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Document 62011CJ0106

Acórdão do Tribunal de Justiça (Oitava Secção) de 7 de junho de 2012.
M. J. Bakker contra Minister van Financiën.
Pedido de decisão prejudicial apresentada por Hoge Raad der Nederlanden.
Processo C-106/11.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2012:328

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção)

7 de junho de 2012 ( *1 )

«Segurança social dos trabalhadores migrantes — Legislação aplicável — Trabalhador de nacionalidade neerlandesa que trabalha, para um empregador com sede nos Países Baixos, a bordo de dragas que navegam fora do território da União Europeia sob pavilhão neerlandês — Residência no território de outro Estado-Membro — Inscrição no regime de segurança social neerlandês»

No processo C-106/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Hoge Raad der Nederlanden (Países Baixos), por decisão de 11 de fevereiro de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 3 de março de 2011, no processo

J. Bakker

contra

Minister van Financiën,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),

composto por: A. Prechal, presidente de secção, K. Schiemann (relator) e L. Bay Larsen, juízes,

advogado-geral: P. Cruz Villalón,

secretário: M.-A. Gaudissart, chefe de unidade,

vistos os autos e após a audiência de 1 de março de 2012,

vistas as observações apresentadas:

em representação de J. Bakker, por H. Menger e V. J. de Groot, belastingadviseurs,

em representação do Governo neerlandês, por C. Wissels e C. Schillemans, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por V. Kreuschitz e M. van Beek, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do título II do Regulamento (CEE) n.o 1408/71 do Conselho, de 14 de junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na sua versão alterada e atualizada pelo Regulamento (CE) n.o 118/97 do Conselho, de 2 de dezembro de 1996 (JO 1997, L 28, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 307/1999 do Conselho, de 8 de fevereiro de 1999 (JO L 38, p. 1, a seguir «Regulamento n.o 1408/71»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe J. Bakker ao Staatssecretaris van Financiën (Secretário de Estado das Finanças) a propósito da sua inscrição obrigatória na segurança social neerlandesa para o ano de 2004.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Por força do artigo 1.o, alínea a), i), do Regulamento n.o 1408/71, a expressão «trabalhador assalariado» designa qualquer pessoa que «esteja abrangida por um seguro obrigatório ou facultativo continuado contra uma ou mais eventualidades correspondentes aos ramos de um regime de segurança social aplicável aos trabalhadores assalariados ou não assalariados ou de um regime especial dos funcionários públicos».

4

Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, deste regulamento:

«O presente regulamento aplica-se aos trabalhadores assalariados ou não assalariados e aos estudantes que estejam ou tenham estado sujeitos à legislação de um ou vários Estados-Membros e sejam nacionais de um dos Estados-Membros [...]»

5

O artigo 13.o do referido regulamento, que faz parte do título II deste diploma, intitulado «Determinação da legislação aplicável», dispõe:

«1.   Sem prejuízo do disposto nos artigos 14.°-C e 14.°-F, as pessoas às quais se aplica o presente regulamento apenas estão sujeitas à legislação de um Estado-Membro. Esta legislação é determinada de acordo com as disposições do presente título.

2.   Sem prejuízo do disposto nos artigos 14.° a 17.°:

[...]

c)

a pessoa que exerça a sua atividade profissional a bordo de um navio com pavilhão de um Estado-Membro está sujeita à legislação desse Estado;

[...]»

Direito neerlandês

6

O artigo 6.o da Lei que institui o regime geral das pensões de reforma (Algemene Ouderdomswet, Stb. 1956, n.o 281) dispõe:

«1.   São beneficiários, na aceção das presentes disposições,

a)

os residentes e

b)

os não residentes que estejam sujeitos ao imposto sobre os rendimentos devido a atividades profissionais assalariadas exercidas nos Países Baixos

que não tenham atingido os 65 anos.

[...]»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

7

Durante o ano de 2004, J. Bakker, de nacionalidade neerlandesa, residia em Espanha e exercia uma atividade assalariada em dragas com pavilhão neerlandês, para uma empresa com sede em Roterdão (Países Baixos). Exerceu as suas atividades principalmente nas águas territoriais chinesas e dos Emirados Árabes Unidos. As dragas estavam inscritas no registo dos navios de mar neerlandês.

8

A imposição notificada a J. Bakker relativa ao ano de 2004, a título do imposto sobre os rendimentos e das contribuições para a segurança social dos Países Baixos foi impugnada pelo interessado. Uma vez que o recurso que interpôs dessa imposição foi julgado improcedente pelo Rechtbank te Breda, J. Bakker recorreu para o Gerechtshof te ’s-Hertogenbosch, que confirmou a decisão de primeira instância.

9

O Gerechtshof te ’s-Hertogenbosch considerou que, relativamente ao ano de 2004, se podia considerar que J. Bakker estava inscrito na segurança social neerlandesa não obstante as suas atividades terem decorrido fora do território da União Europeia. Esse órgão jurisdicional baseou a sua apreciação no facto de a legislação neerlandesa em matéria de segurança social ter passado a ser aplicável ao interessado por força do Regulamento n.o 1408/71, mais particularmente do seu título II. Considerou, nomeadamente, que J. Bakker exercia as suas atividades em navios de mar com pavilhão neerlandês, isto é, de um Estado-Membro, na aceção do artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do referido regulamento. O facto de esses navios fundearem, durante as atividades de dragagem, em águas territoriais não pertencentes à União não é determinante, segundo o Gerechtshof te ’s-Hertogenbosch, uma vez que esta disposição não estabelece qualquer restrição em função do tipo de navio ou do lugar das atividades.

10

Chamado a conhecer de um recurso de cassação, o Hoge Raad der Nederlanden considera, no entanto, que existem dúvidas razoáveis no que respeita à aplicação do título II do Regulamento n.o 1408/71 ao caso em apreço.

11

Considera que foi acertadamente que o Gerechtshof te ’s-Hertogenbosch observou que, à luz apenas do direito neerlandês, o interessado não estava sujeito a inscrição obrigatória na segurança social a título do ano de 2004, pois não residiu nesse ano nos Países Baixos e também não exerceu aí uma atividade assalariada. No entanto, o órgão jurisdicional de reenvio duvida da presunção, na qual se baseia o Gerechtshof te ’s-Hertogenbosch, segundo a qual o interessado integrava, relativamente a 2004, o âmbito de aplicação pessoal do Regulamento n.o 1408/71, que permite a aplicação do título II do referido regulamento à sua situação.

12

A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio assinala que a definição de trabalhador, constante do artigo 1.o, alínea a), do Regulamento n.o 1408/71, impõe que o interessado esteja abrangido por um seguro obrigatório ou facultativo contra uma ou mais eventualidades referidas nessa disposição. Assim, interroga-se sobre se é possível que uma pessoa na situação de J. Bakker, que, à luz apenas da legislação nacional, não está obrigatoriamente abrangida por um seguro devido ao facto de não residir nos Países Baixos, possa, contudo, ter a qualidade de trabalhador na aceção do Regulamento n.o 1408/71, dado que as regras de determinação da legislação aplicável, constantes do título II deste regulamento, designam a legislação desse Estado-Membro como sendo a aplicável.

13

O Hoge Raad der Nederlanden considera que, a fim de garantir o efeito útil das disposições do título II do Regulamento n.o 1408/71, essa questão exige uma resposta afirmativa.

14

O órgão jurisdicional de reenvio interroga-se sobre se, todavia, o facto de o interessado ter exercido as suas atividades fora do território referido no artigo 299.o CE se opõe à aplicação do título II do Regulamento n.o 1408/71. Invoca a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual as normas do direito da União relativas à livre circulação dos trabalhadores se aplicam igualmente às atividades exercidas fora do território da União desde que a relação de trabalho mantenha uma conexão suficientemente estreita com esse território (acórdão de 29 de junho de 1994, Aldewereld, C-60/93, Colet., p. I-2991, n.o 14). O órgão jurisdicional de reenvio considera igualmente pertinente o acórdão de 27 de setembro de 1989, Lopes da Veiga (9/88, Colet., p. 2989, n.o 17), que dizia também respeito à situação de um marítimo, e no qual o Tribunal de Justiça considerou que havia que verificar se a relação de trabalho do interessado apresentava uma conexão suficientemente estreita com o território neerlandês.

15

O órgão jurisdicional de reenvio sublinha que, no decurso de 2004, no âmbito da política conduzida pelo Landelijk Instituut sociale verzekeringen (Instituto nacional da segurança social) no domínio da segurança social dos trabalhadores assalariados, o título II do Regulamento n.o 1408/71 passou a ser aplicável aos marítimos que tenham a nacionalidade de um Estado-Membro da União ou do Espaço Económico Europeu, que residam num desses Estados, e que exerçam atividades assalariadas num navio que não arvore pavilhão de um Estado-Membro, pelo simples facto de o empregador ter sede nos Países Baixos.

16

A referida política conduz a que a segurança social dos trabalhadores assalariados considere que os trabalhadores, como J. Bakker, estão obrigatoriamente seguros quando, à luz da legislação neerlandesa, não pertencem a essa categoria de beneficiários. O órgão jurisdicional de reenvio observa que essa mesma política não proporciona, no entanto, uma base jurídica para a cobrança de contribuições para a segurança social dos trabalhadores assalariados.

17

Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o facto de o interessado ser equiparado, na prática, pela segurança social dos trabalhadores assalariados, a um sujeito passivo, pelo menos para parte da segurança social nos Países Baixos, beneficiando assim efetivamente de uma cobertura social para essa garantia, é uma circunstância que reforça o nexo com os Países Baixos. Se, em contrapartida, não for possível considerar a inscrição no regime de segurança social de um Estado-Membro para apreciar a medida do vínculo com o território da União, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se essa inscrição é uma condição necessária para a aplicação do Regulamento n.o 1408/71 a atividades fora do território da União. A jurisprudência do Tribunal de Justiça (v. acórdão de 23 de outubro de 1986, van Roosmalen, 300/84, Colet., p. 3097; e acórdãos Lopes da Veiga e Aldewereld, já referidos) não oferece certezas quanto a este ponto.

18

O Hoge Raad der Nederlanden vê-se, pois, confrontado com a questão de saber se, tendo em conta todas as circunstâncias do caso em apreço, existe um vínculo suficiente com o território da União. Se o título II do Regulamento n.o 1408/71 se aplicar no processo que lhe foi submetido, o órgão jurisdicional de reenvio presume que a pessoa em causa ficará então sujeita à legislação neerlandesa, em conformidade com o artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do referido regulamento.

19

Foi neste contexto que o Hoge Raad der Nederlanden decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudicais:

«1)

Num caso como o vertente, em que um trabalhador, residente em Espanha e de nacionalidade neerlandesa, presta trabalho como marítimo, por conta de um empregador com sede nos Países Baixos, a bordo de dragas que navegam fora do território da [União] sob pavilhão neerlandês, mas, considerado unicamente à luz da legislação nacional neerlandesa, não está inscrito no [regime] de segurança social [neerlandês] por não residir nos Países Baixos, são aplicáveis as regras de determinação da legislação aplicável constantes do [t]ítulo II do Regulamento […] n.o 1408/71, com a consequência de que a legislação designada como aplicável é a neerlandesa e, por isso, podem ser cobradas contribuições para o regime geral […] da segurança social [neerlandês]?

2)

Em que medida é relevante a circunstância de, na aplicação do regime […] da segurança social [neerlandês], o respetivo organismo de gestão, invocando o direito comunitário, seguir a política de considerar que os marítimos, num caso como o vertente, estão inscritos nesse regime?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

20

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento n.o 1408/71 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que uma medida legislativa de um Estado-Membro exclua da inscrição no regime de segurança social desse Estado-Membro uma pessoa que se encontre numa situação como a do recorrente no processo principal, que possui a nacionalidade do referido Estado-Membro, embora aí não resida, e que trabalha numa draga com pavilhão do mesmo Estado-Membro e desenvolve as suas atividades fora do território da União.

21

Enquanto o Governo neerlandês e a Comissão Europeia consideram que esta questão deve ter uma resposta afirmativa, J. Bakker é de opinião contrária.

22

A este respeito, há que recordar que o artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento n.o 1408/71 dispõe expressamente que a pessoa que exerça a sua atividade profissional a bordo de um navio com pavilhão de um Estado-Membro está sujeita à legislação desse Estado.

23

Assim, por força desta disposição, uma pessoa na situação de J. Bakker está, em princípio, sujeita à legislação neerlandesa em matéria de segurança social, dada a atividade profissional que essa pessoa exerce a bordo de um navio com pavilhão neerlandês.

24

Contudo, J. Bakker apresentou dois argumentos para contestar a aplicação do artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento n.o 1408/71 à sua situação.

25

Em primeiro lugar, sustentou, nas suas observações escritas, que as dragas em que exercia a sua atividade profissional não se incluíam no conceito de «navio» constante do referido artigo 13.o, n.o 2, alínea c).

26

Este argumento não pode ser acolhido, na medida em que nenhuma condição relativa ao tipo de «navio» em causa figura nessa disposição. Além disso, resulta das explicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio que as referidas dragas possuíam um certificado de registo e estavam inscritas no registo dos navios de mar neerlandês.

27

Em segundo lugar, na audiência, J. Bakker apresentou o argumento de que o artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento n.o 1408/71 não se aplica à sua situação dado que as dragas em questão exerciam as suas atividades principalmente nas águas territoriais chinesas e dos Emirados Árabes Unidos. Ora, em virtude do artigo 2.o, n.o 1, da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, assinada em Montego Bay (Jamaica), em 10 de dezembro de 1982, entrada em vigor em 16 de novembro de 1994, ratificada pelo Reino dos Países Baixos em 28 de junho de 1996 e aprovada em nome da Comunidade Europeia pela Decisão 98/392/CE do Conselho, de 23 de março de 1998 (JO L 179, p. 1), a soberania do Estado costeiro estende-se além do seu território e das suas águas interiores a uma zona de mar adjacente designada pelo nome de mar territorial. Por conseguinte, segundo J. Bakker, as atividades profissionais exercidas nas dragas em causa são da competência dos órgãos jurisdicionais dos Estados costeiros, e não da do Estado-Membro do pavilhão, a saber, o Reino dos Países Baixos.

28

Importa salientar, a este respeito, que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a mera circunstância de as atividades de um trabalhador serem exercidas fora do território da União não basta para afastar a aplicação das normas da União sobre a livre circulação dos trabalhadores, desde que a relação de trabalho mantenha um vínculo suficientemente estreito com o território da União. Num caso como o do processo principal, esse vínculo reside na circunstância, confirmada pelo órgão jurisdicional de reenvio, de J. Bakker exercer uma atividade profissional num navio registado nos Países Baixos, ao serviço de uma empresa com sede nesse Estado-Membro (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Lopes da Veiga, n.o 17, e Aldewereld, n.o 14).

29

Além disso, nem o respeito da soberania do Estado costeiro nem a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar obrigam a que se prive um trabalhador na situação de J. Bakker do benefício da cobertura social prevista, nos termos do Regulamento n.o 1408/71, pelo Estado-Membro do pavilhão do navio, quando esse navio se encontra nas águas territoriais de um Estado que não seja esse Estado-Membro.

30

Por conseguinte, o segundo argumento invocado por J. Bakker não pode ser acolhido.

31

Por seu turno, o órgão jurisdicional de reenvio duvida da aplicação do artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento n.o 1408/71, na medida em que J. Bakker não está abrangido pelo âmbito de aplicação pessoal deste regulamento por não estar obrigatoriamente sujeito à segurança social geral nos Países Baixos, uma vez que aí não reside.

32

A este respeito, há que referir que o artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento n.o 1408/71 tem por único objetivo determinar a legislação nacional aplicável às pessoas que exercem uma atividade assalariada a bordo de um navio com pavilhão de um Estado-Membro. Esta disposição, enquanto tal, não tem por objeto determinar as condições da existência do direito ou da obrigação de se inscrever num regime de segurança social ou neste ou naquele ramo de tal regime. Cabe à legislação de cada Estado-Membro determinar essas condições (v. acórdão de 17 de janeiro de 2012, Salemink, C-347/10, n.o 38).

33

Todavia, os Estados-Membros, embora conservem a sua competência para regulamentar as condições de inscrição nos respetivos sistemas de segurança social, devem contudo, no exercício dessa competência, respeitar o direito da União. Em particular, essas condições não podem ter por efeito excluir da aplicação da legislação em causa as pessoas às quais, por força do Regulamento n.o 1408/71, essa legislação é aplicável (v., neste sentido, acórdãos de 3 de maio de 1990, Kits van Heijningen, C-2/89, Colet., p. I-1755, n.o 20, e Salemink, já referido, n.os 39 e 40).

34

Ora, o artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento n.o 1408/71 dispõe expressamente que a pessoa que exerce a sua atividade profissional a bordo de um navio com pavilhão de um Estado-Membro está sujeita à legislação desse Estado. Esta disposição não seria respeitada se a condição de residência imposta pela legislação do Estado-Membro em causa, para efeitos da admissão ao regime de segurança social que institui, fosse oponível às pessoas a que o dito artigo 13.o, n.o 2, alínea c), se refere (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Kits van Heijningen, n.o 21, e Salemink, n.o 41).

35

Por conseguinte, o artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento n.o 1408/71 tem por efeito tornar inoponível às pessoas visadas nessa disposição uma cláusula da legislação nacional aplicável, por força da qual a admissão ao regime de segurança social previsto nessa legislação está subordinada a uma condição de residência no Estado-Membro em questão (v., neste sentido, acórdão Kits van Heijningen, já referido, n.o 22).

36

Resulta da decisão de reenvio que esta abordagem foi de facto transposta para a política do Landelijk Instituut sociale verzekeringen, que equipara as pessoas na situação de J. Bakker a sujeitos passivos.

37

Em face do exposto, há que responder à primeira questão que o artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento n.o 1408/71 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que uma medida legislativa de um Estado-Membro exclua da inscrição no regime de segurança social desse Estado-Membro uma pessoa que se encontre numa situação como a do recorrente no processo principal, que possui a nacionalidade do referido Estado-Membro, embora aí não resida, e que trabalha numa draga com pavilhão do mesmo Estado-Membro e desenvolve as suas atividades fora do território da União.

Quanto à segunda questão

38

Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, não é necessário responder à segunda questão.

Quanto às despesas

39

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declara:

 

O artigo 13.o, n.o 2, alínea c), do Regulamento (CEE) n.o 1408/71 do Conselho, de 14 de junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na sua versão alterada e atualizada pelo Regulamento (CE) n.o 118/97 do Conselho, de 2 de dezembro de 1996, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 307/1999 do Conselho, de 8 de fevereiro de 1999, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que uma medida legislativa de um Estado-Membro exclua da inscrição no regime de segurança social desse Estado-Membro uma pessoa que se encontre numa situação como a do recorrente no processo principal, que possui a nacionalidade do referido Estado-Membro, embora aí não resida, e que trabalha numa draga com pavilhão do mesmo Estado-Membro e desenvolve as suas atividades fora do território da União.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.

Top

Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Parte decisória

Partes

No processo C-106/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Hoge Raad der Nederlanden (Países Baixos), por decisão de 11 de fevereiro de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 3 de março de 2011, no processo

J. Bakker

contra

Minister van Financiën,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),

composto por: A. Prechal, presidente de secção, K. Schiemann (relator) e L. Bay Larsen, juízes,

advogado-geral: P. Cruz Villalón,

secretário: M.-A. Gaudissart, chefe de unidade,

vistos os autos e após a audiência de 1 de março de 2012,

vistas as observações apresentadas:

¾ em representação de J. Bakker, por H. Menger e V. J. de Groot, belastingadviseurs,

¾ em representação do Governo neerlandês, por C. Wissels e C. Schillemans, na qualidade de agentes,

¾ em representação da Comissão Europeia, por V. Kreuschitz e M. van Beek, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão

1. O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do título II do Regulamento (CEE) n.° 1408/71 do Conselho, de 14 de junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na sua versão alterada e atualizada pelo Regulamento (CE) n.° 118/97 do Conselho, de 2 de dezembro de 1996 (JO 1997, L 28, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 307/1999 do Conselho, de 8 de fevereiro de 1999 (JO L 38, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 1408/71»).

2. Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe J. Bakker ao Staatssecretaris van Financiën (Secretário de Estado das Finanças) a propósito da sua inscrição obrigatória na segurança social neerlandesa para o ano de 2004.

Quadro jurídico

Direito da União

3. Por força do artigo 1.°, alínea a), i), do Regulamento n.° 1408/71, a expressão «trabalhador assalariado» designa qualquer pessoa que «esteja abrangida por um seguro obrigatório ou facultativo continuado contra uma ou mais eventualidades correspondentes aos ramos de um regime de segurança social aplicável aos trabalhadores assalariados ou não assalariados ou de um regime especial dos funcionários públicos».

4. Nos termos do artigo 2.°, n.° 1, deste regulamento:

«O presente regulamento aplica-se aos trabalhadores assalariados ou não assalariados e aos estudantes que estejam ou tenham estado sujeitos à legislação de um ou vários Estados-Membros e sejam nacionais de um dos Estados-Membros [...]»

5. O artigo 13.° do referido regulamento, que faz parte do título II deste diploma, intitulado «Determinação da legislação aplicável», dispõe:

«1. Sem prejuízo do disposto nos artigos 14.°-C e 14.°-F, as pessoas às quais se aplica o presente regulamento apenas estão sujeitas à legislação de um Estado-Membro. Esta legislação é determinada de acordo com as disposições do presente título.

2. Sem prejuízo do disposto nos artigos 14.° a 17.°:

[...]

c) a pessoa que exerça a sua atividade profissional a bordo de um navio com pavilhão de um Estado-Membro está sujeita à legislação desse Estado;

[...]»

Direito neerlandês

6. O artigo 6.° da Lei que institui o regime geral das pensões de reforma (Algemene Ouderdomswet, Stb. 1956, n.° 281) dispõe:

«1. São beneficiários, na aceção das presentes disposições,

a) os residentes e

b) os não residentes que estejam sujeitos ao imposto sobre os rendimentos devido a atividades profissionais assalariadas exercidas nos Países Baixos

que não tenham atingido os 65 anos.

[...]»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

7. Durante o ano de 2004, J. Bakker, de nacionalidade neerlandesa, residia em Espanha e exercia uma atividade assalariada em dragas com pavilhão neerlandês, para uma empresa com sede em Roterdão (Países Baixos). Exerceu as suas atividades principalmente nas águas territoriais chinesas e dos Emirados Árabes Unidos. As dragas estavam inscritas no registo dos navios de mar neerlandês.

8. A imposição notificada a J. Bakker relativa ao ano de 2004, a título do imposto sobre os rendimentos e das contribuições para a segurança social dos Países Baixos foi impugnada pelo interessado. Uma vez que o recurso que interpôs dessa imposição foi julgado improcedente pelo Rechtbank te Breda, J. Bakker recorreu para o Gerechtshof te ’s-Hertogenbosch, que confirmou a decisão de primeira instância.

9. O Gerechtshof te ’s-Hertogenbosch considerou que, relativamente ao ano de 2004, se podia considerar que J. Bakker estava inscrito na segurança social neerlandesa não obstante as suas atividades terem decorrido fora do território da União Europeia. Esse órgão jurisdicional baseou a sua apreciação no facto de a legislação neerlandesa em matéria de segurança social ter passado a ser aplicável ao interessado por força do Regulamento n.° 1408/71, mais particularmente do seu título II. Considerou, nomeadamente, que J. Bakker exercia as suas atividades em navios de mar com pavilhão neerlandês, isto é, de um Estado-Membro, na aceção do artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do referido regulamento. O facto de esses navios fundearem, durante as atividades de dragagem, em águas territoriais não pertencentes à União não é determinante, segundo o Gerechtshof te ’s-Hertogenbosch, uma vez que esta disposição não estabelece qualquer restrição em função do tipo de navio ou do lugar das atividades.

10. Chamado a conhecer de um recurso de cassação, o Hoge Raad der Nederlanden considera, no entanto, que existem dúvidas razoáveis no que respeita à aplicação do título II do Regulamento n.° 1408/71 ao caso em apreço.

11. Considera que foi acertadamente que o Gerechtshof te ’s-Hertogenbosch observou que, à luz apenas do direito neerlandês, o interessado não estava sujeito a inscrição obrigatória na segurança social a título do ano de 2004, pois não residiu nesse ano nos Países Baixos e também não exerceu aí uma atividade assalariada. No entanto, o órgão jurisdicional de reenvio duvida da presunção, na qual se baseia o Gerechtshof te ’s-Hertogenbosch, segundo a qual o interessado integrava, relativamente a 2004, o âmbito de aplicação pessoal do Regulamento n.° 1408/71, que permite a aplicação do título II do referido regulamento à sua situação.

12. A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio assinala que a definição de trabalhador, constante do artigo 1.°, alínea a), do Regulamento n.° 1408/71, impõe que o interessado esteja abrangido por um seguro obrigatório ou facultativo contra uma ou mais eventualidades referidas nessa disposição. Assim, interroga-se sobre se é possível que uma pessoa na situação de J. Bakker, que, à luz apenas da legislação nacional, não está obrigatoriamente abrangida por um seguro devido ao facto de não residir nos Países Baixos, possa, contudo, ter a qualidade de trabalhador na aceção do Regulamento n.° 1408/71, dado que as regras de determinação da legislação aplicável, constantes do título II deste regulamento, designam a legislação desse Estado-Membro como sendo a aplicável.

13. O Hoge Raad der Nederlanden considera que, a fim de garantir o efeito útil das disposições do título II do Regulamento n.° 1408/71, essa questão exige uma resposta afirmativa.

14. O órgão jurisdicional de reenvio interroga-se sobre se, todavia, o facto de o interessado ter exercido as suas atividades fora do território referido no artigo 299.° CE se opõe à aplicação do título II do Regulamento n.° 1408/71. Invoca a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual as normas do direito da União relativas à livre circulação dos trabalhadores se aplicam igualmente às atividades exercidas fora do território da União desde que a relação de trabalho mantenha uma conexão suficientemente estreita com esse território (acórdão de 29 de junho de 1994, Aldewereld, C-60/93, Colet., p. I-2991, n.° 14). O órgão jurisdicional de reenvio considera igualmente pertinente o acórdão de 27 de setembro de 1989, Lopes da Veiga (9/88, Colet., p. 2989, n.° 17), que dizia também respeito à situação de um marítimo, e no qual o Tribunal de Justiça considerou que havia que verificar se a relação de trabalho do interessado apresentava uma conexão suficientemente estreita com o território neerlandês.

15. O órgão jurisdicional de reenvio sublinha que, no decurso de 2004, no âmbito da política conduzida pelo Landelijk Instituut sociale verzekeringen (Instituto nacional da segurança social) no domínio da segurança social dos trabalhadores assalariados, o título II do Regulamento n.° 1408/71 passou a ser aplicável aos marítimos que tenham a nacionalidade de um Estado-Membro da União ou do Espaço Económico Europeu, que residam num desses Estados, e que exerçam atividades assalariadas num navio que não arvore pavilhão de um Estado-Membro, pelo simples facto de o empregador ter sede nos Países Baixos.

16. A referida política conduz a que a segurança social dos trabalhadores assalariados considere que os trabalhadores, como J. Bakker, estão obrigatoriamente seguros quando, à luz da legislação neerlandesa, não pertencem a essa categoria de beneficiários. O órgão jurisdicional de reenvio observa que essa mesma política não proporciona, no entanto, uma base jurídica para a cobrança de contribuições para a segurança social dos trabalhadores assalariados.

17. Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o facto de o interessado ser equiparado, na prática, pela segurança social dos trabalhadores assalariados, a um sujeito passivo, pelo menos para parte da segurança social nos Países Baixos, beneficiando assim efetivamente de uma cobertura social para essa garantia, é uma circunstância que reforça o nexo com os Países Baixos. Se, em contrapartida, não for possível considerar a inscrição no regime de segurança social de um Estado-Membro para apreciar a medida do vínculo com o território da União, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se essa inscrição é uma condição necessária para a aplicação do Regulamento n.° 1408/71 a atividades fora do território da União. A jurisprudência do Tribunal de Justiça (v. acórdão de 23 de outubro de 1986, van Roosmalen, 300/84, Colet., p. 3097; e acórdãos Lopes da Veiga e Aldewereld, já referidos) não oferece certezas quanto a este ponto.

18. O Hoge Raad der Nederlanden vê-se, pois, confrontado com a questão de saber se, tendo em conta todas as circunstâncias do caso em apreço, existe um vínculo suficiente com o território da União. Se o título II do Regulamento n.° 1408/71 se aplicar no processo que lhe foi submetido, o órgão jurisdicional de reenvio presume que a pessoa em causa ficará então sujeita à legislação neerlandesa, em conformidade com o artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do referido regulamento.

19. Foi neste contexto que o Hoge Raad der Nederlanden decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudicais:

«1) Num caso como o vertente, em que um trabalhador, residente em Espanha e de nacionalidade neerlandesa, presta trabalho como marítimo, por conta de um empregador com sede nos Países Baixos, a bordo de dragas que navegam fora do território da [União] sob pavilhão neerlandês, mas, considerado unicamente à luz da legislação nacional neerlandesa, não está inscrito no [regime] de segurança social [neerlandês] por não residir nos Países Baixos, são aplicáveis as regras de determinação da legislação aplicável constantes do [t]ítulo II do Regulamento […] n.º 1408/71, com a consequência de que a legislação designada como aplicável é a neerlandesa e, por isso, podem ser cobradas contribuições para o regime geral […] da segurança social [neerlandês]?

2) Em que medida é relevante a circunstância de, na aplicação do regime […] da segurança social [neerlandês], o respetivo organismo de gestão, invocando o direito comunitário, seguir a política de considerar que os marítimos, num caso como o vertente, estão inscritos nesse regime?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

20. Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1408/71 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que uma medida legislativa de um Estado-Membro exclua da inscrição no regime de segurança social desse Estado-Membro uma pessoa que se encontre numa situação como a do recorrente no processo principal, que possui a nacionalidade do referido Estado-Membro, embora aí não resida, e que trabalha numa draga com pavilhão do mesmo Estado-Membro e desenvolve as suas atividades fora do território da União.

21. Enquanto o Governo neerlandês e a Comissão Europeia consideram que esta questão deve ter uma resposta afirmativa, J. Bakker é de opinião contrária.

22. A este respeito, há que recordar que o artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1408/71 dispõe expressamente que a pessoa que exerça a sua atividade profissional a bordo de um navio com pavilhão de um Estado-Membro está sujeita à legislação desse Estado.

23. Assim, por força desta disposição, uma pessoa na situação de J. Bakker está, em princípio, sujeita à legislação neerlandesa em matéria de segurança social, dada a atividade profissional que essa pessoa exerce a bordo de um navio com pavilhão neerlandês.

24. Contudo, J. Bakker apresentou dois argumentos para contestar a aplicação do artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1408/71 à sua situação.

25. Em primeiro lugar, sustentou, nas suas observações escritas, que as dragas em que exercia a sua atividade profissional não se incluíam no conceito de «navio» constante do referido artigo 13.°, n.° 2, alínea c).

26. Este argumento não pode ser acolhido, na medida em que nenhuma condição relativa ao tipo de «navio» em causa figura nessa disposição. Além disso, resulta das explicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio que as referidas dragas possuíam um certificado de registo e estavam inscritas no registo dos navios de mar neerlandês.

27. Em segundo lugar, na audiência, J. Bakker apresentou o argumento de que o artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1408/71 não se aplica à sua situação dado que as dragas em questão exerciam as suas atividades principalmente nas águas territoriais chinesas e dos Emirados Árabes Unidos. Ora, em virtude do artigo 2.°, n.° 1, da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, assinada em Montego Bay (Jamaica), em 10 de dezembro de 1982, entrada em vigor em 16 de novembro de 1994, ratificada pelo Reino dos Países Baixos em 28 de junho de 1996 e aprovada em nome da Comunidade Europeia pela Deci são 98/392/CE do Conselho, de 23 de março de 1998 (JO L 179, p. 1), a soberania do Estado costeiro estende-se além do seu território e das suas águas interiores a uma zona de mar adjacente designada pelo nome de mar territorial. Por conseguinte, segundo J. Bakker, as atividades profissionais exercidas nas dragas em causa são da competência dos órgãos jurisdicionais dos Estados costeiros, e não da do Estado-Membro do pavilhão, a saber, o Reino dos Países Baixos.

28. Importa salientar, a este respeito, que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a mera circunstância de as atividades de um trabalhador serem exercidas fora do território da União não basta para afastar a aplicação das normas da União sobre a livre circulação dos trabalhadores, desde que a relação de trabalho mantenha um vínculo suficientemente estreito com o território da União. Num caso como o do processo principal, esse vínculo reside na circunstância, confirmada pelo órgão jurisdicional de reenvio, de J. Bakker exercer uma atividade profissional num navio registado nos Países Baixos, ao serviço de uma empresa com sede nesse Estado-Membro (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Lopes da Veiga, n.° 17, e Aldewereld, n.° 14).

29. Além disso, nem o respeito da soberania do Estado costeiro nem a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar obrigam a que se prive um trabalhador na situação de J. Bakker do benefício da cobertura social prevista, nos termos do Regulamento n.° 1408/71, pelo Estado-Membro do pavilhão do navio, quando esse navio se encontra nas águas territoriais de um Estado que não seja esse Estado-Membro.

30. Por conseguinte, o segundo argumento invocado por J. Bakker não pode ser acolhido.

31. Por seu turno, o órgão jurisdicional de reenvio duvida da aplicação do artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1408/71, na medida em que J. Bakker não está abrangido pelo âmbito de aplicação pessoal deste regulamento por não estar obrigatoriamente sujeito à segurança social geral nos Países Baixos, uma vez que aí não reside.

32. A este respeito, há que referir que o artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1408/71 tem por único objetivo determinar a legislação nacional aplicável às pessoas que exercem uma atividade assalariada a bordo de um navio com pavilhão de um Estado-Membro. Esta disposição, enquanto tal, não tem por objeto determinar as condições da existência do direito ou da obrigação de se inscrever num regime de segurança social ou neste ou naquele ramo de tal regime. Cabe à legislação de cada Estado-Membro determinar essas condições (v. acórdão de 17 de janeiro de 2012, Salemink, C-347/10, n.° 38).

33. Todavia, os Estados-Membros, embora conservem a sua competência para regulamentar as condições de inscrição nos respetivos sistemas de segurança social, devem contudo, no exercício dessa competência, respeitar o direito da União. Em particular, essas condições não podem ter por efeito excluir da aplicação da legislação em causa as pessoas às quais, por força do Regulamento n.° 1408/71, essa legislação é aplicável (v., neste sentido, acórdãos de 3 de maio de 1990, Kits van Heijningen, C-2/89, Colet., p. I-1755, n.° 20, e Salemink, já referido, n. os  39 e 40).

34. Ora, o artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1408/71 dispõe expressamente que a pessoa que exerce a sua atividade profissional a bordo de um navio com pavilhão de um Estado-Membro está sujeita à legislação desse Estado. Esta disposição não seria respeitada se a condição de residência imposta pela legislação do Estado-Membro em causa, para efeitos da admissão ao regime de segurança social que institui, fosse oponível às pessoas a que o dito artigo 13.°, n.° 2, alínea c), se refere (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Kits van Heijningen, n.° 21, e Salemink, n.° 41).

35. Por conseguinte, o artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1408/71 tem por efeito tornar inoponível às pessoas visadas nessa disposição uma cláusula da legislação nacional aplicável, por força da qual a admissão ao regime de segurança social previsto nessa legislação está subordinada a uma condição de residência no Estado-Membro em questão (v., neste sentido, acórdão Kits van Heijningen, já referido, n.° 22).

36. Resulta da decisão de reenvio que esta abordagem foi de facto transposta para a política do Landelijk Instituut sociale verzekeringen, que equipara as pessoas na situação de J. Bakker a sujeitos passivos.

37. Em face do exposto, há que responder à primeira questão que o artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento n.° 1408/71 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que uma medida legislativa de um Estado-Membro exclua da inscrição no regime de segurança social desse Estado-Membro uma pessoa que se encontre numa situação como a do recorrente no processo principal, que possui a nacionalidade do referido Estado-Membro, embora aí não resida, e que trabalha numa draga com pavilhão do mesmo Estado-Membro e desenvolve as suas atividades fora do território da União.

Quanto à segunda questão

38. Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, não é necessário responder à segunda questão.

Quanto às despesas

39. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Parte decisória

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declara:

O artigo 13.°, n.° 2, alínea c), do Regulamento (CEE) n.° 1408/71 do Conselho, de 14 de junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na sua versão alterada e atualizada pelo Regulamento (CE) n.° 118/97 do Conselho, de 2 de dezembro de 1996, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 307/1999 do Conselho, de 8 de fevereiro de 1999, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que uma medida legislativa de um Estado-Membro exclua da inscrição no regime de segurança social desse Estado-Membro uma pessoa que se encontre numa situação como a do recorrente no processo principal, que possui a nacionalidade do referido Estado-Membro, embora aí não resida, e que trabalha numa draga com pavilhão do mesmo Estado-Membro e desenvolve as suas atividades fora do território da União.

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