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Document 62011CC0254

Conclusões do advogado-geral Cruz Villalón apresentadas em 6 de Dezembro de 2012.
Szabolcs-Szatmár-Bereg Megyei Rendőrkapitányság Záhony Határrendészeti Kirendeltsége contra Oskar Shomodi.
Pedido de decisão prejudicial: Legfelsőbb Bíróság - Hungria.
Espaço de liberdade, segurança e justiça - Pequeno tráfego fronteiriço nas fronteiras terrestres externas dos Estados-Membros - Regulamento (CE) n.º 1931/2006 - Regulamento (CE) n.º 562/2006 - Duração máxima de estada - Regras de cálculo.
Processo C-254/11.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2012:773

CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

PEDRO CRUZ VILLALÓN

apresentadas em 6 de dezembro de 2012 ( 1 )

Processo C-254/11

Szabolcs-Szatmár-Bereg Megyei Rendőrkapitányság Záhony Határrendészeti Kirendeltsége

contra

Oskar Shomodi

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Magyar Köztársaság Legfelsőbb Bírósága (Hungria)]

«Espaço de liberdade, de segurança e de justiça — Pequeno tráfego fronteiriço nas fronteiras terrestres externas da União — Regulamento (CE) n.o 1931/2006 — Artigo 5.o — Fronteiriços — Cálculo da duração máxima de estada ininterrupta autorizada — Convenção bilateral — Duração máxima de estadia ininterrupta de três meses durante um período de seis meses — Respeito pela vida privada — Artigo 7.o da Carta — Artigo 8.o da CEDH — Liberdade de passagem da fronteira — Razões legítimas — Prevenção e sanção dos abusos — Justo equilíbrio»

1. 

O Tribunal de Justiça é, pela primeira vez, convidado a interpretar as disposições do Regulamento (CE) n.o 1931/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de dezembro de 2006, que estabelece as regras para o pequeno tráfego fronteiriço nas fronteiras terrestres externas dos Estados-Membros e que altera o disposto na Convenção de Schengen ( 2 ).

2. 

O regime específico do pequeno tráfego fronteiriço, que derroga as regras gerais que regulam o controlo das pessoas nas fronteiras terrestres exteriores dos Estados-Membros, esforça-se, de uma forma geral, por dar resposta à situação das populações estabelecidas em zonas fronteiriças, as quais, frequentemente, consideram o traçado das fronteiras estatais uma circunstância artificial prejudicial ou, pelo menos, constitutiva de um obstáculo prático ao desenvolvimento da sua vida social nas suas diferentes dimensões. Esta constatação é especialmente válida para as populações que foram frequentemente afetadas por deslocações das fronteiras, relativamente frequentes ao longo do século passado.

3. 

A ratio legis desta regulamentação específica, que apresenta a particularidade de delegar nos Estados-Membros o dever de celebrarem com os países terceiros envolvidos acordos bilaterais de aplicação do regime que institui, conduzir-nos-á a convidar o Tribunal de Justiça a declarar que um regime de passagem de fronteiras instituído no contexto do pequeno tráfego fronteiriço, como o que está em causa no processo principal, não pode, tendo em conta a lógica própria do regime introduzido pelo Regulamento n.o 1931/2006 e os imperativos decorrentes, nomeadamente, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia ( 3 ) e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma a 4 de novembro de 1950 ( 4 ), encontrar apoio nas disposições do artigo 5.o do referido regulamento, mesmo quando esta disposição seja lida em conjugação com o artigo 20.o da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen, assinada em Schengen em 19 de junho de 1990 ( 5 )

I — Quadro jurídico

4.

O presente processo inscreve-se num quadro jurídico singular. Este quadro é, de facto, essencialmente constituído, por um lado, por um ato de direito internacional, no caso o Acordo relativo ao pequeno tráfego fronteiriço, assinado em 18 de setembro de 2007 em Oujgorod entre o Governo húngaro e o Conselho de Ministros da Ucrânia ( 6 ), e, por outro lado, um ato de direito derivado da União, o Regulamento n.o 1931/2006, tendo o primeiro sido adotado sob «autorização» do segundo. Apenas as principais disposições pertinentes do referido Acordo bilateral e do referido regulamento serão retomadas a seguir, embora se inscrevam num quadro jurídico mais geral, composto designadamente pelo Acervo de Schengen ( 7 ), pelo Código das Fronteiras Schengen ( 8 ) e pelo Código de Vistos ( 9 ).

A — O direito internacional: o acordo bilateral celebrado pela Hungria

5.

O artigo 1.°, n.os 1 e 5, do acordo bilateral celebrado pela Hungria, dispõe que:

«1.   As pessoas que tenham tido, pelo menos durante três anos, residência fixa em qualquer das localidades fronteiriças enumeradas no anexo I do Acordo e que sejam titulares de uma autorização de pequeno tráfego fronteiriço na aceção do artigo 2.o poderão entrar e permanecer na zona fronteiriça da outra Parte Contratante sem necessidade de obter qualquer outra autorização.

[…]

5.   A autorização definida no artigo 2.o confere o direito à entrada múltipla e à estada ininterrupta com o limite máximo de três meses, dentro de um período de seis, na zona fronteiriça da outra Parte Contratante, nomeadamente quando sejam motivadas por razões sociais, culturais ou familiares ou por qualquer razão económica justificada que, à luz da legislação nacional, não seja a de exercer uma atividade remunerada. O residente fronteiriço que tenha entrado no território da outra Parte Contratante ao abrigo de uma autorização não poderá permanecer fora da zona fronteiriça desta.

[…]»

B — O direito da União: o Regulamento n.o 1931/2006

6.

Os considerandos 2 a 4, 9 e 13 do Regulamento n.o 1931/2006 preveem:

«(2)

É do interesse da Comunidade alargada assegurar que as suas fronteiras com os países vizinhos não constituam um obstáculo às trocas comerciais, ao intercâmbio social e cultural ou à cooperação regional. Deverá, por conseguinte, ser criado um regime eficaz para o pequeno tráfego fronteiriço.

(3)

O regime de pequeno tráfego fronteiriço constitui uma exceção às normas gerais que regem o controlo das pessoas que atravessam as fronteiras externas dos Estados-Membros da União Europeia estabelecidas no [Código das Fronteiras Schengen].

(4)

A Comunidade deverá estabelecer os critérios e as condições a respeitar para simplificar a travessia, pelos residentes fronteiriços, de uma fronteira terrestre externa ao abrigo do regime de pequeno tráfego fronteiriço. Tais critérios e condições deverão assegurar um equilíbrio entre, por um lado, a simplificação da travessia das fronteiras pelos residentes fronteiriços de boa fé que tenham razões legítimas para atravessar frequentemente uma fronteira terrestre externa e, por outro, a necessidade de prevenir a imigração ilegal e potenciais ameaças à segurança resultantes de atividades criminosas.

[…]

(9)

Para efeitos da aplicação do regime de pequeno tráfego fronteiriço, os Estados-Membros deverão ser autorizados a manter ou a celebrar, se necessário, acordos com os países terceiros vizinhos, desde que tais acordos respeitem as regras estabelecidas no presente regulamento.

[…]

(13)

O presente regulamento respeita os direitos e as liberdades fundamentais e observa os princípios reconhecidos, em especial, na [Carta].»

7.

O artigo 2.o, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 1931/2006 dispõe que:

«O presente regulamento não afeta as disposições de direito comunitário e de direito interno aplicáveis aos nacionais de países terceiros relativas a:

a)

Estadas de longa duração;

b)

Acesso a atividades económicas e seu exercício.»

8.

O artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006, sob a epígrafe de «Duração da estada na zona fronteiriça», dispõe que:

«Os acordos bilaterais referidos no artigo 13.o fixam a duração máxima permitida de cada estada ininterrupta ao abrigo do regime de pequeno tráfego fronteiriço, a qual não pode exceder três meses.»

9.

A celebração pelos Estados-Membros de acordos bilaterais com os países terceiros referidos no artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006 é regulada pelo artigo 13.o do referido regulamento, que prevê que:

«1.   Para efeitos da aplicação do regime de pequeno tráfego fronteiriço, os Estados-Membros são autorizados a celebrar acordos bilaterais com países terceiros vizinhos em conformidade com as regras estabelecidas no presente regulamento.

Os Estados-Membros podem igualmente manter acordos bilaterais já celebrados com países terceiros vizinhos sobre pequeno tráfego fronteiriço. Na medida em que tais acordos não sejam compatíveis com o presente regulamento, os Estados-Membros em causa devem alterá-los, a fim de suprimir as incompatibilidades identificadas.

2.   Antes de celebrarem ou alterarem qualquer acordo bilateral relativo ao pequeno tráfego fronteiriço com os países terceiros vizinhos, os Estados-Membros em causa devem consultar a Comissão quanto à compatibilidade do acordo com o presente regulamento.

Se a Comissão considerar que o acordo não é compatível com o presente regulamento, notifica desse facto o Estado-Membro em causa. Este deve tomar as medidas adequadas para alterar o acordo num prazo razoável, a fim de suprimir as incompatibilidades identificadas.

3.   Caso não exista um acordo geral de readmissão celebrado pela Comunidade ou pelo Estado-Membro em causa com um país terceiro, os acordos bilaterais relativos ao pequeno tráfego fronteiriço celebrados com esse país terceiro devem incluir disposições destinadas a facilitar a readmissão de pessoas que tenham utilizado abusivamente o regime de pequeno tráfego estabelecido pelo presente regulamento.»

10.

O artigo 14.o do Regulamento n.o 1931/2006 dispõe que:

«Nos acordos bilaterais referidos no artigo 13.o, os Estados-Membros devem assegurar que os países terceiros em causa concedam aos beneficiários do direito comunitário à livre circulação e aos nacionais de países terceiros que residam legalmente na zona fronteiriça do Estado-Membro em causa um tratamento pelo menos equivalente ao concedido aos residentes fronteiriços do país terceiro em causa.»

11.

O artigo 20.o do Regulamento n.o 1931/2006, alterou, entre outros, o artigo 136.o, n.o 3, da CAAS. O artigo 136.o, na versão alterada, dispõe que:

«1.   A Parte Contratante que tencionar encetar negociações com um Estado terceiro relativamente aos controlos fronteiriços informará desse facto, em tempo útil, as outras Partes Contratantes.

2.   As Partes Contratantes só podem concluir com um ou mais Estados terceiros acordos que simplifiquem ou suprimam controlos nas fronteiras, com consentimento prévio das outras Partes Contratantes, sem prejuízo do direito dos Estados-Membros das Comunidades Europeias de concluírem em comum tais acordos.

3.   O disposto no n.o 2 não é aplicável aos acordos bilaterais relativos ao pequeno tráfego fronteiriço, referidos no artigo 13.o do Regulamento n.o [1931/2006].»

C — Direito húngaro

12.

O artigo 40.o, n.o 1, da Lei n.o II de 2007, relativa à entrada e à permanência dos nacionais de países terceiros (2007. évi II. törvény a harmadik országbeli állampolgárok beutazásáról és tartózkodásáról ( 10 )), prevê:

«Ao abrigo do disposto no Código das Fronteiras Schengen, a administração do controlo nas fronteiras recusará a entrada no território nacional aos nacionais de Estados terceiros que aí tencionem permanecer por um período não superior a três meses e, tendo em atenção os seus interesses, providenciará o seu retorno [...]»

II — Factos na origem do processo principal

13.

Oskar Shomodi ( 11 ) é um nacional ucraniano titular de uma autorização de pequeno tráfego válida, emitida nos termos do Regulamento n.o 1931/2006 e que se apresentou em 2 de fevereiro de 2010, no posto de passagem rodoviário de Záhony (Hungria) para aceder à zona fronteiriça do território húngaro definida por aplicação do referido regulamento.

14.

Contudo, o Szabolcs-Szatmár-Bereg Megyei Rendőrkapitányság Záhony Határrendészeti Kirendeltsége (Serviço de Polícia da Záhony, pertencente ao comissariado da região de Szabolcs-Szatmár-Bereg) ( 12 ) recusou a entrada do recorrente no território húngaro ao abrigo do pequeno tráfego fronteiriço, em conformidade com o artigo 40.o, n.o1, da Lei n.o II de 2007. Com efeito, constatou, ao consultar os dados do sistema de entradas e de saídas do território que o recorrente no processo principal tinha passado, durante o período compreendido entre 3 de setembro de 2009 e 2 de fevereiro de 2010, 105 dias no território húngaro, contando as entradas e as saídas múltiplas, ultrapassando assim os 93 dias autorizados.

15.

O cônsul geral da Ucrânia em Nyíregyháza (Hungria) e o recorrente no processo principal recorreram dessa decisão para o Szabolcs-Szatmár-Bereg megyei bíróság (tribunal distrital de Szabolcs-Szatmár-Bereg, Hungria), alegando violação do artigo 1.o, n.o 5, do acordo bilateral celebrado pela Hungria.

16.

O Szabolcs-Szatmár-Bereg megyei bíróság deu provimento ao recurso, considerando que o artigo 1.o, n.o 5, do acordo bilateral celebrado pela Hungria devia ser entendido, à luz do direito da União, no sentido de que o titular de uma autorização de pequeno tráfego fronteiriço dispõe, por um lado, de um número ilimitado de entradas no território húngaro e, por outro lado, de um direito de permanência ininterrupta com a duração máxima de três meses, dentro de um período de seis meses. Entendeu, assim, que o titular de uma autorização de pequeno tráfego fronteiriço dispunha de um número ilimitado de entradas e que o limite temporal de três meses se aplicava apenas à estada ininterrupta. Decidiu, igualmente, que nem o Código das Fronteiras Schengen nem as disposições da Lei n.o II de 2007 eram aplicáveis no quadro do pequeno tráfego fronteiriço.

17.

A recorrente no processo principal interpôs recurso no Magyar Köztársaság Legfelsőbb Bírósága contra o acórdão do Szabolcs-Szatmár-Bereg megyei bíróság, no âmbito do qual alega que a interpretação do artigo 1.°, n.o 5, do acordo bilateral celebrado pela Hungria que este proferiu é contrária ao artigo 20.o, n.o 1, da CAAS, ao considerando 3 do Código das Fronteiras Schengen, bem como aos artigos 2.°, alínea a), e 5.° do Regulamento n.o 1931/2006. Argumenta que a estada ininterrupta referida por essa disposição do acordo bilateral celebrado pela Hungria deve ser entendida no sentido de que a validade da autorização de pequeno tráfego fronteiriço tem uma duração máxima de três meses, à razão de 31 dias em cada período, ou seja 93 dias no total, compreendidos num período de seis meses, contados desde a primeira entrada.

III — As questões prejudiciais e o processo no Tribunal de Justiça

18.

Nessas circunstâncias, o Magyar Köztársaság Legfelsőbb Bírósága decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as questões prejudiciais seguintes:

«1)

O artigo 5.o do Regulamento [n.o 1931/2006] que fixa em três meses a duração máxima permitida de cada estada ininterrupta — mesmo Regulamento —, deve ser interpretado no sentido de que o regulamento permite as entradas e as saídas múltiplas e a estada ininterrupta por um período máximo de três meses, ao abrigo dos acordos bilaterais celebrados entre Estados-Membros e Estados terceiros nos termos do artigo 13.o, de forma que, antes do termo do prazo da estada de três meses, o residente fronteiriço que disponha de uma autorização de pequeno tráfego fronteiriço pode interromper a continuidade da estada ininterrupta e, após atravessar novamente a fronteira, voltar a ter direito a uma estada ininterrupta de três meses?

2)

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, pode considerar-se interrompida a continuidade da estada ininterrupta na aceção do artigo 5.o do Regulamento sobre o pequeno tráfego fronteiriço se a entrada e a saída tiverem lugar no mesmo dia ou em dias consecutivos?

3)

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão e negativa à segunda, qual o lapso de tempo ou qual o critério de apreciação a ter em conta para que, nos termos do artigo 5.o do Regulamento sobre o pequeno tráfego fronteiriço, se possa considerar que se verificou uma rutura na continuidade da estada ininterrupta?

4)

Em caso de resposta negativa à primeira questão, a disposição que autoriza uma estada ininterrupta por um máximo de três meses, contida no artigo 5.o do Regulamento sobre o pequeno tráfego fronteiriço, pode ser interpretada no sentido de que se deve calcular a permanência considerando as múltiplas entradas e saídas e que, tendo em conta o disposto no artigo 20.o, n.o 1, da [CAAS] — e em quaisquer outras normas reguladoras do Espaço Schengen —, se o total perfizer noventa e três dias (três meses), a autorização de pequeno tráfego fronteiriço não confere direito a uma estada adicional dentro dos seis meses contados a partir da primeira entrada?

5)

Em caso de resposta afirmativa à quarta questão, no cálculo global devem ser tidas em conta as entradas e as saídas múltiplas que tenham lugar no mesmo dia, ou as entradas e as saídas individuais no mesmo dia, e qual o método de cálculo a utilizar?»

19.

Apresentaram observações escritas o recorrido no processo principal, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República eslovaca e a Comissão.

20.

O recorrente no processo principal, a Hungria, a Roménia e a Comissão apresentaram também alegações orais na audiência que teve lugar em 14 de junho de 2012.

IV — Análise

A — Observações preliminares quanto à ordem de análise das questões prejudiciais

21.

É necessário esclarecer inicialmente que, atendendo aos factos em causa no processo principal bem como ao quadro jurídico em que este se inscreve, e em especial às disposições pertinentes do acordo bilateral celebrado pela Hungria, é principalmente o problema suscitado pela quarta questão prejudicial formulada pelo órgão jurisdicional de reenvio que deve merecer atenção.

22.

Com efeito, e desde logo, resulta do processo que ao recorrido no processo principal foi recusado o acesso ao território húngaro porque a soma das suas estadas nesse território ultrapassava a duração de três meses, num período de seis meses. Mais precisamente, a decisão controvertida era, por um lado, baseada apenas na duração total acumulada das estadas do interessado na Hungria e era, por outro lado, fundamentada apenas nas disposições do artigo 40.o, n.o 1 da Lei n.o II de 2007, que remete para o Código das Fronteiras Schengen.

23.

Ora, a quarta questão do órgão jurisdicional de reenvio incide, em relação direta com os factos no processo principal, na compatibilidade com o artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006, do regime decorrente do acordo bilateral celebrado pela Hungria. Com efeito, o artigo 1.o, n.o 5, do referido acordo autoriza a entrada múltipla e uma estada ininterrupta com o limite máximo de três meses, em conformidade com o artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006, mas só, por referência implícita ao artigo 20.o da CAAS e ao artigo 5.o do Código das Fronteiras Schengen, «dentro de um período de seis meses, na zona fronteiriça» abrangida pelo referido acordo. A mesma disposição permitiria, ainda, na hipótese submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio, adicionar a duração máxima das estadas múltiplas de uma pessoa na Hungria para efeitos do cálculo da duração máxima de três meses de estada dentro de um período de seis meses.

24.

Em contrapartida, as três primeiras questões do órgão jurisdicional de reenvio assentam num fundamento hipotético. Estas questões configuram, de facto, uma hipótese em que uma pessoa utiliza a sua autorização de passagem local da fronteira para, de certa forma, otimizar legalmente o seu tempo de estada no território de um Estado-Membro, aí permanecendo de forma ininterrupta durante o período máximo de três meses previsto no artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006 para depois voltar a passar a fronteira, eventualmente no mesmo dia, de forma a recuperar um direito de permanência de três meses, desvirtuando assim a finalidade do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço.

25.

Por fim, a quinta questão, que de certa forma completa a quarta questão, ampliando-a, incide sobre as modalidades de cálculo da duração das estadas resultantes de deslocações únicas ou múltiplas, inferiores a 24 horas.

26.

Uma resposta negativa à quarta questão implica que não será necessário responder à quinta questão. Para mais, as três primeiras questões configuram uma hipótese de abuso de direito, uma vez que se referem a deslocações transfronteiriças suscetíveis de camuflar uma residência dissimulada, que desvirtuariam a finalidade do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço, sendo nesta perspetiva que serão abordadas, no âmbito da resposta a dar à quarta questão.

B — A aplicação do Regulamento n.o 1931/2006

1. Os acordos bilaterais previstos no artigo 13.o do Regulamento n.o 1931/2006

27.

O Regulamento n.o 1931/2006 apresenta a originalidade de delegar certos aspetos da sua aplicação nos Estados-Membros envolvidos, ao habilitá-los a celebrar ( 13 ), por força do seu artigo 13.o, acordos bilaterais conformes com as normas do referido regulamento, com a vocação de substituírem os anteriormente existentes ( 14 ).

28.

O artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006 prevê, assim, que estes acordos bilaterais devem especificar a duração máxima autorizada para cada estada ininterrupta realizada ao abrigo do referido regime, estabelecendo-se que esta duração não pode ultrapassar três meses.

29.

Os Estados-Membros dispõem, portanto, no âmbito do dever que assim lhes é imposto, ou seja, desde que seja fixada uma duração máxima autorizada para cada estada ininterrupta que não exceda três meses, e sob reserva, de forma mais geral, do respeito pelo direito da União ( 15 ), de uma verdadeira margem de negociação com os Estados terceiros envolvidos, para estipularem as modalidades, designadamente temporais, do exercício dos direitos decorrentes do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço.

30.

A prática seguida pelos diferentes Estados-Membros e Estados terceiros envolvidos é testemunho, de resto, tanto quanto pudemos analisar ( 16 ), desta latitude. Alguns destes acordos estabelecem uma duração máxima de estada relativamente curta ( 17 ), sem mais condições. Outros fixam, como sucede com o acordo bilateral celebrado pela Hungria, a duração máxima autorizada de estada ininterrupta, mas para um período de tempo determinado, como é o caso dos acordos celebrados pela República da Polónia, respetivamente, com a Ucrânia ( 18 ) e a República da Bielorrússia ( 19 ), ou ainda o acordo celebrado pela República eslovaca com a Ucrânia ( 20 ). O acordo celebrado pela Roménia com a República da Moldávia limita-se a prever uma duração máxima de estada ininterrupta de três meses na disposição que define o pequeno tráfego fronteiriço ( 21 ).

31.

Importa, todavia, salientar que, por força do artigo 13.o do Regulamento n.o 1931/2006, a celebração e a manutenção destes acordos bilaterais se verifica sob «autorização» da União e com o controlo prévio, pela Comissão, antes da sua celebração ou alteração, da sua compatibilidade com as normas do referido regulamento. De resto, sendo verdade que os Estados-Membros dispõem, no âmbito das regras estabelecidas pelo Regulamento n.o 1931/2006, de uma verdadeira latitude para definirem de comum acordo com os Estados terceiros as modalidades precisas de aplicação do referido regulamento, as autoridades e os tribunais competentes dos Estados-Membros devem igualmente interpretar e aplicar as disposições adotadas à luz da letra e da finalidade do dito regulamento e em conformidade com o conjunto das disposições do direito da União.

2. O acordo bilateral celebrado pela Hungria

32.

O artigo 1.o, n.o 5, do acordo bilateral celebrado pela Hungria inscreve-se nas exigências colocadas pelo artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006, mas em termos que não são desprovidos de ambiguidade.

33.

Esta disposição estabelece, com efeito, que a autorização de passagem local da fronteira prevista no seu artigo 2.o«autoriza o seu titular a efetuar entradas múltiplas e uma estada ininterrupta com uma duração máxima de três meses no decurso de um período de seis meses na zona fronteiriça». Fixa, deste modo, claramente a duração máxima de estada ininterrupta autorizada ao abrigo do pequeno tráfego fronteiriço em três meses, mas limita as possibilidades de estada ininterrupta «no decurso de um período de seis meses».

34.

Esta disposição, tal como está formulada, presta-se, no entanto, como resulta da decisão de reenvio, a interpretações divergentes por parte das autoridades e dos tribunais húngaros.

35.

Seguindo a primeira abordagem, adotada pelo Szabolcs-Szatmár-Bereg megyei bíróság, pelo recorrente no processo principal e pelo cônsul geral da Ucrânia na Hungria, o artigo 1.o, n.o 5, do acordo bilateral celebrado pela Hungria autoriza, por um lado, múltiplas entradas e, por outro lado, uma estada ininterrupta com a duração máxima de três meses no decurso de um período de seis meses.

36.

Seguindo a segunda abordagem, defendida pelas autoridades húngaras competentes, esta disposição deve ser interpretada e aplicada de forma tal que a duração máxima de três meses num período de seis meses possa ser calculada pela soma das possíveis estadas múltiplas realizadas por uma pessoa, seja qual for a respetiva duração.

37.

O acordo bilateral celebrado pela Hungria assenta, assim, de acordo com esta segunda abordagem, na ideia de que o artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006, lido em conjugação com o artigo 20.o da CAAS ou com o artigo 5.o do Código das Fronteiras Schengen, institui um regime de «crédito de tempo», sendo cada unidade de presença contínua contabilizada para efeitos do cálculo da duração máxima de três meses num período de seis meses autorizado. Os titulares de uma autorização de pequeno tráfego fronteiriço dispõem, portanto, para cada período de seis meses, de um direito de estada total de três meses, suscetível de ser repartido livremente, incluindo de forma concentrada e contínua num só período, esclarecendo-se que, no último caso, está excluída qualquer possibilidade de atravessar a fronteira no âmbito do regime do pequeno tráfego fronteiriço durante o período de três meses seguintes. Em consequência, um fronteiriço que permaneça de forma ininterrupta durante três meses na zona fronteiriça de um Estado-Membro logo no início de um período de seis meses e que regresse ao seu Estado terceiro no final deste período não pode voltar a passar de novo a fronteira durante os três meses seguintes.

C — A compatibilidade com o artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006 do acordo bilateral celebrado pela Hungria e da sua interpretação

38.

O artigo 1.o, n.o 5, do acordo bilateral celebrado pela Hungria responde «formalmente» à exigência do artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006, ao fixar a duração máxima da estada ininterrupta autorizada em três meses. Esta disposição não pode, portanto, ser considerada incompatível com as disposições pertinentes do Regulamento n.o 1931/2006 e pode mesmo ser considerada literalmente conforme a estas disposições ( 22 ). O problema é que esta interpretação literal não é suficiente.

39.

Com efeito, a simples constatação do respeito textual do Regulamento n.o 1931/2006 não permite concluir que o seu artigo 5.o admite uma interpretação no sentido de que o regime assim instituído pelo artigo 1.o, n.o 5 do acordo bilateral celebrado pela Hungria, tal como interpretado e aplicado pelas autoridades húngaras competentes, é perfeitamente compatível com o direito da União, sem prejuízo das disposições do artigo 20.o da CAAS e do artigo 5.o do Código das Fronteiras Schengen.

40.

Com efeito, é necessário analisar em especial, se a exigência suplementar que consiste em limitar as possibilidades de estada ininterrupta a três meses «durante um período de seis meses» ( 23 ) juntamente com o método de cálculo da duração máxima de estada de três meses num período de seis meses, pela soma da duração do conjunto de estadas múltiplas realizadas na zona fronteiriça, são perfeitamente compatíveis com o texto e com a finalidade do Regulamento n.o 1931/2006 e, mais amplamente, com as disposições do direito da União, e designadamente do direito primário.

1. Quanto ao sentido do Regulamento n.o 1931/2006

a) Quanto à lógica do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço

41.

Os considerandos do Regulamento n.o 1931/2006 fornecem certas indicações sobre os fundamentos e a finalidade do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço, que este introduz ( 24 ). Indicam que esta regulamentação específica foi especialmente adotada para evitar que as fronteiras terrestres da União com os seus vizinhos constituam «um obstáculo às trocas comerciais, ao intercâmbio social e cultural ou à cooperação regional» ( 25 ). O artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1931/2006, que define o «pequeno tráfego fronteiriço», evoca ainda razões sociais e culturais mas também «razões económicas comprovadas» ou «razões familiares» ( 26 ).

42.

Nesta perspetiva, o regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço introduzido pelo Regulamento n.o 1931/2006 tem, fundamentalmente, por objeto assegurar um equilíbrio entre, por um lado, a necessidade de facilitar o atravessamento das fronteiras terrestres externas da União pelos «fronteiriços de boa fé que tenham razões legítimas para [as] atravessar frequentemente», e, por outro lado, «a necessidade de prevenir a imigração ilegal e potenciais ameaças à segurança resultantes de atividades criminosas» ( 27 ).

43.

Em termos muito gerais, a introdução de um «sistema eficaz e convivial em relação [à gestão do] pequeno tráfego transfronteiras» ( 28 ) é, portanto, encarada como «elemento essencial da política de desenvolvimento regional» ( 29 ) e com elemento indispensável para a eficácia do dispositivo de controlo nas fronteiras externas instituído pela União concomitantemente com a supressão das fronteiras internas no âmbito da criação do espaço de liberdade, segurança e justiça ( 30 ).

44.

É, portanto, levando em conta o contexto histórico, cultural, económico e social em que se inscreve o regime introduzido pelo Regulamento n.o 1931/2006 que deve ser extraída a sua ratio legis, interpretadas as suas disposições e apreciada a sua aplicação.

45.

Pode ser útil recordar, a este respeito, que a região onde se concretizou o litígio no processo principal foi palco de uma história movimentada ao longo do século XX, marcada por múltiplas modificações de fronteiras ( 31 ).

46.

Neste contexto, o Regulamento n.o 1931/2006 introduz a «autorização de pequeno tráfego fronteiriço» ( 32 ), e define as suas principais condições e as suas modalidades de emissão ( 33 ) bem, como as condições de validade ( 34 ), e define as condições de entrada e de saída do território dos Estados-Membros dos titulares da referida autorização, mas autoriza os Estados-Membros a manter e a celebrar com os Estados terceiros vizinhos os acordos bilaterais necessários à aplicação do regime assim introduzido.

47.

Importa, a este respeito, insistir, desde logo, em que nem o artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006 nem qualquer outra sua disposição preveem que a duração total do direito de estada dos beneficiários do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço deve estar limitada à duração máxima prevista para a estada ininterrupta calculada num período de seis meses ( 35 ).

48.

Deve assinalar-se, de seguida, que o regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço se caracteriza essencialmente, por um lado, pela limitação ratione personae ( 36 ) e ratione loci ( 37 ), sob pena de sanção ( 38 ), do seu âmbito de aplicação e, por outro lado, pela sua finalidade, que é a de permitir aos seus beneficiários atravessar «frequentemente» ( 39 ) e «regularmente» ( 40 ) uma fronteira terrestre externa, desde que tenham razões legítimas para o fazer.

49.

No entanto, não se pode deixar de observar que o Regulamento n.o 1931/2006 fornece apenas algumas precisões quanto ao que esta frequência e esta regularidade implicam. Compete, portanto, ao Tribunal de Justiça pronunciar-se, na medida do necessário, sobre este ponto, tomando em consideração as razões legítimas suscetíveis de justificarem o benefício do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço.

50.

Ora, importa constatar a este respeito que, embora o artigo 9.o, alínea b), do Regulamento n.o 1931/2006 faça depender a emissão de uma autorização de pequeno tráfego fronteiriço da condição de o requerente apresentar documentos justificativos não só do seu estatuto de fronteiriço mas também da «existência de razões legítimas para atravessar frequentemente uma fronteira terrestre externa ao abrigo do regime de pequeno tráfego fronteiriço», o referido regulamento diz muito pouco sobre a natureza das razões legítimas suscetíveis de serem aceites ( 41 ).

51.

O considerando 2 do Regulamento n.o 1931/2006 limita-se, tal como já salientámos, a evocar o «intercâmbio comercial, social e cultural», e o seu artigo 3.o, n.o 3), define o «pequeno tráfego fronteiriço» como sendo a travessia regular de uma fronteira terrestre externa por residentes fronteiriços, para uma estada na zona fronteiriça motivada, por exemplo, por razões sociais, culturais ou familiares» mas também por «razões económicas comprovadas», esclarecendo-se que, neste caso, em conformidade com o artigo 2.o, alínea b), do Regulamento n.o 1931/2006, este se aplica sem prejuízo das disposições do direito da União e do direito nacional aplicáveis aos nacionais de Estados terceiros em matéria de acesso a atividades económicas e seu exercício ( 42 ).

52.

Decorre destas considerações que a ratio legis da regulamentação específica do pequeno tráfego fronteiriço é a de permitir aos residentes das zonas fronteiriças em causa atravessarem facilmente, ou seja, sem constrangimentos administrativos excessivos ( 43 ), de maneira frequente ( 44 ), mas também regular ( 45 ), por razões legítimas de ordem económica, social, cultural ou familiar, as fronteiras terrestres externas da União, esclarecendo-se, todavia, que esta liberdade não pode ser desvirtuada, desviada da sua finalidade nem explorada de forma fraudulenta ou abusiva sob pena de sanção ( 46 ).

53.

É às autoridades nacionais competentes que incumbe apreciar estas razões legítimas aquando da concessão das autorizações de pequeno tráfego fronteiriço ( 47 ), tendo em conta o contexto histórico, cultural, económico e social no qual cada acordo bilateral de aplicação do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço é negociado e celebrado pelos Estados-Membros e pelos Estados terceiros envolvidos. Deverão, igualmente, tomar em consideração as mesmas razões legítimas no exercício do poder de controlo das entradas e saídas que o artigo 6.o do Regulamento n.o 1931/2006 lhes reconhece, para assegurarem o respeito pelas condições previstas no artigo 4.o desse regulamento ou do poder de sancionar os abusos, que lhes confere o artigo 17.o do referido regulamento.

b) Quanto à lógica própria da CAAS e do Código das Fronteiras Schengen

54.

As autoridades húngaras competentes argumentam, todavia, no essencial que o regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço se inscreve no âmbito mais geral do regime instituído pela CAAS e pelo Código das Fronteiras Schengen e que as disposições do Regulamento n.o 1931/2006 devem, portanto, ser interpretadas à luz destes. Ora, os dois regimes não têm origem na mesma inspiração.

55.

Decorre do artigo 1.o, n.o 5, do acordo bilateral celebrado pela Hungria que foi, implícita mas claramente, por referência ao regime aplicável às estadas de curta duração dos nacionais de Estados terceiros, tal como estabelecido pelos artigos 5.° e 20.° da CAAS, por um lado, e por outro, pelo artigo 5.o do Código das Fronteiras Schengen e o artigo 2.o do Código de Vistos, que os dois estados envolvidos corporizaram a exigência constante do artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006.

56.

O artigo 20.o da CAAS prevê a livre circulação dos nacionais de Estados terceiros não submetidos à obrigatoriedade de visto no espaço Schengen com uma duração máxima de três meses, durante um período de seis meses, contados a partir da data da primeira entrada ( 48 ), sob reserva do respeito pelas condições referidas no artigo 5.o, n.o 1, alíneas a) e c) a e), da CAAS.

57.

A mesma limitação de três meses num período de seis meses da duração autorizada da estada encontra-se no artigo 5.o do Código das Fronteiras Schengen, que fixa as condições gerais de entrada dos nacionais de Estados terceiros no território da União para uma estada de curta duração, bem como no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), do Código de Vistos, que define o conceito de visto ( 49 ).

58.

Ao contrário do Regulamento n.o 1931/2006, cujo âmbito de aplicação ratione loci e ratione personae é limitado restritivamente, a CAAS, tal como o Código das Fronteiras Schengen e o Código de Vistos, aplicam-se, salvo exceções, às estadas de curta duração de todos os nacionais de Estados terceiros no conjunto do território dos Estados-Membros envolvidos.

59.

A limitação de direito comum, aplicável a todos os nacionais de Estados terceiros, da estada de curta duração a uma duração que não exceda os três meses, num período de seis meses, não se aplica, portanto, ao regime excecional próprio do pequeno tráfego fronteiriço.

60.

O argumento apresentado pela Hungria, segundo o qual o caráter excecional do Regulamento n.o 1931/2006 não é total e abrange apenas as formalidades de entrada, pelo que o seu artigo 5.o deve ser lido à luz das disposições do artigo 20.o da CAAS ou do artigo 5.o do Código das Fronteiras Schengen deve, nesta sede, ser rejeitado.

61.

Com efeito, o considerando 3 do Regulamento n.o 1931/2006 indica expressamente que o regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço constitui uma exceção às regras gerais que regem o controlo das pessoas nas fronteiras externas dos Estados-Membros da União, que são fixadas no Código das Fronteiras Schengen ( 50 ). O artigo 35.o do Código das Fronteiras Schengen esclarece, de resto, paralelamente, que é aplicável sem prejuízo das regras da União sobre o pequeno tráfego fronteiriço e dos acordos bilaterais existentes na matéria.

62.

Daí resulta que é o conjunto das disposições do Regulamento n.o 1931/2006, cujo objeto é precisamente o de aprovar as regras relativas ao pequeno tráfego fronteiriço, que deve ser considerado derrogatório do regime das estadas de curta duração fixado pelo Código das Fronteiras Schengen.

63.

O caráter excecional do Regulamento n.o 1931/2006 não implica, todavia, que as suas disposições devam necessariamente ser objeto de uma interpretação estrita ou restritiva. Implica, sobretudo, como veremos abaixo, que, enquanto lex specialis, as disposições do referido regulamento não possam ser exploradas para fins que este não previu, nem utilizadas com o objetivo de contornar as normas do direito da União e de direito nacional aplicáveis, nomeadamente, por um lado, às estadas de longa duração ( 51 ) e, por outro lado, ao acesso e ao exercício de uma atividade económica ( 52 ).

64.

Em definitivo e para concluir, resulta do exposto que as disposições do artigo 20.o da CAAS e do artigo 5.o do Código das Fronteiras Schengen não podem alterar a lógica própria do pequeno tráfego fronteiriço introduzida pelo Regulamento n.o 1931/2006, que é a de permitir aos fronteiriços elegíveis atravessarem, o mais normalmente possível, as fronteiras locais, ou seja com facilidade e com a frequência necessária, salvo fraude e abuso.

2. Quanto ao respeito pela Carta e pela CEDH

65.

Em face do exposto, a questão principal, assim submetida à apreciação do Tribunal de Justiça é a de saber se o regime instituído pelo acordo bilateral celebrado pela Hungria, tal como interpretado e/ou aplicado pelas autoridades húngaras competentes, é compatível, em primeiro lugar, como o espírito do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço que acabámos de examinar detalhadamente, interpretado em conformidade com o direito primário da União ( 53 ), e, mais precisamente, com as disposições pertinentes da Carta ( 54 ) ou, sendo o caso, da CEDH e, em segundo lugar, e de forma mais geral, com o conjunto do direito da União ( 55 ), em conformidade com o artigo 4.o, n.o 3, TUE ( 56 ).

66.

Deve salientar-se, a este respeito, que, segundo o considerando 13 do Regulamento n.o 1931/2006, este respeita as liberdades e os direitos fundamentais e observe os princípios, nomeadamente, reconhecidos pela Carta.

67.

Por outro lado, a celebração de acordos bilaterais como o que está em causa no processo principal enquadra-se na aplicação ( 57 ) do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço, pelo que os referidos acordos, que devem ser conformes às regras do Regulamento n.o 1931/2006, devem, de uma forma mais geral, ser celebrados no respeito do direito primário e em especial das disposições da Carta, em conformidade com o seu artigo 51.o, n.o 1, ou, se assim não for, e sendo esse o caso, das disposições da CEDH, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 3, TUE.

68.

Poder-se-ia, desde logo, de uma forma muito intuitiva, considerar a abordagem desta questão sob a perspetiva da liberdade de circulação.

69.

Importa, contudo, salientar, sem prejuízo da situação das «pessoas que exerçam o direito comunitário à livre circulação» ou com direitos equivalentes ( 58 ), na aceção do artigo 3.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1931/2006, que o artigo 45.o, n.o 1, da Carta, que prevê o direito de todos os cidadãos da União circularem e permanecerem livremente no território dos Estados-Membros, não é aplicável ratione personae ao litígio no processo principal, tal como não o é o artigo 45.o, n.o 2, da Carta, que prevê a possibilidade de conceder esses mesmos direitos aos nacionais de Estados terceiros que residam legalmente no território de um Estado-Membro ( 59 ).

70.

Todavia, e sem que seja necessário interrogarmo-nos sobre a questão de saber se o litígio no processo principal caberia, de alguma forma, no âmbito de aplicação do artigo 2.o, do Protocolo n.o 4 Adicional à CEDH ( 60 ), que consagra o direito à liberdade de circulação, é claro que este se enquadra, em qualquer caso ( 61 ), dada a lógica do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço, nas disposições do artigo 7.o da Carta, que garante o respeito pela vida privada e familiar, disposição esta que, em conformidade com o artigo 52.o, n.o 3, da Carta, deve ser interpretada à luz das disposições do artigo 8.o da CEDH ( 62 ).

71.

Os nacionais de Estados terceiros que não são abrangidos pela definição de membros da família de um cidadão da União, na aceção da Diretiva n.o 2004/38/CE, e que, portanto, não beneficiam de um direito automático de entrada e de permanência no Estado-Membro de acolhimento, mas que se enquadrem no âmbito de aplicação do Regulamento n.o 1931/2006, devem poder beneficiar, em nosso entender, no quadro da aplicação deste, das garantias decorrentes do direito à vida privada e familiar, em sentido lato ( 63 ), tal como, reciprocamente, os fronteiriços residentes nos Estados-Membros.

D — A aplicação do artigo 7.o da Carta e do artigo 8.o da CEDH

72.

É, portanto, definitivamente, à luz das disposições pertinentes da Carta e da CEDH, bem como dos princípios gerais do direito da União, e em particular, do princípio da proporcionalidade, que o Regulamento n.o 1931/2006 deve ser interpretado e que a aplicação da disposição em causa do acordo bilateral celebrado pela Hungria deve ser apreciada.

73.

Ora, uma aplicação puramente mecânica da norma constante do artigo 1.o, n.o 5, do acordo bilateral celebrado pela Hungria, interpretada de acordo com a abordagem defendida pelas autoridades húngaras competentes e que conduz a recusar ao beneficiário a autorização de pequeno tráfego fronteiriço para a passagem local da fronteira, justificada por relações pessoais, familiares ou, de forma mais geral, relações sociais ( 64 ) com cidadãos da União residentes na zona fronteiriça de um Estado-Membro, ao abrigo do Regulamento n.o 1931/2006, o direito de entrada no território do referido Estado-Membro, apenas porque acumulou três meses de presença no referido território num período de seis meses, infligiria uma violação desproporcionada ao seu direito ao respeito pela vida privada e familiar.

74.

Como o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem decidiu, embora em contextos diferentes ( 65 ), o artigo 8.o da CEDH protege, para além da vida familiar stricto sensu, o direito de criar e de manter laços com os seus semelhantes e com o mundo exterior e pode englobar aspetos da identidade social de uma pessoa ( 66 ).

75.

Assim, e da mesma forma que, independentemente da existência ou não de uma «vida familiar», a expulsão de um imigrante estabelecido num Estado-Membro é considerada uma violação do seu direito ao respeito pela sua vida privada, também a recusa da entrada no território de um Estado-Membro oposta ao titular de uma autorização de pequeno tráfego fronteiriço se pode considerar como tal e, deve, portanto, ser conforme à lei e necessária numa sociedade democrática, ou seja, justificada por uma necessidade social imperiosa e, designadamente, proporcional ao objetivo legítimo prosseguido ( 67 ).

76.

É às autoridades nacionais competentes que compete, sob fiscalização dos tribunais nacionais, garantir um justo equilíbrio dos interesses em presença, neste caso, o direito de o recorrente no processo principal beneficiar plenamente da sua autorização de pequeno tráfego fronteiriço e a necessidade de as autoridades competentes do Estado-Membro prevenirem e de punirem os abusos, em conformidade com o artigo 17.o do Regulamento n.o 1931/2006. Compete-lhes, nesta perspetiva, examinar em cada caso se uma autorização de pequeno tráfego fronteiriço é utilizada de forma abusiva ou fraudulenta pelo seu beneficiário, tendo em devida conta as razões legítimas por ele invocadas, no momento da emissão da referida autorização, com vista à respetiva obtenção.

77.

Nestas condições, a prática, das autoridades competentes de um Estado-Membro, que consista em recusar sistematicamente aos titulares de uma autorização de pequeno tráfego fronteiriço para passagem local da sua fronteira, validamente emitida em conformidade com as disposições do Regulamento n.o 1931/2006, o direito de entrada no território desse Estado-Membro apenas pela razão de que estes, ao longo de um período de seis meses, realizaram várias estadias cuja duração acumulada é de mais de três meses, sem que sejam tidas em conta as razões legítimas justificativas destas estadas, nem as circunstâncias nas quais estas decorreram e sem que seja provada a existência de uma utilização abusiva ou fraudulenta das referidas autorizações, em nenhum caso responde, mesmo que fosse imposta pelas disposições de um acordo bilateral de aplicação do referido regulamento, às exigências decorrentes do princípio da proporcionalidade.

78.

Daí resulta que o Regulamento n.o 1931/2006 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que um acordo bilateral celebrado em aplicação do artigo 13.o desse regulamento, como é o caso do acordo bilateral celebrado pela Hungria, ou a interpretação que dele é feita pelas autoridades e pelos tribunais nacionais competentes, excluam a possibilidade de uma pessoa elegível para beneficiar do referido regime atravessar a fronteira de um Estado-Membro em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, salvo se se demonstrar a existência de fraude ou de abuso.

V — Conclusão

79.

Tendo em conta as considerações anteriores, propomos ao Tribunal de Justiça que responda às questões colocadas pelo Magyar Köztársaság Legfelsőbb Bírósága (Hungria) nos termos seguintes:

«O artigo 5.o do Regulamento (CE) n.o 1931/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de dezembro de 2006, que estabelece as regras para o pequeno tráfego fronteiriço nas fronteiras terrestres externas dos Estados-Membros e que altera o disposto na Convenção de Schengen, na medida em que fixa em três meses a duração máxima da estada ininterrupta autorizada sob o regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que um acordo bilateral adotado em aplicação do artigo 13.o do referido regulamento, ou a interpretação que dele é feita, excluam a possibilidade de uma pessoa elegível beneficiar do referido regime de passagem da fronteira de um Estado-Membro:

quando esta seja titular de uma autorização de pequeno tráfego fronteiriço emitida em conformidade com o referido regulamento e dentro do seu prazo de validade,

pela única razão de esta, durante determinado período, ter efetuado estadas múltiplas na zona fronteiriça do referido Estado-Membro com uma duração acumulada equivalente à duração máxima da estada ininterrupta prevista no referido acordo, independentemente desta última duração, e

salvo se ficar provado que as referidas estadas configuram um comportamento fraudulento ou abusivo.

É às autoridades nacionais competentes que cabe, sob a fiscalização dos tribunais nacionais, fazer a prova de que a autorização de pequeno tráfego fronteiriço é utilizada de forma abusiva ou fraudulenta.»


( 1 )   Língua original: francês.

( 2 )   JO L 405, p. 1, retificação JO 2007, L 29, p. 3. Quanto a este regulamento, v. Peers S., EU Justice and Home Affairs Law, 3.a ed., Oxford EU Law Library, 2011, pp. 210 e segs.; Beaudu, G., «La politique européenne des visas de court séjour», Cultures & Conflits, disponibilização eletrónica em 29 de setembro de 2003, consultado em 4 de novembro de 2012 <http://conflits.revues.org/909.

( 3 )   A seguir «Carta».

( 4 )   A seguir «CEDH».

( 5 )   JO 2000, L 239, p. 19; a seguir «CAAS».

( 6 )   A seguir «acordo bilateral celebrado pela Hungria». Acordo promulgado pela Lei n.o CLIII de 2007, que autoriza a ratificação do acordo aprovado entre o Governo húngaro e o Conselho de Ministros da Ucrânia, que estabelece as regras para o pequeno tráfego fronteiriço (2007. évi CLIII. Törvény a Magyar Köztársaság Kormánya és Ukrajna Miniszteri Kabinetje között a kishatárforgalom szabályozásáról szóló Egyezmény kihirdetéséről).

( 7 )   O Acordo entre os Governos dos Estados da União Económica Benelux, da República Federal da Alemanha e da República Francesa, relativo à supressão gradual dos controlos nas fronteiras comuns, assinado em Schengen em 14 de junho de 1985, bem como a CAAS, fazem, desde a entrada em vigor do Tratado de Amesterdão (v. protocolo que integra o Acervo de Schengen no quadro da União Europeia, anexo ao Tratado sobre a União Europeia e ao Tratado que institui a Comunidade Europeia pelo Tratado de Amesterdão), parte do Acervo de Schengen, que se aplica à Hungria por força do artigo 2.o do Protocolo n.o 19 sobre o Acervo de Schengen, integrado no quadro da União Europeia. O Acervo de Schengen aplica-se à Hungria a partir de 21 de dezembro de 2007. V. artigo 1.° da Decisão 2007/801/CE do Conselho, de 6 de dezembro de 2007, relativa à aplicação das disposições do acervo de Schengen na República Checa, na República da Estónia, na República da Letónia, na República da Lituânia, na República da Hungria, na República de Malta, na República da Polónia, na República da Eslovénia e na República Eslovaca (JO L 323, p. 34).

( 8 )   Regulamento (CE) n.o 562/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, que estabelece o código comunitário relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen) (JO L 105, p. 1).

( 9 )   Regulamento (CE) n.o 810/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, que estabelece o Código Comunitário de Vistos (Código de Vistos) (JO L 243, p. 1).

( 10 )   A seguir «Lei n.o II de 2007».

( 11 )   A seguir «recorrente no processo principal».

( 12 )   A seguir «recorrido no processo principal».

( 13 )   Ou a manter, quanto aos acordos celebrados antes da entrada em vigor do Regulamento n.o 1931/2006 e que podem continuar a produzir os seus efeitos, desde que sejam conformes ao direito da União; v., também neste sentido, Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre a aplicação e o funcionamento do regime de pequeno tráfego fronteiriço introduzido pelo Regulamento (CE) n.o 1931/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece as regras para o pequeno tráfego fronteiriço nas fronteiras terrestres externas dos Estados-Membros [COM(2009) 383 final, a seguir «Primeiro Relatório da Comissão sobre o regime próprio de pequeno tráfego fronteiriço»]. Este é o caso, nomeadamente, do acordo celebrado entre a República da Eslovénia e a República da Croácia, em vigor desde 2001, referido pelo dito relatório.

( 14 )   Sobre o «acervo» constituído pelos acordos bilaterais sobre o pequeno tráfego fronteiriço preexistentes, v. documento de trabalho da Comissão de 9 de setembro de 2002, intitulado «Desenvolvimento do acervo no âmbito do pequeno tráfego fronteiriço, [SEC(2002) 947].

( 15 )   Como veremos abaixo.

( 16 )   Apesar das disposições do artigo 19.o do Regulamento n.o 1931/2006, por força das quais a Comissão deve tornar acessíveis aos Estados-Membros e ao público as informações relativas aos acordos bilaterais celebrados pelos Estados-Membros envolvidos e por estes notificados, não foi possível recensear com certeza todos os acordos celebrados, nem, consequentemente, recolher todas as informações pertinentes a este respeito. V., no entanto, as informações constantes do Primeiro Relatório da Comissão sobre o regime de pequeno tráfego fronteiriço, bem como as que constam da Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho, intitulada «Segundo Relatório sobre a aplicação e o funcionamento do regime de pequeno tráfego fronteiriço introduzido pelo Regulamento (CE) n.o 1931/2006» [COM(2011) 47 final, a seguir «Segundo Relatório sobre a aplicação e o funcionamento do regime de pequeno tráfego fronteiriço»] relatórios publicados nos termos do artigo 18.o do Regulamento n.o 1931/2006, dos quais resulta que catorze acordos foram celebrados ou estarão em vias de o ser. V., também, Eckstein, A., «Cross-border travel to become easier in Kaliningrad area», Europolitics, 29 de julho de 2011.

( 17 )   V. artigo 3.o, n.os 2 e 3, do acordo entre a República da Eslovénia e a República da Croácia relativo ao pequeno tráfego fronteiriço e a cooperação, que limita a estada ininterrupta a sete dias, embora sem prejuízo de casos de força maior; v., também, o artigo 2.o, n.o 2, do acordo entre a República da Áustria e a Confederação Helvética sobre a passagem de fronteiras por pessoas ao abrigo do pequeno tráfego fronteiriço, assinado em Viena em 13 de junho de 1973.

( 18 )   V. artigo 4.o do acordo entre o Governo da República da Polónia e o Conselho de Ministros da Ucrânia, relativo às regras específicas do pequeno tráfego fronteiriço, assinado em Kiev em 28 de março de 2008, que prevê uma duração máxima de estada ininterrupta de 60 dias, mas limitada a um total de 90 dias, durante um período de seis meses, contados desde a primeira passagem da fronteira. V., igualmente, artigo 4.o, parágrafo 5, do acordo celebrado pela República da Letónia com a República da Bielorrússia, assinado em Riga em 23 de agosto de 2010.

( 19 )   V. artigo 4.o do acordo entre o Governo da República da Polónia e o Governo da República da Bielorrússia sobre as regras específicas do pequeno tráfego fronteiriço, assinado em Varsóvia em 12 de fevereiro de 2010, que prevê uma duração máxima de estada ininterrupta de 30 dias, num período de seis meses, contados desde a primeira passagem da fronteira.

( 20 )   Decorre das observações apresentadas pela República Eslovaca que o referido acordo, na sua versão inicial, limitava o prazo de estada ininterrupta a 30 dias e a duração total da estada a 90 dias, num período de 180 dias. O novo acordo, assinado em Bratislava em17 de junho de 2011 prevê uma duração máxima de estada ininterrupta de 90 dias num período de 180 dias.

( 21 )   V. artigo 1.o, alínea c) do acordo entre o Governo da República da Moldávia e o Governo da Roménia sobre o pequeno tráfego fronteiriço, assinado em Bucareste em 13 de novembro de 2009.

( 22 )   Deve, de resto, observar-se que, no âmbito da missão de controlo da compatibilidade dos acordos bilaterais que lhe é confiada pelo artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1931/2006, a Comissão, tal como decorre do Primeiro Relatório como do Segundo Relatório sobre o regime próprio de pequeno tráfego fronteiriço, não assinalou esta «discordância» como sendo constitutiva de uma incompatibilidade, sem dúvida dadas as razões evocadas abaixo, nota 23.

( 23 )   É necessário, a este respeito, salientar que a própria Comissão mantém uma certa ambiguidade. Assim, no seu Primeiro Relatório sobre o regime próprio de pequeno tráfego fronteiriço, constata que todos os acordos bilaterais de que teve conhecimento «estabelecem restrições adicionais no que diz respeito ao período de estada na zona fronteiriça, ou seja, 90 dias num período de 180 dias» (p. 7, n.o 4), o sublinhado é meu, enquanto foi a própria a especificar, no mesmo relatório, que a possibilidade de realizar uma estada ininterrupta de 90 dias constitui «uma derrogação à regra geral do Código das Fronteiras Schengen que limita as estadas curtas a um máximo de 90 dias num período de 180 dias». Salienta ainda no seu Segundo Relatório sobre o regime próprio de pequeno tráfego fronteiriço que o Regulamento n.o 1931/2006 «prevê que a estada num Estado-Membro possa durar no máximo três meses durante um período determinado» (p. 4, n.o 3.1), o sublinhado é meu.

( 24 )   A problemática do pequeno tráfego fronteiriço foi exposta de forma mais precisa pela Comissão no seu documento de trabalho de 9 de setembro de 2002, acima referido, na origem do processo legislativo que culminou com a adoção do Regulamento n.o 1931/2006.

( 25 )   V. considerando 2 do Regulamento n.o 1931/2006. V., também, considerando 1 do Regulamento (UE) n.o 1342/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, que altera o Regulamento (CE) n.o 1931/2006 para efeitos da inclusão da oblast de Kaliningrado e de certos distritos administrativos polacos na zona fronteiriça elegível (JO L 347, p. 41).

( 26 )   Na mesma ordem de ideias, o Código das Fronteiras Schengen esclarece, no seu considerando 11, que os «Estados-Membros deverão assegurar que os procedimentos de controlo nas fronteiras externas não constituam um entrave significativo para o comércio e os intercâmbios sociais e culturais».

( 27 )   V. considerando 4 do Regulamento n.o 1931/2006.

( 28 )   Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu, de 11 de março de 2003, intitulada «Europa alargada e os países vizinhos: um novo enquadramento para as relações com os nossos vizinhos orientais e meridionais [COM(2003) 104 final].

( 29 )   V., além da Comunicação de 11 de março de 2003, acima referida, «Política europeia de vizinhança — Documento de orientação», Comunicação da Comissão de 12 de maio 2004 [COM(2004) 373 final].

( 30 )   Como expôs a própria Comissão, o Regulamento n.o 1931/2006 forma com o Código das Fronteiras Schengen e o Regulamento (CE) n.o 2007/2004 do Conselho, de 26 de outubro de 2004, que cria uma Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas dos Estados-Membros da União Europeia (FRONTEX) (JO L 349, p. 1), «uma gestão integrada que garanta um nível elevado […] de controlo […] nas fronteiras». V., a este respeito, a Comunicação da Comissão de 19 de julho de 2006 sobre as prioridades da política de luta contra a imigração clandestina de nacionais de países terceiros [COM(2006) 402 final, n.o 18]. V., igualmente, «Rumo a uma gestão integrada das fronteiras externas dos Estados-Membros da União Europeia», Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu, de 7 de maio 2002 [COM(2002) 233 final] que evoca um acervo legislativo comum relativo às fronteiras externas.

( 31 )   A população em causa no processo principal fez, portanto, parte de cinco estados diferentes num só século. A região, integrada no Reino da Hungria, fazia parte do império austro-húngaro. Depois da criação da Checoslováquia, em 28 de outubro de 1918, foi-lhe anexada, por força do Tratado de Trianon, de 4 de junho de 1920. De seguida, foi de novo reagrupada à Hungria, por força da Primeira Arbitragem de Viena de 2 de novembro de 1938, arbitragem ulteriormente declarada nula e sem efeitos pelo Tratado de Paris, de 10 de fevereiro de 1947. A região foi então integrada na URSS até à proclamação da independência da Ucrânia, em 24 de agosto de 1991. De acordo com os números publicados no Segundo Relatório da Comissão sobre o regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço, entre 400000 e 450000 pessoas serão elegíveis para a autorização de atravessamento local da fronteira na Hungria (n.o 3.2.1).

( 32 )   V. artigo 1.o, n.o 1, e 7.°, n.o 1, do Regulamento n.o 1931/2006. Na terminologia utilizada, foi, há que salientar, preferida a expressão «autorização» à de visto, inicialmente proposta pela Comissão. O Conselho da União Europeia, de resto, para tomar em consideração as disposições do Regulamento n.o 1931/2006, adotou na mesma data o Regulamento (CE) n.o 1932/2006 do Conselho, de 21 de dezembro de 2006, que altera o Regulamento (CE) n.o 539/2001 que fixa a lista dos países terceiros cujos nacionais estão sujeitos à obrigação de visto para transporem as fronteiras externas e a lista dos países terceiros cujos nacionais estão isentos dessa obrigação (JO L 405, p. 23). No presente caso, o artigo 1.o, n.o 2, segunda alínea, primeiro travessão do Regulamento (CE) n.o 539/2001 do Conselho, de 15 de março de 2001, que fixa a lista dos países terceiros cujos nacionais estão sujeitos à obrigação de visto para transporem as fronteiras externas e a lista dos países terceiros cujos nacionais estão isentos dessa obrigação (JO L 81, p. 1), na versão alterada, isenta da obrigação de visto as pessoas, titulares de uma autorização de pequeno tráfego fronteiriço, nacionais dos Estados referidos no seu Anexo I, anexo que contém a lista taxativa dos Estados terceiros cujos nacionais devem ser titulares de visto para a passagem das fronteiras externas dos Estados-Membros, entre os quais a Ucrânia, em causa no processo principal.

( 33 )   Artigos 7.° a 12.° do Regulamento n.o 1931/2006.

( 34 )   Artigo 10.o do Regulamento n.o 1931/2006 quanto ao prazo de validade, e artigo 7.o, n.o 2, do referido regulamento quanto ao âmbito territorial de validade, neste caso, a zona fronteiriça definida no seu artigo 3.o, n.o 2.

( 35 )   No seu Segundo Relatório sobre a aplicação e o funcionamento do regime de pequeno tráfego fronteiriço (n.o 3.2.3, p. 5), a Comissão assinala que este ponto foi objeto de discussões durante as negociações de 2006. Importa salientar, a este respeito, que na sua proposta inicial, a Comissão considerava apenas um direito de estada na zona fronteiriça de sete dias consecutivos no máximo, não podendo a duração total das visitas sucessivas ultrapassar três meses por semestre. V. artigo 6.o da Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de fevereiro de 2005, que estabelece regras em matéria de pequeno tráfego fronteiriço nas fronteiras terrestres externas dos Estados-Membros e que altera a Convenção de Schengen e as Instruções Consulares Comuns [COM(2005)56 final]. O texto do artigo 5.o do Regulamento n.o 1931/2006 é o que resulta da alteração proposta pelo Parlamento Europeu. V. relatório de Brejc, M., de 13 de dezembro de 2005, sobre a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece regras em matéria de pequeno tráfego fronteiriço nas fronteiras terrestres externas dos Estados-Membros e que altera a Convenção de Schengen e as Instruções Consulares Comuns (A6-0406/2005).

( 36 )   V. artigo 3.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1931/2006, que define o fronteiriço elegível para beneficiar do regime próprio do pequeno tráfego fronteiriço, bem como o artigo 4.o do referido regulamento, que fixa as condições de entrada dos referidos fronteiriços no território dos Estados-Membros.

( 37 )   V. artigo 3.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1931/2006, que define a zona fronteiriça como uma zona que não se estende, salvo exceção, por mais de 30 quilómetros a partir da fronteira; v., também, considerando 5, bem como o artigo 7.o do referido regulamento, que limita a validade territorial da autorização de pequeno tráfego fronteiriço.

( 38 )   V. artigo 7.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1931/2006.

( 39 )   V., igualmente, considerando 4 bem como o artigo 9.o, alínea b), do Regulamento n.o 1931/2006.

( 40 )   V. artigos 3.°, n.o 3, e 15.°, n.o 3, do Regulamento n.o 1931/2006, que definem o pequeno tráfego fronteiriço.

( 41 )   O relator da proposta de Regulamento n.o 1931/2006 perante o Parlamento Europeu, acima referido, evocava, a este respeito «razões académicas ou profissionais [tanto quanto a] existência de relações familiares». A Comissão parece, em contrapartida, mais restritiva uma vez que concebeu o regime do pequeno tráfego fronteiriço como permitindo apenas «melhorar os contactos entre as pessoas nas zonas fronteiriças». V., para além da Comunicação de 12 de maio de 2004, já referida, que evoca a manutenção dos «contactos tradicionais», «Uma Política Europeia de Vizinhança forte», Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho, de 5 de dezembro de 2007 [COM (2007) 774 final, p. 6].

( 42 )   O artigo 1.o, n.o 5 do acordo bilateral celebrado pela Hungria esclarece, de resto, que a travessia da fronteira está autorizada «por razões económicas justificadas que […], não seja[m] as de exercer uma atividade remunerada».

( 43 )   Trata-se, como foi assinalado pela Comissão, de «permitir às populações das regiões fronteiriças manter contactos tradicionais sem se confrontarem com obstáculos administrativos excessivos». V. Comunicação de 12 de maio de 2004, já referida, p. 18; v., também, Parecer da Comissão dos Negócios Estrangeiros do Parlamento Europeu, de 25 de novembro de 2005, sobre a proposta de Regulamento n.o 1931/2006.

( 44 )   Esta frequência pode, em certos casos, ser quotidiana, como salienta o relatório de Brejc, M., de 13 de dezembro de 2005, já referido.

( 45 )   É, parece-nos, o principal ponto em discussão no âmbito do presente processo.

( 46 )   V. considerando 4 bem como os artigos 7.°, n.o 3, segundo parágrafo e 17.° do Regulamento n.o 1931/2006.

( 47 )   Em conformidade com o artigo 9.o, alínea b), do Regulamento n.o 1931/2006.

( 48 )   Sobre o conceito de «primeira entrada» e suas implicações, v. acórdão de 3 de outubro de 2006, Bot (C-241/05, Colet., p. I-9627). Note-se que, tomando em consideração este acórdão, a Comissão propôs a adoção da «uma definição clara do método de cálculo de ‘uma estada[s] que não exceda[s] três meses num período de seis meses’». V. proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento n.o 562/2006 e a Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen [COM(2011) 118 final].

( 49 )   A mesma limitação é sistematicamente recordada nas decisões do Conselho sobre a assinatura e a aplicação provisória dos acordos celebrados pela Comunidade Europeia com Estados terceiros relativamente à isenção de vistos para as estadas de curta duração. V., por exemplo, Decisão n.o 2009/478/CE do Conselho, de 6 de abril de 2009, relativa à assinatura e à aplicação provisória do Acordo entre a Comunidade Europeia e Antígua e Barbuda sobre a isenção de visto para as estadas de curta duração (JO L 169, p. 1), bem como Decisões 2009/479/CE, 2009/480/CE, 2009/481/CE e 2009/483/CE do Conselho, da mesma data e com o mesmo objeto relativamente a Barbados (JO L 169, p. 9), à República da Maurícia (JO L 169, p. 16), à Comunidade das Baamas (JO L 169, p. 23), à República das Seicheles (JO L 169, p. 30), e à Federação de São Cristóvão e Nevis (JO L 169, p. 37).

( 50 )   O artigo 3.o CAAS previa já que o Comité Executivo de Schengen devia adotar disposições sobre as «exceções e as modalidades do pequeno tráfego fronteiriço», disposições essas que, contudo, nunca foram adotadas, antes da adoção do Regulamento n.o 1931/2006.

( 51 )   Designadamente, como a República da Polónia observou, as disposições da Diretiva n.o 2003/109/CE do Conselho, de 25 de novembro de 2003, relativa ao estatuto dos nacionais de países terceiros residentes de longa duração (JO L 16, p. 44).

( 52 )   V. artigo 2.o do Regulamento n.o 1931/2006.

( 53 )   Designadamente os artigos 67.° TFUE e 8.° TUE. Deve recordar-se, a este respeito, que nos termos do artigo 8.o TUE «A União desenvolve relações privilegiadas com os países vizinhos, a fim de criar um espaço de prosperidade e boa vizinhança, fundado nos valores da União e caracterizado por relações estreitas e pacíficas, baseadas na cooperação». Sobre esta «cláusula de vizinhança», v., nomeadamente, Hanf, D., «The European Neighbourhood Policy in the Light of the new ‘Neighbourhood Clause’ (Article 8.° TEU)», em Lannon, E., The European Neighbourhood Policy ChallengesLes défis de la politique européenne de voisinage, Peter Lang, 2012, pp. 109 a 123.

( 54 )   Acórdãos de 6 de novembro de 2003, Lindqvist (C-101/01, Colet., p. I-12971, n.o 87); de 26 de junho de 2007, Ordre des barreaux francophones et germanophone e o. (C-305/05, Colet., p. I-5305, n.o 28); de 23 de dezembro de 2009, Detiček (C-403/09 PPU, Colet., p. I-12193, n.o 34); de 21 de dezembro de 2011, N. S. e o., C-411/10 e C-493/10, Colet., p. I-13905, n.o 77); e de 22 de novembro de 2012, M.M. (C-277/11, n.o 93).

( 55 )   Importa salientar que, em conformidade com o Protocolo n.o 23 sobre as relações exteriores dos Estados-Membros relativo à passagem das fronteiras externas, anexo ao TUE e ao TFUE, não é por os Estados-Membros conservarem, na falta de disposições adotadas com fundamento no artigo 77.o, n.o 1, alínea b), TFUE, a competência para negociar e celebrar acordos com países terceiros, que os ditos acordos respeitam automaticamente o direito da União e os outros acordos internacionais. A fortiori será assim os casos de acordos bilaterais cuja celebração é prevista, imposta, por um ato de direito derivado adotado com fundamento no artigo 77.o, n.o 2, alínea a), TFUE, tal como o Regulamento n.o 1931/2006.

( 56 )   V., a este respeito, além dos acórdãos de 15 de janeiro de 2002, Gottardo (C-55/00, Colet., p. I-413, n.o 33), e de 14 de julho de 2005, Comissão/Alemanha (C-433/03, Colet., p. I-6985), acórdãos relativos a acordos bilaterais ditos «a céu aberto», por exemplo, acórdão de 5 de novembro de 2002, Comissão/Dinamarca (C-467/98, Colet., p. I-9519, n.os 110 à 112). V., igualmente, acórdão de 24 de abril de 2007, Comissão/Países Baixos (C-523/04, Colet., p. I-3267, n.os 74 a 76).

( 57 )   É, de resto, assim que se intitula o capítulo IV do Regulamento n.o 1931/2006, em que se insere o artigo 13.o que prevê a celebração de acordos bilaterais.

( 58 )   Estes enquadram-se nas disposições da Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados-Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/ CEE (JO L 158, p. 77).

( 59 )   O regime do pequeno tráfego fronteiriço não se aplica, por definição, aos nacionais de Estados terceiros que residam legalmente no território de um Estado-Membro, mas aos fronteiriços, tal como definidos no artigo 3.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1931/2006.

( 60 )   Protocolo que reconhece certos outros direitos e liberdades, para além dos que já constam da CEDH e no Primeiro Protocolo Adicional à CEDH.

( 61 )   Diversas disposições da Carta e/ou da CEDH são suscetíveis de ser, mais ou menos diretamente, afetadas. Tendo em vista a função principalmente social e cultural do Regulamento n.o 1931/2006, podemos, a título de exemplo, citar o artigo 9.o da Carta (artigo 12.o CEDH), que garante o direito ao casamento e à constituição de uma família, o artigo 14.o (artigo 2.o, do Primeiro Protocolo Adicional à CEDH) que consagra o direito à educação, mas também o artigo 17.o da Carta sobre o direito de propriedade (artigo 1.o do Primeiro Protocolo Adicional à CEDH), ou o artigo 35.o da Carta sobre a proteção da saúde, uma vez que o exercício e o gozo destes direitos podem depender do direito de circular livremente entre os dois lados das fronteiras e que, consequentemente, qualquer limitação desta liberdade de circulação pode afetar o exercício dos ditos direitos.

( 62 )   V., igualmente, explicações relativas à Carta dos Direitos Fundamentais (JO 2007, C 303, p. 17).

( 63 )   De resto, é exatamente o que consta do considerando 6 da Diretiva n.o 2004/38, acima referida, que prevê a possibilidade de os Estados-Membros preverem, com base na sua própria legislação, a possibilidade de decidir se um direito de entrada ou de permanência pode ser concedido a estas pessoas «a fim de manter a unidade da família numa aceção mais lata», «tendo em conta a sua relação com o cidadão da União ou com quaisquer outras circunstâncias, como a sua dependência física ou financeira em relação ao cidadão da União».

( 64 )   Neste sentido, TEDH, acórdão Niemietz e Alemanha de 16 de dezembro de 1992, Recueil des arrêts et décisions 1992, petição n.o 13710/88, série A, n.o 251-B, § 29. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem decidiu, neste acórdão que, se não é «nem possível nem necessário procurar definir exaustivamente o conceito ‘vida privada’», seria todavia «demasiado restritivo limitá-la a um ‘círculo íntimo’ onde cada um pode levar a sua vida pessoal como bem entender e afastar totalmente o mundo exterior a este círculo». Acrescenta que «[o] respeito pela vida privada deve também englobar, em certa medida, o direito da pessoa a criar e desenvolver relações com os seus semelhantes». V., também, TEDH, acórdão C. c. Bélgica de 7 de agosto de 1996, Recueil des arrêts et décisions 1996-III, petição n.o 21794/93, § 25. Sobre a elasticidade do conceito de vida privada, v., designadamente, TEDH, acórdãos Burghartz e Suíça de 22 de fevereiro de 1994, petição n.o 16213/90, série A, n.o 280-B, § 24 (conservação do nome patronímico depois do casamento); Pretty c. Reino Unido de 29 de abril de 2002, Recueil des arrêts et décisions 2002-III, petição n.o 2346/02, § 61 (direito à morte assistida); Bigaeva c. Grécia de 28 de maio de 2009, petição n.o 26713/05, §§ 22 a 25 (recusa de inscrição na Ordem dos Advogados); M. c. Suíça de 26 de abril de 2011, petição n.o 41199/06, §§ 36 e 37 (não renovação de passaporte); Fernández Martínez c. Espanha de 15 de maio de 2012, petição n.o 56030/07, §§ 56 a 60 (não renovação de contrato de trabalho de um professor de religião); e Godelli c. Itália de 25 de setembro de 2012, petição n.o 33783/09, § 46 (averiguação da identidade dos progenitores).

( 65 )   Estavam em causa, naqueles casos, processos sobre a expulsão de estrangeiros; v. TEDH, acórdãos Üner c. Países Baixos de 18 de outubro de 2006, Recueil des arrêts et décisions 2006-XII, petição n.o 46410/99, § 59, bem como Maslov c. Áustria de 23 de junho de 2008, Recueil des arrêts et décisions 2008, petição n.o 1638/03, § 63.

( 66 )   TEDH, acórdão Mikulić c. Croácia de 7 de fevereiro de 2002, Recueil des arrêts et décisions 2002-I, petição n.o 53176/99, § 53.

( 67 )   V., designadamente, em matéria de expulsão, TEDH, acórdãos Mehemi c. França de 26 de setembro de 1997, Recueil des arrêts et décisions 1997-VI, petição n.o 25017/94, § 34, bem como Dalia c. França de 19 de fevereiro de 1998, Recueil des arrêts et décisions 1998-I, petição n.o 26102/95, § 52; sobre um afastamento, TEDH, acórdão Mubilanzila Mayeka e Kniki Mitunga c. Bélgica de 12 de outubro de 2006, Recueil des arrêts et décisions 2006-XI, petição n.o 13178/03, § 80. V., igualmente, TEDH, acórdão Kurić e o. c. Eslovénia de 13 de julho de 2010, petição n.o 26828/06, §§ 351 e segs.

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