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Document 62010CJ0488

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 16 de fevereiro de 2012.
    Celaya Emparanza y Galdos Internacional SA contra Proyectos Integrales de Balizamiento SL.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Juzgado de lo Mercantil n.° 1 de Alicante y n.° 1 de Marca Comunitaria.
    Regulamento (CE) n.° 6/2002 ― Artigo 19.°, n.° 1 ― Desenhos ou modelos comunitários ― Contrafação ou ameaça de contrafação ― Conceito de ‘terceiro’.
    Processo C‑488/10.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2012:88

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

    16 de fevereiro de 2012 ( *1 )

    «Regulamento (CE) n.o 6/2002 — Artigo 19.o, n.o 1 — Desenhos ou modelos comunitários — Contrafação ou ameaça de contrafação — Conceito de ‘terceiro’»

    No processo C-488/10,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Juzgado de lo Mercantil n.o 1 de Alicante y n.o 1 de Marca Comunitaria (Espanha), por decisão de 15 de setembro de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 11 de outubro de 2010, no processo

    Celaya Emparanza y Galdos Internacional SA

    contra

    Proyectos Integrales de Balizamiento SL,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: A. Tizzano, presidente de secção, M. Safjan, M. Ilešič (relator), E. Levits e M. Berger, juízes,

    advogado-geral: P. Mengozzi,

    secretário: K. Malacek, administrador,

    vistos os autos e após a audiência de 14 de setembro de 2011,

    vistas as observações apresentadas:

     

    em representação da Celaya Emparanza y Galdos Internacional SA, por J. L. Gracia Albero, F. Rodríguez Domínguez, F. Miazetto e S. Ferrandis González, abogados,

     

    em representação do Governo polaco, por M. Laszuk, I. Żarski e M. Szpunar, na qualidade de agentes,

     

    em representação da Comissão Europeia, por F. Wenzel Bulst e R. Vidal Puig, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 8 de novembro de 2011,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 19.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 6/2002 do Conselho, de 12 de dezembro de 2001, relativo aos desenhos ou modelos comunitários (JO 2002, L 3, p. 1, a seguir «regulamento»).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Celaya Emparanza y Galdos Internacional SA (a seguir «Cegasa») à Proyectos Integrales de Balizamiento SL (a seguir «PROIN») a propósito de uma ação de contrafação intentada pela Cegasa.

    Quadro jurídico

    3

    Resulta do seu quinto considerando que o regulamento tem por objetivo a «criação de um desenho ou modelo comunitário diretamente aplicável em todos os Estados-Membros» a fim de «obter […] um desenho ou modelo válido num único território que englobe todos os Estados-Membros».

    4

    O décimo oitavo considerando do regulamento enuncia:

    «Um desenho ou modelo comunitário registado exige a criação e a manutenção de um registo em que sejam inscritos todos os pedidos que satisfaçam os requisitos formais previstos e aos quais tenha sido atribuída uma data de depósito do pedido de registo. Em princípio, o sistema de registo não deve basear-se num exame destinado a determinar previamente ao registo se o desenho ou modelo satisfaz as condições de obtenção da proteção, o que permitiria reduzir ao mínimo as formalidades de registo e demais operações a efetuar pelo requerente.»

    5

    Nos termos do artigo 1.o, n.o 2, alínea b), do regulamento, um desenho ou modelo comunitário será protegido «[e]nquanto ‘desenho ou modelo comunitário registado’, caso seja registado nos termos do presente regulamento».

    6

    O artigo 1.o, n.o 3, do regulamento dispõe:

    «O desenho ou modelo comunitário possui caráter unitário. Produz efeitos idênticos em toda a Comunidade. Só pode ser registado, transmitido, ser objeto de renúncia ou de declaração de nulidade, ou o seu uso ser proibido, em toda a Comunidade. Este princípio é aplicável salvo disposição em contrário do presente regulamento.»

    7

    Nos termos do artigo 3.o, alínea a), do regulamento:

    «[…] são aplicáveis as seguintes definições:

    a)

    ‘Desenho ou modelo’ designa a aparência da totalidade ou de uma parte de um produto resultante das suas características, nomeadamente, das linhas, contornos, cores, forma, textura e/ou materiais do próprio produto e/ou da sua ornamentação».

    8

    O artigo 4.o, n.o 1, do regulamento prevê:

    «Um desenho ou modelo será protegido enquanto desenho ou modelo comunitário na medida em que seja novo e possua caráter singular.»

    9

    Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, alínea b), do regulamento, um desenho ou modelo comunitário registado será considerado novo se nenhum desenho ou modelo idêntico tiver sido divulgado ao público «antes da data de depósito do pedido de registo do desenho ou modelo para o qual é reivindicada proteção ou, caso seja reivindicada prioridade, antes da data de prioridade».

    10

    O artigo 6.o, n.o 1, alínea b), do regulamento prevê que se considera que um desenho ou modelo comunitário registado possui caráter singular se a impressão global que suscita no utilizador informado diferir da impressão global suscitada nesse utilizador por qualquer desenho ou modelo divulgado ao público «antes da data de depósito do pedido de registo […] ou, caso seja reivindicada prioridade, antes da data de prioridade».

    11

    O artigo 10.o do regulamento, intitulado «Âmbito da proteção», dispõe, no seu n.o 1:

    «O âmbito da proteção conferida por um desenho ou modelo comunitário abrange qualquer desenho ou modelo que não suscite no utilizador informado uma impressão global diferente.»

    12

    O artigo 19.o do regulamento, intitulado «Direitos conferidos pelo desenho ou modelo comunitário», prevê:

    «1.   Um desenho ou modelo comunitário registado confere ao seu titular o direito exclusivo de utilizar o desenho ou modelo e de proibir que um terceiro o utilize sem o seu consentimento. A referida utilização abrange, em especial, o fabrico, a oferta, a colocação no mercado, a importação, exportação ou utilização de um produto em que esse desenho ou modelo esteja incorporado, ou em que tenha sido aplicado, bem como a armazenagem desse produto para os mesmos efeitos.

    2.   Todavia, um desenho ou modelo comunitário não registado só confere ao seu titular o direito de proibir os atos mencionados no n.o 1, se o uso em litígio resultar de uma cópia do desenho ou modelo protegido.

    O uso em litígio não é considerado resultante de uma cópia do desenho ou modelo protegido se resultar de um trabalho de criação independente, realizado por um criador de que não se possa razoavelmente pensar que conhecia o desenho ou modelo divulgado pelo seu titular.

    […]»

    13

    A secção 5 do título II do regulamento, intitulada «Nulidade», inclui os artigos 24.° a 26.° do mesmo.

    14

    Nos termos do artigo 24.o, n.o 1, do regulamento:

    «Um desenho ou modelo comunitário registado será declarado nulo mediante a apresentação de um pedido ao Instituto [de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI)], de acordo com o procedimento previsto nos Títulos VI e VII, ou por um tribunal de desenhos e modelos comunitários, com base num pedido reconvencional de nulidade em processo por infração.»

    15

    O artigo 25.o do regulamento, intitulado «Causas de nulidade», dispõe no seu n.o 1, alínea d), que um desenho ou modelo comunitário só pode ser declarado nulo, designadamente, «se o desenho ou modelo comunitário estiver em conflito com um desenho ou modelo anterior».

    16

    O título V do regulamento, intitulado «Processo de registo», é constituído pelos artigos 45.° a 50.° do mesmo.

    17

    O artigo 45.o do regulamento, intitulado «Verificação dos requisitos formais de depósito de um pedido», enuncia, no seu n.o 2:

    «O [IHMI] examinará se:

    a)

    O pedido preenche os restantes requisitos definidos nos n.os 2, 3 e 4 do artigo 36.o e, no caso dos pedidos múltiplos, nos n.os 1 e 2 do artigo 37.o;

    b)

    O pedido preenche os requisitos formais estabelecidos pelo regulamento de execução para a aplicação dos artigos 36.° e 37.°;

    c)

    Estão preenchidos os requisitos previstos no n.o 2 do artigo 77.o;

    d)

    Estão preenchidos os requisitos relativos à reivindicação de prioridade, caso seja reivindicada.»

    18

    O artigo 47.o do regulamento, intitulado «Fundamentos para a recusa do pedido de registo», dispõe, no seu n.o 1:

    «Se, ao examinar o pedido nos termos do artigo 45.o, o [IHMI] verificar que o desenho ou modelo para o qual se requer proteção:

    a)

    Não corresponde à definição dada na alínea a) do artigo 3.o, ou

    b)

    É contrário à ordem pública ou aos bons costumes, recusará o pedido.»

    19

    Nos termos do artigo 48.o do regulamento, «[s]e os requisitos que um pedido de desenho ou modelo comunitário registado tem de preencher tiverem sido cumpridos, e desde que o pedido não tenha sido recusado nos termos do artigo 47.o, o [IHMI] registará o pedido no Registo de Desenhos e Modelos comunitários como desenho ou modelo comunitário registado».

    20

    O título VI do regulamento, intitulado «Renúncia e nulidade do desenho ou modelo comunitário registado», é constituído pelos artigos 51.° a 54.° do mesmo.

    21

    O artigo 52.o do regulamento, intitulado «Pedido de declaração de nulidade», prevê no seu n.o 1 que «qualquer pessoa singular ou coletiva, ou qualquer entidade pública habilitada para o efeito, pode apresentar ao [IHMI] um pedido de declaração de nulidade de um desenho ou modelo comunitário registado».

    22

    O título IX do regulamento, intitulado «Competência e procedimento em ações judiciais relativas a desenhos e modelos comunitários», inclui, designadamente, uma secção 2, intitulada «Litígios em matéria de infração e validade dos desenhos ou modelos comunitários», que compreende os artigos 80.° a 92.° do regulamento.

    23

    Nos termos do artigo 81.o do regulamento:

    «Os tribunais de desenhos e modelos comunitários têm competência exclusiva em relação a:

    a)

    Ações de contrafação e — se a legislação nacional o permitir — ações por ameaça de contrafação de desenhos ou modelos comunitários;

    b)

    Ações de verificação de não contrafação de desenhos ou modelos comunitários, se a legislação nacional as permitir;

    c)

    Ações de declaração de nulidade de desenhos ou modelos comunitários não registados;

    d)

    Pedidos reconvencionais de declaração de nulidade de desenhos ou modelos comunitários apresentados em ligação com as ações referidas na alínea a).»

    24

    O artigo 85.o do regulamento, intitulado «Presunção de validade — Defesa quanto ao fundo», dispõe, no seu n.o 1:

    «Nos processos resultantes de ações de contrafação ou de ações por ameaça de contrafação de um desenho ou modelo comunitário registado, os tribunais de desenhos e modelos comunitários considerarão o desenho ou modelo comunitário como válido. A validade só poderá ser contestada por meio de um pedido reconvencional de declaração de nulidade. A exceção de nulidade do desenho ou modelo comunitário apresentada por outra via que não seja um pedido reconvencional será, porém, admissível, se o requerido alegar que o desenho ou modelo comunitário poderia ser declarado nulo devido à existência de um direito nacional anterior, na aceção do disposto na alínea d) do n.o 1 do artigo 25.o, que lhe pertence.»

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    25

    A Cegasa é titular do desenho ou modelo comunitário registado n.o 000421649-0001, constituído por um marco de sinalização rodoviária. Este desenho ou modelo foi depositado no IHMI em 26 de outubro de 2005 e publicado no registo de desenhos ou modelos comunitários em 13 de dezembro de 2005.

    26

    Em finais de 2007, a PROIN colocou no mercado o marco de sinalização H-75. Considerando que este marco não causava uma impressão geral diferente da do desenho ou modelo comunitário registado n.o 000421649-0001, a Cegasa requereu extrajudicialmente à PROIN, em janeiro de 2008, que pusesse termo à contrafação. Esta última negou a contrafação, mas comprometeu-se, não obstante, a introduzir alterações no seu desenho. Em março de 2008, a Cegasa reiterou o seu pedido à PROIN de pôr termo à contrafação.

    27

    Em 11 de abril de 2008, a PROIN depositou no IHMI um pedido de registo de um desenho ou modelo comunitário constituído por um marco de sinalização rodoviária. Este desenho ou modelo foi publicado no registo de desenhos ou modelos comunitários em 7 de maio de 2008 sob o número 000915426-001.

    28

    O órgão jurisdicional de reenvio considera que o marco cilíndrico comercializado pela PROIN é uma reprodução do desenho ou modelo comunitário registado n.o 000421649-0001 da Cegasa, na medida em que não causa no utilizador informado uma impressão global diferente da causada por este desenho ou modelo. O órgão jurisdicional de reenvio precisa que, não obstante, a Cegasa não apresentou um pedido de declaração de nulidade do desenho ou modelo comunitário registado n.o 000915426-001.

    29

    Em contrapartida, a Cegasa interpôs no Juzgado de lo Mercantil n.o 1 de Alicante y n.o 1 de Marca Comunitaria uma ação de contrafação de um desenho ou modelo comunitário registado, alegando que a oferta, a promoção, a publicidade, o armazenamento, a comercialização e a distribuição do sinal rodoviário H-75 pela PROIN constituem uma violação dos direitos que o regulamento lhe reconhece enquanto titular do desenho ou modelo comunitário registado n.o 000421649-0001.

    30

    A PROIN opôs-se à referida ação de contrafação. Invocou, designadamente, a falta de legitimidade ativa da Cegasa para instaurar uma ação de contrafação do seu desenho ou modelo comunitário registado, na medida em que o marco de sinalização comercializado pela PROIN é uma reprodução de um desenho ou modelo comunitário igualmente registado. Sustentou, deste modo, que, enquanto o referido registo não for anulado, o seu titular beneficia de um direito de utilização ao abrigo do regulamento, pelo que o exercício desse direito não pode ser considerado uma contrafação.

    31

    Nestas condições, o Juzgado de lo Mercantil n.o 1 de Alicante y n.o 1 de Marca Comunitaria decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Num litígio por violação do direito exclusivo concedido por um [desenho ou] modelo comunitário registado, o direito de proibir a respetiva utilização por terceiros, previsto no artigo 19.o, n.o 1, do [r]egulamento […], abrange qualquer terceiro que utilize outro [desenho ou] modelo que não produza nos utilizadores informados uma impressão global diferente ou, pelo contrário, exclui o terceiro que usa um [desenho ou] modelo comunitário posterior registado a seu favor enquanto este não for declarado nulo?

    2)

    A resposta à questão anterior não depende da intenção do terceiro ou varia consoante o seu comportamento, sendo determinante que esse terceiro tenha requerido e registado o [desenho ou] modelo comunitário posterior após ter recebido o pedido extrajudicial do titular do modelo comunitário anterior para pôr termo à comercialização de um produto por violação dos direitos decorrentes desse modelo anterior?»

    Quanto às questões prejudiciais

    Quanto à primeira questão

    32

    A título preliminar, importa salientar que o regulamento não contém nenhuma regra que refira expressamente a possibilidade de o titular de um desenho ou modelo comunitário registado anterior propor uma ação de contrafação contra o titular de um desenho ou modelo comunitário registado posterior.

    33

    Não obstante, impõe-se constatar que a redação do artigo 19.o, n.o 1, do regulamento não faz distinção em função do facto de o terceiro ser ou não titular de um desenho ou modelo comunitário registado.

    34

    Deste modo, nos termos da referida disposição, o desenho ou modelo comunitário registado confere ao seu titular o direito exclusivo de o utilizar e de proibir que «qualquer terceiro» o utilize sem o seu consentimento.

    35

    Da mesma forma, o artigo 10.o, n.o 1, do regulamento enuncia que a proteção conferida pelo desenho ou modelo comunitário abrange «qualquer desenho ou modelo que não suscite no utilizador informado uma impressão global diferente».

    36

    Resulta destas disposições que o regulamento não exclui a propositura de uma ação de contrafação, pelo titular de um desenho ou modelo comunitário registado, com o objetivo de fazer proibir a utilização de um desenho ou modelo comunitário registado posterior que não suscite no utilizador informado uma impressão global diferente.

    37

    Na verdade, como o Governo polaco salientou nas observações que apresentou ao Tribunal de Justiça, o titular do desenho ou modelo comunitário registado posterior também goza, em princípio, de um direito exclusivo de utilizar o seu desenho ou modelo.

    38

    Não obstante, esta circunstância não é suscetível de pôr em causa a interpretação do conceito de «qualquer terceiro», na aceção do artigo 19.o, n.o 1, do regulamento, como abrangendo o terceiro titular de um desenho ou modelo comunitário registado posterior.

    39

    A este propósito, importa recordar que, como a Comissão Europeia sustentou nas suas observações, as disposições do regulamento devem ser interpretadas à luz do princípio da prioridade, por força do qual o desenho ou modelo comunitário registado anterior tem primazia sobre os desenhos ou modelos comunitários registados posteriores.

    40

    Decorre em particular do artigo 4.o, n.o 1, do regulamento que um desenho ou modelo será protegido enquanto desenho ou modelo comunitário na medida em que seja novo e possua caráter singular. Ora, em caso de conflito entre dois desenhos ou modelos comunitários registados, presume-se que o desenho ou modelo registado em primeiro lugar reúne estes requisitos para obter a proteção comunitária antes do registado em segundo lugar. Assim, o titular do desenho ou modelo comunitário registado posterior só poderá beneficiar da proteção que o regulamento confere se comprovar, através de uma ação de anulação ou, se for caso disso, de uma ação reconvencional, que o desenho ou modelo comunitário registado anterior não preenche um dos referidos requisitos.

    41

    Neste contexto, e como salientou o advogado-geral nos n.os 32 e 33 das suas conclusões, importa ter em conta as características essenciais do processo de registo de desenhos e modelos comunitários instituído pelo regulamento.

    42

    Com efeito, nos termos deste processo, regulado pelos artigos 45.° a 48.° do regulamento, o IHMI examina a conformidade de um pedido com os requisitos formais de depósito, tal como previstos no regulamento. Se o pedido preencher os referidos requisitos, corresponder à definição de desenho ou modelo nos termos do artigo 3.o, alínea a), do regulamento e não for contrário à ordem pública ou aos bons costumes, o IHMI inscreve o pedido no registo de desenhos e modelos comunitários como desenho ou modelo comunitário registado.

    43

    Trata-se, portanto, de um controlo expedito de natureza essencialmente formal, que, como indicado no décimo oitavo considerando do regulamento, não exige um exame de mérito para determinar previamente ao registo se o desenho ou modelo satisfaz as condições de obtenção da proteção e que, por outro lado, diversamente do processo de registo previsto no Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1), não inclui uma fase que permita ao titular de um desenho ou modelo registado anterior opor-se ao registo.

    44

    Nestas condições, só uma interpretação do conceito de «qualquer terceiro», na aceção do artigo 19.o, n.o 1, do regulamento, no sentido de que abrange o terceiro titular de um desenho ou modelo comunitário registado posterior é suscetível de garantir o objetivo de proteção eficaz dos desenhos e modelos comunitários registados prosseguido pelo regulamento, bem como o efeito útil das ações de contrafação.

    45

    Esta conclusão, de resto, em nada é prejudicada pelo facto de o regulamento não atribuir aos tribunais de desenhos e modelos comunitários competência para conhecer dos pedidos de declaração de nulidade dos desenhos ou modelos comunitários registados e dispor, no seu artigo 85.o, que, nos processos resultantes de ações de contrafação ou de ações por ameaça de contrafação, esses tribunais devem considerar o desenho ou modelo comunitário registado como válido.

    46

    A este propósito, importa sublinhar que o regulamento distingue claramente, no âmbito das ações relativas aos desenhos e modelos comunitários registados, entre ações em matéria de contrafação e ações em matéria de nulidade.

    47

    No que se refere, por um lado, às ações em matéria de contrafação, o artigo 81.o do regulamento confere aos tribunais de desenhos e modelos comunitários competência exclusiva para conhecer destes litígios. No âmbito destas ações, os referidos tribunais examinam unicamente se foi violado o direito exclusivo de utilização que o regulamento confere ao titular de um desenho ou modelo comunitário registado.

    48

    No que respeita, por outro lado, aos pedidos de declaração de nulidade dos desenhos ou modelos comunitários registados, o regulamento optou por centralizar o tratamento destes pedidos no IHMI, estando este princípio, porém, mitigado pela possibilidade de os tribunais de desenhos e modelos comunitários conhecerem dos pedidos reconvencionais de declaração de nulidade de um desenho ou modelo comunitário registado, apresentados no âmbito de uma ação de contrafação ou por ameaça de contrafação.

    49

    A este propósito, não pode ser acolhida a argumentação segundo a qual a interpretação do conceito de «qualquer terceiro», na aceção do artigo 19.o, n.o 1, do regulamento, como abrangendo o terceiro titular de um desenho ou modelo comunitário registado posterior altera a repartição de competências entre os referidos tribunais e o IHMI, esvaziando de sentido a competência deste último em matéria de declaração de nulidade.

    50

    Com efeito, resulta das características acima expostas que as ações em matéria de contrafação e os pedidos de declaração de nulidade se distinguem entre si pelo seu objeto e pelos seus efeitos, de modo que a possibilidade de o titular de um desenho ou modelo comunitário registado anterior propor uma ação de contrafação contra o titular de um desenho ou modelo comunitário registado posterior não é suscetível de esvaziar de sentido a apresentação no IHMI de um pedido de declaração de nulidade contra esse desenho ou modelo.

    51

    Consequentemente, importa concluir que, na medida em que o desenho ou modelo comunitário registado posterior, cuja utilização foi proibida, continua a ser válido enquanto a sua nulidade não for declarada pelo IHMI ou pelo tribunal de desenhos e modelos comunitários no âmbito de um pedido reconvencional de declaração de nulidade, o sistema de recurso estabelecido pelo regulamento não é alterado pela conclusão enunciada no n.o 44 do presente acórdão.

    52

    À luz de todas as considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o artigo 19.o, n.o 1, do regulamento deve ser interpretado no sentido de que, num litígio relativo à violação do direito exclusivo conferido por um desenho ou modelo comunitário registado, o direito de proibir a utilização por terceiros do referido desenho ou modelo abrange qualquer terceiro que utilize um desenho ou modelo que não cause no utilizador informado uma impressão global diferente, incluindo o terceiro titular de um desenho ou modelo comunitário registado posterior.

    Quanto à segunda questão

    53

    Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se a resposta à primeira questão varia em função da intenção e do comportamento do terceiro titular do desenho ou modelo comunitário registado posterior.

    54

    O órgão jurisdicional de reenvio faz designadamente referência à situação no processo principal, em que a PROIN apenas registou o seu desenho ou modelo comunitário depois de ter recebido um requerimento extrajudicial da Cegasa.

    55

    A este respeito, há que declarar, em primeiro lugar, que, como salientaram todos os interessados que apresentaram observações ao Tribunal de Justiça, o alcance dos direitos conferidos pelo regulamento deve ser determinado de forma objetiva e não pode variar em função das circunstâncias relativas ao comportamento da pessoa que pede o registo de um desenho ou modelo comunitário.

    56

    Em segundo lugar, como salientou o advogado-geral, no essencial, no n.o 49 das suas conclusões, resulta do artigo 19.o, n.o 2, segundo parágrafo, do regulamento que o legislador da União teve efetivamente em conta a boa-fé para proteger o criador que não conhecia o desenho ou modelo não registado divulgado pelo titular.

    57

    Por outro lado, há que salientar que o legislador não incluiu no n.o 1 do mesmo artigo considerações relativas às intenções do terceiro.

    58

    Consequentemente, há que responder à segunda questão que a resposta à primeira questão é independente da intenção e do comportamento do terceiro.

    Quanto às despesas

    59

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

     

    1)

    O artigo 19.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 6/2002 do Conselho, de 12 de dezembro de 2001, relativo aos desenhos ou modelos comunitários, deve ser interpretado no sentido de que, num litígio relativo à violação do direito exclusivo conferido por um desenho ou modelo comunitário registado, o direito de proibir a utilização por terceiros do referido desenho ou modelo abrange qualquer terceiro que utilize um desenho ou modelo que não cause no utilizador informado uma impressão global diferente, incluindo o terceiro titular de um desenho ou modelo comunitário registado posterior.

     

    2)

    A resposta à primeira questão é independente da intenção e do comportamento do terceiro.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: espanhol.

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