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Document 62009CJ0438

Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 22 de dezembro de 2010.
Bogusław Juliusz Dankowski contra Dyrektor Izby Skarbowej w Łodzi.
Pedido de decisão prejudicial apresentada por Naczelny Sąd Administracyjny.
Sexta Directiva IVA – Direito a dedução do IVA pago a montante – Serviços prestados – Sujeito passivo não inscrito no registo IVA – Menções obrigatórias na factura para efeitos do IVA – Regulamentação fiscal nacional – Exclusão do direito a dedução nos termos do artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva IVA.
Processo C-438/09.

Colectânea de Jurisprudência 2010 I-14009

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2010:818

Processo C‑438/09

Bogusław Juliusz Dankowski

contra

Dyrektor Izby Skarbowej w Łodzi

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Naczelny Sąd Administracyjny)

«Sexta Directiva IVA – Direito a dedução do IVA pago a montante – Serviços prestados – Sujeito passivo não inscrito no registo IVA – Menções obrigatórias na factura para efeitos do IVA – Regulamentação fiscal nacional – Exclusão do direito a dedução nos termos do artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva IVA»

Sumário do acórdão

1.        Disposições fiscais – Harmonização das legislações – Impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado – Dedução do imposto pago a montante – Dedução por um sujeito passivo que pagou o imposto relativamente a prestações de serviços fornecidas por outro sujeito passivo não registado para efeitos desse imposto – Requisito – Factura emitida pelo referido prestador que comporta todas as informações exigidas

[Directiva 77/388 do Conselho, artigos 18.°, n.° 1, alínea a), e 22.°, n.° 3, alínea b)]

2.        Disposições fiscais – Harmonização das legislações – Impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado – Dedução do imposto pago a montante – Exclusões do direito a dedução – Faculdade de os Estados‑Membros manterem as exclusões existentes no momento da entrada em vigor da Sexta Directiva – Regulamentação nacional que exclui do direito a dedução o imposto pago por um sujeito passivo a outro sujeito passivo pelo facto de este último não estar registado para efeito deste imposto – Inadmissibilidade

(Directiva 77/388 do Conselho, artigo 17.°, n.° 6)

1.        Os artigos 18.°, n.° 1, alínea a), e 22.°, n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva 77/388, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, conforme alterada pela Directiva 2006/18, devem ser interpretados no sentido de que um sujeito passivo beneficia do direito a dedução no que diz respeito ao imposto sobre o valor acrescentado pago por prestações de serviços fornecidas por outro sujeito passivo que não está registado para efeitos deste imposto, quando as facturas correspondentes contenham todas as informações exigidas pelo referido artigo 22.°, n.° 3, alínea b), em particular as necessárias para a identificação da pessoa que emitiu as ditas facturas e a natureza dos serviços fornecidos.

Com efeito, desde que a Administração Fiscal competente disponha dos dados necessários para determinar que o sujeito passivo é, enquanto destinatário das operações em causa, devedor de imposto sobre o valor acrescentado, não poderá impor, no que diz respeito ao direito deste de deduzir o imposto pago a montante, condições suplementares que possam ter por efeito tornar completamente inútil o exercício desse direito.

Assim, um eventual incumprimento pelo prestador de serviços da obrigação estabelecida no artigo 22.°, n.° 1, da Sexta Directiva não poderá pôr em causa o direito a dedução de que beneficia o destinatário dos referidos serviços ao abrigo do artigo 17.°, n.° 2, desta directiva.

(cf. n.os 35‑36, 38, disp. 1)

2.        O artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva 77/388, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, conforme alterada pela Directiva 2006/18, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que exclua do direito a dedução o imposto sobre o valor acrescentado pago por um sujeito passivo a outro sujeito passivo, prestador de serviços, quando este não esteja registado para efeitos desse imposto.

Com efeito, a faculdade concedida aos Estados‑Membros no artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva não constitui um poder discricionário absoluto de excluir todos os bens e serviços ou a quase totalidade destes do direito a dedução do IVA e de esvaziar, assim, da sua substância o regime instituído pelas disposições dessa directiva. A referida faculdade não se refere, portanto, a exclusões gerais e não dispensa os Estados‑Membros do dever de precisar suficientemente os bens e os serviços em relação aos quais está excluído o direito a dedução.

(cf. n.os 41, 47, disp. 2)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

22 de Dezembro de 2010 (*)

«Sexta Directiva IVA – Direito a dedução do IVA pago a montante – Serviços prestados – Sujeito passivo não inscrito no registo IVA – Menções obrigatórias na factura para efeitos do IVA – Regulamentação fiscal nacional – Exclusão do direito a dedução nos termos do artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva IVA»

No processo C‑438/09,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Naczelny Sąd Administracyjny (Polónia), por decisão de 14 de Julho de 2009, entrado no Tribunal de Justiça em 9 de Novembro de 2009, no processo

Bogusław Juliusz Dankowski

contra

Dyrektor Izby Skarbowej w Łodzi,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente de secção, D. Šváby, R. Silva de Lapuerta (relatora), E. Juhász e T. von Danwitz, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: K. Malacek, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 11 de Novembro de 2010,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação de Bogusław Juliusz Dankowski, por R. Grzejszczak, J. Skrzydło, T. Grzejszczak e A. Kania, adwokaci,

–        em representação do Governo polaco, por A. Kramarczyk, M. Szpunar e B. Majczyna, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo alemão, por C. Blaschke e J. Möller, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo helénico, por Z. Chatzipavlou, D. Tsagkaraki e K. Georgiadis, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por D. Triantafyllou, A. Stobiecka‑Kuik e K. Herrmann, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 17.°, n.os 2 e 6, bem como dos artigos 18.° e 22.° da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1; EE 09 F1 p. 54), na sua versão em vigor à data dos factos controvertidos.

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe B. J. Dankowski ao Dyrektor Izby Skarbowej w Łodzi (director da Câmara Fiscal de Łódz) relativamente à limitação de que foi objecto o direito a dedução do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA»).

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        Nos termos do artigo 2.° da Sexta Directiva:

«Estão sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado:

1.      As entregas de bens e as prestações de serviços, efectuadas a título oneroso, no território do país, por um sujeito passivo agindo nessa qualidade;

[…]»

4        O artigo 4.° desta directiva dispõe:

«1.      Por ‘sujeito passivo’ entende‑se qualquer pessoa que exerça, de modo independente, em qualquer lugar, uma das actividades económicas referidas no n.° 2, independentemente do fim ou do resultado dessa actividade.

2.      As actividades económicas referidas no n.° 1 são todas as actividades de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas […]

[…]»

5        Nos termos do artigo 17.° da Sexta Directiva:

«1.      O direito à dedução surge no momento em que o imposto dedutível se torna exigível.

2.      Desde que os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das próprias operações tributáveis, o sujeito passivo está autorizado a deduzir do imposto de que é devedor:

a)      o imposto sobre o valor acrescentado devido ou pago em relação a bens que lhe tenham sido fornecidos ou que lhe devam ser fornecidos e a serviços que lhe tenham sido prestados ou que lhe devam ser prestados por outro sujeito passivo;

[…]

6.      O mais tardar antes de decorrido o prazo de quatro anos a contar da data da entrada em vigor da presente directiva, o Conselho, deliberando por unanimidade, sob proposta da Comissão, determinará quais as despesas que não conferem direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado. Serão excluídas do direito à dedução, em qualquer caso, as despesas que não tenham carácter estritamente profissional, tais como despesas sumptuárias, recreativas ou de representação.

Até à entrada em vigor das disposições acima referidas, os Estados‑Membros podem manter todas as exclusões previstas na legislação nacional respectiva no momento da entrada em vigor da presente directiva.

[…]»

6        O artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Sexta Directiva prevê:

«Para poder exercer o direito à dedução, o sujeito passivo deve satisfazer as seguintes condições:

a)      Relativamente à dedução prevista no n.° 2, alínea a), do artigo 17.°, possuir uma factura emitida nos termos do n.° 3 do artigo 22.° [...]»

7        Em conformidade com o disposto no artigo 22.°, n.° 1, da referida directiva:

«a)      Os sujeitos passivos devem declarar o início, a alteração e a cessação da sua actividade na qualidade de sujeitos passivos. […]

[…]

c)      Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para que um número pessoal identifique:

–        todos os sujeitos passivos […] que efectuem, no território do país, entregas de bens ou prestações de serviços que lhes confiram direito a dedução, e que não sejam entregas de bens ou prestações de serviços em relação às quais o imposto seja devido unicamente pelo destinatário […]»

8        O artigo 22.°, n.° 3, da Sexta Directiva está redigido como se segue:

«a)      Todos os sujeitos passivos devem assegurar que seja emitida […] uma factura para […] as prestações de serviços que efectuem a outros sujeitos passivos […]

b)      Sem prejuízo das disposições específicas constantes da presente directiva, nas facturas emitidas por força do disposto no primeiro, segundo e terceiro parágrafos da alínea a), as únicas menções obrigatórias para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado são as seguintes […]:

–        a data de emissão;

–        um número sequencial […],

–        o número de identificação para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado, referido na alínea c) do n.° 1, ao abrigo do qual o sujeito passivo tenha efectuado […] a prestação de serviços;

–        o número de identificação para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado do cliente, a que se refere o n.° 1, alínea c), ao abrigo do qual tenha sido efectuada […] uma prestação de serviços […],

–        o nome e o endereço completo do sujeito passivo e do seu cliente;

–        a quantidade e natureza […] dos serviços prestados;

–        a data em que for efectuada, ou concluída […] a prestação de serviços […]

[…]»

9        O artigo 22.°, n.° 8, da Sexta Directiva prevê:

«Os Estados‑Membros podem prever outras obrigações que considerem necessárias para garantir a cobrança exacta do imposto e para evitar a fraude. […]

A faculdade prevista no primeiro parágrafo não poderá ser utilizada para impor obrigações suplementares às fixadas no n.° 3.»

 Regulamentação nacional

10      O artigo 96.° da Lei do imposto sobre os bens e serviços (ustawa o podatku od towarów iusłúg), de 11 de Março de 2004, na versão aplicável aos factos do caso em apreço no processo principal, prevê que os sujeitos passivos devem, antes do primeiro dia do exercício da sua actividade, apresentar à autoridade fiscal competente uma declaração de registo.

11      O artigo 88.°, n.° 3a, ponto 1, alínea a), da referida lei prevê que facturas não podem servir de base à dedução do imposto a montante e ao reembolso do diferencial de imposto ou ao reembolso do imposto a montante, quando a venda constar de facturas emitidas por um operador inexistente ou não autorizado a emitir facturas.

12      As disposições de um regulamento de execução dessa mesma lei, adoptadas pelo Ministério das Finanças, prevêem que os sujeitos passivos registados, enquanto sujeitos passivos efectivos do IVA, detentores de um número de identificação fiscal, devem emitir facturas portadoras da menção «factura IVA».

13      O § 48, n.° 4, ponto 1, alínea a), desse regulamento prevê que, no caso de a venda de mercadorias ou de serviços constar de facturas emitidas por operador inexistente ou não autorizado a emitir facturas, estas não podem servir de base à dedução do imposto a montante e ao reembolso do diferencial ou ao reembolso do imposto a montante.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

14      B. J. Dankowski, recorrente no processo principal, detém a empresa Dan‑Trak. Entre 2004 e 2006, M. Płacek, dirigente da empresa Artem‑Studio, forneceu‑lhe um determinado número de serviços comerciais tributáveis. M. Płacek não tinha todavia cumprido a obrigação de se inscrever no registo do imposto sobre os bens e os serviços, nem liquidado o IVA, apesar de ter emitido facturas que atestam os serviços fornecidos e que mencionam o imposto devido.

15      Por decisão de 23 de Março de 2007, o Dyrektor Izby Skarbowej w Łodzi, não pondo embora em causa a realização dos serviços em questão, recusou a B. J. Dankowski o direito a dedução do IVA pago a montante, que figura nas facturas emitidas por M. Płacek.

16      Nos fundamentos dessa decisão, salientou que o emissor das facturas controvertidas não tinha sido registado como sujeito passivo de IVA e que, devido ao não cumprimento da obrigação de registo que as disposições nacionais aplicáveis impõem, as facturas emitidas por esse operador não conferiam direito à dedução do IVA pago a montante.

17      B. J. Dankowski interpôs recurso da referida decisão para o Wojewódzki Sąd Administracyjny w Łodzi (Tribunal Administrativo de Łódź). Em apoio do seu recurso, B. J. Dankowski alegou, nomeadamente, que o registo de um operador como sujeito passivo de IVA é apenas um acto técnico que não poderá ter efeitos sobre o direito a dedução do imposto pago a montante.

18      Por decisão de 4 de Dezembro de 2007, o Wojewódzki Sąd Administracyjny w Łodzi negou provimento ao recurso.

19      No seu recurso de cassação interposto para o Naczelny Sąd Administracyjny, B. J. Dankowski invocou nomeadamente a desconformidade com o direito da União da aplicação das disposições do direito fiscal polaco, bem como uma interpretação errada do artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva.

20      Nestas condições, o Naczelny Sąd Administracyjny decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      As regras do sistema [do IVA], em particular o artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva […], opõem‑se a uma legislação de um Estado‑Membro por força da qual um sujeito passivo não beneficia do direito de deduzir o imposto suportado resultante de uma factura IVA emitida por um operador não registado no cadastro de sujeitos passivos do imposto sobre bens e serviços?

2)      Para responder à primeira questão, é relevante que:

a)      não haja dúvidas de que as transacções referidas na factura IVA estão sujeitas a IVA e foram efectivamente executadas;

b)      a factura contenha todas as informações exigidas pelo direito comunitário;

c)      a restrição a que está sujeito o direito do sujeito passivo de deduzir o imposto suportado resultante da factura emitida por um operador não registado fosse aplicável na ordem jurídica nacional antes da data da adesão da República da Polónia à União?

3)      A resposta à primeira questão está subordinada ao preenchimento de requisitos suplementares (por exemplo, a prova de que o sujeito passivo agiu de boa fé)?»

 Quanto às questões prejudiciais

21      Através das três questões submetidas, que cumpre examinar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se, nas circunstâncias do caso em apreço no processo principal e tendo em conta os artigos 18.°, n.° 1, alínea a), e 22.°, n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, um sujeito passivo beneficia do direito a dedução no que diz respeito ao IVA pago por prestações de serviços fornecidas por outro sujeito passivo que não está registado para efeitos de IVA e, em caso de resposta afirmativa, se o artigo 17.°, n.° 6, desta directiva se opõe a uma regulamentação nacional que exclua o direito a dedução quando os serviços tiverem sido fornecidos por tal sujeito passivo.

 Quanto à primeira vertente das questões prejudiciais

22      Há que recordar, a título preliminar, que o direito a dedução previsto no artigo 17.°, n.° 2, da Sexta Directiva faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado (v. acórdãos de 8 de Janeiro de 2002, Metropol e Stadler, C‑409/99, Colect., p. I‑81, n.° 42, e de 26 de Maio de 2005, Kretztechnik, C‑465/03, Colect., p. I‑4357, n.° 33).

23      O direito a dedução exerce‑se imediatamente em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efectuadas a montante (v. acórdãos de 13 de Março de 2008, Securenta, C‑437/06, Colect., p. I‑1597, n.° 24; de 4 de Junho de 2009, SALIX Grundstücks‑Vermietungsgesellschaft, C‑102/08, Colect., p. I‑4629, n.° 70; e de 29 de Outubro de 2009, SKF, C‑29/08, Colect., p. I‑10413, n.° 55).

24      Com efeito, o regime das deduções assim estabelecido visa aliviar inteiramente o empresário do peso do IVA devido ou pago no quadro de todas as suas actividades económicas. O sistema comum do IVA garante dessa forma a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as actividades económicas, independentemente do seu fim ou do seu resultado, na condição de essas actividades estarem elas mesmas, em princípio, sujeitas a IVA (v. acórdãos de 29 de Abril de 2004, Faxworld, C‑137/02, Colect., p. I‑5547, n.° 37, e SKF, já referido, n.° 56).

25      No que diz respeito ao litígio no processo principal, é pacífico que os serviços em causa foram realizados por um operador situado a montante e que os referidos serviços foram utilizados pelo recorrente no processo principal a jusante para os fins das suas operações tributáveis.

26      Por conseguinte, as condições materiais relativas ao surgimento do direito a dedução, previstas no artigo 17.°, n.° 2, da Sexta Directiva, encontram‑se preenchidas.

27      Quanto às regras de exercício do direito a dedução, o artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Sexta Directiva prevê que o sujeito passivo deve possuir uma factura emitida em conformidade com o disposto no artigo 22.°, n.° 3, desta directiva.

28      Esta última disposição especifica na sua alínea b) as menções que devem figurar obrigatoriamente, para efeitos de IVA, nas facturas emitidas em aplicação das disposições do artigo 22.°, n.° 3, alínea a), da Sexta Directiva, prevendo essa alínea a obrigação de qualquer sujeito passivo de se assegurar de que uma factura seja emitida em relação às prestações de serviços que efectua para outro sujeito passivo.

29      No que diz respeito às menções enunciadas no artigo 22.°, n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, o órgão jurisdicional de reenvio apurou que as facturas apresentadas pelo recorrente no processo principal continham todas as informações exigidas por essa disposição. Resulta em particular dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça, bem como das indicações fornecidas pelo Governo polaco na audiência, que as referidas facturas continham o número de identificação fiscal do prestador dos serviços em causa, sendo tal número atribuído oficiosamente aos operadores pelas autoridades fiscais polacas, independentemente de pedido de registo por sua parte.

30      Mesmo que a referida disposição preveja a menção do «número de identificação para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado», há que considerar que o número de identificação fiscal atribuído no caso em apreço assegura a identificação do sujeito passivo em causa e é, pois, de molde a satisfazer as exigências do artigo 22.°, n.° 3, alínea b), terceiro travessão, da Sexta Directiva.

31      No entanto, o referido prestador, como notou o órgão jurisdicional de reenvio, tendo embora emitido facturas relativas aos serviços fornecidos ao recorrente no processo principal, não pediu o registo à autoridade nacional competente para efeitos de IVA.

32      O artigo 22.°, n.° 1, da Sexta Directiva prevê, com efeito, que os sujeitos passivos devem declarar o início da sua actividade na qualidade de sujeitos passivos.

33      Ora, não obstante a importância de tal registo para o bom funcionamento do sistema do IVA, um incumprimento dessa obrigação por um sujeito passivo não poderá pôr em causa o direito a dedução conferido pelo artigo 17.°, n.° 2, da Sexta Directiva a outro sujeito passivo.

34      Com efeito, o artigo 22.°, n.° 1, da Sexta Directiva prevê somente a obrigação de os sujeitos passivos declararem o início, a alteração e a cessação das suas actividades, mas não autoriza de forma alguma os Estados‑Membros, em caso de falta de apresentação de tal declaração, a reportar o exercício do direito a dedução para o início efectivo da realização habitual das operações tributadas ou a privar o sujeito passivo do exercício desse direito (v. acórdãos de 21 de Março de 2000, Gabalfrisa e o., C‑110/98 a C‑147/98, Colect., p. I‑1577, n.° 51, e de 21 de Outubro de 2010, Nidera Handelscompagnie, C‑385/09, ainda não publicado na Colectânea, n.° 48).

35      Desde que a Administração Fiscal competente disponha dos dados necessários para determinar que o sujeito passivo é, enquanto destinatário das operações em causa, devedor de IVA, não poderá impor, no que diz respeito ao direito deste de deduzir o imposto pago a montante, condições suplementares que possam ter por efeito tornar completamente inútil o exercício desse direito (v. acórdãos de 8 de Maio de 2008, Ecotrade, C‑95/07 e C‑96/07, Colect., p. I‑3457, n.° 64, e de 30 de Setembro de 2010, Uszodaépítő, C‑392/09, ainda não publicado na Colectânea, n.° 40).

36      Assim, um eventual incumprimento pelo prestador de serviços da obrigação estabelecida no artigo 22.°, n.° 1, da Sexta Directiva não poderá pôr em causa o direito a dedução de que beneficia o destinatário dos referidos serviços ao abrigo do artigo 17.°, n.° 2, desta directiva.

37      Acontece o mesmo com o artigo 22.°, n.° 8, da Sexta Directiva, nos termos do qual os Estados‑Membros têm a faculdade de prever outras obrigações que julgarem necessárias para garantir a cobrança exacta do imposto e para evitar a fraude. Com efeito, embora essa disposição permita aos Estados‑Membros adoptar determinadas medidas, estas não deverão, todavia, ir para além do que é necessário para atingir esse fim e não poderão, por isso, ser utilizadas de tal forma que ponham sistematicamente em causa o direito a dedução do IVA, que é um princípio fundamental do sistema comum do IVA (v. acórdãos de 18 de Dezembro de 1997, Molenheide e o., C‑286/94, C‑340/95, C‑401/95 e C‑47/96, Colect., p. I‑7281, n.° 47; Gabalfrisa e o., já referido, n.° 52; e Ecotrade, já referido, n.os 65 e 66).

38      Resulta destas considerações que os artigos 18.°, n.° 1, alínea a), e 22.°, n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva devem ser interpretados no sentido de que um sujeito passivo beneficia do direito a dedução no que diz respeito ao IVA pago por prestações de serviços fornecidas por outro sujeito passivo que não está registado para efeitos de IVA, quando as facturas correspondentes contenham todas as informações exigidas pelo referido artigo 22.°, n.° 3, alínea b), em particular, as necessárias para a identificação da pessoa que emitiu as ditas facturas e a natureza dos serviços fornecidos.

 Quanto à segunda vertente das questões prejudiciais

39      Uma vez que o recorrente no processo principal tem consequentemente direito a dedução, por força da Sexta Directiva, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber se o artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que exclua o direito a dedução do IVA pago por um sujeito passivo a outro sujeito passivo, prestador de serviços, quando este não esteja registado para efeitos do IVA.

40      A este propósito, deve recordar‑se que essa disposição constitui uma medida de natureza derrogatória que permite, em certas condições, aos Estados‑Membros manter a sua legislação existente em matéria de exclusão do direito a dedução, à data da entrada em vigor da Sexta Directiva para o Estado‑Membro em causa, até que o Conselho adopte as disposições previstas nesse artigo (v. acórdãos de 11 de Dezembro de 2008, Danfoss e AstraZeneca, C‑371/07, Colect., p. I‑9549, n.° 28, e de 15 de Abril de 2010, X Holding e Oracle Nederland, C‑538/08 e C‑33/09, ainda não publicado na Colectânea, n.° 38).

41      Quanto ao alcance dessa disposição, o Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de que a faculdade concedida aos Estados‑Membros no artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva não constitui um poder discricionário absoluto de excluir todos os bens e serviços ou a quase totalidade destes do direito a dedução do IVA e de esvaziar, assim, da sua substância, o regime instituído pelas disposições dessa directiva. A referida faculdade não se refere, portanto, a exclusões gerais e não dispensa os Estados‑Membros do dever de precisar suficientemente os bens e os serviços em relação aos quais está excluído o direito a dedução (v. acórdãos de 5 de Outubro de 1999, Royscot e o., C‑305/97, Colect., p. I‑6671, n.os 22 e 24; de 14 de Julho de 2005, Charles e Charles‑Tijmens, C‑434/03, Colect., p. I‑7037, n.os 33 e 35; e de 30 de Setembro de 2010, Oasis East, C‑395/09, ainda não publicado na Colectânea, n.° 23).

42      Além disso, tratando‑se de um regime que constitui uma derrogação ao princípio do direito a dedução do IVA, é de interpretação estrita (v. acórdãos de 22 de Dezembro de 2008, Magoora, C‑414/07, Colect., p. I‑10921, n.° 28, e Oasis East, já referido, n.° 24).

43      No que diz respeito ao processo principal e à eventual aplicabilidade do regime derrogatório previsto no artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva à situação do caso em apreço, importa salientar que a referida directiva entrou em vigor na Polónia na data de adesão deste Estado‑Membro à União Europeia, ou seja, em 1 de Maio de 2004. Assim, essa data é pertinente para efeitos da aplicação da disposição referida, no que diz respeito a esse Estado‑Membro (acórdão Oasis East, já referido, n.° 25).

44      A fim de apreciar a regulamentação nacional em causa no processo principal à luz do artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva e da jurisprudência supramencionada, há que reconhecer que constitui uma medida de carácter geral que exclui o direito a dedução do IVA pago a montante em relação a qualquer operação realizada por um sujeito passivo que não cumpra a obrigação de registo para efeitos do IVA.

45      Ora, tal regulamentação implica uma limitação do direito a dedução do IVA que excede a autorizada pelo artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva.

46      Com efeito, o Tribunal de Justiça precisou que os Estados‑Membros não estão habilitados a manter exclusões do direito a dedução do IVA que se apliquem de forma geral a qualquer despesa ligada à aquisição de bens ou serviços (acórdãos de 23 de Abril de 2009, PARAT Automotive Cabrio, C‑74/08, Colect., p. I‑3459, n.os 28 e 29, e Oasis East, já referido, n.° 30).

47      Resulta do conjunto das considerações precedentes que o artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que exclua o direito a dedução do IVA pago por um sujeito passivo a outro sujeito passivo, prestador de serviços, quando este não esteja registado para efeitos desse imposto.

 Quanto às despesas

48      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

1)      Os artigos 18.°, n.° 1, alínea a), e 22.°, n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, conforme alterada pela Directiva 2006/18/CE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 2006, devem ser interpretados no sentido de que um sujeito passivo beneficia do direito a dedução no que diz respeito ao imposto sobre o valor acrescentado pago por prestações de serviços fornecidas por outro sujeito passivo que não está registado para efeitos desse imposto, quando as facturas correspondentes contenham todas as informações exigidas pelo referido artigo 22.°, n.° 3, alínea b), em particular, as necessárias para a identificação da pessoa que emitiu as ditas facturas e a natureza dos serviços fornecidos.

2)      O artigo 17.°, n.° 6, da Sexta Directiva 77/388, conforme alterada pela Directiva 2006/18, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que exclua o direito a dedução do imposto sobre o valor acrescentado pago por um sujeito passivo a outro sujeito passivo, prestador de serviços, quando este não esteja registado para efeitos desse imposto.

Assinaturas


* Língua do processo: polaco.

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