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Document 62010CJ0107

Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 12 de Maio de 2011.
Enel Maritsa Iztok 3 AD contra Direktor «Obzhalvane i upravlenie na izpalnenieto» NAP.
Pedido de decisão prejudicial: Administrativen sad Sofia-grad - Bulgária.
Reenvio prejudicial - IVA - Directivas 77/388/CEE e 2006/112/CE - Reembolso - Prazo - Juros - Compensação - Princípios da neutralidade fiscal e da proporcionalidade - Protecção da confiança legítima.
Processo C-107/10.

Colectânea de Jurisprudência 2011 I-03873

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2011:298

Processo C‑107/10

Enel Maritsa Iztok 3 AD

contra

Direktor «Obzhalvane i upravlenie na izpalnenieto» NAP

(pedido de decisão prejudicial apresentado pel

Administrativen sad Sofia‑grad)

« Reenvio prejudicial – IVA – Directivas 77/388/CEE e 2006/112/CE – Reembolso – Prazo – Juros – Compensação – Princípios da neutralidade fiscal e da proporcionalidade – Protecção da confiança legítima»

Sumário do acórdão

1.        Disposições fiscais – Harmonização das legislações – Impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado – Dedução do imposto pago a montante – Restituição do excedente

(Directiva 2006/112 do Conselho, conforme alterada pela Directiva 2006/138, artigo 183.°)

2.        Disposições fiscais – Harmonização das legislações – Impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado – Dedução do imposto pago a montante – Restituição do excedente

(Directiva 2006/112 do Conselho, conforme alterada pela Directiva 2006/138, artigo 183.°)

3.        Disposições fiscais – Harmonização das legislações – Impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado – Dedução do imposto pago a montante – Restituição do excedente

(Directiva 2006/112 do Conselho, conforme alterada pela Directiva 2006/138, artigo 183.°)

1.        O artigo 183.° da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, conforme alterada pela Directiva 2006/138/CE do Conselho, de 19 de Dezembro de 2006, conjugado com o princípio da protecção da confiança legítima, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que prevê, com efeito retroactivo, a prorrogação do prazo em que deve ser efectuado o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado pago em excesso, na medida em que essa legislação priva o sujeito passivo do direito de que dispunha, antes da sua entrada em vigor, de obter juros de mora sobre o montante que lhe deve ser reembolsado.

(cf. n.° 41 e disp. 1)

2.        O artigo 183.° da Directiva 2006/112, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, conforme alterada pela Directiva 2006/138, à luz do princípio da neutralidade fiscal, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional segundo a qual o prazo normal para efectuar o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado pago em excesso, no termo do qual são devidos juros de mora sobre o montante que deve ser reembolsado, é prorrogado no caso de ser iniciado um procedimento inspecção fiscal, prorrogação esta que tem como consequência que esses juros só são devidos a partir da data em que o procedimento estiver concluído, apesar de esse excesso já ter sido objecto de reporte para os três períodos tributáveis seguintes àquele em que se revelou. Pelo contrário, o facto de esse prazo normal estar fixado em 45 dias não é contrário à referida disposição.

(cf. n.° 61 e disp. 2)

3.        O artigo 183.° da Directiva 2006/112, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, conforme alterada pela Directiva 2006/138, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado pago em excesso seja efectuado por compensação.

Com efeito, os Estados‑Membros dispõem de uma certa margem de discricionariedade relativamente às modalidades de reembolso do IVA pago em excesso, desde que esse reembolso seja efectuado num prazo razoável, através do pagamento em dinheiro ou de forma equivalente e que o sujeito passivo não corra nenhum risco financeiro.

(cf. n.os 64, 67 e disp. 3)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

12 de Maio de 2011 (*)

«Reenvio prejudicial – IVA – Directivas 77/388/CEE e 2006/112/CE – Reembolso – Prazo – Juros – Compensação – Princípios da neutralidade fiscal e da proporcionalidade – Protecção da confiança legítima»

No processo C‑107/10,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Administrativen sad Sofia‑grad (Bulgária), por decisão de 15 de Fevereiro de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 25 de Fevereiro de 2010, no processo

Enel Maritsa Iztok 3 AD

contra

Direktor «Obzhalvane i upravlenie na izpalnenieto» NAP,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente de secção, D. Šváby, R. Silva de Lapuerta, E. Juhász e T. von Danwitz (relator), juízes,

advogado‑geral: Y. Bot,

secretário: C. Strömholm, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 20 de Janeiro de 2011,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Enel Maritsa Iztok 3 AD, por L. Ruessmann, avocat, e S. Yordanova, advokat,

–        em representação do direktor «Obzhalvane i upravlenie na izpalnenieto» NAP, por A. Georgiev e I. Atanasova Kirova, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo búlgaro, por T. Ivanov e E. Petranova, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por D. Triantafyllou e S. Petrova, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 18.°, n.° 4, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54), conforme alterada pela Directiva 2006/98/CE do Conselho, de 20 de Novembro de 2006 (JO L 363, p. 129, a seguir «Sexta Directiva»), e do artigo 183.°, primeiro parágrafo, da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO L 347, p. 1), conforme alterada pela Directiva 2006/138/CE do Conselho, de 19 de Dezembro de 2006 (JO L 384, p. 92, a seguir «Directiva IVA»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Enel Maritsa Iztok 3 AD (a seguir «Enel») ao direktor «Obzhalvane i upralvenie na izpalnenieto» NAP (director do Departamento «Impugnação e Gestão da Execução» da Administração Central da Agência Nacional das Receitas Fiscais, a seguir «direktor»), relativamente à data pertinente a partir da qual são devidos juros de mora sobre um montante do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») a reembolsar.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        O artigo 18.°, n.os 2 a 4, da Sexta Directiva dispõe:

«2.      O sujeito passivo efectuará a dedução subtraindo do montante total do imposto devido num determinado período fiscal o montante do imposto em relação ao qual, durante o mesmo período, o direito à dedução surge e é exercido por força do n.° 1.

Todavia, os Estados‑Membros podem obrigar os sujeitos passivos que efectuem operações ocasionais referidas no n.° 3 do artigo 4.° a exercerem o direito à dedução apenas no momento da entrega.

[...]

4.      Quando o montante das deduções autorizadas exceder o montante do imposto devido num determinado período fiscal, os Estados‑Membros podem operar o transporte do excedente para o período seguinte, ou proceder ao respectivo reembolso, nas condições por eles fixadas.

Todavia, os Estados‑Membros podem recusar o transporte ou o reembolso quando o excedente for insignificante.»

4        Nos termos do artigo 183.° da Directiva IVA:

«Quando o montante das deduções exceder o montante do IVA devido relativamente a um período de tributação, os Estados‑Membros podem efectuar o reporte do excedente para o período seguinte, ou proceder ao respectivo reembolso nas condições por eles fixadas.

Todavia, os Estados‑Membros podem não autorizar o reporte ou o reembolso quando o excedente for insignificante.»

5        O artigo 252.° da Directiva IVA dispõe:

«1.      A declaração de IVA deve ser entregue num prazo a fixar pelos Estados‑Membros. Esse prazo não pode exceder em mais de dois meses o termo de cada período de tributação.

2.      O período de tributação é fixado pelos Estados‑Membros em um, dois ou três meses.

Os Estados‑Membros podem, todavia, fixar períodos diferentes, desde que não excedam um ano.»

 Direito nacional

6        Nos termos do artigo 87.° da Lei do Imposto sobre o Valor Acrescentado (Zakon za danak varhu dobavenata stoynost, a seguir «lei do IVA), o período de tributação é, em geral, fixado em um mês.

7        O artigo 92.° da lei do IVA, na versão em vigor até 18 de Dezembro de 2007, dispunha:

«(1)      O montante do imposto a reembolsar a título do artigo 88.°, n.° 3, é compensado, deduzido ou reembolsado de acordo com as seguintes modalidades:

1.      Perante outras dívidas fiscais ou dívidas relativas a contribuições para a segurança social devidas e não pagas, cobradas pela Agência Nacional das Receitas Fiscais, e que tiveram origem antes da data de apresentação da declaração fiscal, a Administração das Receitas Fiscais compensa essas dívidas com o montante a reembolsar nos termos da declaração fiscal; os montantes residuais, sendo caso disso, são sujeitos ao procedimento referido no ponto 2.

2.      Na falta de outras dívidas devidas e não pagas na acepção do ponto 1, ou se o montante dessas dívidas for inferior ao montante a reembolsar resultante da declaração fiscal, a pessoa registada deduz o montante a reembolsar ou o montante residual, na acepção do ponto 1, dos montantes devidos resultantes da declaração fiscal a título dos três períodos de tributação seguintes.

[...]

4.      Se, após o termo do prazo referido no ponto 2, subsistir um montante residual a reembolsar, a Administração das Receitas Fiscais compensa esse montante residual com outras dívidas fiscais devidas e não pagas ou outras dívidas relativas a contribuições para a segurança social cobradas pela Agência Nacional das Receitas Fiscais, ou reembolsa os referidos montantes residuais nos 45 dias após a apresentação da declaração fiscal seguinte.

[...]

(8)      Os montantes reembolsáveis que não tenham sido reembolsados nos prazos fixados pela presente lei, sem motivo ou por motivos caducos (incluindo a anulação de uma decisão), devem ser reembolsados acrescidos dos juros de mora legais, calculados a contar da data em que esses impostos deviam ter sido reembolsados nos termos da presente lei e até ao momento do seu reembolso definitivo, independentemente da suspensão e recomeço dos prazos durante o procedimento fiscal. Está‑se em presença de um imposto que não foi reembolsado por motivos que já não são válidos também quando, após a inspecção fiscal, o imposto a reembolsar estabelecido corresponde ao montante declarado ou é de montante inferior, quanto à parte sujeita à obrigação de reembolso.»

8        O artigo 92.° da lei do IVA, na versão em vigor desde 19 de Dezembro de 2007, enuncia:

«[...]

(8)      Independentemente do disposto no n.° 1, ponto 4, e nos n.os 3 a 6, quando uma pessoa foi objecto de uma inspecção, o prazo de reembolso dos impostos corresponde ao prazo fixado para a emissão da liquidação adicional, com excepção dos casos em que a pessoa em causa prestou uma caução em dinheiro, em títulos de Estado ou através de uma garantia bancária irrevogável à primeira solicitação [...]

[...]

(10)      Os montantes reembolsáveis que não tenham sido reembolsados nos prazos fixados pela presente lei, sem motivos ou por motivos caducos (incluindo a anulação de uma decisão), devem ser reembolsados acrescidos dos juros de mora legais, calculados a contar da data em que esses impostos deviam ter sido reembolsados nos termos da presente lei e até ao momento do seu reembolso definitivo, independentemente da suspensão e do recomeço dos prazos durante o procedimento fiscal.»

9        Nos termos do artigo 93.°, n.° 1, da lei do IVA, na versão aplicável até 18 de Dezembro de 2007:

«Os prazos de reembolso nos termos do artigo 92.°, n.° 1, ponto 4, e n.os 3 e 4, são suspensos:

[...]

5.      Quando é iniciado um procedimento de inspecção relativamente a uma pessoa, até à conclusão desse procedimento, no prazo previsto no artigo 114.° do Código do Procedimento Tributário e da Segurança Social.»

10      O artigo 93.°, n.° 1, ponto 5, da lei do IVA foi revogado a partir de 19 de Dezembro de 2007.

11      O artigo 114.° do Código do Procedimento Tributário e da Segurança Social prevê:

«(1)      O prazo para a execução de uma inspecção fiscal é de três meses a contar da data da notificação da decisão que a ordena.

(2)      Se o prazo referido no n.° 1 se afigurar insuficiente, pode ser prorrogado por um mês, no máximo, através de uma decisão de prorrogação emitida pela autoridade que ordenou a inspecção.»

12      O artigo 117.° do Código do Procedimento Tributário e da Segurança Social enuncia:

«(1)      O relatório da inspecção fiscal é redigido pela Administração das Receitas Fiscais, que efectua a inspecção nos 14 dias após o termo do prazo para a sua execução.

[...]

(5)      A pessoa sujeita à inspecção pode apresentar uma reclamação escrita e provas às autoridades que a efectuaram, num prazo de 14 dias a contar da notificação do relatório da inspecção. Se esse prazo for insuficiente, pode ser prorrogado, a pedido da pessoa em causa, no máximo, por um mês.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

13      Em 11 de Outubro de 2007, a Enel apresentou uma declaração fiscal da qual resultava o direito ao reembolso de 2 273 514,85 BGN pela Administração Fiscal búlgara. Este montante resultava do facto de o montante das deduções ultrapassar o do IVA devido para o período tributável em causa e de a Enel não poder efectuar essas deduções nos períodos tributáveis seguintes. Em conformidade com o artigo 92.°, n.° 1, ponto 4, da lei do IVA, na versão em vigor até 18 de Dezembro de 2007, o prazo para efectuar o reembolso, a saber, de 45 dias, tinha expirado, em circunstâncias normais, em 26 de Novembro de 2007, o que implicava, em conformidade com o artigo 92.°, n.° 8, dessa lei, a obrigação da referida autoridade fiscal de pagar juros de mora a partir dessa data.

14      Ora, em 8 de Novembro de 2007, a Enel foi notificada de uma decisão que ordenava uma inspecção fiscal, destinada a determinar dívidas de IVA no período compreendido entre 1 de Janeiro de 2005 e 30 de Setembro de 2007 e dívidas relativas a outros impostos respeitantes aos anos de 2005 e 2006.

15      Por decisão de 19 de Dezembro de 2007, relativa ao pedido de dedução e de reembolso, foi ordenado o reembolso do montante de 1 364 108,9 BGN a título de IVA, com base na declaração fiscal de 11 de Outubro de 2007, tendo este montante sido depositado na conta da sociedade em 21 de Dezembro de 2007.

16      A inspecção fiscal deu origem a um relatório datado de 13 de Março de 2008, do qual a Enel deduziu uma reclamação em que alegava o seu direito aos juros de mora sobre o montante de 1 364 108,91 BGN já reembolsado, relativo ao período compreendido entre 27 de Novembro de 2007 e 21 de Dezembro de 2007, e sobre o montante residual a reembolsar, relativo ao período compreendido entre 27 de Novembro de 2007 e a data do reembolso efectivo.

17      Em 29 de Abril de 2008, foi feita uma liquidação adicional. Esta liquidação não contém nenhuma observação relativa ao pagamento de juros de mora.

18      Do montante do imposto a reembolsar à Enel com base nessa liquidação adicional foram deduzidos, com base na mesma liquidação, as dívidas fiscais, acrescidas de juros de mora, relativas aos exercícios de 2005 a 2006. Em 13 de Maio de 2008, foi depositado na conta da Enel o montante residual de 179 092,25 BGN, sem que tenha sido tomada uma decisão sobre os juros de mora vencidos.

19      Em 20 de Maio de 2008, a Enel interpôs um recurso administrativo da liquidação adicional de 29 de Abril de 2008, contestando as dívidas fiscais acrescidas dos juros de mora, a compensação dessas dívidas com as quantias que lhe deviam ser reembolsadas e a recusa implícita de lhe conceder os juros de mora solicitados na sua reclamação de 13 de Março de 2008.

20      Este recurso deu origem à decisão n.° 1518 do direktor, de 20 de Outubro de 2008. Ao abrigo desta decisão, foram concedidos juros de mora sobre o montante de 179 092,25 BGN, para o período compreendido entre a data da adopção da liquidação adicional, 29 de Abril de 2008, e o reembolso efectivo desse montante, 13 de Maio de 2008. Quanto ao resto, foi negado provimento ao recurso.

21      Em 31 de Outubro de 2008, a Enel interpôs um recurso para o Administrativen sad Sofia‑grad (Tribunal Administrativo de Sófia) em que pedia, nomeadamente, que os juros de mora relativos ao montante do IVA a reembolsar fossem pagos a partir de 27 de Novembro de 2007 até à data do reembolso efectivo da totalidade desse montante.

22      O órgão jurisdicional de reenvio considera que, para decidir sobre este pedido, é necessária uma interpretação das disposições pertinentes da Sexta Directiva ou da Directiva IVA. Na sua opinião, a Sexta Directiva é aplicável ratione temporis, nos termos do artigo 2.° do Acto relativo às condições de adesão da República da Bulgária e da Roménia e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 2005, L 157, p. 203), e do anexo VI, capítulo 6, ponto 1, deste acto.

23      Consequentemente, o Administrativen sad Sofia‑grad decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«O artigo 18.°, n.° 4, da [Sexta Directiva] e o artigo 183.°, primeiro parágrafo, da [Directiva IVA], nas circunstâncias do processo principal:

1)      Devem ser interpretados no sentido de que permitem que, ao abrigo de uma alteração legislativa aprovada com o objectivo de lutar contra a fraude fiscal, se prorrogue o prazo de reembolso do IVA até à data de emissão de uma liquidação adicional, por se ter iniciado, no prazo de 45 dias após a apresentação da declaração fiscal, [uma inspecção] ao interessado, sem que durante esse período se devam pagar juros sobre o montante a reembolsar, se simultaneamente se verificarem as seguintes circunstâncias:

a)      antes da alteração legislativa tinha terminado o prazo legal de 45 dias para o reembolso do imposto e, independentemente do início [da inspecção], tinham começado a vencer‑se juros sobre o montante a reembolsar;

b)      [da inspecção] fiscal resultou a correcção do montante de reembolso declarado;

c)      a única possibilidade legal que o sujeito passivo tem de reduzir esse prazo é prestar uma garantia de montante equivalente ao montante a reembolsar, em dinheiro, títulos de Estado ou garantia bancária incondicional e irrevogável, de duração determinada?

2)      Devem ser interpretados no sentido de que permitem estabelecer um prazo de reembolso do IVA com uma duração de 45 dias a contar da data de apresentação da declaração desse imposto, bem como a possibilidade legal de suspender e posteriormente prorrogar tal prazo mediante o início, durante o mesmo, de [uma inspecção] fiscal, tendo em conta que o período tributário para liquidar esse imposto é de um mês?

3)      Devem ser interpretados no sentido de que permitem que se efectue o reembolso do IVA mediante uma liquidação adicional em que se compense[m] [com] o montante a reembolsar [as] dívidas tributárias de IVA e de outros impostos e […] créditos públicos correspondentes a diferentes períodos tributários, todos eles determinados na própria liquidação adicional, bem como […] os juros liquidados sobre tais montantes até à data de emissão da liquidação adicional, tendo em conta que durante [a inspecção] foi declarada a correcção do montante a reembolsar declarado e, ao mesmo tempo, se verificam as seguintes circunstâncias:

a)      no procedimento [de inspecção] fiscal não foi prestada uma garantia provisória relativa a futuros créditos públicos que pudessem ser determinados no decurso do procedimento para emitir a liquidação adicional;

b)      a compensação [de] créditos públicos não está prevista no direito nacional como meio de execução coerciva nem como medida cautelar;

c)      os prazos de impugnação e de pagamento voluntário dos montantes principais e juros compensados não tinham terminado, dado que esses montantes foram determinados na mesma liquidação adicional, e parte deles foram impugnados por via judicial?

4)      Devem ser interpretados no sentido de que permitem que, na hipótese de que se tenha verificado a correcção do montante a reembolsar indicado na declaração fiscal, o Estado proceda à compensação [com esse] montante [de] dívidas tributárias determinadas na própria liquidação adicional correspondentes a períodos anteriores à apresentação da declaração fiscal, bem como [de] juros sobre essas dívidas, e efectue a referida compensação na data de emissão da liquidação adicional, em vez de a efectuar na data de apresentação da declaração, tendo em conta que o Estado não deve juros durante o prazo legal de reembolso, mas cobra juros sobre os impostos compensados a partir do dia de apresentação da declaração até à data de emissão da liquidação adicional?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Observações preliminares

24      Na medida em que as questões prejudiciais dizem respeito tanto às disposições da Sexta Directiva como às da Directiva IVA, deve observar‑se que os factos pertinentes do litígio no processo principal são posteriores a 1 de Janeiro de 2007, data em que a Directiva IVA entrou em vigor e substituiu a Sexta Directiva, como resulta dos artigos 411.° e 413.° da Directiva IVA.

25      Ora, em conformidade com o artigo 411.°, n.° 2, da Directiva IVA, as referências à Sexta Directiva entendem‑se como sendo feitas à Directiva IVA. Assim, o facto de o ponto 6 da lista referida no artigo 20.° do Protocolo relativo às condições e regras de admissão da República da Bulgária e da Roménia à União Europeia (JO 2005, L 157, p. 29) se referir à Sexta Directiva não pode ter por consequência a inaplicabilidade da Directiva IVA, na Bulgária, a partir de 1 de Janeiro de 2007.

26      Por conseguinte, para o exame das questões prejudiciais que apenas dizem respeito ao cálculo dos juros de mora sobre o montante do IVA pago em excesso, a reembolsar, só é pertinente a interpretação da Directiva IVA, em especial, o seu artigo 183.°

27      É verdade que, como salienta o Governo búlgaro, esta disposição não prevê, nos termos da sua redacção, nem uma obrigação de pagar juros sobre o IVA pago em excesso, a reembolsar, nem a data a partir da qual esses juros são devidos.

28      Contudo, como importa recordar, essa circunstância não permite, por si só, concluir que a mesma disposição deve ser interpretada no sentido de que as regras fixadas pelos Estados‑Membros para o reembolso do IVA pago em excesso estão isentas de controlo, à luz do direito da União (v., neste sentido, acórdão de 21 de Janeiro de 2010, Alstom Power Hydro, C‑472/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 15).

29      Com efeito, por um lado, embora a aplicação do direito ao reembolso do IVA pago em excesso, previsto no artigo 183.° da Directiva IVA, se inclua, em princípio, na autonomia processual dos Estados‑Membros, a verdade é que essa autonomia é enquadrada pelos princípios da equivalência e da efectividade (v., neste sentido, acórdão Alstom Power Hydro, já referido, n.° 17). Por outro lado, segundo jurisprudência constante, o princípio da protecção da confiança legítima deve ser respeitado pelos Estados‑Membros, quando dão execução às regulamentações da União (v. acórdão de 11 de Julho de 2002, Marks & Spencer, C‑62/00, Colect., p. I‑6325, n.° 44 e jurisprudência referida).

30      Por outro lado, deve examinar‑se em que medida o artigo 183.° da Directiva IVA, interpretado à luz do contexto e dos princípios gerais que regem o domínio do IVA, contém regras específicas que devem ser respeitadas pelos Estados‑Membros, quando da aplicação do direito ao reembolso do IVA pago em excesso (v., por analogia, acórdão de 30 de Setembro de 2010, Strabag e o., C‑314/09, ainda não publicado na Colectânea, n.° 34).

31      A este respeito, deve observar‑se que resulta da jurisprudência constante que o direito dos sujeitos passivos de deduzir do IVA de que são devedores o IVA que já incidiu a montante sobre os bens adquiridos e os serviços que lhes foram prestados constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA instituído pela legislação da União (v., nomeadamente, acórdãos de 18 de Dezembro de 1997, Molenheide e o., C‑286/94, C‑340/95, C‑401/95 e C‑47/96, Colect., p. I‑7281, n.° 47, de 25 de Outubro de 2001, Comissão/Itália, C‑78/00, Colect., p. I‑8195, n.° 28, e de 10 de Julho de 2008, Sosnowska, C‑25/07, Colect., p. I‑5129, n.° 14).

32      Como o Tribunal de Justiça salientou reiteradamente, daqui resulta que o direito à dedução faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Em particular, este direito é imediatamente exercido em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efectuadas a montante (v., nomeadamente, acórdãos de 6 de Julho de 1995, BP Soupergaz, C‑62/93, Colect., p. I‑1883, n.° 18, de 18 de Dezembro de 2007, Cedilac, C‑368/06, Colect., p. I‑12327, n.° 31, e acórdão Sosnowska, já referido, n.° 15).

33      Quanto à possibilidade de, nos termos do artigo 183.° da Directiva IVA, prever que o IVA pago em excesso seja reportado para o período tributável seguinte ou reembolsado, o Tribunal de Justiça precisou que, embora os Estados‑Membros disponham de uma certa margem de discricionariedade para fixar as regras de reembolso do IVA pago em excesso, essas regras não podem violar o princípio da neutralidade do sistema fiscal, fazendo recair sobre o contribuinte, no todo ou em parte, o encargo desse imposto. Em especial, devem permitir ao sujeito passivo recuperar, em condições adequadas, a totalidade do seu crédito resultante do IVA pago em excesso, o que implica que o reembolso seja efectuado, num prazo razoável, através do pagamento em dinheiro ou de forma equivalente e que, em qualquer caso, o modo de reembolso escolhido não deve fazer correr nenhum risco financeiro ao contribuinte (v. acórdãos, já referidos, Comissão/Itália, n.os 32 a 34, e Sosnowska, n.° 17).

34      Consequentemente, é à luz destas considerações preliminares que devem ser examinadas as questões prejudiciais.

 Quanto à primeira questão

35      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, no essencial, se o artigo 183.° da Directiva IVA, conjugado com o princípio da protecção da confiança legítima, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que prevê, com efeito retroactivo, a prorrogação do prazo em que deve ser efectuado o reembolso do IVA pago em excesso.

36      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o prazo de reembolso do IVA pago em excesso expirou, no processo principal, em 26 de Novembro de 2007. Sob a égide da legislação nacional em vigor até 18 de Dezembro de 2007, os juros de mora sobre o montante que devia ser reembolsado seriam devidos a partir de 26 de Novembro de 2007, independentemente do facto de ter sido iniciada uma inspecção fiscal em 8 de Novembro de 2007. Contudo, segundo a legislação nacional entrada em vigor em 19 de Dezembro de 2007, um procedimento de inspecção fiscal determina que o prazo de reembolso do IVA pago em excesso, e, consequentemente, o momento a partir do qual são devidos os juros de mora, é prorrogado até à conclusão do relatório de inspecção, que, no caso em apreço, só foi concluído em 13 de Março de 2008.

37      Relativamente à interpretação da legislação nacional em vigor até 18 de Dezembro de 2007, feita pelo órgão jurisdicional de reenvio, de acordo com a qual, no processo principal, eram devidos juros de mora a partir de 27 de Novembro de 2007 pelo facto de o decurso do prazo de reembolso do IVA pago em excesso não ser afectado por uma inspecção fiscal, o direktor e o Governo búlgaro sustentam que, mesmo antes da alteração desta legislação, só eram devidos juros de mora a partir da conclusão do procedimento de inspecção fiscal, uma vez que o decurso desse prazo de reembolso estava suspenso durante esse procedimento.

38      Quanto a este ponto, embora incumba exclusivamente ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se, nos termos da legislação nacional em vigor até 18 de Dezembro de 2007, eram devidos juros de mora, no processo principal, a partir de 27 de Novembro de 2007, cabe, em contrapartida, ao Tribunal de Justiça responder à questão prejudicial, baseando‑se na interpretação da legislação nacional efectuada pelo órgão jurisdicional de reenvio, e fornecer‑lhe todos os elementos de interpretação decorrentes do direito da União, que possam permitir‑lhe apreciar a conformidade dessa legislação com o artigo 183.° da Directiva IVA e o princípio da confiança legítima (v., neste sentido, acórdãos de 28 de Fevereiro de 2008, Deutsche Shell, C‑293/06, Colect., p. I‑1129, n.os 25 e 26, e de 10 de Setembro de 2009, Plantanol, C‑201/08, Colect., p. I‑8343, n.° 45).

39      A este respeito, deve observar‑se que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, é perfeitamente possível e, em princípio, conforme com o princípio da confiança legítima que uma nova regulamentação se aplique aos efeitos futuros de situações criadas no domínio da regulamentação anterior (acórdão de 29 de Junho de 1999, Butterfly Music, C‑60/98, Colect., p. I‑3939, n.° 25 e jurisprudência referida). Contudo, o princípio da confiança legítima opõe‑se a que uma alteração da legislação nacional retire a um sujeito passivo, com efeito retroactivo, o direito que adquiriu com fundamento na legislação anterior (v., neste sentido, acórdão Marks & Spencer, já referido, n.° 45).

40      Daqui resulta que, numa situação como a do litígio no processo principal, o princípio da protecção da confiança legítima se opõe a que uma alteração da legislação nacional retire a um sujeito passivo, com efeito retroactivo, o direito de que gozava antes da referida alteração e em virtude do qual devia obter juros de mora sobre o montante de IVA pago em excesso, a reembolsar (v., neste sentido, acórdão Marks & Spencer, já referido, n.° 46).

41      Face ao exposto, há que responder à primeira questão que o artigo 183.° da Directiva IVA, conjugado com o princípio da protecção da confiança legítima, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que prevê, com efeito retroactivo, a prorrogação do prazo em que deve ser efectuado o reembolso do IVA pago em excesso, na medida em que essa legislação priva o sujeito passivo do direito de que dispunha, antes da sua entrada em vigor, de obter juros de mora sobre o montante que lhe deve ser reembolsado.

 Quanto à segunda questão

42      Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, no essencial, se o artigo 183.° da Directiva IVA, lido à luz do princípio da neutralidade fiscal, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal, segundo a qual o prazo para efectuar o reembolso do IVA pago em excesso é normalmente fixado em 45 dias, no termo do qual são devidos juros de mora sobre o montante que deve ser reembolsado, mas que prevê que este prazo é prorrogado quando é iniciado um procedimento de inspecção fiscal, o que implica que esses juros só são devidos a partir da data em que esse procedimento esteja concluído.

43      Para responder a esta questão, há que recordar as especificidades da legislação nacional em causa no litígio do processo principal.

44      Antes de mais, esta legislação prevê expressamente o pagamento de juros de mora sobre o IVA pago em excesso, a reembolsar. Portanto, o Tribunal de Justiça é chamado a pronunciar‑se exclusivamente sobre a questão de saber a partir de que momento esses juros são devidos nos termos do artigo 183.° da Directiva IVA, lido à luz do princípio da neutralidade fiscal.

45      Seguidamente, deve também observar‑se que, no processo principal, não está em causa a possibilidade oferecida no artigo 183.°, segundo parágrafo, da Directiva IVA, de recusar o reembolso ou o reporte quando o excedente é insignificante, que se aplica a fortiori aos juros.

46      Por último, há que salientar que a legislação nacional em causa no processo principal prevê o reembolso do IVA pago em excesso, apenas na medida em que este não pôde ser deduzido do montante dos impostos devidos nos três períodos tributáveis seguintes àquele em que o pagamento em excesso se revelou, implicando assim que essa legislação combine as duas vias de restituição do IVA pago em excesso, previstas no artigo 183.°, primeiro parágrafo, da Directiva IVA, a saber, o reembolso e o reporte.

47      Em primeiro lugar, relativamente a essa combinação do reporte e do reembolso do IVA pago em excesso, deve observar‑se que nem o órgão jurisdicional de reenvio nem as partes que apresentaram observações ao Tribunal de Justiça puseram em causa, acertadamente, a possibilidade de um Estado‑Membro prever que esse excesso seja restituído mediante o reporte e, depois, o reembolso. Com efeito, o artigo 183.° da Directiva IVA não pode ser interpretado no sentido de que o reembolso e o reporte se excluem mutuamente. Caso contrário, um Estado‑Membro que tivesse escolhido o reporte como forma de restituição do IVA pago em excesso, estaria impedido, em contradição com os princípios recordados nos n.os 29 a 33 do presente acórdão, de reembolsar esse excesso se, no período tributável para o qual foi reportado, o montante do imposto devido fosse insuficiente para permitir a imputação do referido excesso.

48      Em segundo lugar, no que se refere ao reporte do IVA pago em excesso para os três períodos tributáveis seguintes àquele em que se revelou, importa observar que é verdade que, nos termos do artigo 183.°, primeiro parágrafo, da Directiva IVA, os Estados‑Membros podem fazer o reporte do excesso para o «período seguinte».

49      Contudo, não se pode inferir desta redacção que o reporte, tal como previsto na legislação nacional em causa no processo principal, é inconciliável com esta disposição. A este respeito, deve ter‑se em conta o facto, recordado pelo Governo búlgaro, de que esta legislação fixou o período tributável, que pode variar, em conformidade com o artigo 252.°, segundo e terceiro períodos, da Directiva IVA, entre um mês e um ano, em um mês. Nestas condições, o reporte para os três períodos tributáveis seguintes àquele em que o pagamento em excesso se revelou não afecta, por si só, os princípios recordados nos n.os 29 a 33 do presente acórdão. Com efeito, esse reporte, que implica que a restituição seja efectuada num período de três meses, inscreve‑se na liberdade reconhecida aos Estados‑Membros de fixarem as modalidades da restituição do IVA pago em excesso.

50      Em terceiro lugar, importa salientar que o reembolso do referido excesso se efectua, segundo a legislação nacional em causa no processo principal, regra geral, num prazo de 45 dias, prazo este que, em si, é conforme com o artigo 183.° da Directiva IVA, e que são devidos juros de mora sobre o montante a reembolsar, a partir do termo desse prazo. No entanto, no caso de as autoridades fiscais iniciarem um procedimento de inspecção fiscal, esses juros só são devidos a partir da data em que esse procedimento estiver concluído.

51      A respeito de uma tal legislação que faz depender a obrigação da Administração Fiscal búlgara de pagar juros da conclusão do procedimento de inspecção fiscal, há que recordar que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, um cálculo de juros devidos pelo Tesouro, que não tome como ponto de partida o dia em que o IVA pago em excesso devia, normalmente, ter sido restituído nos termos da Directiva IVA, é, em princípio, contrário às exigências do artigo 183.° desta directiva (v., neste sentido, acórdão Molenheide e o., já referido, n.os 63 e 64).

52      A este respeito, cabe salientar que o funcionamento normal do sistema comum do IVA pressupõe a cobrança exacta do imposto. Com efeito, cada Estado‑Membro tem a obrigação de tomar todas as medidas legislativas e administrativas necessárias para garantir a cobrança da totalidade do IVA devido no seu território. A este respeito, os Estados‑Membros são obrigados a verificar as declarações dos sujeitos passivos, a contabilidade destes e outros documentos pertinentes, bem como a calcular e a cobrar o imposto devido (acórdão de 29 de Julho de 2010, Profaktor Kulesza, Frankowski, Jóźwiak, Orłowski, C‑188/09, ainda não publicado na Colectânea, n.° 21).

53      Daí resulta que o prazo para efectuar o reembolso do IVA pago em excesso pode, em princípio, ser prorrogado, para efectuar uma inspecção fiscal, sem que esse prazo prorrogado deva ser considerado excessivo, desde que a prorrogação não ultrapasse o que é necessário para levar a cabo este procedimento de inspecção (v., por analogia, acórdão Sosnowska, já referido, n.° 27). Contudo, na medida em que o sujeito passivo não pode dispor temporariamente dos fundos correspondentes ao IVA pago em excesso, suporta economicamente uma desvantagem que é susceptível de ser compensada pelo pagamento dos juros, garantindo assim o respeito do princípio da neutralidade fiscal.

54      Ora, uma vez que a legislação em causa no processo principal combina o reporte e o reembolso como vias de restituição do IVA pago em excesso, importa examinar, em quarto lugar, se é compatível com os princípios recordados nos n.os 29 a 33 do presente acórdão adiar a data a partir da qual são devidos juros de mora, até à conclusão de uma inspecção fiscal, apesar de o excesso já ter sido objecto de reporte para os três períodos tributáveis seguintes àquele em que se revelou.

55      A este respeito, há que realçar, por um lado, que a aplicação da legislação em causa no processo principal tem como efeito não só privar o sujeito passivo dos fundos correspondentes ao IVA pago em excesso, durante um período considerável, a saber, durante cerca de oito meses, mas também privar o sujeito passivo do direito aos juros normalmente devidos nos termos dessa legislação.

56      Por outro lado, deve observar‑se que a referida legislação confere às autoridades fiscais a faculdade de iniciarem uma inspecção fiscal a qualquer momento, mesmo numa data próxima da data de vencimento do reembolso do IVA pago em excesso, permitindo, assim, prolongar consideravelmente o prazo para o efectuar e, ao mesmo tempo, retardar a data a partir da qual são devidos juros de mora sobre o montante a reembolsar.

57      Portanto, o sujeito passivo não está apenas exposto a desvantagens pecuniárias, mas encontra‑se também impossibilitado de prever a data a partir da qual pode dispor dos fundos correspondentes ao IVA pago em excesso, o que constitui um encargo acrescido para o referido sujeito passivo.

58      Nestas condições, verifica‑se que as regras estabelecidas pela legislação nacional em causa no processo principal não permitem, contrariamente aos princípios recordados no n.° 33 do presente acórdão, que o sujeito passivo recupere, em condições adequadas, a totalidade do crédito resultante do IVA pago em excesso, sem correr nenhum risco financeiro.

59      Contudo, importa ainda responder à dúvida do órgão jurisdicional de reenvio sobre a relevância, para efeitos da apreciação da legislação nacional em causa no processo principal, da possibilidade conferida ao sujeito passivo de reduzir o prazo de reembolso mediante a prestação de uma caução em dinheiro.

60      A este respeito, há que recordar que a possibilidade de prestar essa caução não pode ter como consequência que a data a partir da qual são devidos juros de mora sobre o montante do IVA pago em excesso, a reembolsar, possa validamente ser adiada até ser efectuada uma inspecção fiscal. Com efeito, como o Tribunal de Justiça já declarou no n.° 32 do acórdão Sosnowska, já referido, a obrigação de prestar a referida caução, a fim de se poder beneficiar do prazo normalmente aplicável, tem apenas por efeito substituir o encargo financeiro devido à imobilização dos fundos correspondentes ao IVA pago em excesso durante esse procedimento de inspecção pelo da imobilização do montante da caução.

61      Face ao exposto, há que responder à segunda questão que o artigo 183.° da Directiva IVA, à luz do princípio da neutralidade fiscal, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional segundo a qual o prazo normal para efectuar o reembolso do IVA pago em excesso, no termo do qual são devidos juros de mora sobre o montante que deve ser reembolsado, é prorrogado no caso de ser iniciado um procedimento inspecção fiscal, prorrogação esta que tem como consequência que esses juros só são devidos a partir da data em que o procedimento estiver concluído, apesar de esse excesso já ter sido objecto de reporte para os três períodos tributáveis seguintes àquele em que se revelou. Pelo contrário, o facto de esse prazo normal estar fixado em 45 dias não é contrário à referida disposição.

 Quanto à terceira e quarta questões

62      Atendendo à resposta dada à segunda questão, deve entender-se que a terceira e a quarta questão, que cabe examinar conjuntamente, visam, no essencial, saber se o artigo 183.° da Directiva IVA deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que o reembolso do IVA pago em excesso seja efectuado por compensação.

63      A este respeito, deve observar‑se que a compensação conduz à extinção total ou parcial de duas obrigações recíprocas, permitindo assim ao Estado‑Membro cumprir a sua obrigação de reembolso.

64      Em conformidade com a jurisprudência recordada no n.° 33 do presente acórdão, os Estados‑Membros dispõem de uma certa margem de discricionariedade relativamente às modalidades de reembolso do IVA pago em excesso, desde que esse reembolso seja efectuado num prazo razoável, através do pagamento em dinheiro ou de forma equivalente e que o sujeito passivo não corra nenhum risco financeiro.

65      À luz destes princípios, não existem razões que se oponham, de uma maneira geral, a que o reembolso do IVA pago em excesso seja efectuado por compensação, na medida em que esta via leva à liquidação imediata do crédito do sujeito passivo sem que este seja exposto a um risco financeiro.

66      Esta análise também se aplica no caso de o crédito do Estado‑Membro ser impugnado pelo sujeito passivo, desde que, como salienta a Comissão Europeia, o sujeito passivo não seja privado das vias de recurso jurisdicional efectivo para defender o seu ponto de vista relativamente ao crédito estatal utilizado para efeitos da compensação.

67      Face ao exposto, há que responder à terceira e quarta questões que o artigo 183.° da Directiva IVA deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que o reembolso do IVA pago em excesso seja efectuado por compensação.

 Quanto às despesas

68      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

1)      O artigo 183.° da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, conforme alterada pela Directiva 2006/138/CE do Conselho, de 19 de Dezembro de 2006, conjugado com o princípio da protecção da confiança legítima, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que prevê, com efeito retroactivo, a prorrogação do prazo em que deve ser efectuado o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado pago em excesso, na medida em que essa legislação priva o sujeito passivo do direito de que dispunha, antes da sua entrada em vigor, de obter juros de mora sobre o montante que lhe deve ser reembolsado.

2)      O artigo 183.° da Directiva 2006/112, conforme alterada pela Directiva 2006/138, à luz do princípio da neutralidade fiscal, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional segundo a qual o prazo normal para efectuar o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado pago em excesso, no termo do qual são devidos juros de mora sobre o montante que deve ser reembolsado, é prorrogado no caso de ser iniciado um procedimento inspecção fiscal, prorrogação esta que tem como consequência que esses juros só são devidos a partir da data em que o procedimento estiver concluído, apesar de esse excesso já ter sido objecto de reporte para os três períodos tributáveis seguintes àquele em que se revelou. Pelo contrário, o facto de esse prazo normal estar fixado em 45 dias não é contrário à referida disposição.

3)      O artigo 183.° da Directiva 2006/112, conforme alterada pela Directiva 2006/138, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado pago em excesso seja efectuado por compensação.

Assinaturas


* Língua do processo: búlgaro.

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