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Document 62012CJ0068

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Décima Secção) de 7 de fevereiro de 2013.
    Protimonopolný úrad Slovenskej republiky contra Slovenská sporiteľňa a.s.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Najvyšší súd Slovenskej republiky.
    Conceito de cartel — Acordo celebrado entre vários bancos — Empresa concorrente que opera no mercado em causa de forma pretensamente ilegal — Incidência — Inexistência.
    Processo C‑68/12.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2013:71

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

    7 de fevereiro de 2013 ( *1 )

    «Conceito de cartel — Acordo celebrado entre vários bancos — Empresa concorrente que opera no mercado em causa de forma pretensamente ilegal — Incidência — Inexistência»

    No processo C-68/12,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Najvyšší súd Slovenskej republiky (Eslováquia), por decisão de 10 de janeiro de 2012, entrado no Tribunal de Justiça em 10 de fevereiro de 2012, no processo

    Protimonopolný úrad Slovenskej republiky

    contra

    Slovenská sporiteľňa a.s.,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

    composto por: A. Rosas, presidente de secção (relator), E. Juhász e C. Vajda, juízes,

    advogado-geral: N. Wahl,

    secretário: A. Calot Escobar,

    vistos os autos,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da Protimonopolný úrad Slovenskej republiky, por T. Menyhart, na qualidade de agente,

    em representação do Slovenská sporiteľňa a.s., por M. Nedelka, advokát,

    em representação do Governo eslovaco, por B. Ricziová, na qualidade de agente,

    em representação do Governo checo, por M. Smolek e T. Müller, na qualidade de agentes,

    em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistido por S. Fiorentino, avvocato dello Stato,

    em representação do Governo polaco, por M. Szpunar e B. Majczyna, na qualidade de agentes,

    em representação da Comissão Europeia, por A. Tokár, P. Van Nuffel e N. von Lingen, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 101.o TFUE.

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Protimonopolný úrad Slovenskej republiky (Autoridade da Concorrência da República Eslovaca, a seguir «Protimonopolný úrad») ao Slovenská sporitel’ňa a.s. (a seguir «Slovenská sporitel’ňa»), a respeito do comportamento de três bancos, que constitui, segundo aquela autoridade, um acordo que visa restringir a concorrência.

    Quadro jurídico

    3

    A lei aplicável na Eslováquia em matéria de concorrência é a Lei n.o 136/2001, relativa à proteção da concorrência.

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    4

    Por decisão de 9 de junho de 2009, o Protimonopolný úrad Slovenskej republiky, odbor dohôd obmedzujúcich súťaž (Serviço dos Acordos Restritivos da Concorrência da Autoridade da Concorrência da República Eslovaca, a seguir «Serviço»), órgão de primeira instância em matéria de proteção da concorrência, considerou que três bancos importantes, com sede em Bratislava (Eslováquia), a saber, o Slovenská sporiteľňa a.s., o Československá obchodná banka a.s. e o Všeobecná úverová banka a.s., tinham violado o artigo 81.o CE, bem como a disposição correspondente da Lei n.o 136/2001, ao celebrarem um acordo que tinha por objeto a rescisão dos contratos relativos às contas correntes da Akcenta CZ a.s. (a seguir «Akcenta»), sociedade com sede em Praga (República Checa), bem como a não celebração de novos contratos com esta sociedade. O Serviço considerou que a Akcenta, estabelecimento não bancário que presta serviços de operações de câmbio escritural, precisava de contas correntes abertas em bancos, para exercer as suas atividades, que incluíam a transferência de divisas do e para o estrangeiro, designadamente para os seus clientes na Eslováquia. Segundo o Serviço, os três bancos em causa, que consideravam que a Akcenta era um concorrente que prestava serviços aos seus clientes e estavam insatisfeitos com a diminuição dos seus lucros em resultado da atividade dessa sociedade, fiscalizaram essa atividade, concertaram-se e decidiram, de comum acordo, rescindir, de forma coordenada, os contratos celebrados com a referida sociedade. Com base nos elementos de prova da existência de contactos entre os referidos bancos, incluindo, designadamente, a reunião entre eles realizada em 10 de maio de 2007 e as subsequentes comunicações por correio eletrónico, o Serviço apurou que cada um desses três bancos tinha aceitado rescindir o contrato que o vinculava à Akcenta, na condição de os outros bancos fazerem o mesmo, a fim de impedir que parte dos seus clientes migrasse para o banco que mantivesse as contas correntes da Akcenta. O Serviço concluiu que o comportamento dos referidos bancos no mercado em causa, definido como o mercado eslovaco dos serviços que consistem em operações de câmbio escritural, constituía um acordo que visava restringir o jogo da concorrência e aplicou coimas de 3197912 euros, ao Slovenská sporitel’ňa, 3183427 euros, ao Československá obchodná banka a.s., e 3810461 euros, ao Všeobecná úverová banka a.s.

    5

    Na sequência do recurso interposto pelo Slovenská sporitel’ňa contra a decisão proferida pelo Serviço, o Rada Protimonopolného úradu Slovenskej republiky (Conselho da Autoridade da Concorrência da República Eslovaca, a seguir «Conselho»), órgão administrativo de segunda instância, adotou, em 19 de novembro de 2009, uma decisão pela qual alterou a decisão impugnada, alargando a qualificação jurídica da prática em causa no processo principal. O Conselho não alterou o montante da coima aplicada pelo Serviço.

    6

    O Slovenská sporitel’ňa impugnou a decisão do Conselho, através de um recurso interposto no Krajský súd Bratislava (Tribunal Regional de Bratislava).

    7

    Por acórdão de 23 de setembro de 2010, o Krajský súd Bratislava anulou as decisões acima referidas de 9 de junho e 19 de novembro de 2009, nas partes em que diziam respeito ao Slovenská sporitel’ňa, e remeteu o processo ao Protimonopolný úrad.

    8

    No seu acórdão, o Krajský súd Bratislava declarou, designadamente, que aquela autoridade tinha aplicado de forma errada os conceitos de concorrente e de mercado em causa. Segundo este órgão jurisdicional, a referida autoridade não verificou se a Akcenta podia ser considerada concorrente do Slovenská sporitel’ňa no mercado em causa, tendo em conta o facto de que operava na Eslováquia, sem dispor da necessária autorização do Národná banka Slovenska (Banco Nacional da Eslováquia), nem examinou a questão de saber se a atividade ilegal exercida por aquela sociedade podia beneficiar de proteção jurídica. A este respeito, o Krajský súd Bratislava salientou que o Národná banka Slovenska aplicou à Akcenta uma coima de 35000 euros, com fundamento em que, no período compreendido entre janeiro de 2008 e junho de 2009, esta realizou operações cambiais na Eslováquia, sem autorização. Não obstante, o Krajský súd Bratislava salientou também que a decisão do Národná banka Slovenska de aplicar essa coima tinha sido anulada pelo Banková rada Národnej banky Slovenska (Conselho Bancário do Banco Nacional da Eslováquia) e que o processo intentado contra a Akcenta tinha sido arquivado com fundamento em que esta não podia ser punida por ter expirado o prazo de prescrição em matéria de sanções pecuniárias. Por outro lado, o Krajský súd Bratislava sublinhou que decorria dos autos que a Akcenta não era concorrente dos bancos em causa, mas apenas cliente dos mesmos, uma vez que prestava os seus serviços a outro nível e segundo modalidades diferentes das observadas por esses bancos. O Krajský súd Bratislava salientou também que a Protimonopolný úrad não tinha tido suficientemente em conta as circunstâncias em que o acordo em causa no processo principal tinha sido celebrado. Considerou que não tinha ficado provado, designadamente, que a Akcenta tinha tentado, em vão, abrir novas contas bancárias no Slovenská sporitel’ňa.

    9

    A Protimonopolný úrad interpôs recurso da decisão do Krajský súd Bratislava para o Najvyšší súd Slovenskej republiky (Tribunal Supremo da República Eslovaca).

    10

    A Protimonopolný úrad alega que demonstrou suficientemente que a Akcenta era concorrente dos bancos em questão no mercado em causa, ou seja, o mercado eslovaco das operações de câmbio escritural. No que se refere ao alegado caráter ilegal da atividade exercida pela Akcenta na Eslováquia, aquela autoridade sublinha que o facto de esta sociedade ter exercido a sua atividade, sem dispor da necessária autorização, não entra em linha de conta para efeitos de examinar o comportamento dos bancos em causa face às regras da concorrência. A referida autoridade salienta também que nem o Slovenská sporitel’ňa nem os outros bancos contestaram a legalidade da atividade da Akcenta, antes de esta ter intentado o processo principal. Considera que não há provas de que a Akcenta operasse ilegalmente. No que se refere à decisão do Conselho Bancário do Banco Nacional da Eslováquia, a Protimonopolný úrad sublinha que essa decisão se reportava ao período compreendido entre janeiro de 2008 e junho de 2009, ao passo que a Akcenta operava no mercado eslovaco desde 2003 e os bancos em causa coordenaram as suas práticas e rescindiram em 2007 os contratos celebrados com a Akcenta. Além disso, aquela autoridade salienta que a referida decisão foi anulada.

    11

    O Slovenská sporitel’ňa sustenta que a Protimonopolný úrad não teve suficientemente em conta facto de que a Akcenta, que não dispunha da necessária autorização, operava ilegalmente no mercado eslovaco em causa. Segundo esta empresa, dado que não estavam reunidas as condições exigidas em matéria de concorrência, não se podia invocar nenhuma restrição da concorrência. Não havia razão para sancionar um comportamento que conduziria ao afastamento de uma empresa que operava ilegalmente. O Slovenská sporitel’ňa sublinha que não ficou demonstrado que a reunião realizada em 10 de maio de 2007 entre os três bancos em causa tenha dado origem a um acordo, dado que o seu empregado que esteve presente nessa reunião se limitou a recolher informações sobre o projeto de rescisão dos contratos relativos às contas correntes da Akcenta.

    12

    Nestas condições, o Najvyšší súd Slovenskej republiky, na sua qualidade de órgão jurisdicional de cujas decisões não cabe recurso de direito interno, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Pode o artigo 101.o, n.o 1, TFUE […] ser interpretado no sentido de que é juridicamente relevante a circunstância de que um concorrente (empresário) prejudicado por um acordo de cartel entre outros concorrentes (empresários) opere ilegalmente no mercado relevante no momento da conclusão do acordo de cartel?

    2)

    É juridicamente relevante para a interpretação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE […], a circunstância de que, no momento da conclusão do acordo de cartel, a legalidade do comportamento do dito concorrente (empresário) não foi posta em causa pelos respetivos órgãos de controlo no território da República Eslovaca?

    3)

    Pode o artigo 101.o, n.o 1, TFUE […] ser interpretado no sentido de que, para considerar um acordo [como] restritivo da concorrência, é necessário demonstrar o comportamento pessoal do representante estatutário ou o consentimento pessoal, sob a forma de mandato, do representante estatutário de uma empresa, que tenha ou possa ter participado no acordo restritivo da concorrência, [na] atuação de um seu [empregado], se a empresa não se tiver distanciado da atuação do [empregado] e, ao mesmo tempo, também tiver dado execução ao acordo?

    4)

    Pode o artigo 101.o, n.o 3, TFUE […] ser interpretado no sentido de que é aplicável também a um acordo proibido pelo artigo 101.o, n.o 1, TFUE […], o qual, por natureza, [teve por] efeito […] excluir do mercado um concorrente em particular (empresário) [que] se verificou que realizava transações em divisas estrangeiras no mercado de operações [de câmbio escritural], não possuindo a licença exigida pela legislação nacional?»

    Quanto às questões prejudiciais

    13

    Foram apresentadas observações pela Protimonopolný úrad, pelo Slovenská sporitel’ňa, pelos Governos eslovaco, checo, italiano e polaco, bem como pela Comissão Europeia.

    Quanto à primeira e segunda questões

    14

    Com a sua primeira e a sua segunda questão, que devem ser examinadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 101.o, n.o 1, TFUE deve ser interpretado no sentido de que é juridicamente relevante o facto de um concorrente, que foi prejudicado por um cartel entre outros concorrentes, operar no mercado em causa, de forma pretensamente ilegal, no momento da celebração desse cartel.

    15

    Nas suas observações, o Governo checo expôs os factos relativos a esta questão, conforme foram tratados por força da Recomendação 2001/893/CE da Comissão, de 7 de dezembro de 2001, relativa aos princípios de utilização de «Solvit» — a rede de resolução de problemas no mercado interno (JO L 331, p. 79). Em substância, considerando que a Akcenta, sociedade checa que dispõe das autorizações necessárias na República Checa, trabalhava exclusivamente por telefone com os seus clientes eslovacos, o centro Solvit deste Estado-Membro entendeu que as prestações de serviços realizadas não necessitavam da emissão de uma autorização na Eslováquia. No entanto, o centro Solvit eslovaco foi de opinião contrária, entendendo que se tratava de uma questão relacionada com a liberdade de estabelecimento, porquanto a prestação de diferentes serviços era efetuada através de intermediários estabelecidos na Eslováquia. De acordo com a base de dados Solvit, em janeiro de 2006, o processo foi arquivado como não resolvido.

    16

    Cumpre recordar que o artigo 101.o, n.o 1, TFUE declara incompatíveis com o mercado interno e proibidos todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas que sejam suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objetivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado interno.

    17

    Para a aplicação desta disposição, a tomada em consideração dos efeitos concretos de um acordo é supérflua a partir do momento em que se verifique que tem por objeto restringir, impedir ou falsear a concorrência (acórdão de 13 de julho de 1966, Consten e Grundig/Comissão, 56/64 e 58/64, Colet.,1965-1968, pp. 423, 434; de 15 de outubro de 2002, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, C-238/99 P, C-244/99 P, C-245/99 P, C-247/99 P, C-250/99 P a C-252/99 P e C-254/99 P, Colet., p. I-8375, n.o 508; e de 8 de dezembro de 2011, KME Germany e o./Comissão, C-389/10 P, Colet., p. I-13125n.o 75).

    18

    Com efeito, o artigo 101.o TFUE visa proteger não apenas os interesses dos concorrentes ou dos consumidores mas também a estrutura do mercado e, deste modo, a concorrência enquanto tal (acórdão de 6 de outubro de 2009, GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., C-501/06 P, C-513/06 P, C-515/06 P e C-519/06 P, Colet., p. I-9291, n.o 63).

    19

    A este respeito, resulta da decisão de reenvio que o acordo celebrado entre os bancos em causa tinha especificamente por objeto restringir a concorrência e que nenhum desses bancos contestou a legalidade da atividade da Akcenta, antes da instrução do processo principal contra eles. Por conseguinte, a alegada situação jurídica da Akcenta não é relevante para determinar se estão reunidas as condições de uma infração às regras da concorrência.

    20

    Por outro lado, é às autoridades públicas, e não às empresas ou associações de empresas privadas, que compete garantir o respeito pelos requisitos legais. A situação da Akcenta, conforme descrita pelo Governo checo, é suficientemente demonstrativa de que a aplicação das disposições legais pode implicar avaliações complexas que não incumbem a essas empresas ou associações de empresas privadas.

    21

    Resulta destes elementos que há que responder à primeira e segunda questões que o artigo 101.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que o facto de uma empresa, que foi prejudicada por um cartel tendo por objeto restringir a concorrência, operar no mercado em causa, de forma pretensamente ilegal, no momento da celebração desse cartel, não é relevante para a questão de saber se o referido cartel constitui uma infração a esta disposição.

    Quanto à terceira questão

    22

    Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 101.o, n.o 1, TFUE pode ser interpretado no sentido de que, para declarar a existência de um acordo restritivo da concorrência, é necessário demonstrar que houve um comportamento pessoal do representante estatutário de uma empresa ou um acordo particular através do qual esse representante, que participou ou que se suspeita ter participado no acordo restritivo da concorrência, autorizou, através de um mandato, a atuação do seu empregado, quando a empresa não se tenha distanciado dessa atuação e, ao mesmo tempo, o acordo tenha sido executado.

    23

    Os Governos eslovaco e checo e a Comissão questionam a pertinência desta questão, tendo em conta os factos descritos pelo órgão jurisdicional de reenvio, embora procurem fornecer elementos de resposta.

    24

    A Protimonopolný úrad alega que esta questão tem origem no facto de, no caso em apreço, o Slovenská sporitel’ňa afirmar que o seu empregado que tinha participado na reunião dos representantes dos bancos em causa, realizada em 10 de maio de 2007, não estava mandatado para o efeito e que, ao mesmo tempo, não tinha ficado demonstrado que este tivesse dado o seu acordo às conclusões dessa reunião.

    25

    A este respeito, cumpre recordar que a aplicação do artigo 101.o TFUE pressupõe, não uma atuação ou mesmo o conhecimento dos sócios ou dos principais gerentes da empresa em causa mas a atuação de uma pessoa autorizada a agir por conta da empresa (acórdão de 7 de junho de 1983, Musique Diffusion française e o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825, n.o 97).

    26

    Por outro lado, como sublinhou a Comissão, a participação em cartéis proibidos pelo Tratado FUE constitui, na maioria dos casos, uma atividade clandestina que não está sujeita a regras formais. É raro que um representante de uma empresa participe numa reunião munido de um mandato para cometer uma infração.

    27

    Além disso, conforme jurisprudência assente, a partir do momento em que fique provado que uma empresa participou em reuniões entre empresas concorrentes, com caráter anticoncorrencial, incumbe a essa empresa apresentar indícios suscetíveis de demonstrar que a sua participação não tinha uma intenção anticoncorrencial, demonstrando que tinha indicado aos seus concorrentes que participava nessas reuniões numa ótica diferente da deles. Para que a participação de uma empresa numa reunião deste tipo não possa ser considerada como uma aprovação tácita de uma iniciativa ilícita nem como uma aceitação do seu resultado, é necessário que essa empresa se distancie publicamente dessa iniciativa, de maneira a que os outros participantes considerem que ela pôs termo à sua participação, ou então que a denuncie às entidades administrativas (acórdão de 3 de maio de 2012, Comap/Comissão, C-290/11 P, n.os 74 e 75 e jurisprudência referida).

    28

    Tendo em conta estes elementos, há que responder à terceira questão que o artigo 101.o, n.o 1, TFUE deve ser interpretado no sentido de que, para declarar a existência de um acordo restritivo da concorrência, não é necessário demonstrar que houve um comportamento pessoal do representante estatutário de uma empresa ou um acordo particular pelo qual esse representante autorizou, através de um mandato, a atuação do seu empregado que participou numa reunião anticoncorrencial.

    Quanto à quarta questão

    29

    Com a sua quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 101.o, n.o 3, TFUE deve ser interpretado no sentido de que é aplicável a um acordo proibido pelo artigo 101.o, n.o 1, TFUE, que, por natureza, teve por efeito excluir do mercado um determinado concorrente individual que, a posteriori, se verificou que realizava transações em divisas estrangeiras no mercado de operações de câmbio escritural, sem ter a licença exigida pela legislação nacional.

    30

    Atendendo a que o artigo 101.o, n.o 3, TFUE só pode ser aplicado quando se constate a existência de um acordo proibido pelo referido artigo 101.o, a resposta do Tribunal de Justiça baseia-se na premissa de que essa constatação foi efetuada.

    31

    Como recordou a Comissão, para que a exceção enunciada no artigo 101.o, n.o 3, TFUE seja aplicável, é necessário que estejam cumulativamente preenchidas as quatro condições previstas nessa disposição. Em primeiro lugar, os acordos devem contribuir para melhorar a produção ou a distribuição dos produtos, ou para promover o progresso técnico ou económico; em segundo lugar, devem reservar aos utilizadores uma parte equitativa do lucro daí resultante; em terceiro lugar, não devem impor às empresas em causa restrições que não sejam indispensáveis à consecução desses objetivos; e, em quarto lugar, não devem dar às empresas a possibilidade de eliminar a concorrência relativamente a uma parte substancial dos produtos em causa.

    32

    É a pessoa que invoca essa disposição que deve demonstrar, através de argumentos e elementos de prova convincentes, que estão reunidas as condições exigidas para se beneficiar de uma isenção (acórdão GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., já referido, n.o 82).

    33

    Nas suas observações, o Slovenská sporitel’ňa alega que o facto de um acordo anticoncorrencial ter por objeto impedir que outro concorrente atue de forma ilegal no mercado por não dispor da autorização exigida deve justificar a aplicação da exceção prevista no artigo 101.o, n.o 3, TFUE, uma vez que, segundo essa empresa, um acordo deste tipo protege as condições de uma concorrência sã e, por conseguinte, num sentido mais amplo, visa promover o progresso económico na aceção desta disposição.

    34

    Cumpre declarar que o Slovenská sporitel’ňa só invoca uma das quatro condições cumulativas enunciadas no artigo 101.o, n.o 3, TFUE.

    35

    Ainda que essa condição estivesse preenchida, não parece que o cartel em causa no processo principal preencha as outras três condições exigidas, mais concretamente a terceira, segundo a qual um acordo não deve impor às empresas em causa restrições que não sejam indispensáveis à consecução dos objetivos enunciados na primeira condição prevista no artigo 101.o, n.o 3, TFUE. Com efeito, mesmo que o fundamento invocado pelas partes no cartel tivesse sido obrigar a Akcenta a respeitar a legislação eslovaca, incumbia-lhes, conforme já referido no n.o 20 do presente acórdão, apresentar às autoridades competentes uma queixa a esse respeito e não eliminar, elas próprias, essa empresa concorrente do mercado.

    36

    Resulta destes elementos que o artigo 101.o, n.o 3, TFUE deve ser interpretado no sentido de que só é aplicável a um acordo proibido pelo artigo 101.o, n.o 1, TFUE quando a empresa que invoca essa disposição provar que estão preenchidas as quatro condições cumulativas nele previstas.

    Quanto às despesas

    37

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

     

    1)

    O artigo 101.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que o facto de uma empresa, que foi prejudicada por um cartel tendo por objeto restringir a concorrência, operar no mercado em causa, de forma pretensamente ilegal, no momento da celebração desse cartel, não é relevante para a questão de saber se o referido cartel constitui uma infração a esta disposição.

     

    2)

    O artigo 101.o, n.o 1, TFUE deve ser interpretado no sentido de que, para declarar a existência de um acordo restritivo da concorrência, não é necessário demonstrar que houve um comportamento pessoal do representante estatutário de uma empresa ou um acordo particular pelo qual esse representante autorizou, através de um mandato, a atuação do seu empregado que participou numa reunião anticoncorrencial.

     

    3)

    O artigo 101.o, n.o 3, TFUE deve ser interpretado no sentido de que só é aplicável a um acordo proibido pelo artigo 101.o, n.o 1, TFUE quando a empresa que invoca essa disposição provar que estão preenchidas as quatro condições cumulativas nele previstas.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: eslovaco.

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