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Document 62012CJ0279

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 19 de dezembro de 2013.
    Fish Legal e Emily Shirley contra Information Commissioner e United Utilities, Yorkshire Water e Southern Water.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Upper Tribunal (Administrative Appeals Chamber) (Reino Unido).
    Reenvio prejudicial — Convenção de Aarhus — Diretiva 2003/4/CE — Acesso do público às informações sobre ambiente — Âmbito de aplicação — Conceito de ‘autoridade pública’ — Empresas de saneamento e de distribuição de água — Privatização do setor da água em Inglaterra e no País de Gales.
    Processo C‑279/12.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2013:853

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

    19 de dezembro de 2013 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Convenção de Aarhus — Diretiva 2003/4/CE — Acesso do público às informações sobre ambiente — Âmbito de aplicação — Conceito de ‘autoridade pública’ — Empresas de saneamento e de distribuição de água — Privatização do setor da água em Inglaterra e no País de Gales»

    No processo C‑279/12,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Upper Tribunal (Administrative Appeals Chamber) (Reino Unido), por decisão de 21 de maio de 2012, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 4 de junho de 2012, no processo

    Fish Legal,

    Emily Shirley

    contra

    Information Commissioner,

    United Utilities Water plc,

    Yorkshire Water Services Ltd,

    Southern Water Services Ltd,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

    composto por: V. Skouris, presidente, K. Lenaerts, vice‑presidente, M. Ilešič, L. Bay Larsen, T. von Danwitz, E. Juhász, A. Borg Barthet e J. L. da Cruz Vilaça, presidentes de secção, A. Rosas, G. Arestis, A. Arabadjiev, C. Toader, A. Prechal (relatora), E. Jarašiūnas e C. Vajda, juízes,

    advogado‑geral: P. Cruz Villalón,

    secretário: A. Impellizzeri, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 16 de abril de 2013,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da Fish Legal, por W. Rundle, solicitor, assistido por D. Wolfe, QC,

    em representação de E. Shirley, por R. McCracken, QC, e M. Lewis, barrister,

    em representação do Information Commissioner, por R. Kamm e A. Proops, barristers, mandatadas por R. Bailey, solicitor,

    em representação da United Utilities Water plc, da Yorkshire Water Services Ltd e da Southern Water Services Ltd, por T. de la Mare, QC, mandatado por J. Mullock, solicitor,

    em representação do Governo do Reino Unido, por J. Beeko, na qualidade de agente, assistida por J. Eadie, QC, J. Maurici e C. Callaghan, barristers,

    em representação do Governo dinamarquês, por V. Pasternak Jørgensen e M. Wolff, na qualidade de agentes,

    em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por P. Gentili, avvocato dello Stato,

    em representação da Comissão Europeia, por P. Oliver, K. Mifsud‑Bonicci e L. Pignataro‑Nolin, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 5 de setembro de 2013,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 2.o, ponto 2, da Diretiva 2003/4/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de janeiro de 2003, relativa ao acesso do público às informações sobre ambiente e que revoga a Diretiva 90/313/CEE do Conselho (JO L 41, p. 26).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Fish Legal e E. Shirley ao Information Commissioner (Comissário da informação), bem como à United Utilities Water plc, à Yorkshire Water Services Ltd e à Southern Water Services Ltd (a seguir «empresas de abastecimento de água em causa»), a propósito do indeferimento por estas últimas dos pedidos de acesso a determinadas informações relativas ao saneamento e à distribuição de água, apresentados pela Fish Legal e por E. Shirley.

    Quadro jurídico

    Direito internacional

    3

    A Convenção sobre acesso à informação, participação do público no processo de tomada de decisão e acesso à justiça em matéria de ambiente, aprovada em nome da Comunidade Europeia pela Decisão 2005/370/CE do Conselho, de 17 de fevereiro de 2005 (JO L 124, p. 1, a seguir «Convenção de Aarhus»), define, no seu artigo 2.o, n.o 2, o conceito de «autoridade pública» nos seguintes termos:

    «[…]

    a)

    Um governo a nível nacional, regional ou outro;

    b)

    Pessoas singulares ou coletivas que desempenhem funções de administração pública, nos termos das disposições do direito interno, incluindo o exercício de deveres específicos, a realização de atividades ou a prestação de serviços relacionados com o ambiente;

    c)

    Quaisquer outras pessoas singulares ou coletivas com responsabilidades públicas, que desempenhem funções públicas ou que prestem serviços públicos relacionados com o ambiente, sob o controlo de um organismo ou de uma entidade referida nas alíneas a) ou b);

    d)

    As instituições das organizações de integração económica regional referidas no artigo 17.o que sejam Parte na presente Convenção.

    Esta definição não inclui organismos ou instituições que atuem na qualidade de órgãos jurisdicionais ou legislativos.»

    4

    O artigo 4.o, n.o 1, desta convenção prevê, com determinadas reservas e condições, que cada parte deve assegurar que as autoridades públicas coloquem à disposição do público, em conformidade com o disposto na sua legislação nacional, as informações sobre ambiente que lhes sejam solicitadas.

    Direito da União

    5

    Os considerandos 1, 5, 8, 9 e 11 da Diretiva 2003/4 enunciam:

    «(1)

    Um maior acesso do público às informações sobre ambiente e a sua divulgação contribuem para uma maior sensibilização dos cidadãos em matéria de ambiente, para uma livre troca de opiniões, para uma participação mais efetiva do público no processo de decisão em matéria de ambiente e, eventualmente, para um ambiente melhor.

    […]

    (5)

    […] As disposições da legislação comunitária devem ser compatíveis com [a Convenção de Aarhus], tendo em vista a sua conclusão pela Comunidade Europeia.

    […]

    (8)

    É necessário garantir que qualquer pessoa singular ou coletiva tenha direito de acesso à informação sobre ambiente na posse das autoridades públicas ou detida em seu nome, sem ter de justificar o seu interesse.

    (9)

    É igualmente necessário que as autoridades públicas disponibilizem e divulguem informação sobre o ambiente ao público em geral, de forma tão ampla quanto possível, nomeadamente através das tecnologias de informação e comunicação. A evolução futura dessas tecnologias deverá ser tida em consideração nos relatórios e revisões da presente diretiva.

    […]

    (11)

    Para ter em conta o princípio consagrado no artigo 6.o do Tratado, de que as exigências em matéria de proteção do ambiente devem ser integradas na definição e execução das políticas e ações da Comunidade, a definição de autoridades públicas deve ser tornada extensiva ao governo ou a outras entidades da administração pública, a nível nacional, regional ou local, com ou sem responsabilidades em matéria de ambiente. Essa definição deverá igualmente abranger outras pessoas ou organismos que desempenhem funções administrativas públicas relacionadas com o ambiente, nos termos da legislação nacional, bem como outras pessoas ou organismos que atuem sob o seu controlo e que tenham responsabilidades ou exerçam funções públicas relacionadas com o ambiente.»

    6

    O artigo 1.o desta diretiva define os seus objetivos da seguinte forma:

    «A presente diretiva tem os seguintes objetivos:

    a)

    Garantir o direito de acesso à informação sobre ambiente na posse das autoridades públicas ou detida em seu nome e estabelecer as condições básicas do, e disposições práticas para o, seu exercício; e

    b)

    Garantir, por via de regra, que a informação sobre ambiente seja progressivamente disponibilizada e divulgada ao público, a fim de atingir a mais vasta disponibilização e divulgação sistemáticas junto do público de informação sobre o ambiente. Para o efeito será conveniente promover, em especial, a utilização de tecnologias telemáticas e/ou eletrónicas, quando disponíveis.»

    7

    O artigo 2.o, ponto 2, da referida diretiva define o conceito de «autoridade pública» da seguinte forma:

    «[…]

    a)

    O governo ou outros órgãos da administração pública nacional, regional ou local, incluindo órgãos consultivos;

    b)

    Qualquer pessoa singular ou coletiva que exerça funções administrativas públicas nos termos da legislação nacional, incluindo deveres, atividades ou serviços específicos, relacionados com o ambiente;

    c)

    Qualquer pessoa singular ou coletiva que tenha responsabilidades ou exerça funções públicas ou que preste serviços públicos relacionados com o ambiente, sob o controlo de um organismo ou pessoa referidos nas alíneas a) ou b).

    Os Estados‑Membros podem prever que esta definição não inclua órgãos ou instituições no exercício da sua competência judicial ou legislativa. Os Estados‑Membros podem excluir órgãos ou instituições desta definição caso, na data de adoção da presente diretiva, a respetiva ordem constitucional não preveja um processo de recurso na aceção do artigo 6.o

    […]»

    8

    O artigo 3.o, n.o 1, da mesma diretiva prevê:

    «Os Estados‑Membros asseguram que as autoridades públicas sejam, nos termos da presente Diretiva, obrigadas a disponibilizar a qualquer requerente informação sobre ambiente na sua posse ou detida em seu nome, sem que o requerente tenha de justificar o seu interesse.»

    Direito do Reino Unido

    Regulamentação relativa ao acesso às informações sobre ambiente

    9

    O Regulamento relativo às informações sobre ambiente de 2004 (Environmental Information Regulations 2004, a seguir «EIR 2004») tem por objetivo transpor a Diretiva 2003/4 para o direito interno.

    10

    Nos termos do Section 2(2), deste regulamento:

    «[…] [e]ntende‑se por ‘autoridade pública’:

    a)

    os departamentos do Governo;

    b)

    qualquer outra autoridade pública conforme definida na Section 3(1), da [Lei de 2000 sobre a liberdade de informação (Freedom of Information Act 2000)] […];

    c)

    qualquer outro organismo ou outra pessoa que exerça funções de administração pública, ou

    d)

    qualquer outro organismo ou outra pessoa que esteja sob o controlo de uma pessoa referida nas alíneas a), b) ou c) e que:

    i)

    tenha responsabilidades públicas relacionadas com o ambiente;

    ii)

    exerça funções de natureza pública relacionadas com o ambiente;

    ou

    iii)

    que preste serviços públicos relacionados com o ambiente.»

    11

    De acordo com as Sections 5 e 7 das EIR 2004, caso tenham sido solicitadas, as informações sobre ambiente devem ser disponibilizadas num prazo de 20 dias úteis, podendo o organismo em causa prorrogar este prazo até 40 dias se estiverem reunidos determinados requisitos.

    12

    Nos termos da Section 50(1) da Lei relativa à liberdade de informação de 2000, conforme alterada pela Section 18 das EIR 2004, uma pessoa que tenha pedido informações pode requerer que o Information Commissioner se pronuncie sobre a questão de saber se a autoridade pública em causa processou o seu pedido de informação de acordo com as exigências constantes das EIR 2004.

    Regulamentação relativa à atual repartição das competências legais no setor da distribuição e do saneamento de águas em Inglaterra e no País de Gales

    13

    Com a adoção da Lei de 1989 sobre a água (Water Act 1989), que privatizou o setor da distribuição e do saneamento de águas em Inglaterra e no País de Gales, a partir de 1 de setembro de 1989, as funções, os poderes, as propriedades e os outros ativos das autoridades responsáveis por questões hídricas foram repartidos entre, por um lado, a National Rivers Authority (Autoridade Nacional Responsável pelos Rios), que, após a entrada em vigor da Lei do ambiente de 1995 (Environment Act 1995), passou a chamar‑se «Environment Agency» (Agência do Ambiente) e, por outro, as empresas responsáveis pelo abastecimento de água que, na qualidade de empresas comerciais, prestam serviços de abastecimento e de saneamento de águas.

    14

    Nos termos da legislação em vigor, em particular da Lei de 1991 sobre o setor da indústria das águas (Water Industry Act 1991, a seguir «WIA 1991»), conforme alterada, a atual repartição das competências legais no setor da distribuição e do saneamento de água é, em resumo, a seguinte:

    as empresas responsáveis pelas águas são designadas como empresa de saneamento das águas («sewerage undertaker») e/ou empresa de distribuição da águas («water undertaker») para uma determinada zona de Inglaterra ou do País de Gales pela Water Services Regulatory Authority (OFWAT) (Autoridade Reguladora dos Serviços de Águas). Esta autoridade é também, sozinha ou, em determinadas circunstâncias, em conjunto com o Secretary of State, ministro competente no domínio do ambiente, a principal autoridade competente em matéria de supervisão destas empresas;

    atualmente, dez empresas foram designadas como empresa de distribuição e de saneamento de águas («water and sewerage companies» ou «WASCs») e doze empresas foram designadas apenas como empresa de distribuição de água («water only companies» ou «WOCs»), pelo que, em cada zona de Inglaterra e do País de Gales, ou uma só empresa assegura simultaneamente a distribuição de água e o saneamento das águas, ou uma empresa é responsável pela distribuição das águas enquanto outra é responsável pelo saneamento na zona em causa, para além das suas atividades de distribuição e saneamento noutra zona;

    as empresas de abastecimento de água são constituídas sob a forma de sociedade anónima de capital aberto («public limited company») ou de sociedade anónima de capital fechado(«limited company»). Cada empresa é gerida por um conselho de administração, responsável perante os acionistas, e é dirigida de acordo com princípios comerciais normais, definidos nos respetivos estatutos, tendo por objetivo a obtenção de lucro a distribuir pelos acionistas sob a forma de dividendos e o reinvestimento nas atividades das empresas;

    as referidas empresas devem respeitar várias obrigações legais relativas à manutenção e ao melhoramento das infraestruturas, bem como à distribuição de águas e/ou ao tratamento das águas residuais nas respetivas zonas;

    além disso, estas empresas detêm poderes legais, entre os quais, nomeadamente, poder de expropriação, direito de aprovar regulamentos administrativos relativos às vias navegáveis e aos terrenos de que são proprietárias, poder para proceder ao transvase de águas, incluindo para condutas de água privadas, direito de impor proibições temporárias de rega ou poder de decidir, relativamente a determinados clientes e em condições estritas, interromper a distribuição de água;

    estas obrigações e estes poderes são referidos no ato de designação, denominado «licença», de cada empresa. Esta licença pode também incluir outras condições, como a de pagar uma taxa ao Secretary of State. Este último e/ou a OFWAT asseguram o cumprimento dos termos da licença. Pode ser exigido às empresas que cumpram certos atos ou tomem medidas específicas. A resolução da licença tem de respeitar um aviso prévio devidamente fundamentado de 25 anos. Pode ser alterada pela OFWAT com o acordo da empresa ou na sequência de um relatório da Competition Commission (Comissão da Concorrência);

    o regime jurídico a que estão sujeitas as empresas de abastecimento de água prevê igualmente a possibilidade de lhes serem aplicadas sanções pecuniárias e de ficarem parcialmente excluídas do regime do direito comum em matéria de dissolução de empresas;

    de cinco em cinco anos, as empresas de abastecimento de águas apresentam um projeto de plano de gestão de ativos, também denominado «plano de desenvolvimento» («business plan»), no qual estabelecem, para um período de cinco anos, de forma detalhada, os resultados esperados e, em especial, os programas de investimento. Durante um processo de consulta, esses planos são finalizados e a OFWAT determina, tomando em consideração os elementos dos programas de investimento que considera adequados, os montantes máximos que as empresas são autorizadas a faturar aos seus clientes com o objetivo de financiar os planos de desenvolvimento e, em especial, os investimentos previstos. Os planos atuais abrangem os anos entre 2010 e 2015.

    Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

    15

    A Fish Legal, braço jurídico da Angling Trust, a saber, a Federação inglesa dos pescadores, é uma organização sem fins lucrativos que tem por objetivo lutar, através de todas as vias legais, contra a poluição e contra outras violações do meio aquático, bem como defender a pesca à linha e os pescadores. Por carta de 12 de agosto de 2009, a Fish Legal solicitou a duas empresas de abastecimento de água, a saber, à United Utilities Water plc e à Yorkshire Water Services Ltd, informações respeitantes a descargas, operações de limpeza de meios poluídos e sobrecargas de emergência.

    16

    Por seu lado, E. Shirley solicitou, por escrito, em agosto de 2009, a outra empresa de abastecimento de água, a saber, à Southern Water Services Ltd, informações sobre a capacidade do sistema de águas residuais com vista à apresentação de um projeto de ordenamento para a sua aldeia, situada no condado de Kent.

    17

    Por não terem recebido, por parte das empresas de abastecimento de água em causa, as informações solicitadas nos prazos previstos nas EIR 2004, a Fish Legal e E. Shirley apresentaram, de forma individual, uma queixa ao Information Commissioner. Por decisões que lhes foram notificadas em março de 2010, o Information Commissioner considerou que as empresas de abastecimento de água em causa não eram autoridades públicas na aceção das EIR 2004 e que, por conseguinte, não se podia pronunciar sobre as respetivas reclamações.

    18

    A Fish Legal e E. Shirley interpuseram então recurso dessas decisões no First‑tier Tribunal (General Regulatory Chamber, Information Rights), que suspendeu a instância enquanto aguardava que o Upper Tribunal (Administrative Appeals Chamber) pronunciasse a sua decisão no processo, dito «piloto», Smartsource v. Information Commissioner.

    19

    Após a prolação do acórdão de 23 de novembro de 2010 Smartsource v. Information Commissioner (a seguir «acórdão Smartsource»), o First‑tier Tribunal (General Regulatory Chamber, Information Rights) negou provimento aos recursos da Fish Legal e de E. Shirley, principalmente pelo facto de as empresas de abastecimento de água em causa não poderem ser qualificadas de «autoridades públicas» na aceção das EIR 2004.

    20

    O órgão jurisdicional de reenvio, na sequência de recursos interpostos pela Fish Legal e por E. Shirley, salienta que ambas admitem que, através de diferentes comunicações, tendo a última sido efetuada em abril de 2011, as empresas de abastecimento de água em causa concederam finalmente acesso a todas as informações solicitadas.

    21

    Contudo, aquele órgão jurisdicional considera que a questão jurídica decorrente dos litígios nos processos principais, a saber, se aquelas empresas eram obrigadas a comunicar as referidas informações, mesmo assim não ficou resolvida. Ora, é necessária uma resposta a esta questão para poder determinar se as empresas de abastecimento de água em causa não cumpriram a sua obrigação de fornecer essas informações nos termos da legislação nacional e, em particular, nos prazos prescritos. A referida questão é, além disso, relevante para outros processos, que dizem respeito a empresas de abastecimento de água, que se encontram suspensos em primeira instância, e para processos relativos a setores de atividade diferentes do setor da água.

    22

    O referido órgão jurisdicional indica que, segundo a Fish Legal e E. Shirley, as empresas de abastecimento de água em causa devem ser qualificadas de «autoridades públicas», na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alíneas b) ou c), da Diretiva 2003/4, porque exercem funções administrativas públicas e são, seja como for, estritamente controladas por um órgão estatal.

    23

    O órgão jurisdicional de reenvio salienta que o Information Commissioner defende uma tese contrária, baseando‑se essencialmente nos fundamentos do acórdão Smartsource. Por um lado, ao aplicarem a abordagem multifatorial preconizada por esse acórdão, as empresas de abastecimento de água não exercem funções de administração pública. Por outro, o controlo ao qual as empresas de abastecimento de água são submetidas é insuficiente na medida em que diz apenas respeito às funções associadas à regulação. Ora, o conceito de «controlo» visa a autoridade, inclusivamente o poder de aplicar sanções, bem como o poder de determinar não só os objetivos a atingir, mas também os meios a utilizar para os atingir.

    24

    Se a abordagem do acórdão Smartsource não for aceite, o Information Commissioner alega, a título subsidiário, que deverá pelo menos ser aceite uma interpretação dita «híbrida» do artigo 2.o, ponto 2, da Diretiva 2003/4. De acordo com esta interpretação, as empresas de abastecimento de água devem ser qualificadas de «autoridades públicas» unicamente no âmbito do exercício das funções que lhes são atribuídas e que são, elas próprias, suscetíveis de serem qualificadas de «funções administrativas públicas», na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4.

    25

    O órgão jurisdicional de reenvio acrescenta que as empresas de abastecimento de água em causa alegam essencialmente que foi com razão que, no acórdão Smartsource, foi decidido que estas empresas não eram «autoridades públicas». Para chegar a esta conclusão, o órgão jurisdicional nacional em causa tomou em consideração uma série de elementos relevantes, entre os quais o documento publicado no ano 2000 pela Comissão Económica para a Europa da Organização das Nações Unidas, intitulado «A Convenção de Aarhus, Guia de Aplicação» (a seguir «guia de aplicação da Convenção de Aarhus»), certos fatores relativos ao estatuto das empresas de abastecimento de água e a regulamentação aplicável ao setor da água em Inglaterra e no País de Gales.

    26

    Foi nestas condições que o Upper Tribunal (Administrative Appeals Chamber) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Ao determinar se uma pessoa singular ou coletiva ‘exerce, nos termos da legislação nacional, funções administrativas públicas’ [na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4], a lei e a interpretação aplicáveis devem ser puramente nacionais?

    2)

    Na negativa, que critérios de direito da União deverão ser utilizados para determinar se:

    a)

    a função em causa é, em substância, uma ‘função administrativa pública’; e

    b)

    a legislação nacional investiu efetivamente aquela pessoa nessa função?

    3)

    O que significa que uma pessoa se encontra ‘sob o controlo de um organismo ou pessoa referidos nas alíneas a) ou b)’ [na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), da Diretiva 2003/4]? Em particular, qual a natureza, a forma e o grau de controlo exigidos e que critérios deverão presidir à identificação desse controlo?

    4)

    Uma ‘emanação do Estado’ na aceção do n.o 20 do [acórdão de 12 de julho de 1990, Foster e o. (C-188/89, Colet., p. I-3313)] é necessariamente uma pessoa abrangida pelo artigo 2.o, [ponto] 2, alínea c)[, da Diretiva 2003/4]?

    5)

    Caso uma pessoa se encontre abrangida [pelo artigo 2.o, ponto 2, alíneas b) e c), da Diretiva 2003/4] relativamente a alguma das suas funções, responsabilidades ou serviços, está a sua obrigação de prestar informações sobre ambiente circunscrita às que são relevantes para essas funções, responsabilidades ou serviços, ou estende‑se a toda as informações sobre ambiente em seu poder, independentemente do fim a que se destinam?»

    Quanto às questões prejudiciais

    Quanto à admissibilidade

    27

    As empresas de abastecimento de água em causa alegam, a título principal, que o pedido de decisão prejudicial é inadmissível.

    28

    Consideram que, na medida em que é facto assente que apresentaram de forma voluntária todas as informações sobre ambiente solicitadas pela Fish Legal e por E. Shirley, não se encontra nenhum litígio pendente no órgão jurisdicional de reenvio. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça está a ser convidado a pronunciar‑se sobre questões que se tornaram puramente hipotéticas, o que retira qualquer justificação ao reenvio prejudicial.

    29

    A este respeito, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, o processo instituído pelo artigo 267.o TFUE é um instrumento de cooperação entre o Tribunal de Justiça e os tribunais nacionais, graças ao qual o primeiro fornece aos segundos os elementos de interpretação do direito da União que lhes são necessários para a resolução do litígio que lhes cabe decidir (v., designadamente, acórdão de 6 de junho de 2013, MA e o., C‑648/11, n.o 36 e jurisprudência referida).

    30

    As questões relativas à interpretação do direito da União submetidas pelo juiz nacional no quadro regulamentar e factual que o mesmo define sob sua responsabilidade, e cuja exatidão não compete ao Tribunal de Justiça verificar, gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar responder a um pedido de decisão prejudicial formulado por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio do processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe foram submetidas (v., designadamente, acórdão MA e o., já referido, n.o 37 e jurisprudência referida).

    31

    No caso em apreço, decorre da decisão de reenvio que o objeto do litígio que se encontra pendente no órgão jurisdicional de reenvio diz respeito às contestações apresentadas pela Fish Legal e por E. Shirley relativas às decisões do Information Commissioner, por meio das quais este considerou que, uma vez que as empresas de abastecimento de água em causa não podiam ser qualificadas de autoridades públicas na aceção da regulamentação nacional destinada a transpor a Diretiva 2003/4, não se podia pronunciar sobre as reclamações daquelas que pretendiam que fosse declarado que as informações sobre ambiente solicitadas não foram fornecidas nos prazos previstos naquela regulamentação.

    32

    Ora, as questões colocadas dizem essencialmente respeito à questão de saber se e, eventualmente, em que condições, as empresas de abastecimento de água em causa devem ser qualificadas de «autoridades públicas», na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alíneas b) ou c), da Diretiva 2003/4.

    33

    Deve, por conseguinte, declarar‑se, à semelhança do que o advogado‑geral salientou nos n.os 55 a 63 das suas conclusões, que uma resposta a estas questões cumpre uma necessidade objetiva para a resolução do litígio que se encontra pendente no órgão jurisdicional de reenvio.

    34

    Nestas condições, as questões submetidas não têm caráter hipotético e, por conseguinte, julga‑se o pedido de decisão prejudicial admissível.

    Quanto ao mérito

    Observações preliminares

    35

    A título preliminar, há que recordar que, ao subscrever a Convenção de Aarhus, a União Europeia se obrigou a assegurar, no âmbito de aplicação do direito da União, um acesso de princípio às informações sobre ambiente na posse das autoridades públicas ou por conta destas (v., neste sentido, acórdãos de 22 dezembro de 2010, Ville de Lyon, C-524/09, Colet., p. I-14115, n.o 36, e de 14 de fevereiro de 2012, Flachglas Torgau, C‑204/09, n.o 30).

    36

    Como confirma o considerando 5 da Diretiva 2003/4, ao adotar esta diretiva, o legislador da União pretendeu assegurar a compatibilidade do direito da União com essa convenção com vista à respetiva subscrição pela Comunidade, prevendo um regime geral destinado a garantir que qualquer pessoa singular ou coletiva de um Estado‑Membro tenha direito de acesso à informação sobre ambiente na posse das autoridades públicas ou detida em seu nome, sem ter de justificar o seu interesse (acórdão Flachglas Torgau, já referido, n.o 31).

    37

    Daqui resulta que, para efeitos da interpretação da Diretiva 2003/4, há que ter em conta o texto e o objeto da Convenção de Aarhus que esta diretiva visa transpor para o direito da União (v., neste sentido, acórdão Flachglas Torgau, já referido, n.o 40).

    38

    Por outro lado, o Tribunal de Justiça já declarou que, embora o guia de aplicação da Convenção de Aarhus possa ser considerado um documento explicativo, eventualmente suscetível de ser tomado em consideração, entre outros elementos pertinentes, para efeitos da interpretação desta convenção, as análises que contém não revestem força obrigatória e não têm o alcance normativo que se prende com as disposições da Convenção de Aarhus (acórdão de 16 de fevereiro de 2012, Solvay e o., C‑182/10, n.o 27).

    39

    Por último, cumpre igualmente sublinhar que o direito de acesso garantido pela Diretiva 2003/4 só se coloca na medida em que as informações solicitadas estejam abrangidas pelas prescrições relativas ao acesso do público previstas por esta diretiva, o que pressupõe, nomeadamente, que as mesmas constituam «informação sobre ambiente» na aceção do artigo 2.o, ponto 1, da referida diretiva, o que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar no que respeita ao litígio no processo principal (acórdão Flachglas Torgau, já referido, n.o 32).

    Quanto às duas primeiras questões

    40

    Com as suas duas primeiras questões, que há que tratar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio procura saber, em substância, quais são os critérios que permitem determinar se entidades como as empresas de abastecimento de água em causa podem ser qualificadas de pessoas coletivas que, de acordo com o direito interno, desempenham «funções administrativas públicas» na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4.

    41

    Por força do artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4, disposição substancialmente idêntica à do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Convenção de Aarhus, o conceito de «autoridade pública» abrange «[q]ualquer pessoa singular ou coletiva que exerça funções administrativas públicas nos termos da legislação nacional, incluindo deveres, atividades ou serviços específicos, relacionados com o ambiente».

    42

    Segundo jurisprudência constante, decorre tanto das exigências da aplicação uniforme do direito da União como do princípio da igualdade que os termos de uma disposição do direito da União que não contenha nenhuma remissão expressa para o direito dos Estados‑Membros para determinar o seu sentido e o seu alcance devem normalmente ser objeto, em toda a União, de uma interpretação autónoma e uniforme, que deve ser procurada tendo em conta o contexto da disposição e o objetivo prosseguido pela regulamentação em causa (v., designadamente, acórdão Flachglas Torgau, já referido, n.o 37).

    43

    No presente processo, importa, em primeiro lugar, determinar se a expressão «nos termos da legislação nacional» deve, ou não, ser compreendida como um reenvio expresso para o direito nacional, no caso em apreço para o direito do Reino Unido, para efeitos da interpretação do conceito «funções administrativas públicas».

    44

    Quanto a este aspeto, há que constatar que existe uma disparidade entre as versões francesa e inglesa do artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4, que corresponde à divergência entre as versões existentes nas mesmas línguas do artigo 2.o n.o 2, alínea b), da Convenção de Aarhus, que fazem parte das versões linguísticas desta convenção que fazem fé. Com efeito, na versão francesa do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2003/4, a expressão «nos termos da legislação nacional» está ligada ao verbo «exerçam», pelo que, nesta versão, os termos da referida disposição só podem ser compreendidos no sentido de que remetem expressamente para o direito nacional no que respeita à definição do conceito de «funções administrativas públicas». Na versão inglesa desta mesma disposição, esta expressão encontra‑se, em contrapartida, colocada a seguir à expressão «funções administrativas públicas» e não tem, por conseguinte, ligação com o referido verbo.

    45

    A este respeito, há que recordar o objetivo, enunciado no considerando 7 da Diretiva 2003/4, que consiste em evitar que as disparidades entre as legislações em vigor em termos de acesso à informação sobre ambiente criem desigualdades no acesso a essa informação ou nas condições de concorrência dentro da União. Este objetivo impõe que a determinação das pessoas obrigadas a conceder ao público acesso à informação sobre ambiente seja submetida às mesmas condições em toda a União, pelo que o conceito de «funções administrativas públicas», na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4 não pode variar em função do direito nacional aplicável.

    46

    Esta interpretação é corroborada pelo guia de aplicação da Convenção de Aarhus, segundo o qual a expressão «nos termos da legislação nacional» significa «que deve haver uma base jurídica para o exercício das funções ao abrigo da alínea b)», abrangendo esta alínea «todas as pessoas autorizadas por lei a exercer uma função pública». Tal não pode ser posto em causa pelo facto de o referido guia acrescentar que «[o] que é considerado função pública no direito interno pode diferir de país para país».

    47

    Neste contexto, contrariamente ao que o Information Commissioner e as empresas de abastecimento de água em causa alegaram durante a audiência, não seria supérfluo interpretar a referida expressão no sentido de que se refere à necessidade da existência de uma base jurídica, uma vez que confirma que o exercício das funções administrativas públicas se deve basear no direito interno.

    48

    Daqui decorre que apenas as entidades que, nos termos de uma base jurídica especificamente definida na legislação nacional que lhes é aplicável, estão habilitadas a exercer funções administrativas públicas podem estar abrangidas pela categoria das autoridades públicas visadas no artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4. Em contrapartida, a questão de saber se as funções de que estão investidas essas entidades nos termos da legislação nacional constituem «funções administrativas públicas», na aceção desta disposição, deve ser examinada à luz do direito da União e de elementos de interpretação pertinentes da Convenção de Aarhus que permitam chegar a uma definição autónoma e uniforme do referido conceito.

    49

    Em segundo lugar, no que respeita aos critérios que devem ser tidos em conta para determinar se funções exercidas nos termos da legislação nacional pela entidade em causa estão abrangidas pelo conceito de «funções administrativas públicas» na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4, o Tribunal de Justiça já indicou que resulta tanto da própria Convenção de Aarhus como da Diretiva 2003/4 que, ao mencionarem as «autoridades públicas», os seus autores pretenderam designar as autoridades administrativas, uma vez que, nos Estados, são elas que habitualmente, no exercício das suas funções, possuem as informações sobre ambiente (acórdão Flachglas Torgau, já referido, n.o 40).

    50

    Por outro lado, o guia de aplicação da Convenção de Aarhus explica tratar‑se de «uma função habitualmente da responsabilidade das autoridades governamentais, conforme definidas pela legislação nacional», não sendo, no entanto, necessário estar relacionada com o ambiente, na medida em que este domínio só foi mencionado a título de exemplo de uma função de administração pública.

    51

    As entidades que, de um ponto de vista orgânico, são autoridades administrativas, a saber, aquelas que fazem parte da Administração Pública ou do poder executivo do Estado, independentemente do seu nível, são autoridades públicas na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea a), da Diretiva 2003/4. Esta primeira categoria inclui todas as pessoas coletivas de direito público que foram criadas pelo Estado e cuja dissolução só este último pode decidir.

    52

    A segunda categoria de autoridades públicas, conforme definida no artigo 2.o, ponto 2, alínea b), desta diretiva visa, por seu lado, autoridades administrativas definidas num sentido funcional, a saber, as entidades, quer sejam pessoas coletivas de direito público ou de direito privado, que estão encarregues, por força do regime legal que lhes é aplicável, da realização de serviços de interesse público, nomeadamente no domínio do ambiente, e que são, para tal, investidas de poderes exorbitantes quando comparados com as regras aplicáveis nas relações entre pessoas de direito privado.

    53

    No presente caso, é facto assente que as empresas de abastecimento de água em causa são, nos termos da legislação nacional aplicável, em particular do WIA 1991, responsáveis por realizar serviços de interesse público, a saber, pela manutenção e pelo desenvolvimento das infraestruturas das águas e do saneamento, bem como pela distribuição de água e pelo tratamento das águas residuais, atividades em cujo âmbito, como a Comissão Europeia observou, devem aliás ser respeitadas várias diretivas no domínio do ambiente relativas à proteção da água.

    54

    Resulta também dos elementos fornecidos pelo órgão jurisdicional de reenvio que, para desempenharem essas funções e para prestarem esses serviços, as referidas empresas dispõem, de acordo com o direito nacional aplicável, de certos poderes, nomeadamente, do direito de expropriação, do poder de aprovar regulamentos administrativos relativos às vias navegáveis e aos terrenos de que são proprietárias, do poder para proceder, em determinadas circunstâncias, ao transvase de águas, incluindo para condutas de água privadas, do direito de impor proibições temporárias de rega e do poder de decidir, relativamente a certos clientes e em condições estritas, interromper a distribuição de água.

    55

    Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se, tendo em conta as modalidades concretas que os acompanham na legislação nacional, esses direitos e poderes reconhecidos às empresas de abastecimento de água em causa podem ser qualificados de poderes exorbitantes.

    56

    Tendo em conta o que precede, há que responder às duas primeiras questões submetidas que, para determinar se entidades como as empresas de abastecimento de água em causa podem ser qualificadas de pessoas coletivas que exercem, de acordo com o direito interno, «funções administrativas públicas», na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4, há que examinar se essas entidades estão investidas, nos termos da legislação nacional que lhes é aplicável, de poderes exorbitantes quando comparados com as regras aplicáveis nas relações entre pessoas de direito privado.

    Quanto às terceira e quarta questões

    57

    Com as suas terceira e quarta questões, que há que tratar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio procura saber, em substância, quais são os critérios que permitem determinar se entidades como as companhias de abastecimento de água em causa, relativamente às quais não se contesta que prestam serviços públicos relacionados com o ambiente, atuam sob o controlo de um organismo ou de uma pessoa visada no artigo 2.o, ponto 2, alíneas a) ou b), da Diretiva 2003/4, pelo que devem ser qualificadas de «autoridades públicas» nos termos do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), desta diretiva.

    58

    No presente caso, coloca‑se a questão de saber se a existência de um regime como o previsto no WIA 1991, que atribui a supervisão das empresas de abastecimento de águas em causa ao Secretary of State e à OFWAT, organismos relativamente aos quais não foi contestado que constituem autoridades públicas abrangidas pelo artigo 2.o, ponto 2, alínea a), da Diretiva 2003/4, implica que essas empresas estão «sob o controlo» dos referidos organismos, na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), desta diretiva.

    59

    Nas suas observações escritas, o Information Commissionner, as empresas de abastecimento de água em causa e o Governo do Reino Unido alegam que o facto de as empresas de abastecimento de água em causa estarem sujeitas a um regime de regulação, é certo que relativamente estrito, não implica que estas estejam sob «controlo» na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), da Diretiva 2003/4. Alegam que, como o Upper Tribunal (Administrative Appeals Chamber) sublinhou no acórdão Smartsource, existe uma diferença fundamental entre um regime dito «de regulação», que inclui unicamente o poder de o regulador determinar os objetivos que devem ser prosseguidos pela entidade regulada, e um regime dito «de controlo», que permite além disso ao regulador determinar de que forma esses objetivos devem ser realizados pela entidade em causa.

    60

    Neste contexto, o guia de aplicação da Convenção de Aarhus indica que, embora o artigo 2.o, n.o 2, alínea c), da Convenção de Aarhus, disposição em substância idêntica ao artigo 2.o, ponto 2, alínea c), da Diretiva 2003/4, vise «no mínimo» pessoas «que são propriedade do Estado», a alínea c) do referido artigo 2.o, n.o 2, pode, «[p]or outro lado, visar organismos que prestem serviços públicos em relação com o ambiente que estejam submetidos a um controlo regulamentar».

    61

    No que se refere a este conceito de «controlo», o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no âmbito da sua quarta questão, qual pode ser a relevância do acórdão Griffin v.South West Water Services Ltd., da High Court of Justice (England & Wales) (Reino Unido), ao qual também se refere o guia de aplicação da Convenção de Aarhus no âmbito do artigo 2.o, n.o 2, alínea c), desta convenção.

    62

    Nesse acórdão, foi nomeadamente decidido que o critério relativo ao controlo, indicado no n.o 20 do acórdão Foster e o., já referido, não deve ser compreendido no sentido de que não abrange um regime de regulação, como o previsto no WIA 1991, e que esse regime respeitava o referido critério de controlo, pelo que, estando igualmente preenchidos os outros critérios, a Diretiva 75/129/CEE do Conselho, de 17 de fevereiro de 1975, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos despedimentos coletivos (JO L 48, p. 29; EE 05 F2 p. 54), podia ser invocada contra a empresa de abastecimento de água em causa nesse processo principal como «emanação do Estado».

    63

    Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio coloca especificamente a questão de saber se uma empresa de abastecimento de água, enquanto «emanação do Estado», é necessariamente uma pessoa coletiva abrangida pelo artigo 2.o, ponto 2, alínea c), da Diretiva 2003/4.

    64

    A este respeito, pode considerar‑se que a constatação de uma situação de controlo no âmbito da aplicação dos critérios definidos no n.o 20 do acórdão Foster e o., já referido, constitui uma indicação de que satisfaz o requisito de controlo constante do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), da Diretiva 2003/4, uma vez que, nos dois contextos, o conceito de controlo visa abranger manifestações do conceito de «Estado» em sentido lato que seja o mais adequado para realizar os objetivos da regulamentação em causa.

    65

    Contudo, a procura do alcance preciso do conceito de controlo constante do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), da Diretiva 2003/4 deve tomar igualmente em consideração os objetivos próprios desta diretiva.

    66

    Resulta do artigo 1.o, alíneas a) e b), da referida diretiva que esta tem nomeadamente por objetivo garantir o direito de acesso à informação sobre ambiente na posse das autoridades públicas ou detida em seu nome e estabelecer as condições básicas do, e disposições práticas para o, seu exercício, e atingir a mais vasta disponibilização e divulgação sistemáticas junto do público de informação sobre ambiente.

    67

    Assim, ao definir três categorias de autoridades públicas, o artigo 2.o, ponto 2, da Diretiva 2003/4 visa abranger todas as entidades, independentemente da sua forma jurídica, que se deve considerar pertencerem ao poder público, seja o próprio Estado, uma entidade autorizada pelo Estado a agir por sua conta, ou uma entidade controlada pelo Estado.

    68

    Estes elementos conduzem à adoção de uma interpretação do conceito de «controlo», na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), da Diretiva 2003/4, segundo a qual esta terceira categoria residual de autoridades públicas abrange qualquer entidade que não determina de forma efetivamente autónoma a maneira como exerce as funções no domínio do ambiente que lhe foram atribuídas, uma vez que uma autoridade pública abrangida pelo artigo 2.o, ponto 2, alíneas a) ou b), desta diretiva pode influenciar de forma decisiva a ação dessa entidade no referido domínio.

    69

    A este respeito, é irrelevante a forma através da qual uma tal autoridade pública pode exercer uma influência decisiva na sequência das competências que lhe foram atribuídas pelo legislador nacional. Pode tratar‑se, nomeadamente, do poder de injunção relativamente às entidades em causa, exercendo ou não os direitos de acionista, do poder de suspender, de anular a posteriori ou de subordinar a uma autorização prévia decisões tomadas por essas entidades, do poder de nomear ou de destituir os membros dos seus órgãos sociais ou a maioria dos mesmos, ou ainda do poder de negar, no todo ou em parte, às referidas entidades o financiamento numa medida que comprometa a sua existência.

    70

    O simples facto de a referida entidade, à semelhança das empresas de abastecimento de água em causa, ser uma sociedade comercial sujeita a um regime específico de regulação para o setor em causa não exclui um controlo na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), da Diretiva 2003/4, na medida em que os requisitos constantes do n.o 68 do presente acórdão estão reunidos nesta entidade.

    71

    Com efeito, embora o regime em causa inclua um quadro legal particularmente preciso, que prescreve um conjunto de regras que determinam a maneira como tais sociedades devem desempenhar as funções públicas relacionadas com a gestão do ambiente de que estão encarregues e que, se necessário, inclui uma supervisão administrativa destinada a assegurar que essas regras são efetivamente respeitadas, eventualmente através de injunções ou da aplicação de coimas, pode suceder que essas entidades não disponham de autonomia real face ao Estado, ainda que este, na sequência da privatização do setor em causa, já não possa determinar a sua gestão diária.

    72

    Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se, nos processos dos litígios principais, o regime previsto no WIA 1991 implica que as empresas de abastecimento de água em causa não dispõem de autonomia real relativamente às autoridades de fiscalização, que são o Secretary of State e a OFWAT.

    73

    Tendo em conta o que precede, há que responder às terceira e quarta questões submetidas que empresas, como as empresas de abastecimento de água em causa, que prestam serviços públicos relacionados com o ambiente estão sob o controlo de um organismo ou de uma pessoa visada no artigo 2.o, ponto 2, alíneas a) ou b), da Diretiva 2003/4, pelo que devem ser qualificadas de «autoridades públicas» nos termos do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), desta diretiva, se essas empresas não determinarem de forma efetivamente autónoma o modo como prestam esses serviços, uma vez que uma autoridade pública abrangida pelo artigo 2.o, ponto 2, alíneas a) ou b), da referida diretiva pode influenciar de forma decisiva a ação das referidas empresas no domínio do ambiente.

    Quanto à quinta questão

    74

    Com a sua quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, ponto 2, alíneas b) e c), da Diretiva 2003/4 deve ser interpretado no sentido de que, quando uma pessoa está abrangida por esta disposição a título de uma das suas funções, de uma das suas responsabilidades ou de um dos seus serviços, esta pessoa só constitui uma autoridade pública no que respeita às informações sobre o ambiente que detém no âmbito das suas funções, responsabilidades e serviços.

    75

    A possibilidade de tal interpretação «híbrida» do conceito de autoridade pública foi apresentada, nomeadamente, no âmbito do processo nacional que deu lugar ao acórdão Smartsource. Nesse âmbito, foi nomeadamente alegado que, embora as empresas de abastecimento de água devam ser abrangidas pelo artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2003/4 por exercerem certas funções administrativas públicas, esta disposição pode ser interpretada no sentido de que as referidas empresas só são obrigadas a comunicar as informações sobre ambiente que detêm no exercício das suas funções.

    76

    A este respeito, há que constatar que, para além do facto de uma interpretação híbrida do conceito de autoridade pública poder dar origem a incertezas e a problemas práticos importantes aquando da execução efetiva da Diretiva 2003/4, esta abordagem não encontra, enquanto tal, fundamento na redação nem na sistemática desta diretiva ou da Convenção de Aarhus.

    77

    Pelo contrário, semelhante abordagem opõe‑se aos fundamentos tanto da referida diretiva como da Convenção de Aarhus no que respeita à articulação do âmbito de aplicação do regime de acesso que ambas preveem, o qual tem por objetivo atingir a mais vasta disponibilização e difusão sistemáticas junto do público de informação sobre ambiente que esteja na posse das autoridades públicas ou que estas detêm em nome daquelas.

    78

    Com efeito, como resulta do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2003/4, disposição central desta diretiva que é substancialmente idêntica ao artigo 4.o, n.o 1, da Convenção de Aarhus, se uma entidade for qualificada de autoridade pública na aceção de uma das três categorias referidas no artigo 2.o, ponto 2, da referida diretiva, esta entidade é obrigada a disponibilizar a qualquer requerente toda a informação sobre ambiente abrangida por uma das seis categorias de informação enunciadas no referido artigo 2.o, ponto 1, que esteja na sua posse ou que é detida em seu nome, exceto se o pedido estiver abrangido por uma das exceções previstas no artigo 4.o da mesma diretiva.

    79

    Deste modo, as pessoas abrangidas pelo artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4 devem, como o advogado‑geral salientou nos n.os 116 e 118 das suas conclusões, ser consideradas, para efeitos desta diretiva, autoridades públicas no que respeita a todas as informações sobre ambiente que estejam na sua posse.

    80

    Por outro lado, como decorre do n.o 73 do presente acórdão, no âmbito específico do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), da Diretiva 2003/4, só se pode considerar que sociedades comerciais, como as empresas de abastecimento de água em causa, constituem uma autoridade pública nos termos da referida disposição desde que, quando prestam serviços públicos no domínio do ambiente, atuem sob o controlo de um organismo ou de uma pessoa abrangida pelo artigo 2.o, ponto 2, alíneas a) ou b), da Diretiva 2003/4.

    81

    Daqui resulta que tais sociedades só estão obrigadas a comunicar as informações sobre ambiente que estejam na sua posse no âmbito da prestação desses serviços públicos.

    82

    Em contrapartida, como o advogado‑geral salientou no n.o 121 das suas conclusões, essas empresas não são obrigadas a disponibilizar informações sobre ambiente se for pacífico que estas não estão relacionadas com a prestação dos referidos serviços públicos. Em caso de dúvida, as informações em causa devem ser fornecidas.

    83

    Nestas condições, há que responder à quinta questão submetida que o artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4 deve ser interpretado no sentido de que uma pessoa abrangida por esta disposição constitui uma autoridade pública no que respeita a todas as informações sobre ambiente que detém. Sociedades comerciais, como as empresas de abastecimento de água em causa, que só constituem uma autoridade pública nos termos do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), da referida diretiva desde que, quando prestam serviços públicos no domínio do ambiente, atuem sob o controlo de um organismo ou de uma pessoa abrangida pelo artigo 2.o, n.o 2, alíneas a) ou b), da mesma diretiva, não são obrigadas a disponibilizar informações sobre ambiente se for pacífico que estas não estão relacionadas com a prestação desses serviços.

    Quanto às despesas

    84

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

     

    1)

    Para determinar se entidades como a United Utilities Water plc, a Yorkshire Water Services Ltd e a Southern Water Services Ltd podem ser qualificadas de pessoas coletivas que exercem, de acordo com o direito interno, «funções administrativas públicas», na aceção do artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de janeiro de 2003, relativa ao acesso do público às informações sobre ambiente e que revoga a Diretiva 90/313/CEE do Conselho, há que examinar se essas entidades estão investidas, nos termos da legislação nacional que lhes é aplicável, de poderes exorbitantes quando comparados com as regras aplicáveis nas relações entre pessoas de direito privado.

     

    2)

    Empresas, como a United Utilities Water plc, a Yorkshire Water Services Ltd e a Southern Water Services Ltd, que prestam serviços públicos relacionados com o ambiente estão sob o controlo de um organismo ou de uma pessoa visada no artigo 2.o, ponto 2, alíneas a) ou b), da Diretiva 2003/4, pelo que devem ser qualificadas de «autoridades públicas» nos termos do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), desta diretiva, se essas empresas não determinarem de forma efetivamente autónoma o modo como prestam esses serviços, uma vez que uma autoridade pública abrangida pelo artigo 2.o, ponto 2, alíneas a) ou b), da referida diretiva pode influenciar de forma decisiva a ação das referidas empresas no domínio do ambiente.

     

    3)

    O artigo 2.o, ponto 2, alínea b), da Diretiva 2003/4 deve ser interpretado no sentido de que uma pessoa abrangida por esta disposição constitui uma autoridade pública no que respeita a todas as informações sobre o ambiente que detém. Sociedades comerciais, como a United Utilities Water plc, a Yorkshire Water Services Ltd e a Southern Water Services Ltd, que só constituem uma autoridade pública nos termos do artigo 2.o, ponto 2, alínea c), da referida diretiva desde que, quando prestam serviços públicos no domínio do ambiente, atuem sob o controlo de um organismo ou de uma pessoa abrangida pelo artigo 2.o, ponto 2, alíneas a) ou b), da mesma diretiva, não são obrigadas a disponibilizar informações sobre ambiente se for pacífico que estas não estão relacionadas com a prestação desses serviços.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: inglês.

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