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Document 62010CJ0283

Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 24 de Novembro de 2011.
Circul Globus Bucureşti (Circ & Variete Globus Bucureşti) contra Uniunea Compozitorilor şi Muzicologilor din România - Asociaţia pentru Drepturi de Autor (UCMR - ADA).
Pedido de decisão prejudicial: Înalta Curte de Casaţie şi Justiţie - Roménia.
Aproximação das legislações - Direitos de autor e direitos conexos - Directiva 2001/29/CE - Artigo 3.º - Conceito de ‘comunicação de uma obra a um público presente no local de origem da comunicação’ - Difusão das obras musicais na presença de um público, sem pagamento ao organismo de gestão colectiva dos direitos de autor da remuneração correspondente a esses direitos - Celebração de contratos de cessão dos direitos patrimoniais com os autores das obras - Âmbito de aplicação da Directiva 2001/29.
Processo C-283/10.

Colectânea de Jurisprudência 2011 -00000

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2011:772

Processo C-283/10

Circul Globus Bucureşti (Circ & Variete Globus Bucureşti)

contra

Uniunea Compozitorilor şi Muzicologilor din România – Asociaţia pentru Drepturi de Autor (UCMR – ADA)

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo

Inalta Curte de Casaţie şi Justiţie)

«Aproximação das legislações – Direitos de autor e direitos conexos – Directiva 2001/29/CE – Artigo 3.° – Conceito de ‘comunicação de uma obra a um público presente no local de origem da comunicação’ – Difusão das obras musicais na presença de um público, sem pagamento ao organismo de gestão colectiva dos direitos de autor da remuneração correspondente a esses direitos – Celebração de contratos de cessão dos direitos patrimoniais com os autores das obras – Âmbito de aplicação da Directiva 2001/29»

Sumário do acórdão

Aproximação das legislações – Direito de autor e direitos conexos – Directiva 2001/29 – Harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação – Comunicação ao público – Conceito

(Directiva 2001/29 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 3.º, n.º 1)

A Directiva 2001/29, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação, e, mais especificamente, o seu artigo 3.°, n.° 1, devem ser interpretados no sentido de que visam apenas a comunicação a um público que não está presente no local de origem da comunicação, ficando excluída qualquer outra comunicação de uma obra realizada directamente, num local aberto ao público, através de qualquer forma de execução pública ou de apresentação directa da obra.

(cf. n.º 41 e disp.)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

24 de Novembro de 2011 (*)

«Aproximação das legislações – Direitos de autor e direitos conexos – Directiva 2001/29/CE – Artigo 3.° – Conceito de ‘comunicação de uma obra a um público presente no local de origem da comunicação’ – Difusão das obras musicais na presença de um público, sem pagamento ao organismo de gestão colectiva dos direitos de autor da remuneração correspondente a esses direitos – Celebração de contratos de cessão dos direitos patrimoniais com os autores das obras – Âmbito de aplicação da Directiva 2001/29»

No processo C‑283/10,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Înalta Curte de Casaţie şi Justiţie (Roménia), por decisão de 14 de Maio de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 7 de Junho de 2010, no processo

Circul Globus Bucureşti (Circ & Variete Globus Bucureşti)

contra

Uniunea Compozitorilor şi Muzicologilor din România – Asociaţia pentru Drepturi de Autor (UCMR – ADA),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente de secção, J. Malenovský (relator), R. Silva de Lapuerta, E. Juhász e D. Šváby, juízes,

advogado‑geral: V. Trstenjak,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Uniunea Compozitorilor şi Muzicologilor din România – Asociaţia pentru Drepturi de Autor (UCMR – ADA), por A. Roată‑Palade, avocat,

–        em representação do Governo romeno, por A. Popescu, na qualidade de agente, A. Wellman e A. Borobeică, consultoras,

–        em representação do Governo espanhol, por N. Díaz Abad, na qualidade de agente,

–        em representação da Comissão Europeia, por J. Samnadda e I. V. Rogalski, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 3.°, n.° 1, da Directiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (JO L 167, p. 10).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Uniunea Compozitorilor şi Muzicologilor din România – Asociaţia pentru Drepturi de Autor (UCMR – ADA) (a seguir «UCMR – ADA») ao Circul Globus Bucureşti, actualmente Circ & Variete Globus Bucureşti (a seguir «circo Globus»), a propósito da pretensa violação, por este último, dos direitos de propriedade intelectual geridos pela UCMR – ADA.

 Quadro jurídico

 Direito internacional

3        Nos termos do artigo 11.° da Convenção de Berna para a Protecção das Obras Literárias e Artísticas (Acto de Paris de 24 de Julho de 1971), na sua versão resultante da alteração de 28 de Setembro de 1979 (a seguir «Convenção de Berna»):

«1.      Os autores de obras dramáticas, dramático‑musicais e musicais gozam do direito exclusivo de autorizar:

i)      A representação e execução públicas das suas obras, incluindo a representação e execução públicas por todos os meios ou processos;

ii)      A transmissão pública por todos os meios da representação e da execução das suas obras.

2.      Os mesmos direitos são concedidos aos autores de obras dramáticas ou dramático‑musicais durante a vigência dos seus direitos sobre a obra original, no que respeita a tradução das suas obras.»

 Direito da União

4        Nos termos do segundo e quinto considerandos da Directiva 2001/29:

«(2)      O Conselho Europeu reunido em Corfu em 24 e 25 de Junho de 1994 salientou a necessidade de criar, a nível comunitário, um enquadramento legal geral e flexível que estimule o desenvolvimento da sociedade da informação na Europa. Tal exige, nomeadamente, um mercado interno para os novos produtos e serviços. Existe já, ou está em vias de ser aprovada, importante legislação comunitária para criar tal enquadramento regulamentar. O direito de autor e os direitos conexos desempenham um importante papel neste contexto, uma vez que protegem e estimulam o desenvolvimento e a comercialização de novos produtos e serviços, bem como a criação e a exploração do seu conteúdo criativo.

[…]

(5)      O desenvolvimento tecnológico multiplicou e diversificou os vectores da criação, produção e exploração. Apesar de não serem necessários novos conceitos para a protecção da propriedade intelectual, a legislação e regulamentação actuais em matéria de direito de autor e direitos conexos devem ser adaptadas e complementadas para poderem dar uma resposta adequada à realidade económica, que inclui novas formas de exploração.»

5        O décimo oitavo considerando da Directiva 2001/29 tem a seguinte redacção:

«A presente directiva não prejudica as regras de gestão de direitos, existentes nos Estados‑Membros como, por exemplo, as licenças colectivas alargadas.»

6        Nos termos do vigésimo terceiro e vigésimo quarto considerandos desta directiva:

«(23)      A presente directiva deverá proceder a uma maior harmonização dos direitos de autor aplicáveis à comunicação de obras ao público. Esses direitos deverão ser entendidos no sentido lato, abrangendo todas as comunicações ao público não presente no local de onde provêm as comunicações. Abrangem ainda qualquer transmissão ou retransmissão de uma obra ao público, por fio ou sem fio, incluindo a radiodifusão, não abrangendo quaisquer outros actos.

(24)      O direito de colocar à disposição do público materiais contemplados no n.° 2 do artigo 3.° deve entender‑se como abrangendo todos os actos de colocação desses materiais à disposição do público não presente no local de onde [provêm] esses actos de colocação à disposição, não abrangendo quaisquer outros actos.»

7        O artigo 3.°, n.° 1, da referida directiva dispõe:

«Os Estados‑Membros devem prever a favor dos autores o direito exclusivo de autorizar ou proibir qualquer comunicação ao público das suas obras, por fio ou sem fio, incluindo a sua colocação à disposição do público por forma a torná‑las acessíveis a qualquer pessoa a partir do local e no momento por ela escolhido.»

 Direito nacional

8        O artigo 15.°, n.° 1, da Lei n.° 8/1996 sobre direitos de autor e direitos conexos (legea nr 8/1996 privind drepturile de autor şi drepturile conexe), alterada pela Lei n.° 285/2004 (a seguir «lei sobre direitos de autor»), prevê:

«Considera‑se comunicação ao público qualquer comunicação de uma obra, efectuada directamente ou através de todos os meios técnicos, realizada num local aberto ao público ou em local onde se reúna um número de pessoas que ultrapasse o círculo de familiares e conhecidos, incluindo a representação cénica, recital ou qualquer outra modalidade pública de execução e de apresentação directa de uma obra, a exposição pública de obras de arte plástica, de arte aplicada, fotográficas e arquitectónicas, a projecção pública de obras cinematográficas e de outras obras audiovisuais, incluindo as obras de arte digital, a apresentação em local público através de qualquer meio de radiodifusão. Considera‑se, ainda, pública qualquer comunicação de obras, com ou sem fio, realizada mediante a colocação à disposição do público, incluindo na Internet ou outras redes informáticas, de modo a que cada um dos membros do público possa ter acesso a elas quando e onde pretender. [...]»

9        O artigo 123.°, n.° 1, da lei sobre direitos de autor dispõe:

«Os titulares do direito de autor e dos direitos conexos podem exercer os direitos que lhes reconhece a presente lei, pessoalmente ou, com base num mandato, por intermédio de organismos de gestão colectiva, nas condições previstas pela presente lei.»

10      O artigo 123.° bis, n.os 1, alínea e), e 2, da lei sobre direitos de autor enuncia:

«(1)      A gestão colectiva é obrigatória para o exercício dos seguintes direitos:

[…]

e)      o direito de comunicar obras musicais ao público, excepto a projecção pública de obras cinematográficas;

[…]

(2)      Para as categorias de direitos referidos no n.° 1, as sociedades de gestão colectiva representam também os titulares de direitos que não lhes conferiram mandato.

[…]»

11      Nos termos do artigo 130.°, n.° 1, da lei sobre direitos de autor, os organismos de gestão colectiva têm o dever de:

«a)      conceder autorizações não exclusivas aos utilizadores que as solicitem antes de qualquer utilização do repertório protegido, em contrapartida de uma remuneração, mediante uma licença não exclusiva, sob forma escrita;

b)      elaborar metodologias para os respectivos domínios de actividade, incluindo os direitos patrimoniais adequados, que devem ser negociadas com os utilizadores para efeitos do pagamento dos referidos direitos, no caso de obras cujo modo de exploração torne impossível a concessão de uma autorização individual pelos titulares de direitos;

[…]

e)      angariar as quantias devidas pelos utilizadores e reparti‑las entre os titulares de direitos, em conformidade com as disposições do estatuto;

[…]

h)      pedir aos utilizadores ou aos respectivos intermediários que comuniquem as informações e transmitam os documentos necessários para calcular o montante das remunerações a angariar, bem como as informações relativas às obras utilizadas, com a identificação do nome dos titulares de direitos, para efeitos da sua repartição; […]»

12      O artigo 131.° bis, n.os 1, alínea e), e 4, desta lei enuncia:

«1.      As metodologias são negociadas pelos organismos de gestão colectiva e os representantes mencionados no artigo 131.°, n.° 2, alínea b), com base nos seguintes critérios principais:

[…]

e)      a proporção de utilizações a respeito da qual o utilizador cumpriu as obrigações de pagamento mediante contratos directos com os titulares de direitos;

[…]

4.      Nos casos em que a gestão colectiva é obrigatória em conformidade com as disposições do artigo 123.° bis, as negociações relativas às metodologias não devem ter em conta os critérios previstos no n.° 1, alíneas c) e e), os repertórios são considerados como repertórios ampliados.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

13      A UCMR – ADA é um organismo de gestão colectiva de direitos de autor no domínio musical.

14      Entre Maio de 2004 e Setembro de 2007, o circo Globus, na qualidade de organizador de espectáculos circenses e de cabaret, comunicou ao público obras musicais com fins lucrativos sem deter a licença «não exclusiva» da UCMR – ADA e sem lhe pagar as remunerações correspondentes aos direitos patrimoniais de autor.

15      A UCMR – ADA, por considerar que o circo Globus tinha lesado os seus direitos, propôs uma acção no Tribunalul Bucureşti (Tribunal de Grande Instância de Bucareste). Em apoio da sua acção, alegou que, em conformidade com as disposições da lei sobre direitos de autor, o exercício do direito de comunicar obras musicais ao público está sujeito à gestão colectiva obrigatória.

16      O circo Globus, por sua vez, respondeu que tinha celebrado, com os compositores das obras musicais utilizadas nos espectáculos por ele organizados, um contrato de cessão dos direitos patrimoniais de autor, e que lhes tinha pagado por essa utilização a remuneração adequada. Com efeito, uma vez que os titulares de direitos optaram, em conformidade com o artigo 123.°, n.° 1, da lei sobre direitos de autor, pela gestão individual dos seus direitos, a reclamação das remunerações por parte do organismo de gestão colectiva carecia de fundamento legal.

17      A Quarta Secção cível do Tribunalul Bucureşti julgou a acção parcialmente procedente e condenou o circo Globus no pagamento das quantias devidas pela comunicação ao público, com fins lucrativos, de obras musicais entre Maio de 2004 e Setembro de 2007, bem como nos correspondentes juros de mora. O circo Globus interpôs recurso, ao qual foi negado provimento pelo Curtea de Apel Bucureşti (Tribunal de Recurso de Bucareste).

18      Esses órgãos jurisdicionais declararam que, juridicamente, o artigo 123.° bis, n.° 1, alínea e), da lei sobre direitos de autor prevê expressamente que o exercício do direito de comunicar obras musicais ao público está sujeito a gestão colectiva obrigatória. Assim, o demandado tinha o dever de pagar à demandante a remuneração calculada segundo a metodologia negociada pelo organismo de gestão colectiva, sem ter em conta os contratos celebrados entre o demandado e os compositores para os vários espectáculos organizados entre 2004 e 2007.

19      O circo Globus interpôs a seguir recurso para o Înalta Curte de Casaţie şi Justiţie (Tribunal Supremo de Cassação e de Justiça) da decisão do Curtea de Apel Bucureşti no âmbito do qual invocou, nomeadamente, a transposição incorrecta da Directiva 2001/29 para o direito interno. Em seu entender, embora, nos termos do vigésimo terceiro e vigésimo quarto considerandos desta directiva, o direito de comunicação ao público esteja definido claramente, em sentido lato, de modo a abranger qualquer comunicação ao público não presente no local de origem da comunicação, o artigo 123.° bis da lei sobre direitos de autor não foi alterado e continua a impor a gestão colectiva do direito de comunicação ao público de obras musicais, sem distinguir entre a comunicação directa e a comunicação indirecta.

20      Assim, é acrescentada uma limitação adicional, além das previstas pela Directiva 2001/29, ao exercício do direito de comunicação ao público. Com efeito, entre os autores de obras musicais e os organizadores de espectáculos interpõe‑se o organismo de gestão colectiva, o que acarreta, para o autor, o pagamento de uma comissão imposta pelo organismo de gestão colectiva e, para o utilizador, um duplo pagamento visto que, embora adquira os direitos patrimoniais dos autores, tem de lhes pagar de novo por intermédio do organismo de gestão colectiva.

21      Em face destas afirmações, a UCMR – ADA responde que não existe nenhuma divergência entre o direito interno e a Directiva 2001/29, uma vez que apenas entram no âmbito de aplicação desta directiva os actos de comunicação ao público de obras musicais específicas da sociedade da informação. No que se refere ao direito de comunicação directa ao público, objecto do presente caso, o décimo oitavo considerando da Directiva 2001/29 permite que os Estados‑Membros exerçam a sua função legislativa e o legislador romeno optou por um sistema de gestão colectiva obrigatória.

22      Na sua decisão, o órgão jurisdicional de reenvio observa que, mesmo que o autor das obras musicais utilizadas não seja membro do organismo de gestão colectiva, o utilizador é obrigado a obter uma licença não exclusiva e a pagar uma remuneração ao organismo de gestão colectiva, em conformidade com o artigo 123.° bis, n.° 2, da lei sobre direitos de autor que prevê que, para as categorias de direitos visadas no n.° 1 desse artigo, os organismos de gestão colectiva representam igualmente os titulares de direitos que não lhes conferiram mandato.

23      Do mesmo modo, esta lei não contém nenhuma disposição que permita a esses titulares excluir as suas obras da gestão colectiva, possibilidade que é, por exemplo, expressamente prevista pelo artigo 3.°, n.° 2, da Directiva 93/83/CEE do Conselho, de 27 de Setembro de 1993, relativa à coordenação de determinadas disposições em matéria de direito de autor e direitos conexos aplicáveis à radiodifusão por satélite e à retransmissão por cabo (JO L 248, p. 15), no caso do direito de comunicação ao público por satélite.

24      O órgão jurisdicional de reenvio conclui daí que essa regulamentação parece constituir uma restrição excessiva à liberdade contratual e não corresponde ao duplo objectivo prosseguido pela gestão colectiva obrigatória do direito de comunicação pública das obras musicais, que consiste em permitir tanto a utilização das obras como a remuneração dos autores.

25      Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, nomeadamente, sobre a questão de saber se essa gestão colectiva responde não só ao objectivo de protecção dos direitos de autor mas também ao prosseguido pela Directiva 2001/29 que consiste em manter um justo equilibro entre os direitos dos autores e os dos utilizadores.

26      Nestas condições, o Înalta Curte de Casaţie şi Justiţie decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)       Deve o artigo 3.°, n.° 1, da Directiva 2001/29[…] ser interpretado no sentido de que, por ‘comunicação ao público’, se entende:

a)       exclusivamente a comunicação ao público que não se encontra presente no local de origem da comunicação, ou

b)      também qualquer outra comunicação de uma obra realizada directamente, em local aberto ao público, através de qualquer modalidade de execução pública ou de apresentação directa da obra?

2)      Caso a resposta à primeira questão seja a alternativa a), isso significa que os actos de comunicação directa das obras ao público mencionados na [alternativa] b) não estão abrangidos pelo âmbito de aplicação desta directiva ou que não constituem actos de comunicação ao público da obra, mas actos de representação e/ou de execução pública de uma obra na acepção do artigo 11.°, n.° 1, [alínea i)], da Convenção de Berna?

3)      Caso a resposta à primeira questão seja a alternativa b), o artigo 3.°, n.° 1, da [Directiva 2001/29] autoriza os Estados‑Membros a estabelecer, por via legislativa, uma gestão colectiva obrigatória do direito de comunicação ao público de obras musicais, independentemente do meio de comunicação, ainda que tal direito possa ser gerido individualmente e o seja por parte dos autores, sem prever a possibilidade de os autores excluírem as suas obras da gestão colectiva?»

 Quanto à competência do Tribunal de Justiça

27      Como resulta da decisão de reenvio, o litígio no processo principal diz respeito a factos que ocorreram ente Maio de 2004 e Setembro de 2007, sendo certo que a Roménia só aderiu à União Europeia em 1 de Janeiro de 2007.

28      A este respeito, importa recordar que o Tribunal de Justiça é competente para interpretar as disposições do direito da União unicamente no que se refere à aplicação dessas disposições num novo Estado‑Membro a partir da data da adesão deste último à União Europeia (v., neste sentido, acórdãos de 10 de Janeiro de 2006, Ynos, C‑302/04, Colect., p. I‑371, n.° 36, e de 14 de Junho de 2007, Telefónica O2 Czech Republic, C‑64/06, Colect., p. I‑4887, n.° 23).

29      Dado que os factos do processo principal são parcialmente posteriores à data de adesão da Roménia à União Europeia, o Tribunal de Justiça é competente para responder às questões submetidas (v., neste sentido, acórdão de 15 de Abril de 2010, CIBA, C‑96/08, Colect., p. I‑2911, n.° 15).

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira e segunda questões

30      Com a primeira e segunda questões, que importa examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se a Directiva 2001/29 e, mais especificamente, o seu artigo 3.°, n.° 1, devem ser interpretados no sentido de que visam apenas a comunicação a um público que não está presente no local de origem da comunicação ou igualmente qualquer comunicação de uma obra realizada directamente, num local aberto ao público, através de qualquer forma de execução pública ou de apresentação directa da obra.

31      Há que sublinhar que nem o artigo 3.°, n.° 1, da Directiva 2001/29 nem nenhuma outra das suas disposições define o conceito de «comunicação ao público».

32      Nesta situação, para interpretar um conceito de direito da União, deve ter‑se em conta não só a redacção da disposição em que esse conceito figura mas também o contexto em que se inscreve e os objectivos prosseguidos pela regulamentação de que o mesmo faz parte.

33      No que se refere, em primeiro lugar, ao contexto, importa notar que a segunda frase do vigésimo terceiro considerando da Directiva 2001/29 dispõe que os direitos de comunicação ao público «deverão ser entendidos no sentido lato, abrangendo todas as comunicações ao público não presente no local de onde provêm as comunicações».

34      A este respeito, no seu acórdão de 4 de Outubro de 2011, Football Association Premier League e o. (C‑403/08 e C‑429/08, Colect., p. I‑0000), o Tribunal de Justiça esclareceu o alcance do referido considerando e, mais especificamente, a respectiva segunda frase.

35      O Tribunal de Justiça recordou assim, apoiando‑se na génese da Directiva 2001/29, e mais especificamente na Posição Comum (CE) n.° 48/2000, adoptada pelo Conselho em 28 de Setembro de 2000 com vista à adopção da Directiva 2001/29 (JO C 344, p. 1), que o vigésimo terceiro considerando desta directiva dá seguimento à proposta do Parlamento Europeu que pretendia precisar, nesse considerando, que a comunicação ao público, na acepção da referida directiva, não abrange «as representações ou execuções directas», conceito que remete para o de «representação ou execução públicas» previsto no artigo 11.°, primeiro parágrafo, da Convenção de Berna, o qual engloba a interpretação das obras perante o público que se encontra em contacto físico e directo com o actor ou o executante dessas obras (v. acórdão Football Association Premier League e o., já referido, n.° 201).

36      Assim, para excluir tal representação e execução públicas directas do alcance do conceito de «comunicação ao público» no quadro da Directiva 2001/29, o referido considerando precisou que a comunicação ao público abrange qualquer comunicação ao público não presente no local de origem da comunicação (v. acórdão Football Association Premier League e o., já referido, n.° 202).

37      Ora, numa situação como a que está em causa no processo principal em que, como resulta da decisão de reenvio, as obras musicais comunicadas ao público, no âmbito de espectáculos circenses e de cabaret, são executadas em directo, esse elemento de contacto físico e directo existe, de modo que o público está, contrariamente ao requisito imposto pela segunda frase do vigésimo terceiro considerando da Directiva 2001/29, presente no local de origem da comunicação.

38      No que se refere, em seguida, ao objectivo prosseguido pela Directiva 2001/29, importa notar que resulta do seu segundo e quinto considerandos que esta tem por finalidade criar um quadro geral e flexível a nível da União a fim de favorecer o desenvolvimento da sociedade da informação e adaptar e completar as regras actuais em matéria de direitos de autor e direitos conexos de modo a ter em conta a evolução tecnológica, que deu lugar a novas modalidades de exploração das obras protegidas.

39      Daqui resulta que a harmonização pretendida pela Directiva 2001/29, a que se refere a primeira frase do vigésimo terceiro considerando, não é suposto visar as formas «tradicionais» de comunicação ao público, como a representação ou a execução directas de uma obra.

40      De resto, esta conclusão é corroborada pela terceira e quarta frases do vigésimo terceiro considerando da Directiva 2001/29, segundo as quais o direito de comunicação ao público abrange qualquer acto de transmissão ou retransmissão de uma obra ao público, por fio ou sem fio, incluindo a radiodifusão, não abrangendo quaisquer outros actos. Assim, esse direito não abrange actos que não impliquem uma «transmissão» ou «retransmissão» de uma obra, como os actos de representação ou de execução directos de uma obra.

41      Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à primeira e segunda questões que a Directiva 2001/29 e, mais especificamente, o seu artigo 3.°, n.° 1, devem ser interpretados no sentido de que visam apenas a comunicação a um público que não está presente no local de origem da comunicação, ficando excluída qualquer outra comunicação de uma obra realizada directamente, num local aberto ao público, através de qualquer forma de execução pública ou de apresentação directa da obra.

 Quanto à terceira questão

42      Tendo em conta a resposta dada à primeira e segunda questões, não há que responder à terceira questão submetida.

 Quanto às despesas

43      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

A Directiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação, e, mais especificamente, o seu artigo 3.°, n.° 1, devem ser interpretados no sentido de que visam apenas a comunicação a um público que não está presente no local de origem da comunicação, ficando excluída qualquer outra comunicação de uma obra realizada directamente, num local aberto ao público, através de qualquer forma de execução pública ou de apresentação directa da obra.

Assinaturas


* Língua do processo: romeno.

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