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Document 62011CC0661

Conclusões do advogado-geral Cruz Villalón apresentadas em 18 de Abril de 2013.
Martin y Paz Diffusion SA contra David Depuydt e Fabriek van Maroquinerie Gauquie NV.
Pedido de decisão prejudicial: Cour de cassation - Bélgica.
Marcas - Diretiva 89/104/CEE - Artigo 5.º - Consentimento dado pelo titular de uma marca ao uso, por um terceiro, de um sinal idêntico à mesma - Consentimento dado no quadro de uma exploração partilhada - Possibilidade de o referido titular pôr fim à exploração partilhada e retomar o uso exclusivo da sua marca.
Processo C-661/11.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2013:252

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PEDRO CRUZ VILLALÓN

apresentadas em 18 de abril de 2013 ( 1 )

Processo C‑661/11

Martin y Paz Diffusion SA

contra

David Depuydt

e

Fabriek van Maroquinerie Gauquie NV

[Pedido de decisão prejudicial apresentado pela Cour de cassation (Bélgica)]

«Marcas — Diretiva 89/104/CEE — Artigo 5.o, n.o 1 — Direitos exclusivos do titular da marca — Uso partilhado da marca — Consentimento — Revogação do consentimento para o uso da marca — Concorrência desleal»

1. 

Pode o titular de uma marca ser proibido, a título definitivo, de exercer os seus direitos exclusivos e de usar a referida marca para determinados produtos pelo facto de um terceiro ter usado a marca para esses produtos com o seu consentimento durante um longo período de tempo? É esta, no fundo, a questão colocada ao Tribunal de Justiça no presente caso.

2. 

As questões surgem no contexto de uma situação caracterizada por factos bastante invulgares. Ambas as partes no processo principal — a Martin y Paz Diffusion (a seguir «MyP») por um lado, e a Fabriek van Maroquinerie Gauquie (a seguir «Gauquie») juntamente com o seu administrador, David Depuydt, por outro — exercem a sua atividade na indústria dos artigos de moda em pele. Ambas as empresas têm usado a mesma marca, mas em relação a produtos diferentes. Inicialmente, as partes cooperaram, mudando a marca que usavam ao longo do tempo. Em determinada altura, a MyP registou algumas daquelas marcas. Posteriormente, a relação entre as partes deteriorou‑se, o que resultou na instauração de várias ações judiciais.

I — Quadro jurídico

A — Direito da União Europeia

3.

A Primeira Diretiva do Conselho 89/104/CEE, de 21 de dezembro de 1988 (a seguir «diretiva») ( 2 ), que é aplicável no presente caso, foi adotada com o objetivo de harmonizar as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas.

4.

O sexto considerando da diretiva dispõe o seguinte: «[...] a presente diretiva não exclui a aplicação às marcas de disposições do direito dos Estados‑Membros que não estejam abrangidas pelo direito de marcas, tais como disposições relativas à concorrência desleal, à responsabilidade civil ou à defesa dos consumidores.»

5.

O sétimo considerando da diretiva estabelece que «[...] os motivos de recusa ou de nulidade relativos à própria marca, por exemplo, a ausência de caráter distintivo, ou relativos aos conflitos entre a marca e os direitos anteriores, devem ser enumerados de modo exaustivo [...]»

6.

O artigo 3.o da diretiva enumera os motivos de recusa e de nulidade. Nos termos do artigo 3.o, n.o 2, alínea d), da diretiva, quando e na medida em que «o requerente tenha apresentado de má‑fé o pedido de registo da marca», qualquer Estado‑Membro pode prever que seja recusado o registo de uma marca ou que o seu registo, uma vez efetuado, fique sujeito a ser declarado nulo. O artigo 4.o enumera outros motivos de recusa ou de nulidade relativos a conflitos com direitos anteriores.

7.

O artigo 5.o, n.o 1, da diretiva estabelece o seguinte:

«1.   A marca registada confere ao seu titular um direito exclusivo. O titular fica habilitado a proibir que um terceiro, sem o seu consentimento, faça uso na vida comercial:

a)

De qualquer sinal idêntico à marca para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca foi registada;

b)

De um sinal relativamente ao qual, devido à sua identidade ou semelhança com a marca e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços a que a marca e o sinal se destinam, exista, no espírito do público, um risco de confusão que compreenda o risco de associação entre o sinal e a marca.»

8.

O artigo 8.o da diretiva regula as licenças.

9.

A diretiva foi revogada pelo artigo 17.o da Diretiva 2008/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas ( 3 ), que entrou em vigor em 28 de novembro de 2008. O considerando 7 da nova diretiva reproduz o considerando 6 da antiga, ao mesmo tempo que o artigo 5.o, n.o 1, da nova diretiva é, com algumas alterações insignificantes, idêntico ao artigo 5.o, n.o 1, da antiga. Em virtude das datas em que ocorreram os factos em causa, é aplicável a diretiva antiga.

B — Direito nacional

10.

O órgão jurisdicional de reenvio está obrigado a aplicar os artigos 2.20.1 e 2.32.1 da Convenção Benelux em matéria de propriedade intelectual (marcas e desenhos ou modelos) (a seguir «CBPI»), assinada na Haia em 25 de fevereiro de 2005, que transpõe os artigos 5.°, n.o 1, e 8.°, n.o 1, da diretiva. A Convenção entrou em vigor em 1 de fevereiro de 2007 e, desde então, já foi alterada.

11.

O artigo 2.20.1 dispõe o seguinte:

«1.

A marca registada confere ao seu titular um direito exclusivo. Sem prejuízo da possível aplicação da lei ordinária em matéria de responsabilidade civil, o direito exclusivo sobre uma marca habilita o seu titular a proibir um terceiro, sem o seu consentimento, de:

a)

usar, na vida comercial, qualquer sinal idêntico à marca para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca foi registada;

b)

usar, na vida comercial, um sinal relativamente ao qual, dado que é idêntico ou semelhante à marca e dado que os produtos ou serviços a que a marca e o sinal se destinam são idênticos ou semelhantes, exista, no espírito do público, um risco de confusão que compreenda o risco de associação entre o sinal e a marca;

c)

[…]»

12.

O artigo 2.32.1 tem a seguinte redação: «1. Uma marca pode ser objeto de uma licença para a totalidade ou parte dos produtos ou serviços para os quais tenha sido depositada ou registada.»

II — Matéria de facto e processo principal

A — Matéria de facto

13.

O caso sub judice respeita ao âmbito dos direitos exclusivos da MyP ao abrigo, nesta fase, de duas marcas por si registadas junto do Instituto do Benelux para a Propriedade Intelectual (a seguir «IBPI»): um «N» alongado, depositado como marca figurativa em 14 de agosto de 1998 (n.o 636308) para todos os produtos das classes 18 (peles e couro) e 25 (vestuário) da Classificação de Nice ( 4 ), e a marca nominativa «NATHAN BAUME» (n.o 712962), depositada para produtos das classes 18 e 25 em 24 de janeiro de 2002.

14.

No entanto, a raiz dos conflitos reside na anterior partilha do uso, por parte da MyP e da Gauquie, de uma terceira marca, «NATHAN», que remonta a Nathan Svitckenbaum, que começou a produzir artigos de moda em pele na década de 1930 sob o nome Nathan Baum. Em 1990, o direito ao nome «Nathan» pertencia a Paul Baquet, outro produtor de artigos de moda em pele.

15.

Em 6 de junho de 1990, P. Baquet vendeu o nome «NATHAN» à MyP. De acordo com o contrato, a venda foi realizada «tendo em vista a produção de uma linha de pequenos artigos em pele». P. Baquet «mantém a titularidade do direito ao nome para o fabrico de malas de mão». A MyP «compromete‑se a não exercer uma concorrência desleal em relação ao fabrico e distribuição de malas, usando os modelos e o nome NATHAN».

16.

Cinco anos depois, por contrato de 2 de maio de 1995, D. Depuydt adquiriu o resto do negócio de P. Baquet, incluindo «a firma/denominação comercial Paul Baquet ‘NATHAN’», bem como a marca nominativa «NATHAN», que P. Baquet tinha registado junto do IBPI para as classes 18 e 25 em 1991. Tendo em conta o contrato celebrado entre P. Baquet e a MyP, D. Depuydt concordou em não produzir e distribuir pequenos artigos em pele sob o nome «NATHAN».

17.

Durante 1995, D. Depuydt comercializou malas de mão sob a marca «NATHAN», que apresentavam a letra N alongada numa disposição horizontal ( 5 ). A MyP usa a letra N alongada pelo menos desde 1996 e alega que começou a usá‑la no final de 1990 ou no início de 1991, o que D. Depuydt e a Gauquie negam.

18.

As partes foram forçadas a reconsiderar o uso da marca quando, em 1998, a empresa Natan (não relacionada com as outras duas) alegou que a marca «NATHAN» se assemelhava demasiado à sua própria marca, «NATAN».

19.

Desde 2002, tanto a MyP como a Gauquie usam a marca figurativa «N» e o novo nome «NATHAN BAUME», partilhando o uso destas marcas da mesma forma que partilhavam a marca «NATHAN». Assim, usando a marca figurativa «N» e a marca nominativa «NATHAN BAUME» (as duas únicas marcas que continuam a ser relevantes nesta fase do processo), a MyP distribui um catálogo com artigos em pele (nomeadamente bolsas de toilette, carteiras, sacos de viagem, cintos, etc.) e a Gauquie produz e vende malas de mão e sapatos. As partes vendem os seus produtos uma à outra e expõem‑nos nas respetivas lojas.

20.

Em 14 de agosto de 1998, a MyP depositou a marca «N» em causa no presente processo e a marca «NATHAN» como marca figurativa no IBPI. Em 2002, depositou a marca «NATHAN BAUME». D. Depuydt e a Gauquie afirmam que a MyP não os informou deste depósito. A transmissão da marca nominativa «NATHAN», originalmente registada por P. Baquet, para a MyP e D. Depuydt foi registada em 17 de agosto de 1998 e em 19 de dezembro de 2000, respetivamente.

21.

Não obstante o registo destas marcas, a relação entre as partes não sofreu alterações. Porém, de acordo com a decisão proferida em sede de recurso, esta relação acabou por se deteriorar porque a MyP começou a comercializar outros produtos e exigiu consultas com a Gauquie relativamente a escolha de materiais, cores e comunicação. Já em julho de 1998 a MyP se tinha queixado à Gauquie de falta de cooperação entre as duas empresas em detrimento da imagem da marca, sugerindo repetidamente (também em dezembro de 2001 e junho e dezembro de 2003) uma colaboração mais estreita. Em dezembro de 2004, a MyP queixou‑se, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, de «que as regras de contitularidade da marca ‘NATHAN BAUME’ foram violadas». A tentativa de chegar a um acordo fracassou.

B — Processo principal

22.

Em 24 de maio de 2005, D. Depuydt e a Gauquie instauraram, sem sucesso, uma ação contra a MyP no tribunal de commerce de Nivelles, tendo requerido a declaração de nulidade das marcas figurativas «N», «NATHAN» e da marca nominativa «NATHAN BAUME» ou, pelo menos, a limitação da sua validade a pequenos artigos em pele.

23.

Em resposta à tentativa de D. Depuydt e da Gauquie de obtenção da declaração de nulidade da marca, a MyP decidiu pôr termo à partilha do uso das marcas e, em 11 de janeiro de 2007, instaurou uma ação contra D. Depuydt e a Gauquie no mesmo tribunal com o objetivo de os impedir de usarem a marca figurativa «N» e a marca nominativa «NATHAN BAUME» para produtos das classes 18 e 25. D. Depuydt e a Gauquie apresentaram um pedido reconvencional, requerendo que a MyP fosse proibida de usar as marcas «N», «NATHAN» e «NATHAN BAUME» para produtos em pele diferentes de pequenos produtos em pele, especialmente malas de mão. O pedido da MyP foi indeferido pelo tribunal, que ordenou que aquela pusesse termo à produção, comercialização, venda e distribuição de malas de mão idênticas ou semelhantes às de D. Depuydt e da Gauquie.

24.

Foi interposto recurso das duas decisões para a Cour d’appel de Bruxelles, que proferiu a sua decisão em 8 de novembro de 2007.

25.

A Cour d’appel concluiu que as três marcas registadas em causa, nomeadamente as duas marcas figurativas «NATHAN» e «N», bem como a marca nominativa «NATHAN BAUME», detidas pela MyP, eram válidas. Em especial, o direito de requerer a sua anulação com fundamento em registo de má‑fé tinha prescrito.

26.

A Gauquie e D. Depuydt foram proibidos de usar as três marcas em quaisquer produtos, exceto em malas de mão e sapatos, com base nos direitos exclusivos conferidos pela marca. A Cour d’appel justificou estas exceções com fundamento na doutrina do abuso de direitos, nomeadamente abuso do processo, tendo declarado que a MyP tinha invocado de forma tão categórica o seu direito exclusivo por uma questão de vingança. Até então, a MyP sempre tinha reconhecido o direito da Gauquie a usar as marcas «N» e «NATHAN BAUME» para malas de mão e sapatos. A Cour d’appel entendeu que não existia um contrato de licença (por tempo indeterminado e tacitamente renovável) entre as partes, mas sim, como admitira a própria MyP, uma forma de contitularidade das marcas. A Cour d’appel considerou que tal constituía um «consentimento irrevogável» para o uso das marcas pela Gauquie em relação a malas de mão e sapatos.

27.

Por outro lado, a MyP foi proibida de usar as marcas, na vida comercial, para malas de mão e sapatos. A Cour d’appel considerou que tal uso constituiria um ato de concorrência desleal. Em primeiro lugar, a MyP sempre tinha reconhecido voluntariamente que a sua obrigação de não entrar em concorrência desleal com P. Baquet na área do fabrico e distribuição de malas com o nome «NATHAN» abrangia igualmente as marcas «N» e «NATHAN BAUME» para malas de mão e sapatos. Em segundo lugar, ao longo dos anos, a Gauquie tinha efetuado um investimento considerável na publicidade dos seus produtos, de que a MyP iria injustamente beneficiar.

28.

Um acórdão interpretativo, de 12 de setembro de 2008, definiu com maior precisão os termos «malas de mão» e «uso na vida comercial».

29.

A MyP interpôs recurso do acórdão e do acórdão interpretativo da Cour d’appel junto da Cour de cassation na parte aplicável às marcas «N» e «NATHAN BAUME», com dois fundamentos.

30.

Quanto ao primeiro fundamento, relativo à limitação da proibição imposta sobre a Gauquie e D. Depuydt, a MyP alegou que apenas uma licença que corresponda ao consentimento exigido pelo artigo 2.20.1 da CBPI pode legitimar o uso de uma marca por um terceiro. O consentimento irrevogável, ou seja, uma obrigação irrevogável, não existe como questão de ordre public e seria incompatível com os direitos exclusivos conferidos pela marca. A revogação do consentimento e o exercício dos direitos conferidos pela marca não podem, no entender da MyP, ser qualificados de abuso de direito e, mesmo que assim fosse, a sanção correta seria a redução do exercício do direito para um nível normal e a atribuição de uma indemnização, e não a proibição do uso da marca.

31.

Quanto ao facto de ter sido ela própria proibida de usar as marcas em alguns aspetos, a MyP alega, no contexto do segundo fundamento do recurso, que as marcas conferem um direito exclusivo a impedir que outros as usem sem o seu consentimento. Segundo a MyP, tal direito implica o direito de usar ela própria as marcas sob pena de caducidade. No termo de uma licença (ainda que, simultaneamente, o titular da marca assuma o compromisso de não usar ele próprio a marca), o titular da marca recupera o exercício pleno dos seus direitos. As eventuais vantagens de que o titular poderá eventualmente beneficiar devido à publicidade efetuada pela parte por ele autorizada a usar a marca, bem como qualquer risco de confusão resultante da recuperação do direito, são consequências necessárias do exercício legal dos direitos exclusivos. Alternativamente, a Cour d’appel não podia proibir o uso da marca a título definitivo, devendo ter imposto uma sanção menos restritiva.

III — Questões prejudiciais e processo perante o Tribunal de Justiça

32.

No seu acórdão de 2 de dezembro de 2011, o órgão jurisdicional de reenvio rejeitou o argumento da MyP de que a sua tentativa de proibir a Gauquie de usar as marcas era apenas uma forma de exercício dos seus direitos exclusivos sobre as mesmas e, como tal, não podia ser considerado um abuso de direito, por entender que tal argumento se baseava numa interpretação errónea do acórdão proferido em sede de recurso. O órgão jurisdicional de reenvio afirmou que a decisão do recurso tomava em consideração não apenas o longo período de partilha do uso das marcas mas também o motivo de vingança e a forma como o pedido da MyP fora formulado.

33.

Aquele órgão jurisdicional considerou ainda que os dois fundamentos do recurso interposto pela MyP suscitam várias questões de interpretação relacionadas com a Diretiva 89/104/CEE. Por conseguinte, decidiu suspender a instância e submeter as seguintes questões, a título prejudicial, ao Tribunal de Justiça:

«1.1.

Devem os artigos 5.°, n.o 1, e o artigo 8.o, n.o 1, da Primeira Diretiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas, ser interpretados no sentido de que o direito exclusivo conferido pela marca registada nunca mais poderá ser oposto a um terceiro pelo seu titular para todos os produtos referidos no registo:

se, durante um longo período de tempo, o titular tiver partilhado o uso da marca com esse terceiro no âmbito de uma forma de contitularidade relativamente a uma parte dos produtos em causa?

se, na altura desta partilha, o titular tiver dado ao terceiro o seu consentimento irrevogável para usar a marca em relação a esses produtos?

1.2.

Devem os referidos artigos ser interpretados no sentido de que a aplicação de uma norma nacional (como a que estabelece que o titular de um direito não o pode exercer de uma forma ilícita ou abusiva) pode proibir, a título definitivo, o exercício deste direito exclusivo para uma parte dos produtos em causa, ou devem ser interpretados no sentido de que a aplicação da norma nacional se deve limitar a sancionar de forma diferente o referido exercício ilícito ou abusivo do direito?

2.1.

Devem os artigos 5.°, n.o 1, e 8.°, n.o 1, da Primeira Diretiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas, ser interpretados no sentido de que, quando o titular de uma marca registada põe termo ao compromisso que assumiu perante um terceiro no sentido de não usar a marca relativamente a determinados produtos, e decide, assim, retomar ele próprio este uso, o juiz nacional pode proibir, a título definitivo, que este uso seja retomado com fundamento no facto de constituir um ato de concorrência desleal, na medida em que o titular beneficiará da publicidade da marca efetuada anteriormente pelo referido terceiro e no facto de suscitar uma eventual confusão no espírito da clientela, ou devem ser interpretados no sentido de que o juiz nacional deve aplicar uma sanção diferente que não proíba, a título definitivo, que o titular retome este uso?

2.2.

Devem os referidos artigos ser interpretados no sentido de que se justifica a proibição, a título definitivo, do uso da marca por parte do seu titular quando um terceiro tenha feito investimentos durante vários anos para dar a conhecer ao público os produtos para os quais foi autorizado pelo titular a usar a marca?»

34.

A decisão de reenvio deu entrada no Tribunal de Justiça em 3 de janeiro de 2012.

35.

Foram apresentadas observações escritas pela MyP, por D. Depuydt e pela Gauquie (em conjunto), pela República da Polónia e pela Comissão.

36.

As partes no processo principal e a Comissão apresentaram observações na audiência que teve lugar em 10 de janeiro de 2013.

IV — Apreciação

A — Admissibilidade

37.

D. Depuydt e a Gauquie contestam a admissibilidade das questões colocadas pelo órgão jurisdicional de reenvio com base em dois argumentos. Em primeiro lugar, uma vez que a diretiva foi transposta para o direito nacional, qualquer questão de interpretação é, segundo eles, uma questão de direito nacional. O mesmo se pode dizer relativamente à questão da possibilidade de o direito nacional limitar os direitos conferidos pelas marcas. A Comissão também considera que a relação entre o litígio e a legislação da UE em matéria de marcas é muito ténue.

38.

Em segundo lugar, D. Depuydt e a Gauquie alegam que as questões não são pertinentes para o caso. Segundo estes, o artigo 5.o, n.o 1, da diretiva não abrange a questão da possibilidade de o direito nacional limitar os direitos exclusivos do titular de uma marca. Uma vez que os órgãos jurisdicionais nacionais concluíram expressamente que não existia qualquer licença, o artigo 8.o, n.o 1, da Diretiva também não é pertinente ( 6 ). D. Depuydt e a Gauquie consideram ainda que a primeira questão diz respeito a uma medida que não está relacionada com os factos.

39.

No meu entender, nenhum dos argumentos procede. É evidente que nos termos do artigo 267.o do TFUE, o Tribunal de Justiça só é competente para decidir, a título prejudicial, sobre a interpretação do direito da UE, não podendo interpretar o direito nacional ( 7 ). No entanto, a Cour de cassation pediu ao Tribunal de Justiça para interpretar a diretiva e não a legislação nacional que a transpôs. O facto de a diretiva ter sido transposta para o direito nacional não significa que os órgãos jurisdicionais nacionais já não tenham de ter em conta as suas disposições. Pelo contrário, estão obrigados a interpretar o direito nacional à luz da letra e do espírito da diretiva ( 8 ).

40.

Quanto à pertinência das questões colocadas pelo órgão jurisdicional nacional, segundo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, compete, em princípio, aos órgãos jurisdicionais nacionais onde corre termos o processo determinar a pertinência das questões que submetem ao Tribunal de Justiça ( 9 ). O Tribunal de Justiça só rejeitará o pedido se for «manifesto» ( 10 ) que a interpretação de uma regra do direito da União é irrelevante para o caso em apreço.

41.

No que diz respeito ao artigo 8.o, n.o 1, da diretiva, o próprio órgão jurisdicional de reenvio concluiu que não existia um contrato de licença entre as partes. Uma vez que o Tribunal de Justiça está vinculado por esta conclusão de facto, parece, com efeito, que o artigo 8.o, n.o 1, da diretiva não é pertinente para a resolução do litígio. Tendo em conta este facto e com vista a fornecer ao órgão jurisdicional de reenvio uma resposta útil, as questões devem ser reformuladas de modo a não incluírem qualquer referência ao artigo 8.o, n.o 1, da diretiva ( 11 ).

B — Análise substantiva

42.

O órgão jurisdicional de reenvio enunciou uma série de factos que são importantes para o nosso caso. Uma vez que o Tribunal de Justiça está vinculado a estes factos, importa salientar alguns deles. Em primeiro lugar, a MyP é a titular das marcas registadas válidas em causa para todos os produtos em causa. Em segundo lugar, desde que a MyP registou as marcas, a Gauquie e D. Depuydt têm‑nas usado com o consentimento da MyP. Em terceiro lugar, existe consenso quanto ao facto de as partes não terem celebrado um contrato de licença. Em quarto lugar, nada indica que a Gauquie e D. Depuydt também são titulares das marcas objeto do litígio. Embora o órgão jurisdicional de reenvio mencione «uma forma de contitularidade», não afirma que aqueles tenham registado as marcas nem que sejam titulares de direitos sobre as marcas com fundamento no uso ( 12 ).

43.

No entanto, no que respeita à inexistência de uma licença, estes factos descrevem, à primeira vista, uma situação normal de licenciamento com todas as suas consequências, nomeadamente a possibilidade de revogação da licença. São os antecedentes peculiares do caso que põem em causa esta conclusão: inicialmente, ambas as partes tinham o mesmo direito aos sinais, tendo partilhado o seu uso durante muito tempo. Porém, como já foi referido, a dada altura a MyP registou as marcas alegadamente «em segredo», embora se deva ter presente que as marcas são publicadas e é possível fiscalizá‑las. A tentativa de anular os registos com fundamento em má‑fé fracassou devido à prescrição do direito.

44.

Não obstante dar como provados os factos supramencionados, o acórdão da Cour d’appel restaurou a partilha do uso das marcas que tinha vigorado entre as partes durante um longo período de tempo. Para tal, limitou os direitos conferidos pelas marcas, por um lado, e proibiu o titular das marcas de usar os sinais para alguns produtos, por outro. Face a esta decisão, o órgão jurisdicional de reenvio questiona‑se sobre a possibilidade de manter a situação de uso partilhado e, em caso afirmativo, através de que instrumento jurídico. Uma vez que vários dos instrumentos jurídicos sugeridos se baseiam no direito nacional, uma questão importante no presente caso prende‑se com a medida em que a legislação da UE em matéria de marcas pode ser limitada pelo direito nacional. Importa salientar que compete aos órgãos jurisdicionais nacionais determinar as disposições nacionais. A tarefa do Tribunal de Justiça nessa matéria resume‑se à definição dos limites impostos ao direito nacional pela diretiva.

1. A primeira questão

45.

Com a primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber quais até que ponto é possível invocar direitos exclusivos conferidos pela marca numa situação como a do caso em apreço, em que o uso da marca foi partilhado durante um longo período de tempo. O órgão jurisdicional de reenvio dividiu a questão em duas subquestões.

a) Objeto da primeira subquestão

46.

A primeira subquestão consiste em saber se o artigo 5.o, n.o 1, da diretiva proíbe, a título definitivo, o titular de uma marca registada de opor os seus direitos exclusivos a um terceiro para todos os produtos referidos no registo se tiver partilhado o uso dessa marca com esse terceiro no âmbito de uma «forma de contitularidade» relativamente a uma parte dos produtos em causa e se o terceiro tiver usado a marca com o «consentimento irrevogável» do titular.

47.

Da decisão do órgão jurisdicional de reenvio resulta que este pretende saber se a legislação em matéria de marcas permite proibir a título permanente o titular de uma marca registada de exercer os seus direitos contra um terceiro com quem tenha partilhado o uso da marca durante um longo período de tempo. As referências do órgão jurisdicional de reenvio a uma «forma de contitularidade» e a um «consentimento irrevogável» impõem alguns esclarecimentos.

48.

Em primeiro lugar, entendo que a expressão «forma de contitularidade» pode ser facilmente compreendida no contexto do acórdão da Cour d’appel citado pelo órgão jurisdicional de reenvio. A Cour d’appel construiu a sua argumentação com base no uso partilhado das marcas pelas partes, referindo que a MyP chegou mesmo a admitir a existência de uma «forma de contitularidade», e concluiu que a MyP tinha dado o seu «consentimento irrevogável» para o uso da marca. Não sugeriu que D. Depuydt e a Gauquie tivessem registado as marcas ou fossem titulares de direitos sobre elas com fundamento no uso. Por conseguinte, a expressão não é utilizada num sentido jurídico, sendo antes uma conclusão de facto referente à partilha consensual do uso das marcas.

49.

A expressão «consentimento irrevogável» utilizada pelo órgão jurisdicional de reenvio — citando novamente a Cour d’appel — surge no contexto da exposição de factos deduzidos do comportamento da MyP. Na audiência, D. Depuydt e a Gauquie alegaram que a determinação da existência de um «consentimento irrevogável» competia ao órgão jurisdicional nacional. A Comissão aceitou que a existência de um consentimento irrevogável é uma questão de facto. No entanto, a conclusão de facto de que esse «consentimento irrevogável» foi dado pressupõe que o consentimento do titular de uma marca pode ser irrevogável nos termos da lei. Incumbe ao Tribunal de Justiça esclarecer se o consentimento mencionado no artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva pode ser dado de forma irrevogável.

50.

Esta é, sem dúvida, uma questão sobre a qual o Tribunal de Justiça se pode pronunciar. Embora seja da competência do órgão jurisdicional nacional determinar a matéria de facto — e, consequentemente, no presente caso, se o consentimento foi dado ou não —, o Tribunal de Justiça não está vinculado pela presunção da existência das figuras jurídicas invocadas pelo órgão jurisdicional de reenvio. Da mesma forma, compete ao órgão jurisdicional nacional determinar o objeto das questões submetidas ao Tribunal de Justiça. Contudo, nada obsta a que este forneça ao órgão jurisdicional de reenvio todos os elementos de interpretação do direito da União Europeia que possam ser úteis para a apreciação do litígio que lhe foi submetido, quer esse órgão jurisdicional nacional lhes tenha ou não feito expressamente referência ( 13 ).

51.

Foi com base neste princípio que, questionado sobre o caráter distintivo de uma cor específica como marca, no processo Libertel, o Tribunal de Justiça pôde determinar se uma cor, por si só, é suscetível de constituir uma marca ( 14 ). Este princípio é igualmente aplicável ao caso sub judice.

52.

Assim, a questão a que o Tribunal de Justiça deve responder pode ser enunciada da seguinte forma: de acordo com o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva, pode o titular de uma marca registada dar o seu consentimento de forma irrevogável para o uso da sua marca, no sentido de que o direito exclusivo conferido pela marca registada nunca mais poderá ser oposto à parte a quem o referido consentimento já foi dado e com a qual o titular partilhou o uso da marca durante um longo período de tempo, antes e depois do registo das marcas?

b) Análise da primeira subquestão

53.

Enunciada desta forma, a questão convida, antes de mais, o Tribunal de Justiça a analisar a natureza do «consentimento» no contexto do artigo 5.o, n.o 1, da diretiva.

54.

É evidente que o Tribunal de Justiça só poderá aceitar este convite se o termo «consentimento» utilizado no referido artigo for um conceito de direito da União Europeia, não podendo, portanto, a sua interpretação ser deixada aos órgãos jurisdicionais nacionais.

55.

Em regra, a necessidade de assegurar uma aplicação uniforme do direito da União Europeia e do princípio da igualdade exige que os termos de uma disposição do direito da União sejam interpretados autonomamente tendo em conta o contexto da disposição e o objetivo da legislação em causa, salvo se a disposição remeter expressamente para o direito dos Estados‑Membros ( 15 ).

56.

Esta regra perde certamente parte da sua autoridade quando aplicada a diretivas que não harmonizam totalmente uma área de direito. No entanto, embora de acordo com o seu terceiro considerando não pretenda efetuar uma aproximação total das legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas, a diretiva harmoniza algumas áreas dessa legislação. A este propósito, o nono considerando salienta que, para facilitar a livre circulação de produtos e serviços, é fundamental que as marcas registadas passem a usufruir da mesma proteção de acordo com a legislação de todos os Estados‑Membros. Nesta conformidade, o Tribunal de Justiça tem entendido repetidamente que os artigos 5.° a 7.° da diretiva procedem a uma harmonização completa das disposições relativas aos direitos conferidos pela marca ( 16 ).

57.

O conceito de «consentimento» utilizado no artigo 5.o, n.o 1, da diretiva é, por conseguinte, um conceito de direito da União Europeia.

58.

O Tribunal de Justiça já teve inúmeras oportunidades de clarificar na sua jurisprudência vários aspetos do artigo 5.o, n.o 1, da diretiva. Considero, porém, que essa mesma jurisprudência não esclarece qual a natureza do «consentimento» do artigo 5.o, n.o 1.

59.

Contudo, o contexto do artigo 5.o, n.o 1, da diretiva e a jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre esta matéria podem ser muito úteis. O termo «consentimento» surge várias vezes na diretiva: nos n.os 1 e 2 do artigo 5.o, relativos ao âmbito dos direitos exclusivos conferidos pela marca; no artigo 7.o, n.o 1, relativo ao esgotamento dos direitos conferidos pela marca, no artigo 10.o, n.o 3, que diz respeito ao requisito do uso, e no artigo 12.o, n.o 2, no contexto dos motivos de caducidade. A utilização do referido termo na diretiva não é, de modo algum, extraordinária. O regulamento do Conselho sobre a marca comunitária menciona o «consentimento» em contextos semelhantes ( 17 ), e o termo também é utilizado no Acordo TRIPS ( 18 ) e na legislação norte‑americana em matéria de marcas ( 19 ).

60.

O Tribunal de Justiça teve de interpretar o conceito de consentimento no contexto do esgotamento do direito, ou seja, do artigo 7.o, n.o 1, da diretiva. Nos termos desta disposição ( 20 ), o titular de uma marca não se pode opor ao uso desta para produtos comercializados no Espaço Económico Europeu (a seguir «EEE») sob essa marca pelo próprio titular ou com o seu consentimento.

61.

No processo Zino Davidoff e Levi Strauss, os titulares das marcas em causa tinham comercializado os seus produtos fora do EEE, tendo posteriormente esses produtos sido importados para aquele espaço por outra entidade. Foi perguntado ao Tribunal de Justiça em que circunstâncias se poderia considerar que o titular da marca tinha dado o seu «consentimento» à comercialização dos produtos no EEE. O Tribunal de Justiça entendeu que competia ao Tribunal de Justiça dar uma interpretação uniforme do conceito de «consentimento» ( 21 ). Segundo o Tribunal de Justiça, esse consentimento pode ser expresso, mas pode também resultar implicitamente de elementos e de circunstâncias anteriores, contemporâneas ou posteriores à comercialização dos produtos fora do EEE. Dada a gravidade dos efeitos do consentimento no contexto do artigo 7.o, n.o 1, da diretiva, nomeadamente o esgotamento dos direitos exclusivos que permitem ao seu titular controlar a primeira comercialização no EEE, «o consentimento deve ser expresso de uma forma que traduza inequivocamente uma vontade de renunciar a esse direito» ( 22 ). Embora o consentimento no artigo 7.o, n.o 1, diga respeito à comercialização de produtos ( 23 ) e no artigo 5.o, n.o 1, da diretiva respeite ao uso da marca (ou de uma marca confundível devido à sua identidade ou semelhança) na vida comercial, entendo que as conclusões do Tribunal de Justiça sobre a natureza do consentimento também são aplicáveis ao conceito de consentimento no artigo 5.o, n.o 1, da diretiva.

62.

As conclusões do Tribunal de Justiça sugerem que o consentimento exige uma manifestação (inequívoca) da vontade de renunciar aos direitos conferidos pela marca. Constitui um negócio jurídico voluntário entre o titular e a pessoa a quem é dado o consentimento.

63.

Esta interpretação é apoiada pela leitura do artigo 5.o, n.o 1, da diretiva no contexto do artigo 8.o sobre licenças. A licença é a forma mais comum em que o consentimento ao uso da marca na vida comercial é dado. Com efeito, circunstâncias como as do caso em apreço, em que é dado o consentimento para o uso da marca, mas não existe uma licença (expressa ou implícita), são raras.

64.

O artigo 10.o, n.o 3, da Diretiva também confirma o meu entendimento quanto à natureza do consentimento. Nos termos daquela disposição, o uso da marca com o consentimento do titular será considerado feito pelo titular e, como tal, preencherá o requisito do uso ( 24 ). A atribuição do uso feito por terceiro ao titular justifica‑se com base numa forma de agência criada pelo consentimento do titular. Esta figura jurídica só se justifica se tiver sido celebrado um negócio jurídico entre o titular e o terceiro que faz uso da marca.

65.

A distinção entre o termo «tolerância» utilizado no artigo 9.o, n.o 1, e «consentimento» também é reveladora. Enquanto o primeiro termo implica passividade no sentido de não proibir o uso de uma marca posterior, o segundo exige uma manifestação da vontade de renunciar ao direito ( 25 ).

66.

Sendo um negócio jurídico voluntário entre o titular e o utilizador da marca, o consentimento está sujeito aos princípios gerais aplicáveis aos negócios jurídicos. Essas regras serão, em grande parte, idênticas às regras aplicáveis à forma mais comum de consentimento: a licença. Assim, o consentimento pode ser dado para um período de tempo determinado ou indeterminado. Mesmo neste último caso, é sempre possível revogar o consentimento ( 26 ). Contudo, a revogação deve respeitar as expectativas legítimas do utilizador da marca e, como tal, exige, por exemplo, um aviso prévio ou um motivo razoável. Não é admissível o consentimento irrevogável.

67.

Por conseguinte, embora não exista um consentimento irrevogável, ainda assim, poderia ser inadmissível o exercício dos direitos exclusivos conferidos pela marca contra a pessoa com quem o uso tinha sido partilhado durante um longo período de tempo, antes e depois do registo das marcas.

68.

O titular de uma marca não pode proibir todos os usos da marca. Dos objetivos do direito das marcas, o Tribunal de Justiça deduziu que só é admissível proibir o uso da marca por um terceiro nos casos em que esse uso afete ou seja suscetível de afetar as funções da marca ( 27 ).

69.

A Polónia argumentou que a partilha do uso, como aconteceu no caso da MyP e da Gauquie, pode gerar uma situação em que a função da marca já não é afetada. Por conseguinte, defende que, sempre que o uso da marca tenha sido partilhado de tal forma que os consumidores se tenham habituado a que um determinado grupo de produtos seja produzido por um terceiro e não pelo titular da marca, foi criada no consumidor a expectativa de continuação desse uso. Por conseguinte, a função essencial da marca de garantir aos consumidores a proveniência dos produtos poderá não ser afetada.

70.

Não estou convencido de que este argumento seja aplicável ao nosso caso. A continuação do uso da marca por D. Depuydt e pela Gauquie após a revogação do consentimento da MyP afetaria a função essencial da marca de garantir aos consumidores a proveniência dos produtos.

71.

O processo Budějovický Budvar ilustra um caso em que o uso simultâneo de uma marca durante um longo período de tempo conduz a uma situação em que a continuação desse uso deixa de afetar a função da marca de garantir a proveniência dos produtos. Embora, naquele caso, a questão tenha sido colocada no contexto do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da diretiva, os mesmos princípios são aplicáveis ao artigo 5.o, n.o 1 ( 28 ).

72.

Os factos desse processo eram excecionais. A Anheuser‑Busch e a Budvar tinham vendido cerveja sob o sinal nominativo «Budweiser» no Reino Unido, com total independência uma da outra, durante quase 30 anos antes do registo das marcas. Em 2000, ambas as empresas foram autorizadas a registar conjunta e simultaneamente as marcas. Em virtude da particularidade do caso, os consumidores tinham plena consciência das diferenças entre as duas cervejas, não obstante a designação comum de «Budweiser». Nestas circunstâncias, o Tribunal de Justiça concluiu que o uso honesto simultâneo de duas marcas idênticas não prejudica a função de garantir aos consumidores a proveniência dos produtos ( 29 ).

73.

Os factos do presente caso diferem consideravelmente dos factos do processo Budějovický Budvar. Em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio não deu qualquer indicação de que os consumidores têm conhecimento do uso partilhado das marcas em causa pela MyP e pela Gauquie e que, como tal, a garantia da proveniência poderá não ser prejudicada se tal uso continuar.

74.

Porém, mais importante ainda, no processo Budějovický Budvar a marca era usada por duas empresas sem qualquer relação entre si. No caso sub judice, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, uma parte usa as marcas válidas de outra com o consentimento do titular e pretende continuar a usá‑las mesmo após a revogação desse consentimento. Nestas circunstâncias, a sugestão de que a função da marca poderá não ser prejudicada pela continuação do uso partilhado representa um desvirtuamento da função das marcas.

75.

A principal função das marcas é permitir aos consumidores identificar a proveniência dos produtos ( 30 ). Nesta perspetiva, no entanto, o que importa para efeitos da proveniência dos produtos é o titular da marca e não (necessariamente) o verdadeiro fabricante. Numa economia moderna, muitos produtos são fabricados ao abrigo de uma licença (ou com o consentimento do titular) por terceiros e/ou em cadeias de produção complexas. Em regra, os consumidores não têm conhecimento destes acordos. Embora a mudança de fabricante possa afetar a qualidade do produto, os consumidores não têm geralmente um interesse protegido na continuação dos acordos celebrados entre o titular da marca e o fabricante. A organização do uso da marca é da responsabilidade do titular. No âmbito desta responsabilidade, o titular pode revogar as licenças, conceder novas licenças e reorganizar os seus processos de fabrico ou de venda. A garantia da proveniência seria, portanto, prejudicada se uma parte continuasse a usar a marca não obstante já não beneficiar do consentimento do seu titular.

c) Análise da segunda subquestão

76.

Com a segunda subquestão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se uma norma de direito nacional, como aquela que proíbe o exercício ilícito ou abusivo dos direitos pelo seu titular, pode conduzir a uma proibição a título definitivo do exercício dos direitos exclusivos conferidos pela marca para parte dos produtos a que o registo diz respeito, ou se essa norma deve prever uma sanção diferente.

77.

D. Depuydt e a Gauquie apresentam argumentos a favor da admissibilidade de uma proibição a título definitivo, por meio de uma norma de direito nacional dos direitos exclusivos conferidos pela marca. Por seu lado, a MyP entende que as disposições do direito nacional só podem prever sanções que não proíbam a título definitivo o exercício dos direitos exclusivos conferidos pela marca. Tanto a Comissão como a Polónia subscrevem, no essencial, este entendimento.

78.

Em regra, de acordo com o sexto considerando da diretiva, esta não exclui a aplicação de disposições do direito nacional que não estejam abrangidas pelo direito de marcas, como disposições relativas à concorrência desleal e à responsabilidade civil. Tal como alegam, com razão, D. Depuydt e a Gauquie, o mesmo é válido para as disposições do direito nacional que proíbem o exercício ilícito ou abusivo dos direitos ( 31 ).

79.

Porém, existem limites à aplicação do direito nacional neste contexto. O direito nacional não pode prejudicar a plena eficácia da diretiva. Não se pode afastar da harmonização completa efetuada pela diretiva. Isto é válido tanto para o comportamento considerado ilícito ou abusivo, como para a sanção prevista para esse comportamento.

80.

No que respeita ao comportamento considerado ilícito, o direito nacional não pode qualificar o exercício de um direito previsto no direito da UE, por si só, de ilícito ou abusivo. Uma vez que a diretiva permite a revogação do consentimento, essa revogação e o exercício dos direitos exclusivos conferidos pela marca contra o antigo beneficiário do consentimento não podem, por si só, ser considerados abusivos. Contudo, a falta de aviso prévio e circunstâncias semelhantes podem ser punidas pelo direito nacional.

81.

Relativamente à sanção, a proibição a título definitivo do exercício dos direitos exclusivos conferidos pela marca para parte dos produtos a que o registo diz respeito também contraria os objetivos da diretiva.

82.

O Tribunal de Justiça tem sustentado repetidamente que os artigos 5.° a 7.° da diretiva procedem a uma harmonização completa dos direitos conferidos pela marca. A diretiva prevê vários motivos de recusa ou de nulidade do registo de marcas (artigos 3.° e 4.°), limitações e esgotamento dos direitos (artigos 6.° e 7.°), bem como a possibilidade de preclusão por tolerância (artigo 9.o) ( 32 ). Não foi sugerido que uma exceção aos direitos exclusivos previstos na diretiva é aplicável.

83.

Se o direito nacional pudesse proibir a título definitivo o titular de uma marca de exercer os seus direitos relativamente a alguns dos produtos a que o registo diz respeito por motivos não previstos na diretiva, parte desses direitos protegidos seria esvaziada de conteúdo, contrariando o objetivo de harmonização de direitos ao abrigo do artigo 5.o da diretiva e contornando as condições de aplicação das disposições da diretiva que limitam os direitos. Esta consequência não pode ser tolerada.

84.

O advogado‑geral F. G. Jacobs chegou a uma conclusão semelhante ao analisar as legislações nacionais que preveem uma proteção complementar à conferida pelo direito das marcas no contexto da marca comunitária: «Se cada Estado‑Membro fosse livre de adotar a proteção adicional que quisesse, haveria efetivamente um grande risco de ver deitado abaixo todo o edifício do sistema da marca comunitária, assim como o próprio objetivo de harmonização da diretiva — consistente em evitar, no interesse do mercado interno, barreiras ao comércio e distorções da concorrência» ( 33 ). Este argumento é aplicável mutatis mutandis ao caso em apreço.

85.

Consequentemente, o direito nacional sobre o exercício ilícito ou abusivo de direitos não pode proibir a título definitivo o titular de uma marca de exercer os seus direitos em relação a alguns dos produtos a que o registo diz respeito.

86.

Dito isto, nada impede o direito nacional de prever uma sanção diferente que seja compatível com o direito da UE, como uma indemnização ou até mesmo a proibição do exercício dos direitos exclusivos conferidos pela marca pelo seu titular. No entanto, essa proibição só poderá ser temporária, respeitando os direitos do titular da marca. Dada a complexidade dos factos, os riscos de um processo judicial demasiado moroso e a possibilidade de uma indemnização, é possível que as partes negoceiem uma licença.

2. Análise da segunda questão

87.

Com a sua segunda questão, que o órgão jurisdicional de reenvio divide em duas subquestões, mas que devem ser analisadas em conjunto, o referido órgão pergunta, no essencial, se o artigo 5.o, n.o 1, da diretiva permite que os órgãos jurisdicionais nacionais proíbam a título definitivo o titular de uma marca registada de retomar o uso da marca após pôr termo ao compromisso assumido perante um terceiro de não usar a marca para determinados produtos. O fundamento de tal proibição seria a proibição de concorrência desleal, dado que o titular beneficiaria injustamente da publicidade e dos investimentos efetuados pelo terceiro a favor da marca, bem como da confusão criada no espírito dos consumidores. Em alternativa, os órgãos jurisdicionais nacionais são obrigados a aplicar uma sanção diferente?

88.

D. Depuydt e a Gauquie defendem que a proibição definitiva do uso da marca pelo titular é uma sanção adequada para punir um ato de concorrência desleal. A MyP, a Polónia e a Comissão entendem que os órgãos jurisdicionais nacionais terão de prever uma sanção diferente.

89.

Mais uma vez, nos termos do sexto considerando da diretiva, esta não exclui geralmente a aplicação de disposições do direito nacional que não estejam abrangidas pelo direito de marcas, tais como disposições relativas à concorrência desleal e à responsabilidade civil. Essas disposições do direito nacional não podem prejudicar a plena eficácia da diretiva nem afastar‑se da harmonização total efetuada pela diretiva.

90.

A diretiva não harmoniza compromissos assumidos pelo titular de uma marca de não a usar. Além disso, a legislação em matéria de marcas não prevê geralmente um direito do titular de usar a marca ( 34 ). Os direitos conferidos pela marca são, antes de mais, direitos negativos de excluir terceiros.

91.

Não obstante, a sanção nacional proposta contraria a diretiva. Esta sanção baseia‑se no presumível benefício de que o titular injustamente usufruiria em virtude dos investimentos efetuados pelo terceiro na publicidade da marca e da confusão dos consumidores, possivelmente resultante do facto de o produto em causa ser agora produzido por outra entidade. Ambas as consequências resultam, em grande parte, da revogação do consentimento e da reorganização do uso da marca. Porém, tal como referi anteriormente, o artigo 5.o, n.o 1, da diretiva cria um sistema que permite ao titular revogar o consentimento dado a um terceiro para usar a marca e reorganizar seguidamente esse uso.

92.

Contudo, mais uma vez, nada impede o direito nacional de prever outras sanções, desde que sejam compatíveis com o direito da UE.

V — Conclusão

93.

À luz das considerações que precedem, entendo que o Tribunal de Justiça deveria responder às questões que lhe foram submetidas da seguinte forma:

O artigo 5.o, n.o 1, da diretiva não permite que o titular de uma marca registada dê o seu consentimento para o uso da marca de forma irrevogável. Após a revogação desse consentimento, o titular pode opor novamente o direito exclusivo conferido pela marca registada ao terceiro que usou a marca com o seu consentimento, mesmo que ambas as partes tenham partilhado o seu uso — cada uma para produtos diferentes abrangidos pelo registo — durante um longo período de tempo.

O direito nacional em matéria de exercício ilícito ou abusivo de direitos não pode proibir a título definitivo o titular de uma marca de exercer os seus direitos em relação a alguns dos produtos a que o registo diz respeito. Não obstante, a diretiva não pode impedir o direito nacional de estabelecer uma sanção diferente.

O artigo 5.o, n.o 1, da diretiva não permite que os órgãos jurisdicionais nacionais proíbam a título definitivo o titular de uma marca registada de retomar o uso da marca após pôr termo ao compromisso assumido perante um terceiro de não usar essa marca para determinados produtos, invocando a legislação em matéria de concorrência desleal com base nos benefícios de que o titular usufruiria em virtude dos investimentos efetuados pelo terceiro na publicidade da marca, bem como da confusão criada no espírito dos consumidores. Não obstante, a diretiva não pode impedir o direito nacional de estabelecer uma sanção diferente.


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) Primeira Diretiva do Conselho 89/104/CEE, de 21 de dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO L 40 de 11.2.1989, p. 1), conforme modificada.

( 3 ) JO L 299 de 8.11.2008, p. 25.

( 4 ) Acordo de Nice relativo à classificação internacional dos produtos e serviços aos quais se aplicam as marcas, de 15 de junho de 1957, com a última redação que lhe foi dada.

( 5 ) D. Depuydt e a Gauquie alegam que o sinal «N» já tinha sido utilizado por P. Baquet e parte do negócio por eles adquirido.

( 6 ) A Comissão também salienta que em momento algum foi celebrado um contrato de licença entre as duas partes.

( 7 ) Acórdão de 2 de dezembro de 1964, Dingemans (C‑24/64, Recueil., p. 1259; Colet. 1962‑1964, p. 583).

( 8 ) Acórdão de 10 de abril de 1984, von Colson e Kamann (C-14/83, Recueil, p. 1891, n.o 26).

( 9 ) Acórdão de 29 de novembro de 1978, Redmond (83/78, Colet., p. 821, n.o 25), acórdão de 30 de novembro de 1995, Esso Española (C-134/94, Colet., p. I-4223, n.o 9).

( 10 ) Acórdão de 16 de junho de 1981, Salonica (126/80, Recueil, p. 1563, n.o 6).

( 11 ) Acórdão de 11 de julho de 2002, Marks & Spencer (C-62/00, Colet., p. I-6325, n.o 32).

( 12 ) Quanto a esses direitos, ver considerando 4 da Diretiva e artigo 16.o, n.o 1, terceira frase, do Acordo sobre os Aspetos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados com o Comércio («Acordo TRIPS»).

( 13 ) Acórdão de 25 de janeiro de 2007, Dyson (C-321/03, Colet., p. I-687, n.o 24).

( 14 ) Acórdão de 6 de maio de 2003, Libertel (C-104/01, Colet., p. I-3793, n.o 22), e acórdão Dyson, já referido, n.os 24 a 26.

( 15 ) Acórdão de 18 de janeiro de 1984, Ekro (327/82, Recueil, p. 107, n.o 11); acórdão de 19 de setembro de 2000, Linster (C-287/98, Colet., p. I-6917, n.o 43); e acórdão de 22 de setembro de 2011, Budějovický Budvar (C-482/09, Colet., p. I-8701, n.o 29).

( 16 ) Acórdão de 16 de julho de 1998, Silhouette International Schmied (C-355/96, Colet., p. I-4799, n.o 25); acórdão de 20 de novembro de 2001, Zino Davidoff e Levi Strauss (processos apensos C-414/99 a C-416/99, Colet., p. I-8691, n.o 39); acórdão de 23 de abril de 2009, Copad (C-59/08, Colet., p. I-3421, n.o 40); acórdão de 3 de junho de 2010, Coty Prestige Lancaster Group (C-127/09, Colet., p. I-4965, n.o 27); e acórdão Budějovický Budvar, já referido, n.o 32.

( 17 ) Quanto aos direitos conferidos, v. artigo 9.o, n.o 1, quanto ao esgotamento, v. artigo 13.o, n.o 1, quanto à utilização, v. artigo 15.o, n.o 2, quanto à extinção, v. artigo 51.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78 de 24.3.2009, p. 1).

( 18 ) O artigo 16.o, n.o 1, do Acordo TRIPS sobre os direitos conferidos pelas marcas utiliza o termo num contexto semelhante ao do artigo 5.o, n.o 1, da diretiva.

( 19 ) Ver Trademark Act of 1946 (Lanham Act), § 32, conforme modificado, título 15 do United States Code, § 1114, relativo a sanções, infrações e infrações inocentes cometidas por gráficas e editoras.

( 20 ) Com a redação que lhe foi dada pelo artigo 65.o, n.o 2, anexo XVII, do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, JO L 1 de 3.1.1994, p. 3.

( 21 ) Acórdão Zino Davidoff e Levi Strauss, já referido, n.o 43.

( 22 ) Acórdão Zino Davidoff e Levi Strauss, já referido, n.os 45 e 47; acórdão Copad, já referido, n.o 42; e acórdão de 15 de outubro de 2009, Makro Zelfbedieningsgroothandel (C-324/08, Colet., p. I-10019, n.o 22).

( 23 ) Segundo o Tribunal de Justiça, o consentimento tem de respeitar a cada exemplar do produto comercializado. Ver acórdão de 1 de julho de 1999, Sebago e Maison Dubois (C-173/98, Colet., p. I-4103, n.o 19), e acórdão Coty Prestige Lancaster Group, já referido, n.o 31.

( 24 ) A disposição correspondente do Regulamento sobre a marca comunitária foi analisada no acórdão de 11 de maio de 2006, Sunrider/IHIM (C-416/04, Colet., p. I-4237).

( 25 ) Acórdão Budějovický Budvar, já referido, n.os 43 e 44.

( 26 ) Uma posição idêntica em relação a licenças para marcas comunitárias é adotada por Schennen, D., in Eisenführ, G. e Schennen, D. (eds.), Gemeinschaftsmarkenverordnung, Carl Heymanns Verlag, 2.a ed. 2007, art.° 22, n.o 18.

( 27 ) Acórdão de 13 de novembro de 2001, Arsenal Football Club (C-206/01, Colet., p. I-10273, n.o 51); acórdão de 18 de junho de 2009, L’Oréal e o. (C-487/07, Colet., p. I-5185, n.o 58); acórdão de 23 de março de 2010, Google France e Google (C-236/08 a C-238/08, Colet., p. I-2417, n.o 76); acórdão de 25 de março de 2010, BergSpechte (C-278/08, Colet., p. I-2517, n.os 29 a 37); acórdão de 22 de setembro de 2011, Interflora e Interflora British Unit (C-323/09, Colet., p. I-8625, n.o 37); e acórdão Budějovický Budvar, já referido, n.o 71. Este entendimento remonta ao acórdão de 23 de fevereiro de 1999, BMW (C-63/97, Colet., p. I-905, n.o 38).

( 28 ) Acórdão de 20 de março de 2003, LTJ Diffusion (C-291/00, Colet., p. I-2799, n.os 41 a 43), e acórdão Budějovický Budvar, já referido, n.os 69‑70.

( 29 ) Acórdão Budějovický Budvar, já referido, n.os 63 a 84.

( 30 ) Acórdão Budějovický Budvar, já referido, n.o 71.

( 31 ) Sobretudo se tivermos em conta que o próprio direito da UE critica o abuso de direitos. Acórdão de 12 de maio de 1998, Kefalas e o. (C-367/96, Colet., p. I-2843, n.o 20), e acórdão de 21 de fevereiro de 2006, Halifax e o. (C-255/02, Colet., p. I-1609, n.os 68‑69).

( 32 ) D. Depuydt e a Gauquie parecem alegar que o décimo primeiro considerando admite um princípio geral de tolerância que ultrapassa o âmbito das disposições da diretiva. Tal princípio geral retiraria efeito útil às condições previstas, por exemplo, no artigo 9.o, n.o 1, da diretiva.

( 33 ) Conclusões no processo Davidoff (acórdão de 9 de janeiro de 2003, C-292/00, Colet., p. I-389, n.o 63).

( 34 ) Porém, a diretiva impõe um requisito de uso no artigo 10.o, n.o 1. Importa ainda salientar que o artigo 20.o do Acordo TRIPS não permite a oneração injustificável do uso de uma marca por exigências especiais.

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