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Document 62010CC0509

Conclusões do advogado‑geral N. Jääskinen apresentadas em 29 de março de 2012.
Josef Geistbeck e Thomas Geistbeck contra Saatgut-Treuhandverwaltungs GmbH.
Pedido de decisão prejudicial apresentada por Bundesgerichtshof.
Processo C-509/10.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2012:187

CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

NIILO JÄÄSKINEN

apresentadas em 29 de março de 2012 ( 1 )

Processo C-509/10

Josef Geistbeck,

Thomas Geistbeck

contra

Saatgut-Treuhandverwaltungs GmbH

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesgerichtshof (Alemanha)]

«Propriedade intelectual e industrial — Regulamento (CE) n.o 2100/94 — Regime de proteção comunitária das variedades vegetais — Obrigação de pagar uma remuneração equitativa ao titular dessa proteção e de o indemnizar dos prejuízos sofridos — Critérios para determinar a remuneração equitativa — Contrafação — Regulamento (CE) n.o 1768/95 — Privilégio dos agricultores — Custos de controlo e vigilância»

I — Introdução

1.

O pedido de decisão prejudicial submetido pelo Bundesgerichtshof (Alemanha), tem por objeto, nomeadamente, a interpretação dos artigos 14.° e 94.° do Regulamento (CE) n.o 2100/94 ( 2 ) (a seguir o «regulamento de base»), relativo ao regime de proteção comunitária das variedades vegetais, e do Regulamento (CE) n.o 1768/95 ( 3 ) (a seguir o «regulamento de execução»), que estabelece as regras de aplicação relativas à exceção agrícola prevista no n.o 3 do artigo 14.o, do regulamento de base.

2.

O litígio submetido ao órgão jurisdicional de reenvio opõe os agricultores Josef e Thomas Geistbeck (a seguir «J. e T. Geistbeck») à Saatgut-Treuhandverwaltungs GmbH (a seguir a «STV») que representa os interesses dos titulares das variedades vegetais protegidas Kuras, Quarta, Solara, Marabel e Secura. Este litígio, no essencial, tem por objeto a relação entre a exceção prevista no artigo 14.o do regulamento de base — também designada por «privilégio dos agricultores») — e o cálculo da indemnização adequada, na aceção do artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base, devida ao titular de uma variedade vegetal protegida, pela prática de atos que constituam uma contrafação.

3.

O presente reenvio prejudicial convida, em especial, o Tribunal de Justiça a decidir a questão relativa à definição do método de cálculo da referida indemnização adequada devida pelo agricultor ao titular de uma variedade vegetal, numa situação em que o agricultor, com autorização, em conformidade com o privilégio dos agricultores, para proceder ao cultivo do produto proveniente da sua colheita, não tenha declarado uma parte deste novo cultivo, em violação das obrigações destes agricultores, previstas no artigo 14.o, n.o 3, do regulamento de base, que conferem o referido privilégio.

4.

As questões submetidas impõem, deste modo, uma ponderação de interesses contraditórios. Como observou o advogado-geral Ruiz-Jarabo Colomer, trata-se de conseguir um equilíbrio entre, por um lado, a necessidade de incrementar os frutos da atividade agrícola e de proteger a produção agrícola, finalidade principal da Política Agrícola Comum e, por outro, a necessidade de proteger os direitos dos titulares das variedades vegetais protegidas com atividade na política industrial, de investigação e de desenvolvimento, empenhados em conseguir um quadro regulamentar adequado para incentivar as suas atividades na União Europeia, sempre respeitando os objetivos prosseguidos pela regulamentação em causa ( 4 ).

5.

Este processo, permitirá, portanto, ao Tribunal de Justiça completar a sua jurisprudência que teve origem no acórdão Schulin ( 5 ) e, designadamente, esclarecer o seu ponto de vista em matéria de indemnização adequada quando a utilização de uma variedade vegetal constitua uma contrafação, bem como pronunciar-se sobre o equilíbrio a atingir entre os interesses subjacentes à regulamentação em matéria de proteção comunitária das obtenções vegetais.

II — Quadro jurídico

A — Regulamento de base

6.

Decorre do quinto considerando do regulamento de base ( 6 ) que, no sentido de fomentar a reprodução vegetal e o desenvolvimento de novas variedades, os reprodutores de espécies vegetais deveriam desfrutar de uma proteção superior àquela de que gozam atualmente.

7.

De acordo com o décimo sétimo considerando deste regulamento, o exercício dos direitos conferidos pela proteção comunitária das variedades vegetais deve ser sujeito a restrições estabelecidas em disposições adotadas no interesse público.

8.

A este respeito, o décimo oitavo considerando do referido regulamento esclarece que o interesse público referido no considerando anterior inclui a salvaguarda da produção agrícola e que este objetivo exige que os agricultores estejam autorizados a utilizar, em determinadas condições, o produto da sua colheita para fins de multiplicação.

9.

Nos termos do artigo 11.o, n.o 1, do regulamento de base, o direito à proteção comunitária das variedades vegetais pertence ao titular, ou seja à «pessoa que criou ou descobriu e desenvolveu a variedade, ou [ao] seu sucessível».

10.

Sob a epígrafe «Direitos do titular de um direito comunitário de proteção de uma variedade vegetal e atos ilícitos», o artigo 13.o do regulamento de base prevê:

«1.   Um direito comunitário de proteção de uma variedade vegetal tem por efeito habilitar o seu titular ou titulares, a seguir designados por «titular», a praticar os atos previsto no n.o 2.

2.   Sem prejuízo do disposto nos artigos 14.° e 15.°, carecem da autorização do titular os seguintes atos relativos aos constituintes varietais, ou ao material de colheita da variedade protegida, ambos a seguir conjuntamente designados por ‘material’:

a)

Produção ou reprodução (multiplicação);

[…]

O titular pode sujeitar a sua autorização a determinadas condições e restrições.»

11.

O privilégio dos agricultores é instituído pelo artigo 14.o do regulamento de base nestes termos:

«1.   Sem prejuízo do disposto no n.o 2 do artigo 13.o, e no intuito de proteger a produção agrícola, os agricultores podem utilizar, para fins de multiplicação nas suas próprias explorações, o produto da colheita que tenham obtido por plantação, nas suas explorações, de material de propagação de uma variedade que não seja um híbrido ou uma variedade artificial, que beneficie da proteção comunitária das variedades vegetais.

[…]

3.   As condições para a aplicação da exceção prevista no n.o 1 e para salvaguardar os legítimos interesses do titular e do agricultor serão estabelecidas […] com base nos seguintes critérios:

[…]

os pequenos agricultores não serão obrigados a pagar qualquer remuneração ao titular […]

[…]

os restantes agricultores devem pagar ao titular uma remuneração equitativa, que deve ser significativamente inferior ao preço da produção licenciada do material de propagação da mesma variedade na mesma área […]

a verificação do cumprimento do presente artigo ou das disposições adotadas com base nele será da exclusiva responsabilidade dos titulares […]

sempre que os titulares o solicitem, os agricultores e os prestadores de serviços de processamento devem prestar-lhes as informações pertinentes […]»

12.

O artigo 94.o do regulamento de base, sob a epígrafe «Violações», dispõe que:

«1.   Todo aquele que:

a)

Praticar um dos atos previstos no n.o 2 do artigo 13.o sem para tal ter legitimidade, em relação a uma variedade para a qual tenha sido reconhecido um direito comunitário de proteção das variedades vegetais;

[…]

pode ser alvo de uma ação judicial por parte do titular, no sentido de pôr termo à infração ou de pagar uma indemnização adequada, ou ambos.

2.   Quem assim agir intencionalmente ou por negligência terá, além disso, de indemnizar o titular de quaisquer danos suplementares resultantes do ato praticado. Em caso de negligência simples, estas indemnizações poderão ser reduzidas em função do grau de gravidade da negligência mas nunca de modo a torná-las inferiores aos benefícios que dela resultaram para a pessoa que praticou a violação.»

B — Regulamento de execução

13.

Nos termos do artigo 3.o, n.o 2, do regulamento de execução, os direitos e as obrigações do titular decorrentes das disposições do artigo 14.o do regulamento de base «podem ser invocados por titulares individuais, conjuntamente por vários titulares, ou por uma organização de titulares estabelecida na Comunidade, a nível comunitário, nacional, regional ou local».

14.

Sob a epígrafe «Nível da remuneração», o artigo 5.o do regulamento de execução dispõe:

«1.   O nível da remuneração equitativa a pagar ao titular nos termos do n.o 3, quarto travessão, do artigo 14.o do regulamento de base pode ser objeto de contrato entre o titular e o agricultor em causa.

2.   Caso não exista um contrato ou, existindo, não seja aplicável, o nível da remuneração deve ser significativamente inferior ao montante cobrado pela produção autorizada de material de propagação da categoria mais baixa, certificada oficialmente, da mesma variedade e na mesma área.

[…]

5.   Se, no caso previsto no n.o 2, não for aplicável um acordo, dos previstos no n.o 4, a remuneração a pagar deve ser igual a 50% dos montantes cobrados pela produção autorizada de material de propagação, conforme referido no n.o 2.

[…]»

15.

O artigo 8.o deste regulamento, sob a epígrafe «Informações a prestar pelo agricultor», do mesmo regulamento prevê:

«1.   Os pormenores relativos a informações pertinentes a prestar pelo agricultor ao titular, nos termos do n.o 3, sexto travessão, do artigo 14.o do regulamento de base, podem constituir objeto de um contrato entre ambos.

2.   Caso não exista um contrato ou, existindo, não seja aplicável, o agricultor deve, sem prejuízo das obrigações em matéria de informações impostas por outra legislação comunitária ou pelas legislações dos Estados-Membros e a pedido do titular, fornecer a este último uma declaração com informações pertinentes. Consideram-se pertinentes as seguintes informações:

[…]

b)

Indicação de ter feito uso, ou não, do produto da colheita pertencente a uma ou mais variedades do titular para plantação no terreno ou terrenos da sua exploração;

c)

No caso de o agricultor ter feito tal uso, indicação da quantidade do produto da colheita pertencente à variedade ou variedades em questão, que tenha sido utilizada pelo agricultor em conformidade com o n.o 1 do artigo 14.o do regulamento de base;

[…]»

16.

O artigo 14.o do referido regulamento, que regula o controlo, pelo titular, da observância das disposições do artigo 14.o do regulamento de base, dispõe, no seu n.o 1, que:

«[…] [o] agricultor […] deve, a pedido do titular:

a)

Apresentar provas que corroborem as informações por si prestadas nos termos do artigo 8.o, mediante fornecimento de documentos relevantes disponíveis, tais como faturas, rótulos utilizados ou quaisquer outros elementos […]

[…]»

17.

Nos termos do artigo 16.o, n.o 1, do regulamento de execução:

«O controlo deve ser efetuado pelo titular. O titular poderá celebrar os acordos adequados para assegurar o apoio de organizações de agricultores, processadores, cooperativas ou outras associações do setor agrícola.»

18.

O artigo 17.o do regulamento de execução, sob a epígrafe «Violações», prevê que:

«O titular pode invocar, nos termos do presente regulamento, os direitos conferidos pelo Instituto comunitário das variedades vegetais contra qualquer pessoa que infrinja qualquer das condições ou restrições decorrentes da derrogação estabelecida pelo artigo 14.o do regulamento de base.»

III — Litígio no processo principal, questões prejudiciais e tramitação processual no Tribunal de Justiça

19.

Entre 2001 e 2004, por força da exceção prevista no artigo 14.o do regulamento de base, J. e T. Geistbeck procederam, depois de o terem comunicado à STV, ao cultivo das variedades Kuras, Quarta, Solara e Marabel, protegidas pelo direito da União, bem como da variedade Secura, protegida pelo direito alemão.

20.

No entanto, aquando de uma inspeção, a STV verificou que as quantidades efetivamente cultivadas excediam, por vezes em mais do triplo, as quantidades declaradas. Baseando-se no montante que teria sido exigível no caso da concessão, em condições gerais, de uma licença para a produção de material de propagação, a STV calculou que o montante da indemnização que lhe era devida, a título da diferença de quantidades, correspondia a 4 576,15 euros. Porém, J. e T. Geistbeck, só procederam ao pagamento de metade deste montante. Este último montante correspondia à remuneração que seria devida, nos termos do artigo 14.o, n.o 3, quarto travessão, do regulamento de base, pela produção autorizada no âmbito do privilégio dos agricultores.

21.

Em consequência, a STV interpôs um recurso contra J. e T. Geistbeck pela declaração incompleta do cultivo de variedades vegetais protegidas e exigiu o pagamento da quantia remanescente, no montante de 2288 euros, bem como o ressarcimento das despesas extrajudiciais, que ascendiam a 141,05 euros. Os pedidos da STV foram julgados procedentes em primeira instância e em sede de recurso. J. e T. Geistbeck interpuseram recurso de «Revision» para o Bundesgerichtshof desta última decisão.

22.

Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio interroga-se, em especial, quanto ao cálculo da indemnização adequada devida, por força do artigo 94.o, n.o 1 do regulamento de base, ao titular dos direitos protegidos ao abrigo do referido regulamento. A este respeito, considera, baseando-se no acórdão Schulin, já referido, que o agricultor que não cumpre devidamente a sua obrigação de informação, estabelecida no artigo 14.o, n.o 3, sexto travessão, do regulamento de base, para com o titular da variedade vegetal protegida, não pode invocar o artigo 14.o, n.o 1, deste regulamento e pode ser alvo de uma ação para pôr termo à infração, nos termos do artigo 94.o do referido regulamento, bem como para o pagamento de uma indemnização adequada.

23.

Todavia, o tribunal a quo tem dúvidas quanto às modalidades de cálculo dessa indemnização. Por um lado, considera que poderia ser calculada com base no montante médio cobrado pela produção licenciada de material de propagação das variedades protegidas da espécie vegetal em causa na mesma área (a seguir «remuneração por produção licenciada»). Por outro, esta indemnização poderia ser calculada com base na remuneração devida quando o cultivo é autorizado, nos termos das disposições conjugadas do artigo 14.o, n.o 3, quarto travessão, do regulamento de base, e do artigo 5.o, n.o 5, do regulamento de execução (a seguir a «remuneração por cultivo autorizado»).

24.

Segundo a primeira hipótese, o agricultor deveria pagar uma remuneração por produção licenciada, nas mesmas condições e à mesma tarifa que um terceiro. Na segunda hipótese, o agricultor poderia invocar a aplicação da tarifa excecional reservada aos agricultores, ou seja a remuneração por cultivo autorizado, que corresponde a 50% dos montantes devidos pela produção licenciada de material de propagação, a não ser que esta remuneração tenha sido objeto de um contrato entre o titular e o agricultor em causa.

25.

Nestas circunstâncias, por decisão de 30 de setembro de 2010, entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 26 de outubro de 2010, o Bundesgerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

A indemnização adequada que um agricultor tem de pagar, nos termos do artigo 94.o, n.o 1 do Regulamento [de Base], ao titular de um direito comunitário de proteção de uma variedade vegetal, por ter utilizado material de propagação de uma variedade protegida, obtido por cultivo, sem ter cumprido as obrigações previstas nos artigos 14.°, n.o 3 do Regulamento [de Base] e 8.° do Regulamento [de Execução], deve ser calculada com base no montante médio cobrado pela produção sob licença de material de multiplicação da mesma variedade vegetal protegida na mesma área, ou, em alternativa, com base na remuneração (inferior) que seria devida nos termos do artigo 14.o, n.o 3, quarto travessão do Regulamento [de Base] e do artigo 5.o do Regulamento [de Execução] no caso de cultivo autorizado?

2)

Devendo tomar-se exclusivamente como base o valor da remuneração devida pelo cultivo autorizado, em situações deste tipo, e quando o agricultor cometeu uma única infração culposamente, o titular do direito de proteção comunitário de uma variedade vegetal pode calcular o montante do prejuízo a reparar nos termos do artigo 94.o, n.o 2, do Regulamento [de Base] sob a forma de uma importância fixa, com base na remuneração devida pela atribuição de uma licença de produção de material de propagação?

3)

Na determinação do valor da indemnização adequada, nos termos do artigo 94.o, n.o 1 do Regulamento [de Base] ou da indemnização suplementar devida, nos termos do artigo 94.o, n.o 2 do mesmo regulamento, é admissível ou mesmo exigido, que se tome em consideração os encargos de fiscalização particularmente elevados, suportados por uma organização que tutela os interesses de numerosos titulares de direitos de proteção, por via da atribuição de uma indemnização num montante correspondente ao dobro, da compensação habitualmente acordada, ou da remuneração devida por força do artigo 14.o n.o 3, quarto travessão do Regulamento [de Base]?»

26.

Apresentaram observações escritas as partes no processo principal, o Governo helénico, o Governo espanhol e a Comissão Europeia. Na audiência, realizada em 18 de janeiro de 2012, compareceram os representantes das partes do processo principal, bem como do Governo helénico e da Comissão.

IV — Análise jurídica

A — Observações preliminares

27.

Para responder às questões prejudiciais submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, farei algumas observações preliminares, por um lado sobre a qualidade do material de propagação utilizado no caso em apreço, questão suscitada por J. e T. Geistbeck, e, por outro, sobre o alcance do privilégio dos agricultores.

28.

Seguidamente, abordarei a questão do método apropriado para calcular indemnização adequada devida ao titular dos direitos de proteção comunitária das variedades vegetais, nos termos do artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base. Por último, analisarei a questão de saber se, no cálculo da referida indemnização ou da reparação do prejuízo, devida pela aplicação do artigo 94.o, n.o 2, do referido regulamento, se poderá tomar em conta os custos com os meios de controlo suportados por uma organização como a que está em causa no processo principal ( 7 ).

1. Quanto à qualidade do material de propagação protegido

29.

Segundo J. e T. Geistbeck, o material de propagação em causa já não teria a qualidade do referido no artigo 13.o, n.o 2, do regulamento de base e, portanto, também já não seria adequado às operações comerciais incluídas no âmbito da concessão de uma licença. Consideram, assim, que a menor qualidade do material de colheita não justifica que o titular da proteção da variedade vegetal exija o pagamento integral de uma licença.

30.

Observo que, do ponto de vista do direito de propriedade intelectual, a utilização do material protegido não é pertinente para a proteção da identidade do material objeto do direito protegido, como as variedades vegetais do processo principal. Com efeito, um direito de propriedade intelectual não desaparece pelo facto de ter sido utilizado.

31.

Acresce que, para que a atividade do agricultor possa entrar no âmbito de aplicação do privilégio dos agricultores previsto no artigo 14.o do regulamento de base, o produto da colheita deve ser conforme às características da variedade protegida ( 8 ). Assim, o agricultor cultiva e propaga as plantas que respeitam as características necessárias da variedade em causa.

2. Quanto ao alcance do privilégio dos agricultores

32.

Antes de mais, deve-se salientar que, nos termos do artigo 13.o, n.o 2, alínea a), do regulamento de base, a autorização do titular é, em princípio, necessária para a multiplicação do material de colheita de uma variedade protegida.

33.

Contudo, o artigo 14.o, n.o 1, do regulamento de base prevê uma exceção a este princípio. Esta exceção, tem por objetivo proteger a produção agrícola. Por força desta disposição, os agricultores estão autorizados a utilizar, para a multiplicação ao ar livre nas suas próprias explorações, o produto da colheita obtido por plantação de material de propagação de variedades protegidas, desde que os critérios referidos no n.o 3 do mesmo artigo sejam respeitados.

34.

Portanto, este privilégio não é aplicável, se o agricultor não respeitar as obrigações enunciadas no artigo 14.o, n.o 3, do regulamento de base e especificadas no regulamento de execução.

35.

Com efeito, no acórdão Schulin, já referido, o Tribunal de Justiça, já analisou, de forma breve, o alcance do direito do agricultor a invocar a referida exceção. Para o Tribunal de Justiça, o agricultor que não pague ao titular uma remuneração equitativa, quando utiliza o produto da colheita obtido por cultivo de material de propagação de uma variedade protegida não pode invocar o artigo 14.o, n.o 1, do regulamento de base e, portanto, deve-se considerar que pratica, sem para isso ter sido autorizado, um dos atos referidos no artigo 13.o, n.o 2, deste regulamento. Por conseguinte, decorre do artigo 94.o do mesmo regulamento que este agricultor pode ser alvo de uma ação, intentada pelo titular, para cessação da contrafação ou para pagamento de uma indemnização adequada, ou a este duplo título. Se se tratar de um comportamento deliberado ou de negligência, o agricultor é ainda obrigado a reparar o prejuízo sofrido pelo titular ( 9 ).

36.

Na minha opinião, o mesmo vale quando um agricultor que não cumpriu devidamente o seu dever de informação, previsto no artigo 14.o, n.o 3, sexto travessão, do regulamento de base, uma vez que o pagamento de uma remuneração equitativa, mencionada no acórdão Schulin, já referido, consta, bem como a prestação de informações, do referido artigo, que enumera os critérios que permitem invocar a exceção prevista no artigo 14.o, n.o 1, do referido regulamento.

37.

Como alegou a Comissão nas suas observações, quando um agricultor não cumpre o seu dever de informação para com o titular, em conformidade com as disposições conjugadas do artigo 14.o, n.o 3, sexto travessão, do regulamento de base, e do artigo 8.o, do regulamento de execução, e também não lhe paga uma remuneração equitativa por esta parte da produção, a norma derrogatória do artigo 14.o, n.o 1, do regulamento de base, deixa de ser aplicável.

38.

De facto, se as referidas condições para o cultivo autorizado, previstas no artigo 14.o, n.o 3, do regulamento de base, não forem respeitadas, a norma derrogatória do artigo 14.o, n.o 1, do mesmo regulamento também não será aplicável. Em consequência, se aquando do cultivo, os critérios estabelecidos no n.o 3 deste artigo não forem respeitados, o referido cultivo constitui uma violação dos direitos conferidos ao titular pelo artigo 13.o, n.o 2, do regulamento de base.

B — Cálculo da indemnização adequada prevista no artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base

39.

Decorre do pedido de decisão prejudicial que, em razão da violação dos direitos de proteção das variedades vegetais, a STV tem o direito de exigir o pagamento de uma indemnização adequada nos termos do artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base. Adicionalmente, o tribunal a quo refere que a violação, por J. e T. Geistbeck, do seu dever de informação, lhes é imputável, pelo que a STV poderá também exigir a reparação do prejuízo sofrido, nos termos do artigo 94.o, n.o 2, do mesmo regulamento.

40.

Observo, antes de mais, que, para analisar o artigo 94.o do regulamento de base, é necessário partir da premissa de que a finalidade subjacente a este artigo é a indemnização integral baseada no princípio da restitutio in integrum ( 10 ). Dito de outra forma, a indemnização que deve ser liquidada em caso de violação dos direitos de proteção das variedades vegetais tem como objetivo devolver o titular dos referidos direitos à situação em que se encontrava antes da violação. Ora, a aplicação deste princípio no caso em apreço não é isenta de dificuldades porquanto a referida situação pode ser reconstituída tomando como referência o cultivo autorizado, ou tomando em consideração o montante cobrado pela produção licenciada do material de propagação.

1. Quanto aos regimes instituídos pelos artigos 14.° e 94.° do regulamento de base

41.

Relativamente à determinação da indemnização adequada, na aceção do artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base, o órgão jurisdicional de reenvio apresenta dois métodos que podem ser utilizados para o cálculo da referida indemnização, ou seja o baseado na remuneração por produção licenciada e o baseado na remuneração por cultivo autorizado.

42.

Observo que a redação do artigo 94.o do regulamento de base não fornece nenhum indício sobre a possibilidade de tomar em consideração o montante da remuneração por cultivo autorizado, na aceção do artigo 14.o, n.o 3, quarto travessão, deste regulamento, no âmbito do cálculo da indemnização adequada, na aceção da primeira disposição.

43.

Observo também que certas versões linguísticas (nomeadamente as versões espanhola, dinamarquesa, alemã, inglesa, italiana e finlandesa) utilizam expressões diferentes no artigo 94.o, n.o 1 ( 11 ), e no artigo 14.o, n.o 3, quarto travessão ( 12 ), do regulamento de base, ao passo que a versão francesa repete a mesma expressão nas duas disposições, a saber «rémunération équitable» [remuneração equitativa]. Contudo, não podendo retirar conclusões desta diferença linguística, deve-se analisar estas disposições tendo em conta os seus contextos respetivos, tomando em consideração, em especial, os objetivos que as orientam.

44.

Antes de mais, recordo que a remuneração equitativa prevista no artigo 14.o, n.o 3, quarto travessão, do regulamento de base, se integra numa disposição derrogatória. Neste contexto, o Tribunal de Justiça declarou no acórdão Schulin, já referido, que em conformidade com os considerandos décimo sétimo e décimo oitavo do regulamento de base, as disposições do artigo 14.o do referido regulamento foram adotadas no interesse público da salvaguarda da produção agrícola e constituem uma exceção à regra segundo a qual a autorização do titular é necessária para a multiplicação do material de colheita da variedade protegida ( 13 ).

45.

No acórdão Brangewitz, já referido, o Tribunal de Justiça declarou igualmente que o direito dos agricultores de plantarem, sem autorização prévia do titular, o produto da colheita obtido pelo cultivo de material de propagação de uma variedade submetida ao privilégio dos agricultores tem como corolário a obrigação de estes fornecerem, a pedido do referido titular, as informações pertinentes e, exceto quanto aos pequenos agricultores, de pagarem uma remuneração equitativa ( 14 ).

46.

Ainda segundo o Tribunal de Justiça, o artigo 14.o do regulamento de base estabelece, portanto, um equilíbrio entre, por um lado, os interesses dos titulares de direitos de proteção das variedades vegetais e, por outro lado, os dos agricultores. O privilégio dos agricultores, ou seja a plantação sem autorização prévia, conjugado com o dever de informação e com a obrigação de pagar uma remuneração equitativa, permite assim, que sejam salvaguardados os interesses legítimos recíprocos dos agricultores e dos titulares nas suas relações diretas ( 15 ).

47.

É, portanto, essencial interpretar o conceito de «remuneração equitativa» previsto no artigo 14.o, n.o 3, quarto travessão, do regulamento de base, de forma restritiva e, no seu contexto particular, enquanto parte integrante do regime derrogatório estabelecido no referido artigo.

48.

Seguidamente, a indemnização adequada a que se refere o artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base, deve, como a remuneração equitativa prevista no artigo 14.o, n.o 3, quarto travessão, deste regulamento, ser interpretada tomando em consideração o contexto do referido regulamento e o objetivo que este prossegue.

49.

No plano geral, e como decorre do quinto considerando do regulamento de base, este prossegue o objetivo generalizado de melhorar a proteção de todos os reprodutores de espécies vegetais ( 16 ). Atendendo à finalidade de proteção dos titulares visada no regulamento de base, considero que o artigo 94.o, n.o 1, do referido regulamento permite ao titular garantir que os seus interesses estarão protegidos contra qualquer pessoa que pratique, sem autorização prévia, um dos atos enumerados no artigo 13.o, n.o 2, do regulamento de base ( 17 ).

2. Quanto ao método de cálculo baseado na remuneração por produção licenciada

50.

Com o intuito de assegurar a proteção dos titulares das variedades vegetais protegidas e de os devolver à situação em que estariam antes da violação dos seus direitos, é necessário calcular a indemnização adequada, na aceção do artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base, partindo da remuneração por produção licenciada.

51.

Esta disposição também se aplica quando a pessoa que cometeu um ato constitutivo de uma contrafação não tenha agido intencionalmente, nem de forma negligente ( 18 ). Pretende-se assegurar que o titular venha a receber uma indemnização adequada que, em meu entender, não poderá ser inferior à compensação que o referido titular poderia exigir pela produção licenciada de material de multiplicação, nos termos do artigo 13.o do regulamento de base.

52.

Baseando-se na natureza derrogatória do regime previsto no artigo 14.o do referido regulamento, considero que um agricultor que não respeita as condições enunciadas no artigo 14.o, n.o 3, do regulamento de base, que servem de base à aplicação da exceção prevista no n.o 1 do mesmo artigo, deve ser considerado como qualquer terceiro que pretende adquirir a variedade protegida no mercado, em contrapartida do pagamento da remuneração por produção licenciada. Por conseguinte, um agricultor que não cumpra as obrigações que para si decorrem do artigo 14.o, n.o 3, do regulamento de base também não poderá invocar a exceção prevista nesse artigo.

53.

Esta conclusão pode, de resto, ser confirmada pela leitura do artigo 17.o do regulamento de execução, nos termos do qual o titular pode invocar os direitos conferidos pela proteção comunitária das variedades vegetais contra qualquer pessoa que infrinja uma das condições ou restrições associadas à exceção prevista no artigo 14.o do regulamento de base.

54.

Adicionalmente, parece-me pertinente referir que, se fosse escolhida uma abordagem diferente, os agricultores poderiam não ser incitados a respeitar o dever de informação para com o titular, dado que o incumprimento das obrigações associadas à referida exceção não implicaria, na realidade, qualquer consequência económica preventiva.

55.

Deste ponto de vista, como decorre igualmente da decisão de reenvio, a limitação do direito do titular a receber uma indemnização cujo montante máximo corresponda à remuneração por cultivo autorizado teria como efeito beneficiar injustificadamente os agricultores que não cumprissem as obrigações estabelecidas no artigo 14.o, n.o 3, do regulamento de base.

56.

Neste regime, cujo objetivo geral é assegurar um grau elevado de proteção das variedades vegetais, seria contrário ao referido objetivo que um agricultor, independentemente do facto de respeitar, ou não, os seus deveres de informação, tivesse sistematicamente o dever de pagar apenas a remuneração que é devida pelo cultivo autorizado e cujo nível se mantêm, por força da legislação aplicável, num patamar consideravelmente inferior ao da remuneração por produção licenciada.

57.

A este respeito, acrescento ainda que, mesmo que da obrigação de pagamento de uma indemnização adequada, na aceção do artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base, calculada com base na remuneração por produção licenciada, resulte uma compensação mais elevada do que a estabelecida para o cultivo autorizado, nos termos do artigo 14.o do regulamento de base, esta não se transforma, por isso, em indemnização pecuniária dita «punitiva» (punitive damages), que integra também uma componente sancionatória ( 19 ). Contudo, trata-se de um método que permite impor o preço da produção licenciada do material de propagação, quando a plantação constitua uma contrafação e que, por este motivo, tem uma função preventiva.

58.

Em conclusão, considero que, para determinar o montante da indemnização adequada, prevista no artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base, numa situação como a do processo principal, devemos tomar por base a remuneração por produção licenciada. Com efeito, qualquer outra interpretação invalidaria o objetivo do referido regulamento e o seu efeito útil.

59.

Todavia, na eventualidade de o Tribunal de Justiça não acolher o meu ponto de vista quanto à necessidade de considerar a remuneração por produção licenciada como base para o cálculo da indemnização adequada visada no artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base, farei também algumas observações referentes ao outro método de cálculo baseado na remuneração por cultivo autorizado, que foi considerada pelo órgão jurisdicional de reenvio.

3. Quanto ao método de cálculo alternativo considerado pelo órgão jurisdicional de reenvio

60.

Observo, desde logo, que, se a indemnização adequada, que um agricultor deve pagar ao titular nos casos em que os seus atos correspondam a uma contrafação, nos termos do artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base, fosse calculada com base na remuneração por cultivo autorizado, a referida indemnização seria claramente inferior ao montante que seria devido por terceiros pela produção licenciada de material de propagação.

61.

Assinalo que a decisão de reenvio considera que os atos de J. e T. Geistbeck lhes são culposamente imputáveis, pelo que a STV pode também pedir a reparação pelos danos sofridos, em conformidade com o artigo 94.o, n.o 2, do regulamento de base ( 20 ).

62.

Neste contexto, e para garantir a realização do objetivo geral do regulamento de base, e evitar que a multiplicação não autorizada possa resultar numa vantagem indevida para os infratores, em comparação com os terceiros que produzem sob licença material de propagação, parece-me necessário calcular o montante do dano que deve ser reparado por força da aplicação do artigo 94.o, n.o 2, do regulamento de base tomando como referência a remuneração por produção licenciada. Nesse caso, o prejuízo sofrido pelo titular, referido no artigo 94.o, n.o 2, do regulamento de base, corresponderia à diferença entre a referida remuneração e a remuneração equitativa estabelecida no artigo 14.o, n.o 3, quarto travessão, do regulamento de base ( 21 ).

63.

Esclareço que a remuneração por cultivo autorizado cobre apenas 50% do montante da remuneração por produção licenciada ( 22 ). O prejuízo sofrido pelo titular, na aceção do artigo 94.o, n.o 2, do regulamento de base, corresponde portanto, nesta situação, e sem que o titular seja obrigado a fazer a respetiva prova, à diferença entre o montante da remuneração por cultivo autorizado e o da remuneração por produção licenciada.

64.

Adicionalmente, estando em causa os custos de controlo e de vigilância normais referidos pelo órgão jurisdicional de reenvio, acrescentaria ainda que, tomar em consideração a remuneração por cultivo autorizado como base para o cálculo da indemnização adequada referida no artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base, acarretaria ainda a consequência de os referidos custos, normalmente incluídos no montante da remuneração por produção licenciada, não estavam integralmente cobertos pela remuneração prevista no artigo 14.o, n.o 3, quarto travessão, do regulamento de base.

65.

Donde decorre que, se este método de cálculo fosse considerado adequado, deveria permitir ao titular de uma variedade vegetal protegida calcular o montante do prejuízo a indemnizar ao abrigo do artigo 94.o, n.o 2, do regulamento de base, tendo por referência a remuneração por produção licenciada, em que estão também incluídos os custos de controlo e de vigilância normais suportados por aquele titular. Esta interpretação conduz ao mesmo resultado, do ponto de vista económico, para o referido titular, do que a proposta a título principal.

4. Quanto à tomada em consideração dos custos especialmente importantes com os meios de controlo

66.

O órgão jurisdicional de reenvio questiona-se também quanto à questão de saber se os custos especialmente elevados com os meios de controlo suportados por uma organização que defende os direitos de um elevado número de titulares de direitos de proteção para averiguar a possível existência de contrafações das variedades vegetais protegidas, na aceção do artigo 94.o, n.os 1 ou 2, do regulamento de base, poderão ser objeto de uma reparação e se os respetivos custos poderão ser calculados com base numa quantia fixa, que ascenda ao dobro da remuneração acordada.

67.

Atendendo, desde logo, à natureza desta questão, a Comissão observa que a mesma não é pertinente para a decisão do litígio no processo principal. Admito que, em verdade, decorre da decisão de reenvio que a STV não exigiu o pagamento da referida quantia fixa e que, no processo principal só estão em causa despesas extra judiciais de muito baixo valor, a saber 141,05 euros, que evidentemente não resultam da gestão dos controlos organizados pela STV. Considero, contudo, que esta questão não é meramente hipotética, dado que se encontra estreitamente relacionada com a aplicação dos n.os 1 e 2 do artigo 94.o do regulamento de base ( 23 ).

68.

Quanto ao mérito, importa salientar que as disposições do artigo 3.o, n.o 2, do regulamento de execução permitem que os titulares se organizem de uma forma apropriada para exercerem os direitos que lhes são conferidos pelo artigo 14.o do regulamento de base. De facto, podem agir a título individual ou coletivo ou ainda constituir uma organização para o efeito ( 24 ).

69.

Decorre do acórdão Jäger, já referido, que a STV é uma sociedade que tem por objeto a defesa dos interesses económicos dos seus associados que produzam ou comercializem, direta ou indiretamente, sementes ou que tenham interesses na produção de sementes ou na sua comercialização. Em especial, esta sociedade controla os direitos dos titulares nos planos nacional e internacional, e organiza inspeções, no que respeita aos direitos dos titulares, dos seus sócios ou de terceiros, em sociedades de multiplicação e em sociedades de multiplicação e de comercialização. Estas funções incluem ainda a cobrança de direitos de exploração de licenças relativas a variedades vegetais e, por fim, a adoção de medidas gerais com vista a promover a produção e a garantir o aprovisionamento dos consumidores em sementes perfeitas e de alta qualidade, bem como o seu escoamento ( 25 ).

70.

Como salientou o Governo helénico nas suas observações, o facto de poder exercer coletivamente os direitos decorrentes do artigo 14.o do regulamento de base não significa, de forma alguma, que os custos com esta ação coletiva devam ser suportados pelo agricultor, ainda que este viole as disposições do referido regulamento. Pelo contrário, em conformidade com as disposições conjugadas do artigo 14.o, n.o 3, quinto travessão, do regulamento de base, e do artigo 16.o do regulamento de execução, nos termos do qual o controlo deve ser efetuado pelo titular, estes custos devem ser integrados pelo titular no montante da remuneração por produção licenciada.

71.

Atendendo ao papel desempenhado por uma organização como a que está em causa no processo principal, que está estreitamente relacionado com o controlo e com as verificações para proteger os direitos dos titulares em causa, os custos com os meios de controlo especialmente elevados suportados por esta organização não podem ser tomados em conta separadamente no âmbito do cálculo da indemnização adequada, devida nos termos do artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base, ou da reparação de danos, devida nos termos do artigo 94.o, n.o 2, do mesmo regulamento.

72.

Em meu entender, só é possível ter em conta o custo destes meios, se estiverem em causa encargos suplementares extrajudiciais ou judiciais associados à análise de um caso especial de contrafação, cujo reembolso possa ser exigido por força do artigo 94.o, n.o 2, do regulamento de base ( 26 ), desde que verificadas as condições aí previstas. Deve, em qualquer caso, existir um nexo de causalidade entre estes custos e a contrafação em causa.

73.

Por último, observo que, a partir do momento em que a indemnização adequada prevista no artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base seja calculada, como proponho, tomando-se como referência a remuneração por produção licenciada, o titular não pode exigir o pagamento de uma indemnização a título de compensação pelos custos de controlo e de vigilância normais relacionados com o controlo referido no artigo 14.o, n.o 3, quinto travessão, do regulamento de base e também no artigo 16.o do regulamento de execução ( 27 ).

74.

Esta conclusão impõe-se uma vez que os custos de controlo e de vigilância normais, ainda que ascendam a montantes elevados, devem considerar-se, como resulta das presentes conclusões, incluídos nas importâncias recebidas a título de produção licenciada, e portanto integrados no montante da remuneração por produção licenciada, dado que o controlo será efetuado pelo titular, por força do artigo 14.o, n.o 3, quinto travessão, do regulamento de base e do artigo 16.o do regulamento de execução. Com efeito, o cálculo do montante da indemnização adequada tomando como referência a remuneração por produção licenciada permite reparar as consequências da infração e devolver, deste modo, o titular, à situação existente antes da violação.

V — Conclusão

75.

Atendendo ao conjunto de considerações anteriores, proponho ao Tribunal de Justiça, por um lado, que declare que não é necessário responder à segunda questão prejudicial e, por outro, que responda à primeira e à terceira questões prejudiciais submetidas pelo Bundesgerichtshof da seguinte forma:

«A indemnização adequada devida, por força do artigo 94.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 2100/94 do Conselho, de 27 de julho de 1994, relativo ao regime comunitário de proteção das variedades vegetais, pelo agricultor ao titular de um direito de proteção comunitária das variedades vegetais, pela utilização de material de propagação de uma variedade protegida obtido por plantação sem ter cumprido as obrigações previstas no artigo 14.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2100/94 e no artigo 8.o do Regulamento (CE) n.o 1768/95 da Comissão, de 24 de julho de 1995, que estabelece as regras de aplicação relativas à exceção agrícola prevista no n.o 3 do artigo 14.o do Regulamento (CE) n.o 2100/94, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 2605/98 da Comissão, de 3 de dezembro de 1998, deve ser calculada com base no montante médio cobrado pela produção licenciada de material de multiplicação das variedades protegidas da espécie vegetal em causa na mesma área. Considerando que, por um lado, o cálculo do montante da indemnização adequada nos termos da base acima indicada, permite devolver o titular à situação existente antes da contrafação e reparar as consequências da violação dos seus direitos, e que, por outro lado, os custos de controlo e vigilância devem considerar-se integrados, pelo titular, no preço da licença, o pagamento destes custos só pode ser exigido pelo titular desde que constituam custos suplementares extrajudiciais ou judiciais associados à análise de um caso especial de contrafação, cujo reembolso seja exigível por força do artigo 94.o, n.o 2, do Regulamento n.o 2100/94, e nas condições aí previstas.»


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) Regulamento do Conselho, de 27 de julho de 1994 (JO L 227, p. 1).

( 3 ) Regulamento da Comissão, de 24 de julho de 1995 (JO L 173, p. 14), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 2605/98 da Comissão, de 3 de dezembro de 1998 (JO L 328, p. 6).

( 4 ) V., neste sentido, n.os 22 e 23 das conclusões do advogado-geral Ruiz-Jarabo Colomer apresentadas no processo que deu origem ao acórdão de 8 de junho de 2006, Deppe e o. (C-7/05 a C-9/05, Colet., p. I-5045).

( 5 ) Acórdão de 10 de abril de 2003 (C-305/00, Colet., p. I-3525). V., também, acórdãos de 11 de março de 2004, Jäger (C-182/01, Colet., p. I-2263); de 14 de outubro de 2004, Brangewitz (C-336/02, Colet., p. I-9801); acórdão Deppe e o., já referido, bem como de 20 de outubro de 2011, Greenstar-Kanzi Europe (C-140/10, Colet., p. I-10075).

( 6 ) No plano internacional, a proteção das variedades vegetais é objeto de uma convenção no âmbito da Organização Mundial da Propriedade Intelectual, a saber a Convenção internacional para a proteção das obtenções vegetais. A Comunidade Europeia aderiu a esta convenção em 2005 [Decisão 2005/523/CE do Conselho, de 30 de maio de 2005, que aprova a adesão da Comunidade Europeia à Convenção internacional para a proteção das obtenções vegetais, revista em Genebra a 19 de março de 1991 (JO L 192, p. 63)]. A regulamentação da União inspira-se fortemente nas disposições desta convenção.

( 7 ) Esclareço que se deve partir da premissa de que os titulares incluem, em geral, no montante da remuneração por produção licenciada, os custos de controlo e de vigilância normais relacionados com a salvaguarda dos seus direitos.

( 8 ) V., no que respeita às características das variedades cultivadas no âmbito da agricultura europeia, n.os 1 a 4 das conclusões da advogada-geral J. Kokott apresentadas no processo Association Kokopelli (C-59/11), pendente no Tribunal de Justiça.

( 9 ) Acórdão Schulin, já referido (n.o 71).

( 10 ) V., neste sentido, Bonadio, E., «Remedies and sanctions for the infringement of intellectual property rights under EC law», European Intellectual Property Review, 2008, n.o 8, vol. 30, p. 324.

( 11 ) A redação utilizada nestas versões é, respectivamente, a seguinte: «indemnización razonable», «rimelig vederlag», «angemessenen Vergütung», «reasonable compensation», «equa compensazione» e «kohtuullinen korvaus».

( 12 ) Estas versões utilizam, respetivamente, as expressões seguintes: «remuneración justa», «rimelig godtgoerelse», «angemessene Entschädigung», «equitable remuneration», «equa remunerazione» e «kohtuullinen palkkio».

( 13 ) Acórdão Schulin, já referido (n.o 47).

( 14 ) Acórdão Brangewitz, já referido (n.o 43).

( 15 ) V., neste sentido, acórdão Brangewitz, já referido (n.o 43) e, por analogia, acórdão de 6 de fevereiro de 2003, SENA (C-245/00, Colet., p. I-1251, n.o 36).

( 16 ) V., também, a este respeito, o n.o 40 das conclusões do advogado-geral Ruiz-Jarabo Colomer apresentadas no processo que deu origem ao acórdão Jäger, já referido. Neste contexto, o advogado-geral observou que o regulamento de base não tinha por finalidade regular um ou outro setor de produção agrícola na Comunidade mas sim instituir uma proteção comunitária para as variedades vegetais.

( 17 ) Assinalo igualmente que este regime constitui um sistema indemnizatório distinto e separado, que visa garantir o efeito útil do regulamento de base.

( 18 ) V., no que se refere ao caráter objetivo da indemnização adequada prevista no artigo 94.o, n.o 1, do regulamento de base, acórdão Greenstar-Kanzi Europe, já referido (n.o 48).

( 19 ) V., também, o vigésimo sexto considerando da Diretiva n.o 2004/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual (JO L 157, p. 45), não aplicável ao caso em apreço.

( 20 ) No que se refere aos possíveis métodos de cálculo do prejuízo sofrido pelo titular e os problemas que estes suscitam, v. Würtenberger G., e o., European Plant Variety Protection, Oxford University Press, Oxford, 2009, pp. 177 e 178.

( 21 ) Acrescento que o artigo 18.o, n.o 2, do regulamento de execução prevê que, em caso de violação repetida e intencional, pelo agricultor, das suas obrigações, estabelecidas no artigo 14.o, n.o 3, do regulamento de base, a reparação dos danos sofridos pelo titular deve cobrir, pelo menos, uma quantia fixa calculada com base no quádruplo do montante médio cobrado pela produção autorizada, sem prejuízo da compensação de quaisquer danos mais elevados. Contudo, as disposições do regulamento de execução não podem impor aos agricultores obrigações mais abrangentes do que as que decorrem do regulamento de base. V., no que se refere à interpretação do artigo 8.o, n.o 2, do regulamento de execução, acórdão Schulin, já referido (n.o 60).

( 22 ) Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, do regulamento de execução, esta remuneração pode constituir o objeto de um contrato entre o titular e o agricultor.

( 23 ) Saliento, de passagem, que esta questão se inspira, tal como resulta da decisão de reenvio, na jurisprudência do Bundesgerichtshof em matéria de violação de direitos de representação. Nesse domínio, desde há muito tempo que o Bundesgerichtshof penaliza a sociedade gestora que comete infrações deste tipo com uma majoração dita «de contrafação», que se eleva ao dobro da remuneração habitual pela licença.

( 24 ) V., a este respeito, acórdão Jäger, já referido (n.o 51).

( 25 ) V. acórdão Jäger, já referido (n.o 17).

( 26 ) Parece-me que esta conclusão está, também, em conformidade com os princípios enunciados no vigésimo sexto considerando e no artigo 13.o da Diretiva n.o 2004/48.

( 27 ) Excetuados estes custos, o titular pode, contudo, por força do artigo 94.o, n.o 2, do regulamento de base, exigir o pagamento de uma indemnização para reparação dos danos sofridos.

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