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Document 62010CJ0119

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 15 de Dezembro de 2011.
    Frisdranken Industrie Winters BV contra Red Bull GmbH.
    Pedido de decisão prejudicial: Hoge Raad der Nederlanden - Países Baixos.
    Marcas - Directiva 89/104/CEE - Artigo 5.º, n.º 1, alínea b) - Enchimento de latas de bebidas que ostentam um sinal semelhante ao de uma marca - Prestação de serviços a pedido e segundo as instruções de um terceiro - Acção do titular da marca contra o prestador.
    Processo C-119/10.

    Colectânea de Jurisprudência 2011 -00000

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2011:837

    Processo C‑119/10

    Frisdranken Industrie Winters BV

    contra

    Red Bull GmbH

    (pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Hoge Raad der Nederlanden)

    «Marcas – Directiva 89/104/CEE – Artigo 5.°, n.° 1, alínea b) – Enchimento de latas de bebidas que ostentam um sinal semelhante ao de uma marca – Prestação de serviços a pedido e segundo as instruções de um terceiro – Acção do titular da marca contra o prestador»

    Sumário do acórdão

    Aproximação das legislações – Marcas – Directiva 89/104 – Direito de o titular de uma marca se opor ao uso, por um terceiro, de um sinal idêntico ou semelhante para produtos ou serviços idênticos ou semelhantes – Utilização da marca na aceção do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), da directiva – Conceito

    [Directiva 89/104 do Conselho, artigo 5.°, n.° 1, alínea b)]

    O artigo 5.°, n.° 1, alínea b), da Primeira Directiva 89/104 relativa às marcas, deve ser interpretado no sentido de que um prestador de serviços que, a pedido e segundo as instruções de um terceiro, enche embalagens que lhe foram fornecidas por esse terceiro, o qual apôs previamente nessas embalagens um sinal idêntico ou semelhante a um sinal protegido como marca, não faz ele próprio um uso desse sinal susceptível de ser proibido por força desta disposição.

    Na medida em que esse prestador permite aos seus clientes o uso de sinais semelhantes a marcas, o seu papel não pode ser apreciado à luz das disposições da Directiva 89/104, antes devendo, se for o caso, ser examinado sob o ângulo de outras regras de direito.

    Por outro lado, a constatação de que o titular de uma marca não pode agir unicamente com base na Directiva 89/104 contra o prestador do serviço não tem de forma alguma por consequência permitir ao cliente desse prestador contornar a protecção conferida ao referido titular por esta directiva, desmembrando o processo de fabrico e confiando os diferentes elementos desse processo a diferentes prestadores de serviços. Com efeito, estas prestações podem ser imputáveis ao referido cliente que continua, portanto, a ser responsável por força desta directiva.

    (cf. n.os 35‑37 e disp.)







    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

    15 de Dezembro de 2011 (*)

    «Marcas – Directiva 89/104/CEE – Artigo 5.°, n.° 1, alínea b) – Enchimento de latas de bebidas que ostentam um sinal semelhante ao de uma marca – Prestação de serviços a pedido e segundo as instruções de um terceiro – Acção do titular da marca contra o prestador»

    No processo C‑119/10,

    que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Hoge Raad der Nederlanden (Países Baixos), por decisão de 19 de Fevereiro de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 4 de Março de 2010, no processo

    Frisdranken Industrie Winters BV

    contra

    Red Bull GmbH,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: A. Tizzano, presidente de secção, M. Safjan, M. Ilešič (relator), E. Levits e M. Berger, juízes,

    advogado‑geral: J. Kokott,

    secretário: C. Strömholm, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 10 de Março de 2011,

    vistas as observações apresentadas:

    –        em representação da Frisdranken Industrie Winters BV, por P. N. A. M. Claassen , advocaat,

    –        em representação da Red Bull GmbH, por S. Klos e A. Alkema, advocaten,

    –        em representação do Governo polaco, por M. Laszuk, na qualidade de agente,

    –        em representação da Comissão Europeia, por A. Nijenhuis e F. W. Bulst, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 14 de Abril de 2011,

    profere o presente

    Acórdão

    1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 5.°, n.os 1 e 3, da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1).

    2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Red Bull GmbH (a seguir «Red Bull») à Frisdranken Industrie Winters BV (a seguir «Winters») relativamente ao facto de esta encher com refrigerante latas que ostentam de sinais semelhantes a marcas da Red Bull.

     Quadro jurídico

    3        O artigo 5.°, n.os 1 a 3, da Directiva 89/104 dispõe:

    «1.      A marca registada confere ao seu titular um direito exclusivo. O titular fica habilitado a proibir que um terceiro, sem o seu consentimento, faça uso na vida comercial:

    a)      De qualquer sinal idêntico à marca para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca foi registada;

    b)      De um sinal relativamente ao qual, devido à sua identidade ou semelhança com a marca e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços a que a marca e o sinal se destinam, exista, no espírito do público, um risco de confusão que compreenda o risco de associação entre o sinal e a marca.

    2.      Qualquer Estado‑Membro poderá também estipular que o titular fique habilitado a proibir que terceiros façam uso, na vida comercial, sem o seu consentimento, de qualquer sinal idêntico ou semelhante à marca para produtos ou serviços que não sejam semelhantes àqueles para os quais a marca foi registada, sempre que esta goze de prestígio no Estado‑Membro e que o uso desse sinal, sem justo motivo, tire partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca ou os prejudique.

    3.      Pode nomeadamente ser proibido, caso se encontrem preenchidas as condições enumeradas nos n.os 1 e 2:

    a)      Apor o sinal nos produtos ou na respectiva embalagem;

    b)      Oferecer os produtos para venda ou colocá‑los no mercado ou armazená‑los para esse fim, ou oferecer ou fornecer serviços sob o sinal;

    c)      Importar ou exportar produtos com esse sinal;

    d)      Utilizar o sinal nos documentos comerciais e na publicidade.»

     Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    4        A Red Bull produz e comercializa uma bebida energética sob a marca mundialmente conhecida RED BULL. Procedeu a registos internacionais destas marcas, os quais são válidos, entre outros, nos países do Benelux.

    5        A Winters é uma empresa cuja actividade principal é o enchimento de latas com bebidas produzidas por si ou por terceiros.

    6        A Smart Drinks Ltd. (a seguir «Smart Drinks»), pessoa colectiva de direito das Ilhas Virgens Britânicas, é uma sociedade concorrente da Red Bull.

    7        A Winters encheu latas de refrigerantes para a Smart Drinks. Para o efeito, a Smart Drinks entregou à Winters latas vazias com as respectivas tampas, ostentando diferentes sinais, decorações e textos. Estas latas ostentavam num primeiro momento, nomeadamente os sinais «BULLFIGHTER», «PITTBULL», «RED HORN» e posteriormente os sinais «LONG HORN» e «LIVE WIRE». A Smart Drinks entregou também à Winters o extracto de base do refrigerante. A Winters encheu as latas, de acordo com as indicações/receitas da Smart Drink, com uma determinada quantidade do extracto, completou‑o com água e, sendo esse o caso, anidrino carbónico, e fechou as latas. Seguidamente, a Winters restituiu as latas cheias à Smart Drinks que as exportou para fora do Benelux.

    8        A Winters limitou‑se a cumprir os serviços de enchimento para a Smart Drinks, sem enviar as latas cheias a esta sociedade. Além disso, não entregou nem vendeu essas latas a terceiros.

    9        Em 2 de Agosto de 2006, a Red Bull requereu contra a Winters uma providência cautelar ao Rechtbank ‘s‑Hertogenbosch pedindo que fosse ordenada à Winters a cessação imediata e para o futuro de todo e qualquer o uso de sinais que se assemelhem ou se associem a um determinado número das suas marcas. A este propósito, a Red Bull afirmou que, ao encher latas que ostentam os sinais «BULLFIGHTER», «PITTBULL», «RED HORN», «LONG HORN» e «LIVE WIRE», a Winters viola os seus direitos de marca. O juiz competente em matéria de providências cautelares considerou que o enchimento das latas deve ser equiparado ao uso desses sinais, mas que só o sinal «BULLFIGHTER» em combinação com as latas utilizadas para esse efeito corresponde às marcas da Red Bull. Consequentemente, por sentença de 26 de Setembro de 2006, ordenou à Winters a cessação do enchimento das latas BULLFIGHTER.

    10      A Red Bull e a Winters interpuseram, respectivamente, recurso e recurso subordinado da referida sentença para o Gerechtshof te ’s Hertogenbosch.

    11      O Gerechtshof aprovou a conclusão do Rechtbank segundo a qual o enchimento das latas pela Winters deve ser equiparado ao uso dos sinais nelas apostos pela Smart Drinks. A este respeito, referiu‑se à função de origem da marca e ao facto de que, para o tipo de produtos em causa, a saber bebidas, um sinal só pode ser aposto combinando a bebida com uma embalagem que já ostenta esse sinal. Ao combinar o extracto diluído com água e as latas, ostentando os sinais em causa, para obter o produto final, a Winters apõe esses sinais no referido produto ainda que não os tenha aposto nas latas.

    12      No que diz respeito à semelhança entre os referidos sinais e as marcas da Red Bull, o Gerechtshof considerou‑a provada relativamente aos sinais «BULLFIGHTER», «PITTBULL» e «LIVE WIRE». Neste contexto, considerou que, no que respeita ao tipo de público a ter em consideração, a natureza dos produtos dita que se considere um público geral e – uma vez que os produtos que a Winters processa para a Smart Drinks não se destinam ao Benelux, mas a países terceiros – no sentido abstracto de um consumidor médio do Benelux.

    13      Consequentemente, por acórdão de 29 de Janeiro de 2008, o Gerechtshof, baseando‑se nas disposições da Convenção Benelux em matéria de propriedade intelectual (marcas e desenhos ou modelos), assinada em Haia em 25 de Fevereiro de 2005, que correspondem ao artigo 5.°, n.os 1, alínea b), e 2, da Directiva 89/104, ordenou à Winters a cessação do enchimento das latas BULLFIGHTER, PITTBULL e LIVE WIRE. A Winters interpôs recurso desse acórdão.

    14      Nestas condições, o Hoge Raad der Nederlanden decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1.      a)      O simples ‘enchimento’ de embalagens que ostentam um sinal […] deve ser considerado como uso desse sinal na vida comercial, na acepção do artigo 5.° da Directiva 89/104, mesmo que esse enchimento seja feito no âmbito de uma prestação de serviços a favor e a pedido de um terceiro, para distinguir os produtos desse terceiro?

    b)      Para a resposta à questão 1. a) é relevante o facto de se tratar da violação referida no artigo 5.°, n.° 1, proémio e alínea a) ou alínea b)?

    2.      Em caso de resposta afirmativa à questão 1. a), o uso do sinal também pode ser proibido no Benelux, com fundamento no artigo 5.° da Directiva 89/104, se os produtos que ostentam o sinal se destinarem exclusivamente à exportação para países fora (a) do território Benelux, ou (b) da União Europeia e, nestes territórios, não puderem ser observados pelo público excepto na empresa onde o enchimento foi efectuado?

    3.      Em caso de resposta afirmativa à questão 2. a) ou 2. b), que critério deve ser aplicado na resposta à questão de saber se existe violação da marca: deverá, nesse caso, ser aplicado o critério da percepção do consumidor (médio, normalmente informado, razoavelmente atento e avisado) do Benelux ou da União Europeia – que, tendo em conta as presentes circunstâncias, só poderá ser determinado de forma fictícia ou abstracta – ou deverá ser aplicado um critério diferente, como por exemplo a percepção do consumidor do país para onde os produtos são exportados?»

     Quanto às questões prejudiciais

     Quanto à primeira questão

    15      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 5.°, n.° 1, alíneas a) e b), da Directiva 89/104 deve ser interpretado no sentido de que um prestador de serviços que, por ordem e segundo as instruções de um terceiro, enche embalagens que lhe foram fornecidas por esse terceiro, o qual apôs previamente nessas embalagens um sinal idêntico ou semelhante a um sinal protegido enquanto marca, faz ele próprio um uso desse sinal susceptível de ser proibido por força desta disposição.

     Observações submetidas ao Tribunal de Justiça

    16      A Winters considera que o simples enchimento de uma embalagem que ostenta um sinal, efectuado a título de um serviço por conta de um terceiro, não constitui um uso do referido sinal na acepção do artigo 5.°, n.° 1, da Directiva 89/104. Baseia‑se, nomeadamente, no acórdão de 23 de Março de 2010, Google France e Google (C‑236/08 a C‑238/08, Colect., p. I‑2417, n.os 50, 56 e 57), no qual o Tribunal de Justiça decidiu que o prestador do serviço de referenciamento permite aos seus clientes fazerem uso de sinais que constituem as palavras‑chave, sem que, contudo, ele próprio faça esse uso e isto apesar de o referido serviço não só ser remunerado e criar as condições técnicas necessárias para o uso dos referidos sinais pelos clientes, mas também implicar um contacto directo com o público. A Winters conclui daí que, a fortiori, os seus próprios serviços que se limitam ao simples enchimento que faz parte do processo de fabrico, sem implicar um papel na venda das bebidas nem a mais pequena forma de contacto com o público, não podem ser qualificados de «uso».

    17      No essencial, esta posição é partilhada pelo Governo polaco que salienta, nomeadamente, que o aspecto exterior das latas não tem qualquer incidência na actividade da Winters nem nas vantagens económicas que esta empresa retira dessa actividade, que seriam as mesmas independentemente de as latas ostentarem ou não os referidos sinais. É verdade que a Winters exerce uma actividade económica, mas essa actividade tem um carácter puramente técnico, agindo a Winters na qualidade de mera executante.

    18      Além disso, as actividades enumeradas no artigo 5.°, n.° 3, da Directiva 89/104 só constituiriam uma violação no caso de os requisitos previstos no n.° 1 desse artigo estarem preenchidos. Não sendo esse o caso, pouco importa que o enchimento de uma lata que ostenta um sinal possa ser qualificado de «aposição» desse sinal no produto em causa. Por outro lado, a tese defendida pela Red Bull e pela Comissão Europeia é questionável uma vez que o sinal não é aposto no produto, mas sim, na embalagem. Acresce que, se essa tese fosse admitida, colocar‑se‑ia então a questão de saber se a empresa que violava o direito das marcas era a que imprimiu o sinal nas latas ou a que procedeu ao seu enchimento.

    19      Em contrapartida, a Red Bull e a Comissão consideram que o uso de um sinal, na acepção do artigo 5.°, n.° 1, da Directiva 89/104, abrange o enchimento de embalagens que ostentam um sinal, ainda que esse enchimento seja efectuado a título de prestação de serviços, sob as instruções do cliente e para distinguir os seus produtos.

    20      Antes de mais, o enchimento de latas que ostentam sinais equivale à «aposição» desses sinais no produto na acepção do artigo 5.°, n.° 3, alínea a), da Directiva 89/104, uma vez que é nesse momento do processo de fabrico que o sinal é associado ao produto. Com efeito, o conceito de «apor» deve ser entendido no sentido de que designa a criação da ligação física entre o sinal e o produto, independentemente da técnica através da qual essa ligação é criada. Além disso, decorre do n.° 61 do acórdão Google France e Google, já referido, que os actos enumerados no artigo 5.°, n.° 3, da Directiva 89/104 constituem exemplos de «usos» na acepção do referido artigo 5.°, n.° 1.

    21      Seguidamente, quando um prestador fornece a um cliente, a título oneroso, um serviço assente no uso de um sinal, esse uso deve ser qualificado de «uso na vida comercial». O facto de o prestador agir sob as instruções do cliente em nada altera a situação, continuando o serviço a ser uma actividade comercial.

    22      Por último, é irrelevante o facto de a sociedade que apõe o sinal nos produtos ou na respectiva embalagem o faça para produtos próprios ou a título de prestação de serviços a terceiros. Assim, a Directiva 89/104 assenta no princípio de que determinados actos, nomeadamente os visados no seu artigo 5.°, n.° 3, estão reservados ao titular da marca registada. É incompatível com este princípio e com a finalidade do referido artigo 5.° subtrair ao seu âmbito de aplicação actos de produção e comercialização executados por uma pessoa sem o consentimento do referido titular pelo simples facto de os produtos não pertencerem a essa pessoa. Com efeito, o objectivo desta disposição não poderia ser atingido se fosse possível contornar a protecção do titular da marca desmembrando pura e simplesmente o processo de fabrico e confiando os diferentes elementos desse processo a contratantes diferentes.

    23      Esta interpretação é confirmada pelo acórdão Google France e Google, já referido (n.os 60 e 61) e pelo despacho de 19 de Fevereiro de 2009, UDV North America (C‑62/08, Colect., p. I‑1279, n.os 39 a 43). Além disso, decorre da economia do referido artigo 5, n.° 3, que o titular da marca pode proibir os actos que aí são previstos em separado e, portanto, opor‑se à aposição da sua marca independentemente de saber se quem a apõe também comercializa depois os produtos em causa.

     Resposta do Tribunal de Justiça

    24      A título preliminar, deve observar‑se que resulta da decisão de reenvio que os sinais em causa que as latas enchidas pela Winters ostentam são, quando muito, semelhantes aos sinais protegidos da Red Bull e não iguais a estes. Nestas condições, é de rejeitar desde logo que a Red Bull possa, com base no artigo 5.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 89/104, que exige a identidade dos sinais em causa, proibir à Winters o enchimento dessas latas. Consequentemente, cabe ao Tribunal de Justiça, no âmbito do presente processo, pronunciar‑se exclusivamente sobre a interpretação do referido artigo 5.°, n.° 1, alínea b), para cuja aplicação é suficiente a semelhança dos referidos sinais.

    25      Em aplicação do artigo 5.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/104, o titular da marca está habilitado a proibir o uso por um terceiro, sem o seu consentimento, de um sinal idêntico ou semelhante à sua marca, quando esse uso ocorra na vida comercial, seja feito em relação a produtos ou serviços idênticos ou semelhantes àqueles para os quais a marca está registada e, devido à existência de um risco de confusão no espírito do público, lese ou seja susceptível de lesar a função essencial da marca que é garantir aos consumidores a proveniência dos produtos ou dos serviços [v., nomeadamente, acórdão de 12 de Junho de 2008, O2 Holdings e O2 (UK), C‑533/06, Colect., p. I‑4231, n.° 57 e jurisprudência aí referida].

    26      No processo principal, é pacífico que a Winters exerce uma actividade comercial e visa uma vantagem económica quando enche, na qualidade de prestador de serviços, a pedido e segundo as instruções da Smart Drinks, latas que esta lhe forneceu e onde apôs previamente sinais semelhantes às marcas da Red Bull.

    27      Também é pacífico que a aposição prévia desses sinais nas latas, o seu enchimento com o refrigerante e a posterior exportação do produto final, a saber as latas cheias que ostentam os referidos sinais, ocorre sem o consentimento da Red Bull.

    28      Embora resulte destes elementos que um prestador de serviços como a Winters opera na vida comercial quando enche essas latas a pedido de um terceiro, não resulta de tais elementos, no entanto, que esse prestador faça ele próprio «uso» destes sinais na acepção do artigo 5.° da Directiva 89/104 (v., por analogia, acórdão Google France e Google, já referido, n.° 55).

    29      Na verdade, o Tribunal de Justiça já declarou que o facto de criar as condições técnicas necessárias para o uso de um sinal e de ser remunerado por esse serviço não significa que aquele que presta o serviço faça ele próprio uso do referido sinal (acórdão Google France e Google, já referido, n.° 57).

    30      Ora, há que observar que um prestador de serviços que, em condições como as do processo principal, se limita, a pedido e segundo as instruções de um terceiro, a encher latas que já ostentam sinais semelhantes a marcas e, consequentemente, a executar simplesmente uma parte técnica do processo de fabrico do produto final, sem ter qualquer interesse na apresentação externa das referidas latas, nomeadamente nos sinais que aí figuram, não faz ele próprio «uso» desses sinais na acepção do artigo 5.° da Directiva 89/104, mas cria unicamente as condições técnicas necessárias para que o terceiro em causa possa fazer esse uso.

    31      A esta conclusão acresce o facto de um prestador na situação da Winters não fazer, em qualquer caso, uso dos referidos sinais «para produtos ou serviços idênticos» ou semelhantes àqueles para os quais a marca foi registada, na acepção do referido artigo. Com efeito, o Tribunal de Justiça já referiu que esta expressão diz respeito, em princípio, aos produtos ou serviços do terceiro que faz uso do sinal [v. acórdãos de 25 de Janeiro de 2007, Adam Opel, C‑48/05, Colect., p. I‑1017, n.os 28 e 29; O2 Holdings e O2 (UK), já referido, n.° 34, e Google France e Google, já referido, n.° 60]. É pacífico que no processo principal o serviço prestado pela Winters consiste no enchimento das latas e que esse serviço não tem qualquer semelhança com o produto para o qual as marcas da Red Bull foram registadas.

    32      É verdade que o Tribunal de Justiça também entendeu que a referida expressão pode, em determinadas condições, dizer respeito a produtos ou serviços de outra pessoa por conta da qual o terceiro age. Assim, considerou que uma situação em que o prestador de um serviço usa um sinal que corresponde a uma marca de outrem para promover produtos que um dos seus clientes comercializa com o apoio deste serviço está abrangida por esta mesma expressão sempre que este uso é feito de tal modo que se estabelece um nexo entre o referido sinal e o referido serviço do prestador (v., neste sentido, acórdãos Google France e Google, já referido, n.° 60; de 12 de Julho de 2011, L’Oréal e o., C‑324/09, ainda não publicado na Colectânea, n.os 91 e 92, e despacho UDV North America, já referido, n.os 43 a 51).

    33      Contudo, como salientou a advogada‑geral no n.° 28 das suas conclusões, o enchimento de latas que ostentam sinais semelhantes a marcas não é, por natureza, comparável a um serviço que visa promover a comercialização de produtos que ostentam esses sinais e não implica, nomeadamente, o estabelecimento de um nexo entre esses sinais e o serviço de enchimento. Com efeito, a empresa que efectua o enchimento não aparece perante o consumidor, o que exclui qualquer associação entre os seus serviços e os referidos sinais.

    34      Uma vez que resulta do que precede que os requisitos estabelecidos no artigo 5.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/104 não estão preenchidos numa situação como a que está em causa no processo principal, de modo que o titular não pode com este fundamento proibir ao prestador do serviço o enchimento das latas que ostentam sinais semelhantes às suas marcas, não é relevante a questão de saber se este enchimento constitui ou não uma aposição de sinais nos produtos ou na respectiva embalagem, na acepção do n.° 3, alínea a), deste artigo.

    35      Na medida em que esse prestador permite aos seus clientes o uso de sinais semelhantes a marcas, o seu papel não pode ser apreciado à luz das disposições da Directiva 89/104, antes devendo, se for o caso, ser examinado sob o ângulo de outras regras de direito (v. por analogia, acórdãos, já referidos, Google France e Google, n.° 57, e L’Oréal e o., n.° 104).

    36      Por outro lado, contrariamente ao que receiam a Red Bull e a Comissão, a constatação de que o titular de uma marca não pode agir unicamente com base na Directiva 89/104 contra o prestador do serviço não tem de forma alguma por consequência permitir ao cliente desse prestador contornar a protecção conferida ao referido titular por esta directiva, desmembrando o processo de fabrico e confiando os diferentes elementos desse processo a diferentes prestadores de serviços. A este respeito, basta observar que estas prestações podem ser imputáveis ao referido cliente que continua, portanto, a ser responsável por força desta directiva.

    37      Face às considerações que precedem, deve responder‑se à primeira questão que o artigo 5.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/104 deve ser interpretado no sentido de que um prestador de serviços que, a pedido e segundo as instruções de um terceiro, enche embalagens que lhe foram fornecidas por esse terceiro, o qual apôs previamente nessas embalagens um sinal idêntico ou semelhante a um sinal protegido como marca, não faz ele próprio um uso desse sinal susceptível de ser proibido por força desta disposição.

     Quanto à segunda e à terceira questões prejudiciais

    38      Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, não há que responder à segunda e à terceira questões.

     Quanto às despesas

    39      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

    O artigo 5.°, n.° 1, alínea b), da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas, deve ser interpretado no sentido de que um prestador de serviços que, a pedido e segundo as instruções de um terceiro, enche embalagens que lhe foram fornecidas por esse terceiro, o qual apôs previamente nessas embalagens um sinal idêntico ou semelhante a um sinal protegido como marca, não faz ele próprio um uso desse sinal susceptível de ser proibido por força desta disposição.

    Assinaturas


    * Língua do processo: neerlandês.

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