser/zona de marés a norte de Brake, de tipo 22.3» e «águas de transição do tipo T1» tenderia a sofrer modificações negativas em consequência dos projetos de ampliação, sem se verificar uma alteração da classe definidora do estado, nos termos do anexo V da DQA. Segundo a autoridade competente, tal deterioração no âmbito de uma classe de estado não devia ser considerada uma deterioração do potencial ecológico nem do estado. A título subsidiário, a autoridade competente considerou que estavam reunidas as condições para uma derrogação à proibição de deterioração que decorre do § 31, n.o 2, da Lei federal sobre o regime das águas (Wasserhaushaltsgesetz, a seguir «WHG» ( 14 )) e do artigo 4.o, n.o 7, da DQA.

    25.

    O BUND impugnou a decisão de aprovação invocando numerosas violações da legislação relativa à aprovação dos planos de ampliação, à avaliação do impacto sobre o ambiente e à proteção do ambiente, bem como a violação de disposições de proteção das águas que transpõem a DQA.

    26.

    Nestas condições, o Bundesverwaltungsgericht submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Deve o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da [DQA] ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros — sob reserva da concessão de uma derrogação — são obrigados a recusar a aprovação de um projeto quando este seja suscetível de causar uma deterioração do estado de uma massa de água de superfície ou esta disposição estabelece um mero objetivo a cumprir pelo plano de gestão?

    2)

    Deve o conceito de ‘deterioração do estado’ constante do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da [DQA] ser interpretado no sentido de que apenas abrange alterações prejudiciais que impliquem uma classificação numa classe inferior nos termos do anexo V da diretiva?

    3)

    Em caso de resposta negativa à segunda questão: em que circunstâncias se verifica uma ‘deterioração do estado’ na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da [DQA]?

    4)

    Deve o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), ii) e iii), da [DQA] ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros — sob reserva da concessão de uma derrogação — são obrigados a recusar a aprovação de um projeto quando este ponha em risco o objetivo de alcançar um bom estado de uma água de superfície ou um bom potencial ecológico e um bom estado químico de uma água de superfície na data pertinente nos termos da [DQA] ou esta disposição estabelece um mero objetivo a cumprir pelo plano de gestão?»

    27.

    O pedido de decisão prejudicial deu entrada na secretaria do Tribunal de Justiça em 22 de agosto de 2013. Foram apresentadas observações escritas pelo BUND, pela Bundesrepublik Deutschland, pelo Reino dos Países Baixos, pela República da Polónia, pelo Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte e pela Comissão Europeia. Na audiência realizada em 8 de julho de 2014 foram ouvidos o BUND, a Bundesrepublik Deutschland, a Freie Hansestadt Bremen, a República Checa, a República Francesa e a Comissão.

    IV – Análise

    A – Quanto ao tratamento das questões prejudiciais

    28.

    Embora o órgão jurisdicional de reenvio tenha submetido ao Tribunal de Justiça quatro questões prejudiciais, parece‑me evidente que estas giram em torno de dois temas principais relativos à interpretação do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da DQA.

    29.

    Assim, antes de mais, o primeiro tema abordado pela primeira e quarta questões prejudiciais é o de saber se o artigo 4.o da DQA prevê um simples objetivo geral em matéria de planeamento da gestão das águas ou se esta disposição deve ser interpretada no sentido de proibir qualquer deterioração do estado das massas de água associada à realização de diferentes projetos, com exceção das situações que possam ser abrangidas pelas derrogações previstas pela DQA. Este tema engloba igualmente a problemática do alcance da obrigação de melhoria que resulta da DQA.

    30.

    O segundo tema suscitado pelo órgão jurisdicional de reenvio na terceira e quarta questões prejudiciais ( 15 ) é o da interpretação do conceito de «deterioração do estado», visado no artigo 4.o, alínea a), i), da DQA.

    31.

    Consequentemente, proponho que as questões submetidas sejam agrupadas em conformidade com os temas que expus.

    B – Quanto ao objetivo, estabelecido pela DQA, de prevenção de qualquer degradação adicional (primeira e quarta questões prejudiciais)

    1. Observações das partes

    32.

    Através das suas questões, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se a DQA prevê uma norma de princípio que estabeleça uma proibição de deterioração do estado de todas as massas de água de superfície, sob reserva das derrogações que decorrem da DQA.

    33.

    As partes no processo defendem, quanto a esta questão, posições diametralmente opostas. O BUND, os Governos polaco e do Reino Unido, bem como a Comissão, partilham da análise efetuada pelo órgão jurisdicional de reenvio, segundo a qual o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i) a iii), da DQA deve ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros são obrigados — sob reserva de concessão de uma derrogação — a recusar a aprovação de um projeto quando este seja suscetível de provocar uma deterioração do estado de uma massa de água de superfície ou quando comprometa a obtenção de um bom estado das águas de superfície ou de um bom potencial ecológico e de um bom estado químico das águas de superfície. Assim, tanto a letra como a sistemática e a finalidade da DQA apontariam no sentido de uma interpretação segundo a qual a proibição de deterioração prevista cria, relativamente aos Estados‑Membros, uma obrigação autónoma no âmbito da aprovação dos projetos, que não é abrangida pelo planeamento da gestão. Segundo a mesma ordem de ideias, o Governo francês explicou na audiência que, na sua opinião, o artigo 4.o da DQA não corresponde apenas a um objetivo, tratando‑se, pelo contrário, de uma obrigação de adotar medidas concretas.

    34.

    Em contrapartida, os Governos alemão e neerlandês consideram que os objetivos ambientais previstos no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i) a iii), da DQA visam os planos de gestão de bacia hidrográfica e os programas de medidas dos Estados‑Membros para as águas de superfície. Não se trata, portanto, segundo estes governos, de critérios para a aprovação de projetos individuais. O Governo neerlandês sustenta, além disso, que a DQA prevê uma abordagem «programática», deixando aos Estados‑Membros uma ampla margem de manobra quanto à sua execução ( 16 ).

    35.

    O Governo alemão sustenta, além disso, que a letra do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA não proíbe as deteriorações, mas impõe a adoção de medidas destinadas a evitar a deterioração. Com efeito, a referida disposição não está redigida sob a forma de uma proibição, exigindo antes uma ação positiva. Daqui resulta, segundo o Governo alemão, que só as medidas positivas de planeamento são abrangidas por uma obrigação de evitar as deteriorações.

    2. Quanto à natureza da DQA e quanto à inserção do artigo 4.o no sistema da DQA

    36.

    Atendendo à complexidade da problemática exposta, proponho‑me proceder por etapas e começar por analisar os conceitos‑chave da DQA, e apresentar em seguida as etapas da determinação dos objetivos ambientais, na aceção do artigo 4.o da DQA, insistindo nas características da diretiva em questão. Esta análise levará a uma conclusão relativa ao caráter da proibição de deterioração que deverá ser seguidamente apoiada por uma série de justificações.

    a) Quanto à arquitetura dos conceitos‑chave da DQA

    37.

    Recorde‑se, a título de introdução, que a DQA é uma diretiva‑quadro adotada com base no artigo 175.o, n.o 1, CE (atual artigo 192.o TFUE). Estabelece princípios comuns e um quadro global de ação para a proteção das águas e assegura a coordenação, a integração assim como, a mais longo prazo, o desenvolvimento dos princípios gerais e das estruturas que permitam a proteção e uma utilização ecologicamente viável da água na União Europeia. Os princípios comuns e o quadro global de ação por ela estabelecidos devem ser posteriormente desenvolvidos pelos Estados‑Membros, que devem adotar uma série de medidas particulares em conformidade com os prazos previstos pela diretiva. Esta última não tem, porém, por objetivo a harmonização completa da legislação dos Estados‑Membros no domínio da água ( 17 ).

    38.

    Nos termos do artigo 1.o, alínea a), da DQA, o objetivo desta é estabelecer um enquadramento para a proteção das águas que evite a continuação da degradação e proteja e melhore o estado dos ecossistemas aquáticos. É, portanto, na perspetiva de tal ação coordenada quanto às águas de superfície interiores, às águas de transição, às águas costeiras e às águas subterrâneas que o legislador define o objetivo principal da DQA.

    39.

    Com efeito, é pacífico que a DQA tem como objetivo último a conformidade com o critério do «bom estado» de todas as águas de superfície e subterrâneas a União até ao ano de 2015 ( 18 ).

    40.

    A este respeito, decorre do considerando 25 da DQA que «[d]evem‑se definir os objetivos ambientais para garantir o bom estado das águas de superfície e subterrâneas em todo o território da Comunidade e para evitar a deterioração do estado das águas».

    41.

    O artigo 4.o, n.o 1, da DQA constitui a disposição fundamental, ao especificar os objetivos ambientais que os Estados‑Membros devem alcançar. Para este efeito, impõe dois objetivos distintos, embora ‘intrinsecamente associados’. Por um lado, nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA, os Estados‑Membros aplicarão as medidas necessárias para evitar a deterioração do estado de todas as massas de águas. Por outro lado, em aplicação do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), ii) e iii), os Estados‑Membros protegerão, melhorarão e recuperarão todas as massas com o objetivo de alcançar um bom estado, o mais tardar no final de 2015. Nos termos do referido artigo 4.o, n.o 1, alínea a), é ao garantir a operacionalidade dos programas de medidas especificados no plano de gestão que os Estados‑Membros adotam as medidas necessárias para realizar os objetivos de não‑deterioração, de preservação e de melhoria do estado das massas de água. Simultaneamente, o artigo 4.o concebe como objetivos ambientais as finalidades visadas pelo legislador, tais como um bom estado de uma água de superfície, um bom potencial ecológico ou um bom estado químico das águas de superfície.

    42.

    A dificuldade conceptual inerente ao sistema da DQA reside, assim, na sobreposição pelo legislador dos conceitos de natureza estática (tais como o bom estado das águas de superfície a alcançar em 2015) e de natureza dinâmica (como a prossecução de objetivos ambientais, na aceção do artigo 4.o da DQA, que corresponde a um processo contínuo).

    b) Quanto às etapas que conduzem à determinação dos objetivos ambientais na aceção do artigo 4.o da DQA

    43.

    Para poderem alcançar os objetivos ambientais, os Estados‑Membros devem dispor de uma imagem de conjunto das características das massas de água em questão.

    44.

    Nos termos do artigo 3.o da DQA, os Estados‑Membros identificam, portanto, as bacias hidrográficas que se encontram no seu território, inserem‑nas em regiões e designam as autoridades competentes.

    45.

    Seguidamente, procedem à caracterização das massas de água, na aceção do artigo 5.o da DQA, conjugado com o seu anexo II. Para este efeito, adotam, para cada região hidrográfica, une análise das suas especificidades, incluindo um estudo do impacto da atividade humana ( 19 ). Uma etapa importante, do ponto de vista de uma futura determinação dos objetivos ambientais, respeita à identificação das pressões antropogénicas a que as massas de água possam estar sujeitas ( 20 ), bem como à avaliação da probabilidade de que as massas de água não cumpram os objetivos de qualidade ambiental estabelecidos no artigo 4.o da DQA ( 21 ).

    46.

    Paralelamente, os Estados‑Membros são obrigados, em conformidade com o artigo 8.o da DQA, a estabelecer o sistema de monitorização exigido ( 22 ), o qual constitui, como obrigação contínua, o principal instrumento para determinar o estado de cada massa de água ( 23 ). Tal sistema deve ser concebido de modo a fornecer uma imagem de conjunto coerente do estado ecológico e químico de cada região ( 24 ). A este respeito, partilho, portanto, da análise do Governo alemão, que salienta que a obrigação de analisar a tendência e de inverter a tendência se aplica antes de intervir a proibição de deterioração.

    47.

    O estado ecológico de uma massa de água de superfície resulta da apreciação da estrutura e do funcionamento dos ecossistemas aquáticos associados a tal massa de água. É determinado através de um mecanismo de natureza científica baseado nos elementos de qualidade: biológicos (espécies vegetais e animais), hidromorfológicos e físico‑químicos, sendo tais elementos apreciados em função de indicadores (por exemplo a presença de invertebrados ou de peixes num curso de água). Quanto a cada tipo de massa de água, o estado ecológico é refletido no sistema de classes previsto no anexo V da DQA, ao qual voltarei em pormenor no âmbito da análise da segunda e terceira questões.

    48.

    Após a classificação, em conformidade com o anexo V da DQA, compete aos Estados‑Membros determinar o modo de alcançar o bom estado ou, pelo menos, o bom potencial ecológico, bem como de evitar a deterioração, nos termos do artigo 4.o da DQA, quanto às massas de água em questão.

    49.

    Para este efeito, em conformidade com o artigo 11.o da DQA, os Estados‑Membros estabelecem os programas de medidas, elaborados para cada região hidrográfica ou para uma parte da mesma. O programa é uma ferramenta que permite responder às pressões identificadas, tendo em vista a melhoria do estado da bacia hidrográfica ou massa de água, para que este passe a ser bom ( 25 ). Estes programas de medidas podem remeter para as medidas que decorrem da legislação adotada a nível nacional e que abranja todo o território de um Estado‑Membro ( 26 ). Tais programas abrangem «medidas básicas», como requisitos mínimos a cumprir e, se necessário, medidas «suplementares» ( 27 ). Entre as medidas básicas figuram, nomeadamente, as medidas adotadas por força das diretivas específicas, na aceção do artigo 11.o, n.o 3, alínea a), da DQA ( 28 ), bem como as medidas previstas no artigo 11.o, n.o 3, alínea i), em caso de impactos adversos significativos sobre o estado das águas, destinadas a garantir que as condições hidromorfológicas da massa de água permitam alcançar o estado ecológico requerido.

    50.

    Com efeito, no que respeita aos impactos adversos, os controlos podem assumir a forma de uma exigência de autorização prévia ou registo, o que me parece crucial do ponto de vista do alcance do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA. Como resulta do artigo 11.o, n.o 3, alínea c), entre as medidas básicas figuram as medidas destinadas a promover uma utilização da água de forma a evitar comprometer a realização dos objetivos especificados no artigo 4.o Entre as medidas suplementares encontram‑se igualmente as concebidas com a finalidade de alcançar os objetivos ambientais, como se prevê no artigo 11.o, n.o 4, da DQA.

    51.

    A elaboração dos programas de medidas pelos Estados‑Membros decorre em várias etapas. Assim, os referidos Estados devem identificar as pressões e os impactos ( 29 ), de modo a definir os principais problemas da região hidrográfica em questão. Em aplicação do artigo 11.o, n.o 5, da DQA, os Estados‑Membros devem também determinar especificamente os casos em que existe um risco de os objetivos de qualidade ambiental não serem atingidos. Neste âmbito, tomam igualmente em conta as massas fortemente modificadas e a necessidade ou a probabilidade de aplicação das derrogações previstas no artigo 4.o da DQA. A primeira versão de um programa de medidas é submetida a uma análise económica, em conformidade com as condições estabelecidas no anexo III da DQA, em função das quais os Estados‑Membros determinam os custos e os prazos da sua realização. Os planos das medidas adotados sob a perspetiva económica são seguidamente submetidos à obrigação de informação e consulta do público, em conformidade com o artigo 14.o da DQA.

    52.

    Em seguida, os programas de medidas são integrados nos planos de gestão, nos termos do artigo 13.o da DQA. Os planos de gestão contêm os elementos previstos no anexo VII desta. A DQA prevê a revisão e a atualização regular dos programas de medidas e dos planos de gestão ( 30 ). O plano de gestão é, simultaneamente, um documento descritivo do estado da região hidrográfica e um plano de ação, na medida em que visa novas medidas destinadas a alcançar os objetivos da DQA. Com base nas estimativas de todos os impactos existentes e nas perspetivas de evolução, um Estado‑Membro determina as medidas necessárias para alcançar os objetivos ambientais estabelecidos nos termos do artigo 4.o da DQA. Tal resulta claramente do anexo VII, pontos 5 e 7, desta, onde se esclarece que um plano de gestão deve conter uma lista dos objetivos ambientais bem como um resumo dos programas de medidas, incluindo os modos pelos quais devem alcançar tais objetivos. Terminado este laborioso processo, os Estados‑Membros devem dar execução às medidas previstas.

    53.

    No caso em apreço, resulta dos autos do processo principal que foi adotado um plano de gestão para a bacia hidrográfica do Weser ( 31 ), que abrange um programa de medidas. Consequentemente, o Tribunal não é chamado a determinar os efeitos do artigo 4.o, n.o 1, da DQA relativamente a uma massa de água quanto à qual não tenham sido adotadas as medidas de avaliação e de planeamento exigidas pelo artigo 4.o, n.o 1, da DQA.

    3. Conclusões quanto ao caráter vinculativo da proibição de deterioração prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA

    54.

    Atendendo à análise acima exposta, há que concluir que, embora a DQA não proceda a uma harmonização total, também não se limita a uma abordagem meramente «programática», o que deixaria aos Estados‑Membros um amplo poder discricionário no que respeita à escolha das políticas e das medidas a adotar ou a considerar ( 32 ).

    55.

    É certo que os Estados‑Membros adotam as medidas necessárias para alcançar os objetivos ambientais em função das especificidades e das características das massas de água identificadas nos seus territórios. Porém, cada etapa da gestão da água é regulamentada em pormenor, chegando inclusivamente ao estabelecimento de critérios científicos, através de um exercício dito de «intercalibração» ( 33 ).

    56.

    Tal exclui, em minha opinião, a tese segundo a qual o alcance de um ato tão complexo e ambicioso poderia ser reduzido a uma mera declaração de princípios desprovidos de caráter vinculativo. Com efeito, resulta claramente da letra do artigo 4.o da DQA que esta disposição pretende que os objetivos ambientais produzam os seus efeitos através da execução dos planos de gestão, os quais devem existir para qualquer massa de água. Além disso, a aplicação de um procedimento de aprovação nos termos da legislação geral parece‑me constituir um exemplo de execução de um programa de medidas nos termos do artigo 11.o, n.o 1, da DQA.

    57.

    Acresce que, como já demonstrei atrás, a determinação dos objetivos ambientais, na aceção do artigo 4.o da DQA, intervém, na realidade, numa fase muito avançada de um procedimento de identificação do estado das massas de água que compete aos Estados‑Membros realizar. Os seus efeitos vinculativos não se limitam, todavia, a esta fase. Na verdade, a prossecução dos objetivos ambientais só é aplicada relativamente a um estado determinado das massas de água, o que exclui a hipótese de o artigo 4.o prever um mero objetivo não vinculativo. Assim, a determinação dos objetivos ambientais deve servir para assegurar um bom estado das águas e para evitar qualquer deterioração.

    58.

    Consequentemente, embora a estrutura do artigo 4.o da DQA não permita analisar facilmente as suas disposições ( 34 ), a única interpretação conforme tanto à sua letra como ao seu objetivo é a interpretação segundo a qual o referido artigo estabelece uma obrigação vinculativa para os Estados‑Membros, que lhes impõe que adotem todas as medidas suscetíveis de impedir uma maior degradação das massas de águas relativamente às quais — como é o caso do Weser — tenha sido elaborado um plano de gestão com um programa de medidas, e que se esforcem no sentido de utilizar todos os meios para proteger, recuperar e melhorar as massas de água para alcançar, por fim, o seu bom estado.

    59.

    A proibição de deterioração constitui, com efeito, tanto uma proibição como uma norma de incitamento que visa alcançar os resultados previstos pela DQA no seu conjunto. Assim, os Estados‑Membros devem não só proibir qualquer deterioração como dar execução a tal proibição de modo eficaz. A execução efetiva do objetivo «de evitar qualquer deterioração», que é a tradução concreta da obrigação geral de proteção prevista no artigo 1.o da DQA, só é possível através da adoção das medidas concretas destinadas a evitar deteriorações bem como perturbações suscetíveis de produzir efeitos significativos relativamente aos objetivos desta diretiva ( 35 ).

    4. Justificações do caráter vinculativo do objetivo previsto no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da DQA, no sentido de evitar qualquer degradação adicional

    a) Quanto às ilações a tirar dos trabalhos legislativos da DQA

    60.

    A interpretação proposta é corroborada pela génese da DQA, que foi concebida, segundo a exposição de motivos do seu projeto inicial, «para prevenir novas deteriorações e proteger e melhorar a qualidade e quantidade dos ecossistemas aquáticos e também dos ecossistemas terrestres, no que se refere às suas necessidades de água». Além disso, a DQA «confirma e formaliza a chamada ‘abordagem combinada’, em que o controlo da poluição na fonte é combinado com a definição de objetivos ambientais» ( 36 ). A importância dos objetivos ambientais é confirmada pelo número e pelo alcance das alterações legislativas que enriqueceram consideravelmente o artigo 4.o da DQA em todas as fases dos trabalhos legislativos ( 37 ).

    61.

    Em particular, os trabalhos preparatórios revelam claramente que, na sua versão inicial, a DQA não obrigava os Estados‑Membros a alcançar efetivamente os objetivos estabelecidos no que respeita ao estado das águas. Foi salientado que a obrigação que lhes era imposta era antes de velar pela elaboração dos planos que permitissem alcançar os objetivos estabelecidos. Competia‑lhes, portanto, elaborar planos de ação, mais do que alcançar resultados. O Parlamento Europeu propôs, assim, alterações com vista a «conferir solidez ao processo de elaboração do plano e garantir a existência de oportunidades para que as Autoridades de Gestão de Região de Bacia Hidrográfica respondam pela não apresentação de planos adequados» ( 38 ).

    62.

    No que respeita, em particular, à obrigação de evitar a deterioração das águas de superfície, os trabalhos preparatórios demonstraram, nomeadamente, que, na sua primeira versão, as disposições em questão podiam implicar que, após a adoção da DQA, as massas de água classificadas na categoria superior a «estado bom» podiam degradar‑se até entrarem na categoria «estado bom». Consequentemente, o Parlamento propôs uma alteração que permitia distinguir entre a obrigação de alcançar um «estado bom» e de evitar qualquer deterioração, introduzindo no artigo 4.o, n.o 1, da DQA, um novo travessão que impunha distintamente esta última obrigação ( 39 ).

    63.

    Além disso, a vontade de concretizar os objetivos ambientais ao nível das medidas a adotar pelos Estados‑Membros decorre, nomeadamente, de uma comparação das versões sucessivas das disposições do artigo 4.o da DQA: proposta inicial ( 40 ) («Os Estados‑Membros elaborarão e garantirão a operacionalidade […] dos programas de medidas considerados necessários para evitar a deterioração […]»), posição comum («Os Estados‑Membros procurarão alcançar os seguintes objetivos […]») ( 41 ), parecer posterior da Comissão («Os Estados‑Membros assegurarão que os programas de medidas especificados nos planos de gestão da bacia hidrográfica se tornem operacionais […]») ( 42 ) e texto finalmente adotado («Ao garantir a operacionalidade dos programas de medidas especificados nos planos de gestão de bacias hidrográficas»).

    64.

    Por fim, é interessante observar que, na fase da aprovação do projeto comum, o Parlamento se congratulou pelo reforço do texto da posição comum no sentido de clarificar os objetivos ambientais e de lhes conferir um caráter mais vinculativo ( 43 ).

    b) Caráter transversal e operacional da proibição de deterioração, em especial face ao alcance da obrigação de melhoria

    65.

    Como o órgão jurisdicional de reenvio, apoiado pelo BUND, considero que a proibição de deterioração prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA, conjugado com o artigo 1.o, alínea a), da DQA, deve ser considerada uma regra de aplicação geral. Como o Tribunal de Justiça declarou ( 44 ), a sua aplicabilidade depende da adoção de um plano de gestão para uma determinada massa de água.

    66.

    Assim, em primeiro lugar, o teor dos trabalhos legislativos acima referidos demonstra que a proibição de deterioração foi concebida de modo autónomo, com o objetivo de preservar o estado das massas de água quando o seu estado seja, pelo menos, «bom».

    67.

    Em segundo lugar, o caráter transversal da proibição de deterioração decorre da comparação com a obrigação de melhoria prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), ii), da DQA. Recorde‑se que, nos termos do seu considerando 19, a DQA tem por objetivo conservar e melhorar o ambiente aquático na União. Na minha opinião, o legislador conferiu, todavia, um estatuto particular à obrigação de melhoria, que não se limita, ao contrário do que a Comissão sustenta, a uma relação de subordinação por força da qual a proibição de deterioração seria um instrumento do dever de melhoria.

    68.

    Assim, logo no artigo 1.o da DQA, que expõe o seu objeto, a melhoria é colocada em segundo plano relativamente à responsabilidade primordial dos Estados‑Membros em matéria de prevenção de qualquer degradação. De igual modo, o artigo 4.o da DQA, no seu n.o 1, alínea a), i), visa, antes de mais, a aplicação das medidas necessárias para evitar a deterioração, antes de visar, na subalínea ii), a proteção e a melhoria das massas de água de superfície. Por outro lado, a obrigação de melhoria é acompanhada de um calendário de execução com possibilidades de prorrogação, em aplicação do artigo 4.o, n.os 5 e 6, da DQA. Ao invés, a obrigação que decore do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA não está sujeita a qualquer prazo, o que permite concluir que a adoção das medidas destinadas a proibir qualquer deterioração é imediata e geral.

    69.

    Atendendo ao objetivo geral da DQA no sentido de alcançar um bom estado das águas em 2015, há que interpretar o alcance da obrigação de melhoria por referência a uma determinada massa de água e através dos efeitos das medidas a adotar. Consequentemente, o ponto de partida deveria ser o estado atual da massa de água em questão. Quando um projeto individual ou as medidas de planeamento sejam «neutros», por não conduzirem a uma melhoria nem a uma deterioração do estado de uma massa de água, tal abordagem só me parece permitida pelo legislador no caso de o estado atual da massa de água em questão ser, pelo menos, «bom». Ao invés, a obrigação de melhoria produz plenamente os seus efeitos se o estado atual da massa de água em causa for inferior a «bom».

    70.

    Em contrapartida, a proibição de deterioração continua a ser vinculativa em todas as fases da execução da DQA e é válida para todos os tipos e todos os estados de massas de água de superfície.

    71.

    De igual modo, a expressão «ao garantir a operacionalidade» dos programas de medidas, constante do artigo 4.o, n.o 1, da DQA, indica claramente que o legislador não se limitou a prever uma obrigação de adotar planos em grande escala, tendo antes pretendido impor um nexo entre a situação das massas de água individuais, inseridas numa bacia e numa região hidrográfica, e a realização dos objetivos definidos no artigo 4.o da DQA, respeitando o objetivo da DQA enunciado no seu artigo 1.o

    72.

    O acórdão Nomarchiaki Aftodioikisi Aitoloakarnanias e.a. (EU:C:2012:560) parece‑me muito esclarecedor a este respeito. Tratava‑se, nesse processo, da apreciação de um projeto de transvase de água de uma bacia ou região hidrográfica para outra, num momento em que não tinham ainda sido elaborados os planos de gestão. O Tribunal excluiu claramente, em tal caso, a aplicação do artigo 4.o da DQA, e, consequentemente, de uma derrogação nos termos do n.o 7 deste artigo ( 45 ). Em contrapartida, o Tribunal referiu‑se à obrigação de abstenção que se aplica a qualquer medida suscetível de comprometer a realização dos resultados previstos pela DQA, a qual é aplicada tanto durante o período de transposição como durante um período transitório ( 46 ). Tal demonstra, na minha opinião, toda a importância que o Tribunal atribui à realização dos objetivos do artigo 4.o da DQA e à preservação da sua força vinculativa. Ora, dificilmente se pode conceber que sejam aplicados requisitos mais rigorosos antes do termo do prazo de transposição do que após o mesmo.

    73.

    Por fim, sem se pronunciar diretamente sobre a natureza do artigo 4.o da DQA, o Tribunal precisou, todavia, na sua jurisprudência, que a DQA «contém disposições de natureza variada que impõem obrigações aos Estados‑Membros (v., a título de exemplo, o artigo 4.o, que obriga os Estados‑Membros a executar as medidas necessárias para prevenir a deterioração do estado de todas as massas de águas de superfície e subterrâneas))». O Tribunal declarou igualmente que «[o] artigo 2.o da diretiva, conjugado com, por exemplo, o artigo 4.o da mesma, impõe aos Estados‑Membros obrigações precisas a executar em prazos determinados, a fim de prevenir a deterioração do estado de todas as massas de águas de superfície e subterrâneas» ( 47 ).

    74.

    O artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da DQA foi, portanto, interpretado como uma disposição que impõe aos Estados‑Membros a obrigação de adotar as medidas necessárias à realização dos objetivos nela previstos ( 48 ), a saber, evitar a deterioração do estado de todas as massas de água de superfície e alcançar o bom estado das mesmas o mais tardar no final de 2015 ( 49 ).

    75.

    Todos estes elementos rejeitam claramente a tese do Governo alemão segundo a qual a prevenção da deterioração não seria uma expressão da proibição de deterioração e tal prevenção seria apenas um objetivo longínquo e não vinculativo da DQA.

    c) Quanto à importância da derrogação prevista no artigo 4.o, n.o 7, da DQA

    76.

    Nos termos do considerando 32 da DQA, «[p]odem existir motivos que justifiquem isenções à obrigação de prevenir uma maior deterioração». O regime das derrogações previstas no artigo 4.o da DQA comporta, portanto, várias categorias ( 50 ). Em especial, nos termos do referido artigo 4.o, n.o 7, da DQA, o facto de não se conseguir evitar a deterioração do estado de uma massa de águas de superfície quando tal deterioração resultar de alterações recentes das características físicas de tal massa de águas ( 51 ) não é considerado uma violação da DQA. Esta derrogação só se aplica, todavia, desde que tenham sido tomadas todas as medidas exequíveis para mitigar o impacto negativo sobre o estado da massa de água e que os programas de medidas e os planos de gestão tenham sido adotados em conformidade. Há que observar, em qualquer caso, que, nos termos do seu considerando 51, a execução da DQA permitirá alcançar um nível de proteção das águas pelo menos equivalente ao proporcionado por determinados atos legislativos anteriores do direito da União.

    77.

    O artigo 4.o, n.o 7, da DQA, é crucial para a interpretação do alcance dos objetivos ambientais, na aceção do seu n.o 1, principalmente por duas razões. Por um lado, a referida derrogação confirma a aplicabilidade da exigência de evitar qualquer degradação à aprovação de projetos particulares suscetíveis de implicar uma deterioração do estado de uma massa de água. Por outro lado, a sua letra confirma incontestavelmente a natureza vinculativa do objetivo que visa impedir a deterioração. O Estado‑Membro é, portanto, obrigado a recusar a aprovação de um projeto quando este comprometa a obtenção de um bom estado das águas de superfície, salvo no caso de se considerar que tal projeto é abrangido por uma derrogação.

    78.

    Com efeito, como a advogada‑geral J. Kokott recordou nas suas conclusões no processo Nomarchiaki Aftodioikisi Aitoloakarnanias e o. (C 43/10, EU:C:2011:651), o artigo 4.o da DQA não contém apenas obrigações programáticas, mas diz também respeito a projetos individuais, pelo menos se estes afetarem visivelmente o estado de uma massa de água ( 52 ). Com efeito, o artigo 4.o, n.o 7, permite a deterioração do estado das águas em consequência de alterações recentes. Tal pode resultar de projetos individuais. Com efeito, é impossível considerar separadamente um projeto e a execução de planos de gestão, do mesmo modo que qualquer licença de construção numa zona em que já exista um plano de ordenamento do território deve ser emitida em conformidade com tal plano.

    79.

    Consequentemente, salvo no caso de se tratar de projetos que não tenham praticamente nenhum impacto sobre o estado das massas de água e, portanto, sobre a gestão de uma região hidrográfica, os projetos são abrangidos pela proibição geral de deterioração do estado das massas de água, podendo, todavia, ser aprovados em aplicação do sistema das derrogações previstas no artigo 4.o da DQA.

    80.

    Em contrapartida, a interpretação proposta pelo Governo alemão privaria a DQA de efeitos, dado que seria possível adotar planos de gestão puramente teóricos que não tivessem qualquer nexo com as medidas individuais nem qualquer impacto sobre as mesmas.

    81.

    Ora, como resulta dos autos, o estado ecológico do Weser é já considerado crítico. O BUND declarou, sem ter sido contestado quanto a este aspeto, que o Weser é objeto de múltiplas alterações desde há anos. Atendendo à gravidade e ao número de problemas relativos à salinização pelo potássio e aos depósitos antropogénicos de nutrientes, é pouco provável que o Weser recupere, num futuro próximo, um bom estado ecológico ou um bom potencial ecológico ( 53 ). É essa também a conclusão que decorre claramente do plano de gestão atual do Weser, de 2009, segundo o qual os objetivos da DQA não poderão ser alcançados antes de 2015, o que implica o recurso a derrogações e a prorrogações ( 54 ). O próprio Governo alemão admite, nas suas observações escritas, que o projeto de ampliação em questão é tomado em conta no programa de medidas, no âmbito do planeamento, o que, na minha opinião, o insere no âmbito das obrigações que são impostas aos Estados‑Membros por força da DQA.

    82.

    Consequentemente, submeter um projeto como a ampliação do Weser à proibição de deterioração, nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA, constitui não só uma simples aplicação da DQA, como também a medida mais apropriada para preservar o efeito útil da DQA, como formulado no seu artigo 1.o

    83.

    É certo que esta interpretação da DQA impõe que se conclua que a maioria dos projetos sujeitos a aprovação e suscetíveis de provocarem uma deterioração serão abrangidos por uma derrogação, ao abrigo do artigo 4.o, n.o 7, da DQA, embora sejam, em principio, abrangidos pela proibição de deterioração. Porém, esta abordagem parece‑me apropriada, dado que permite a realização de projetos que respondam a outros imperativos (nomeadamente económicos), respeitando, simultaneamente, o objeto e os objetivos principais da DQA, ao permitir submeter a aprovação a condições e a limites adequados.

    5. Proposta de resposta à primeira e quarta questões prejudiciais

    84.

    Atendendo a todas as considerações anteriores, entendo que a proibição de deterioração e a obrigação de melhoria previstas no artigo 4.o da DQA são aplicáveis aos procedimentos de aprovação dos projetos individuais. Daqui decorre que, nesta fase, salvo derrogação concedida em conformidade com as disposições do direito da União aplicáveis ( 55 ), os Estados‑Membros são obrigados a recusar a aprovação de um projeto individual suscetível de comprometer o objetivo da referida diretiva.

    C – Quanto ao conceito de «deterioração », na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA (segunda e terceira questões)

    1. Observações das partes

    85.

    Através das suas segunda e terceira questões, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, em que condições se deve constatar uma «deterioração» do estado das massas de água, na aceção do 4.°, n.o 1, alínea a), i) da DQA. Observo, de passagem, que a articulação proposta pelo órgão jurisdicional de reenvio entre as questões submetidas me parece inadequada, dado que é impossível responder à questão relativa ao sistema de classificação sem ter analisado previamente o próprio conceito de «deterioração».

    86.

    O órgão jurisdicional de reenvio refere as considerações da autoridade que adotou a decisão de aprovação. Delas resulta que, apesar da constatação de que a ampliação do Weser levaria a alterações negativas do estado atual das massas de água, entende, todavia, que tal deterioração no interior de uma classe não deve ser considerada uma deterioração do potencial ecológico ou do estado ecológico de uma massa de água. A referida autoridade concluiu, portanto, pela inexistência de deterioração na aceção do § 27 do WHG, que transpõe o artigo 4.o, n.o 1, da DQA ( 56 ). Em contrapartida, baseando‑se, nomeadamente, na letra do artigo 4, n.o 1, alínea a), i), da DQA, o órgão jurisdicional de reenvio é de opinião que o conceito de «deterioração» não pode ser entendido no sentido de visar apenas as alterações que se traduzam numa classificação numa classe inferior, nos termos do anexo V da DQA.

    87.

    No que respeita à segunda questão, na opinião do BUND e da Comissão, a «deterioração» na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA não depende apenas da alteração das classes de estado, dado que a DQA proíbe qualquer deterioração relevante dentro da mesma classe. Alegam, a este respeito, que esta disposição proíbe, de maneira geral, a deterioração do estado das massas de água de superfície (v. subalínea i) e só remete para o anexo V da DQA no que respeita à obrigação de melhoria (v. subalíneas ii e iii), e, portanto, à classificação nele prevista.

    88.

    No que respeita à terceira questão, o BUND alega que a «deterioração» na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA corresponde a qualquer influência que tenha repercussões negativas sobre o estado das águas ou que se situe acima de um limiar de minimis decorrente do princípio da proporcionalidade, incluindo, em princípio, os impactos negativos locais e a curto prazo. A Comissão, por seu turno, considera que se verifica uma «deterioração» sempre que o estado de pelo menos um dos elementos de qualidade utilizados para avaliar o estado ecológico das águas de superfície desça pelo menos uma classe.

    89.

    Os Governos alemão, britânico, neerlandês e polaco consideram, em contrapartida, que só devem ser consideradas «deteriorações» as alterações que se traduzam numa classificação numa classe inferior, definida nos termos do anexo V da DQA. O Governo alemão e, em substância, também os Governos britânico e polaco, consideram que, apesar de o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA não remeter para o anexo V da DQA, a classificação prevista é indiretamente aplicável. Por outro lado, apesar da sua proposta de resposta à terceira questão prejudicial, o Governo neerlandês sugere uma interpretação do conceito de «deterioração» atendendo a diferentes elementos de qualidade ou a substâncias e não ao nível do estado ecológico global. Por fim, o Governo francês defendeu na audiência uma tese segundo a qual o conceito de deterioração corresponderia unicamente a uma classificação global do estado ecológico num nível inferior, em conformidade com os critérios do anexo V da DQA.

    2. Quanto ao mecanismo de classificação do estado ecológico das massas de água ( 57 ) estabelecido pela DQA

    90.

    Observe‑se, a título preliminar, que tanto as dúvidas do órgão jurisdicional de reenvio como as divergências entre as partes têm origem no debate da doutrina que opõe os defensores da teoria segundo a qual o conceito de deterioração corresponde a uma classificação numa classe inferior, nos termos do anexo V da DQA (teoria dita «das classes») aos defensores da teoria segundo a qual o conceito de deterioração corresponde a qualquer modificação do estado das massas de água (teoria dita «do statu quo»). Estas teorias representam, portanto, duas posições extremas na interpretação do conceito de deterioração na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA. Ora, para poder abordar o referido conceito, parece‑me indispensável completar este quadro com um estudo mais aprofundado dos aspetos técnicos que resultam da DQA ( 58 ).

    91.

    Como já observei, a avaliação do estado das águas de superfície assenta numa análise do estado ecológico que abrange cinco classes ( 59 ).

    92.

    Há que sublinhar, todavia, que cada classe, incluindo a de um estado ecológico excelente, é determinada em função do desvio relativamente a condições de referência, nos termos do ponto 1.2 do anexo V da DQA, a saber, valores normalmente associados a um tipo de massa de água em condições não perturbadas. Trata‑se, portanto, das condições naturais das águas de superfície, específicas para cada tipo de massa de água ( 60 ), sem serem, porém, definidas pela DQA.

    93.

    Considera‑se, portanto, que um bom estado ecológico, na aceção do anexo V da DQA, corresponde a uma ligeira distorção resultante da atividade humana relativamente ao estado normal associado ao tipo de massa de água de superfície considerado em condições não perturbadas. Por outras palavras, quanto maior for o desvio relativamente ao estado virgem ou histórico das massas de água, maior será considerada a degradação do estado ecológico de uma massa de água.

    94.

    Para efeitos de apreciação do estado ecológico, os Estados‑Membros devem basear‑se nos elementos de qualidade biológica que constituem a sua base, completados pelos elementos físico‑químicos e pelos elementos hidromorfológicos ( 61 ). Cada um dos referidos elementos de qualidade comporta uma longa lista de parâmetros ( 62 ). São previstas listas separadas para os rios, os lagos, as águas de transição e as águas costeiras.

    95.

    Seguidamente, para quantificar o desvio entre as condições normais e o estado atual da massa de água, os Estados‑Membros devem estabelecer rácios de qualidade ecológica (a seguir «RQE»). O RQE representa uma relação entre os valores dos parâmetros biológicos observados para uma dada massa de águas de superfície e os valores desses parâmetros nas condições de referência aplicáveis a essa massa ( 63 ). O rácio é expresso sob a forma de um valor numérico entre zero e um. Um estado ecológico excelente é representado por valores próximos de um e um mau estado ecológico representado por valores próximos de zero.

    96.

    Assim, é só nesta fase avançada que os Estados‑Membros repartem os RQE de cada categoria de águas de superfície em cinco classes, através de um valor‑limite dos elementos de qualidade biológica que indica a fronteira entre estas diferentes classes (excelente, bom, razoável, medíocre e mau) ( 64 ). Os valores‑limite devem ser estabelecidos através do exercício de intercalibração ( 65 ) que consiste em comparar os resultados de classificação dos sistemas de monitorização nacionais para cada elemento biológico e para cada um dos tipos comuns de massas de água de superfície nos Estados‑Membros que façam parte do mesmo grupo de intercalibração geográfica, e em avaliar a coerência dos resultados com as definições normativas constantes do anexo V, secção 1.2, da DQA ( 66 ). O exercício de intercalibração serve apenas, todavia, para delimitar os estados das classes «excelente», «bom» e «razoável» ( 67 ). Os valores‑limite dos Estados‑Membros constam da «decisão sobre a intercalibração» adotada pela Comissão ( 68 ).

    97.

    Por fim, a regra primordial, invocada pela Comissão é a descrita pela expressão «one out all out» ( 69 ). Nos termos deste princípio, uma massa de água é classificada na classe imediatamente inferior desde que o rácio de um dos elementos de qualidade se encontre abaixo do nível correspondente à classe atual. Esta técnica está associada à definição do «estado das águas de superfície» constante do artigo 2.o, ponto 17, da DQA, que deve ser determinado pelo pior dos seus dois estados, ecológico ou químico.

    3. Consequências sobre a interpretação do conceito de «deterioração» na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA

    98.

    Atendendo à análise precedente, é manifesto que o sistema de classificação constitui um instrumento de alcance transversal, no qual se baseia o sistema de gestão estabelecido pela DQA. Tal é confirmado pelo artigo 2.o, ponto 21, da DQA, que remete para a classificação nos termos do anexo V. O referido anexo qualifica estas classificações do estado ecológico como «definições normativas».

    99.

    Todavia, é igualmente incontestável que a determinação dos valores‑limite entre as classes se traduz numa adoção de intervalos extremamente amplos. Por conseguinte, as classes são apenas um instrumento que demarca ou limita a ação muito detalhada dos Estados‑Membros que consiste em determinar os elementos de qualidade que reflitam um estado real de uma dada massa de água. Parece‑me, portanto, que é nomeadamente por esta razão que o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da DQA não remete para o anexo V, dado que o conceito de deterioração, um conceito clássico no direito da água, é um conceito de alcance global neste domínio que ultrapassa a tecnicidade da DQA.

    100.

    Consequentemente, entre as duas teorias opostas atrás referidas, sou de opinião que a interpretação mais equilibrada e coerente relativamente aos objetivos decorrentes dos artigos 1.° e 4.° da DQA é a que considera que o conceito de «deterioração do estado de uma massa de água de superfície» deve ser avaliado por referência a qualquer substância ou elemento de qualidade que faça parte da avaliação do estado ecológico, na aceção da DQA, sem que tal se traduza necessariamente numa alteração da classificação.

    101.

    Com efeito, importa recordar que, ao adotar a DQA, o legislador pretendeu salientar a importância da abordagem ecológica na gestão da água. É também essa a abordagem subjacente à classificação das águas de superfície que exige diversos requisitos do ponto de vista do seu estado ecológico e do seu estado químico. Esta abordagem é corroborada pela aplicação do princípio «one out all out», que constitui uma expressão particular do princípio da precaução ( 70 ). Observe‑se, porém, que a aplicação deste princípio retira utilidade ao sistema de classificação como instrumento eventual de tomada de decisão operacional, na medida em que lhe retira a sua função de média (matemática) dos indicadores do estado de uma determinada massa de água.

    102.

    Na verdade, parece‑me que a aplicação da regra «one out all out» associada à teoria das classes leva a resultados contraprodutivos. Assim, como a Comissão, sou de opinião que a adoção da teoria das classes apresenta o risco de levar à exclusão das águas da classe mais baixa do âmbito de aplicação da proibição de deterioração, bem como de debilitar a proteção das águas incluídas nas classes mais elevadas. Ora, atendendo ao objetivo da DQA, este tipo de água merece uma atenção particular no âmbito da gestão das águas. É certo que, segundo o princípio «one out all out», a deterioração de um único parâmetro basta para classificar toda a massa num nível inferior. Ora, depois dessa classificação num nível inferior, todos os outros parâmetros poderiam deteriorar‑se sem que tal envolvesse qualquer deterioração segundo a teoria das classes ( 71 ).

    103.

    A avaliação do conceito de deterioração através do prisma das classes levará, portanto, a excluir do âmbito de aplicação da DQA inúmeras alterações do estado dos elementos de qualidade, o que compromete a realização do objetivo desta diretiva.

    104.

    Por outro lado, e sem pretender tomar parte numa discussão científica a propósito da DQA, observo que existem várias posições críticas quanto ao modelo de classificação ( 72 ). Parece, portanto, que, na realidade, o referido sistema conduz na maioria dos casos a resultados aproximativos ou insatisfatórios, no sentido de que não reflete um estado atual do ecossistema.

    105.

    Pelo contrário, se o conceito de «deterioração» for interpretado por referência a um elemento de qualidade ou a uma substância, a proibição de deterioração mantém todo o seu efeito útil, na medida em que abrange qualquer alteração suscetível de comprometer a realização do objetivo principal da DQA.

    106.

    Por fim, saliente‑se que várias partes se referem ao mesmo documento de orientação da Comissão ( 73 ), embora retirando conclusões opostas. Nos termos desse documento, «no âmbito do artigo 4.o, n.o 7, os objetivos de prevenção da deterioração do estado ecológico referem‑se a alterações de classe e não a alterações dentro das classes. Os Estados‑Membros não necessitam, portanto, de recorrer ao artigo 4.o, n.o 7, para alterações dentro de uma classe».

    107.

    A este respeito, constato uma certa confusão entre o conceito de deterioração e uma violação das disposições da DQA, enquanto tal. Parece‑me, com efeito, que o referido documento confirma a tese segundo a qual o Estado‑Membro é obrigado a adotar todas as medidas que permitam alcançar um bom estado das massas de água, executando os objetivos ambientais previstos no artigo 4.o da DQA. Em contrapartida, o Estados‑Membros não será objeto de qualquer sanção se, apesar de todos os seus esforços, tal estado não for alcançado. Em qualquer caso, como o Governo alemão referiu, este documento, por mais útil que possa parecer, não tem valor vinculativo. Além disso, não constitui uma comunicação da Comissão na aceção da jurisprudência no domínio do direito da concorrência ou das sanções financeiras ( 74 ).

    108.

    Em qualquer caso, gostaria de salientar que nem a letra nem o objetivo da DQA permitem, em caso algum, confirmar a existência de um limiar de minimis para efeitos de uma teoria da deterioração grave, como é apresentada pelo órgão jurisdicional de reenvio. Com efeito, o único limite mínimo das obrigações de proteção do estado das águas é o que resulta da legislação da União já em vigor, em conformidade com o considerando 51 da DQA, conjugado com os artigos 4.°, n.os 8 e 9, e 11.°, n.o 3, alínea a), desta.

    109.

    Atendendo a todas as considerações anteriores, proponho que se responda à segunda e terceira questões prejudiciais que o conceito de deterioração deve ser interpretado por referência a uma substância ou a um elemento de qualidade que faça parte da avaliação do estado ecológico, na aceção do anexo V da DQA, sem que a alteração deva necessariamente traduzir‑se numa alteração da classificação. Tal alteração da classificação pode verificar‑se, todavia, no caso de o valor de uma substância ou de um elemento de qualidade descer abaixo do nível correspondente à classificação atual.

    V – Conclusão

    110.

    Proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões submetidas do seguinte modo:

    O artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2000, que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da política da água, conforme alterada pela Diretiva 2009/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, deve ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros são obrigados, sob reserva de concessão de uma derrogação em conformidade com as disposições do direito da União aplicáveis, a recusar a aprovação de um projeto quando este seja suscetível de provocar uma deterioração do estado de uma massa de água de superfície ou de comprometer a obtenção de um bom estado das águas de superfície ou de um bom potencial ecológico e de um bom estado químico das águas de superfície na data prevista pela referida diretiva.

    O conceito de «deterioração do estado», que figura no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), i), da Diretiva 2000/60, conforme alterada pela Diretiva 2009/31, deve ser interpretado no sentido de que visa alterações relativas a uma substância ou a um elemento de qualidade que faça parte da avaliação do estado ecológico, na aceção do anexo V da referida diretiva, sem que a alteração deva necessariamente traduzir‑se numa alteração da classificação, na aceção do referido anexo. Tal alteração da classificação pode verificar‑se, todavia, no caso de o valor da substância ou do elemento de qualidade descer abaixo do nível correspondente à classificação atual.


    ( 1 ) Língua original: francês.

    ( 2 ) JO L 327, p. 1. Diretiva conforme alterada pela Diretiva 2009/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009 (JO L 140, p. 114). Saliente‑se que esta diretiva foi completada pela Diretiva 2006/118/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa à proteção das águas subterrâneas contra a poluição e a deterioração (JO L 372, p. 19).

    ( 3 ) V., para uma apresentação detalhada: Josefsson H., Baaner, L., «The Water Framework Directive: A Directive for the Twenty‑First Century?», Journal of Environmental Law, vol. 23 (2011), n.o 3, p. 463; Irvine, K., «Classifying ecological status under the European Water Framework Directive: the need for monitoring to account for natural variability», Aquatic Conservation: Marine and Freshwater Ecosystems, vol. 14, n.o 2 (2004), p. 107; Thieffry, P., «Le nouveau cadre de la politique communautaire de l’eau», Europe, n.o 2 (2001), p. 4; e Leprince, S., «La directive cadre 2000/60/CE ‘eau’: exposé général et premières considérations relatives à sa mise en œuvre», em Neuray, J.F. (ed.), La directive 2000/60/CE du 23 octobre 2000 établissant un cadre pour une politique communautaire dans le domaine de l’eau, Bruylant, 2005.

    ( 4 ) A título de ilustração, no seu artigo 2.o a DQA contém 41 definições diversas, abrangendo tanto conceitos geográficos como conceitos técnicos relativos ao estado das águas. O objetivo da DQA é descrito por uma meia dúzia de características enumeradas no seu artigo 1.o Além disso, a determinação dos objetivos ambientais é apresentada no artigo 4.o da DQA através de um regime que comporta vários níveis de derrogações.

    ( 5 ) V. documentos de orientação da Comissão constantes do seguinte endereço: http://www.waterframeworkdirective.wdd.moa.gov.cy/guidance.html.

    ( 6 ) Tais como Water information system for Europe (WISE), Infrastructure for spatial information in the European Community (Inspire), Shared environmental information system (SEIS), Programme européen de surveillance de la Terre (GMES).

    ( 7 ) V. Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões, intitulada: «Uma matriz destinada a preservar os recursos hídricos da Europa», [COM(2012) 673 final, p. 18].

    ( 8 ) Documento do Conselho 10917/06, do 26 de junho de 2006, intitulado «Reapreciação da Estratégia da UE para o Desenvolvimento Sustentável (EDS) — Nova estratégia».

    ( 9 ) V. considerando 19 da DQA.

    ( 10 ) A DQA é aplicável, nos termos do seu artigo 1.o, a todas as águas: de superfície interiores, de transição, costeiras e subterrâneas.

    ( 11 ) Prevê‑se uma definição distinta para uma massa de águas subterrâneas.

    ( 12 ) V. anexo II, ponto 1.1, da DQA.

    ( 13 ) O artigo 2.o, ponto 21, relativo ao estado ecológico, remete para o anexo V da DQA, o que permite a classificação do estado das massas de água e, consequentemente, a determinação dos resultados a alcançar em termos de qualidade das águas. O artigo 2.o, ponto 24, da DQA, relativo ao bom estado químico, remete para o anexo IX da DQA. O estado químico de uma massa de água de superfície é determinado por referência ao cumprimento das normas de qualidade ambiental (NQA), através de valores‑limite. São definidas duas classes: bom (cumprimento) e insuficiente (incumprimento). São controladas 41 substâncias: 8 substâncias ditas perigosas (anexo IX da DQA) e 33 substâncias prioritárias (anexo X da DQA).

    ( 14 ) O § 31, n.o 2, primeira frase, do WHG, dispõe: «2) Se o bom estado ecológico das águas de superfície não for alcançado, ou se o seu estado se deteriorar, tal não será contrário aos objetivos de gestão enumerados nos §§ 27 e 30 se 1.) tal resultar de uma modificação recente das características físicas das águas ou do nível piezómetrico das águas subterrâneas, 2.) essa modificação responder a um interesse geral superior ou as vantagens da modificação recente para a saúde ou a segurança das pessoas ou para o desenvolvimento sustentável superarem as vantagens para o ambiente e para a coletividade associadas à realização dos objetivos de gestão, 3.) os objetivos prosseguidos pela modificação das águas não puderem ser alcançados por outras medidas adequadas cujo impacto negativo sobre o ambiente seja consideravelmente menor, que sejam tecnicamente realizáveis e cujo custo não seja desproporcionado e 4.) forem tomadas todas as medidas adequadas na prática para reduzir o impacto negativo sobre o estado das águas».

    ( 15 ) Para uma análise da relação entre estas duas questões, v. n.o 85 das presentes conclusões.

    ( 16 ) Acórdão Stichting Natuur en Milieu e o. (C‑165/09 a C‑167/09, EU:C:2011:348, n.o 75).

    ( 17 ) Acórdãos Comissão/Luxemburgo (C‑32/05, EU:C:2006:749, n.o 41) e Comissão/Alemanha (C‑525/12, EU:C:2014:2202, n.o 50).

    ( 18 ) No que respeita às massas de água artificiais e fortemente modificadas, devem pelo menos visar um bom potencial ecológico e um bom estado químico.

    ( 19 ) As especificações que constam do anexo II da DQA permitem proceder a uma primeira qualificação de todas as massas de água em causa, reparti‑las por categorias (rios, lagos, águas de transição, águas costeiras, massas de água de superfície artificiais ou fortemente modificadas) e, seguidamente, por tipos (A ou B). Além disso, é também exigida uma análise económica, em conformidade com o anexo III.

    ( 20 ) V. anexo II da DQA.

    ( 21 ) Quanto a estes tipos de massas, a DQA impõe uma análise mais aprofundada, para otimizar a conceção dos programas de monitorização nos termos do artigo 8.o da DQA e dos programas de medidas nos termos do artigo 11.o da DQA. V. anexo II, ponto 1.5, in fine, da DQA.

    ( 22 ) V. artigo 8.o da DQA, conjugado com os pontos 1.3 e 1.4. do seu anexo V.

    ( 23 ) Para uma descrição detalhada dos tipos de monitorização, v. WISE Guidance Document, note n.o 6, http://ec.europa.eu/environment/water/participation/pdf/waternotes/WATER%20INFO%20NOTES%206%20‑%20FR.pdf.

    ( 24 ) Os resultados das monitorizações e vigilância são utilizados, nomeadamente, nos termos do ponto 1.3.1. do anexo V da DQA, para determinar os requisitos a satisfazer pelos programas de monitorização tanto do plano de gestão da bacia em questão como dos planos futuros.

    ( 25 ) V. Relatório da Comissão sobre a execução da DQA, COM (2012) 670 final, p. 4.

    ( 26 ) Neste sentido, a doutrina salientou que, embora os programas de medidas sejam estabelecidos para uma determinada região hidrográfica, o seu conteúdo é normalmente executado através de medidas legislativas aplicáveis em todo o território do Estado‑Membro em questão, e não através de decisões adotadas apenas ao nível da região hidrográfica em causa. V. Hollo, E., Vertaileva Vesioikeus, p. 119 (Direito comparado da água), Suomen Ympäristöoikeustieteen Seura ry, Helsínquia 2003.

    ( 27 ) Definidos no anexo VI, parte B, da DQA.

    ( 28 ) V. lista que consta do anexo VI, parte A, da DQA.

    ( 29 ) Na aceção do anexo II, pontos 1.4. e 1.5 da DQA.

    ( 30 ) Os planos de gestão (artigo 13.o, n.os 6 e 7) e os programas de medidas (artigo 11.o, n.o 7) obedecem ao mesmo calendário: devem ser estabelecidos até 22 de dezembro de 2009, reexaminados antes de 22 de dezembro de 2015 e, posteriormente, de seis em seis anos. As medidas propriamente ditas devem estar operacionais em 22 de dezembro de 2012.

    ( 31 ) V. plano de gestão para 2009 disponível no seguinte endereço: http://www.fgg‑weser.de/Download‑Dateien/bwp2009_weser_091222.pdf.

    ( 32 ) V., a contrario, acórdão Stichting Natuur en Milieu e o. (EU:C:2011:348), que respeita à Diretiva 2001/81/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2011, relativa ao estabelecimento de valores‑limite nacionais de emissão de determinados poluentes atmosféricos (JO L 309, p. 22).

    ( 33 ) Previsto nos pontos 1.4.1 iv) a ix) do anexo V da DQA. Para uma análise deste conceito, v. n.o 96 das presentes conclusões.

    ( 34 ) V. documento explicativo da Comissão: Common Implementation Strategy for the Water Framework Directive, Guidance Document on Exemptions to the Environmental Objectives, Document n.o 20.

    ( 35 ) Há que observar, além disso, que o artigo 4.o da DQA introduz um sistema de gradação do objetivos a alcançar quando, segundo o legislador, seja provável que a mesma massa de água esteja sujeita a diferentes objetivos e, consequentemente, a diferentes medidas. Resulta, com efeito, do artigo 4.o, n.o 2, da DQA que, no caso de vários objetivos da DQA se referirem a uma mesma massa de água, serão aplicados os mais estritos.

    ( 36 ) Proposta de Diretiva do Conselho [COM(97) 49 final, ponto 1].

    ( 37 ) V., por exemplo, a proposta inicial da Comissão [COM(97) 49 final]; a proposta alterada, COM(1999) 271 final, pp. 16 a 22; a posição comum do Conselho n.o 41/1999, já referida, bem como o projeto comum aprovado pelo Comité de Conciliação previsto no n.o 4 do artigo 251.o do Tratado CE, PE‑CONS 3639/00, ENV 221, CODEC 513.

    ( 38 ) V. alteração n.o 42 e ponto 3.1 do Relatório do Parlamento Europeu de 8 de julho de 1998, sobre a proposta e as propostas alteradas de uma Diretiva do Conselho relativa a um quadro de ação comunitária no domínio da política da água [COM(97)0049 ‑ C4‑0192/97, COM(97)0614 ‑ C4‑0120/98 e COM(98)0076 ‑ C4‑0121/98 ‑ 97/0067(SYN)], documento A4‑0261/98.

    ( 39 ) V. ponto 3.2.1 do relatório do Parlamento Europeu, referido na nota de pé de página anterior.

    ( 40 ) COM(97) 49 final.

    ( 41 ) Artigo 4.o na versão que decorre da posição comum (CE) n.o 41/1999, de 22 de outubro de 1999, adotada pelo Conselho deliberando nos termos do procedimento previsto no artigo 251.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia (JO C 343, p. 1).

    ( 42 ) Artigo 4.o da DQA na versão do parecer da Comissão nos termos do n.o 2, alínea c), do artigo 251.o do Tratado CE, sobre as alterações do Parlamento Europeu à posição comum do Conselho respeitante à proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a um quadro de ação comunitária no domínio da política da água [COM(97) 49 final, COM(97) 614 final, COM(98) 76 final e COM(1999) 271 final], que altera a proposta da Comissão nos termos do n.o 2 do artigo 250.o do Tratado CE [COM(2000) 219 final — COD 97/0067.

    ( 43 ) Relatório sobre o projeto comum, aprovado pelo Comité de Conciliação, de uma diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da política da água [C5‑0347/2000 — 1997/0067(COD)], documento n.o A5‑0214/2000: «Para os objetivos e a sua natureza vinculativa, o compromisso alcançado segue quase totalmente os princípios estabelecidos nas alterações do Parlamento em segunda leitura. A formulação das diversas obrigações é agora ‘os Estados‑Membros devem’. As tentativas do Conselho para diluir a obrigação aditando a expressão ‘quando for praticável’ aos diversos pontos depararam com a oposição bem sucedida da delegação do Parlamento.»

    ( 44 ) Porém, em conformidade com a jurisprudência Inter‑Environnement Wallonie (acórdão C‑129/96, EU:C:1997:628, n.o 45), a proibição de deterioração impõe‑se mesmo durante o período transitório, antes da adoção dos planos de gestão. V. acórdão Nomarchiaki Aftodioikisi Aitoloakarnanias e o. (C‑43/10, EU:C:2012:560, n.os 57 e 58).

    ( 45 ) O Tribunal salientou, todavia, o nexo entre as medidas de conservação relevantes que os Estados‑Membros são obrigados a tomar por força do artigo 4.o, n.o 1, da DQA e a existência prévia de um plano de gestão para a região em causa, v. acórdão Nomarchiaki Aftodioikisi Aitoloakarnanias e o. (EU:C:2012:560, n.os 49 a 62).

    ( 46 ) Acórdão Nomarchiaki Aftodioikisi Aitoloakarnanias e o. (EU:C:2012:560, n.os 57 e 58).

    ( 47 ) Acórdão Comissão/Luxemburgo (EU:C:2006:749, n.os 42 e 63).

    ( 48 ) V. n.o 53 das conclusões da advogada‑geral E. Sharpston no processo Comissão/Luxemburgo (C‑32/05, EU:C:2006:334).

    ( 49 ) V. n.o 59 das conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Nomarchiaki Aftodioikisi Aitoloakarnanias e o. (EU:C:2011:651).

    ( 50 ) Com exceção das zonas protegidas, na aceção do artigo 1.o, n.o 1, alínea c), da DQA, os Estados‑Membros podem procurar alcançar objetivos ambientais de qualidade menos estritos para determinadas massas de água, como prevê o artigo 4.o, n.o 5, da DQA, quando estas «estejam tão afetadas pela atividade humana» ou «o seu estado natural seja tal que se revele inexequível ou desproporcionadamente oneroso alcançar esses objetivos». Em conformidade com o artigo 4.o, n.o 6, da DQA, a deterioração temporária do estado das massas de água não será considerada uma violação da DQA se resultar de circunstâncias naturais ou de força maior. Por fim, salvo no que respeita às águas protegidas, embora, nos termos da DQA, o bom estado das massas de água deva, em princípio, ser alcançado em 2015, são também admitidas prorrogações em aplicação do artigo 4.o, n.o 4, da DQA.

    ( 51 ) Esta derrogação é igualmente aplicável em caso de alteração do nível das massas de águas subterrâneas.

    ( 52 ) V. n.o 62 das conclusões da advogada geral J. Kokott no processo Nomarchiaki Aftodioikisi Aitoloakarnanias e o. (EU:C:2011:651).

    ( 53 ) O BUND remete para o plano de gestão do Weser (http://www.fgg‑weser.de/Download_Dateien/bwp2009_weser_091222.pdf), do qual resulta que, nos setores afetados do Weser inferior, as massas de água de superfície têm apenas, na maior parte dos casos, um potencial ecológico medíocre e certos afluentes do Weser, também afetados pelo projeto de ampliação, têm até um potencial ecológico mau.

    ( 54 ) V. plano de gestão já referido, capítulo 5, pp. 6 e seguintes. Além disso, o BUND esclarece que a Comissão deu início, a este respeito, a um procedimento por incumprimento contra a República Federal da Alemanha, com a referência n.o 2012/4081 (a notificação da Comissão tem data de 21 de junho de 2012), com fundamento em que o plano de gestão era insuficiente a este respeito.

    ( 55 ) A este respeito, entendo que há que tomar em conta não só as derrogações previstas no artigo 4.o da DQA, como também o conjunto da legislação aplicável no domínico da água que seja suscetível de interferir com a diretiva‑quadro. Para uma apresentação do conjunto das diretivas pertinentes nesta matéria, v. n.o 43 das minhas conclusões no processo Comissão/Alemanha (C‑525/12, EU:C:2014:449),.

    ( 56 ) O § 27 do WHG, intitulado «Objetivos de gestão no que respeita às águas de superfície», prevê: «1) Na medida em que não sejam qualificadas como artificiais ou fortemente modificadas em conformidade com o § 28, as águas de superfície são geridas de modo 1.) a evitar a deterioração do seu estado ecológico e do seu estado químico e 2.) a preservar ou alcançar um bom estado ecológico e um bom estado químico. 2) As águas de superfície que sejam qualificadas como artificiais ou fortemente modificadas em conformidade com o § 28 são geridas de modo 1.) a evitar a deterioração do seu potencial ecológico e do seu estado químico e 2.) a preservar ou alcançar um bom potencial ecológico e um bom estado químico».

    ( 57 ) A presente análise não respeita a águas subterrâneas nem a massas de água fortemente modificadas ou artificiais.

    ( 58 ) Para uma apresentação detalhada do sistema de classificação, v. Common Implementation Strategy, Guidance Document n.o 13, intitulado «Overall approach to the classification of ecological status and ecological potential».

    ( 59 ) No que respeita ao estado químico, a DQA prevê duas classes.

    ( 60 ) Para uma apresentação dos tipos A e B e das categorias de massas, v. anexos II e V da DQA.

    ( 61 ) Os Estados‑Membros verificam, portanto, quanto a cada tipo de massa de água, as condições hidromorfológicas e físico‑químicas específicas que representem os valores dos elementos de qualidade constantes do ponto 1.1 do anexo V da DQA. Os Estados‑Membros devem também identificar as condições biológicas de referência específicas que representem os valores dos elementos de qualidade constantes do ponto 1.2 do anexo V da DQA.

    ( 62 ) V. ponto 1.2.1. do anexo V da DQA. No que respeita aos elementos de qualidade biológica, trata‑se, nomeadamente, da estimativa do fitoplâncton, dos macrófitos e fitobentos, da fauna bentónica invertebrada e da fauna piscícola. No que respeita aos elementos hidromorfológicos, trata‑se da estimativa das caudais e das condições de escoamento, das ligações às águas subterrâneas, da continuidade do rio, das estruturas do leito, das variações de largura e de profundidade, da estrutura e condições das zonas ripícolas. Quanto aos elementos de qualidade físico‑química, trata‑se da estimativa dos níveis de salinidade, do balanço de oxigénio, da temperatura, do pH e dos poluentes específicos.

    ( 63 ) Nos termos do ponto 1.4. 1., ii), do anexo V da DQA.

    ( 64 ) Em conformidade com o ponto 1.2 do anexo V da DQA.

    ( 65 ) Previsto nos pontos 1.4.1 iv) a ix) do anexo V da DQA.

    ( 66 ) V. considerando 5 da Decisão da Comissão, de 20 de setembro de 2013, que estabelece, nos termos da Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, os valores para a atribuição de classificações com base nos sistemas de monitorização dos Estados‑Membros, no seguimento do exercício de intercalibração, e revoga a Decisão 2008/915/CE, JO L 266, p. 1.

    ( 67 ) V. anexo V, ponto 1.4.1., iii), da DQA.

    ( 68 ) V. decisão da Comissão de 20 de setembro de 2013 mencionada na nota de pé de página 66 das presentes conclusões.

    ( 69 ) Constante do ponto 1.4.2. i), do anexo V, da DQA.

    ( 70 ) Segundo a doutrina, conduz, todavia, na maioria dos casos, a uma subclassificação, V. Josefsson H. e Baaner, L., «The Water Framework Directive: A Directive for the Twenty‑First Century?», Journal of Environmental Law, vol. 23 (2011), n.o 3, p. 471.

    ( 71 ) A este respeito, basta referir a hipótese em que o estado de uma massa de água, no seu conjunto, deva ser qualificado como «mau» atendendo a um único parâmetro. Em tal caso, embora não seja possível, formalmente, qualquer degradação, serão permitidas, na realidade, todas as degradações à luz dos restantes parâmetros.

    ( 72 ) Assim, sugere‑se, em especial, que seria mais razoável considerar um estado excelente como equivalente a condições de referência. Além disso, salientou‑se que, para poder estabelecer limites entre as classes, seria conveniente adotar como base uma análise puramente científica cuja metodologia, na realidade, não foi ainda determinada. V. um estudo de: Van de Bund, W., e de Solimini, A., Ecological Quality Ratios for Ecological Quality Assessment in Inland and Marine Waters, Rebecca Deliverable 10, Joint Research Centre, Institute for Environment and Sustainability 2007, p. 10. http://publications.jrc.ec.europa.eu/repository/bitstream/111111111/10875/2/6757%20‑%20Deliverable_10_1%200recc.pdf. V. igualmente Moss, B., The determination of ecological status in shallow lakes — a tested system (Ecoframe) for implementation of the European Water Framework Directive, KOPS 2003.

    ( 73 ) V. Guidance Document n.o 20, já referido.

    ( 74 ) V. acórdãos Dansk Rørindustri e o./Comissão (C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, EU:C:2005:408, n.os 211 a 213) e Comissão/Portugal (C‑70/06, EU:C:2008:3, n.o 34).

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