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Document 62009CJ0133

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 30 de Septembro de 2010.
    József Uzonyi contra Mezőgazdasági és Vidékfejlesztési Hivatal Központi Szerve.
    Pedido de decisão prejudicial: Fővárosi Bíróság - Hungria.
    Agricultura - Política agrícola comum - Regimes de apoio - Regulamento (CE) n.º 1782/2003 - Artigo 143.º-B-A - Pagamento específico para o açúcar - Concessão - Decisão dos novos Estados-Membros - Requisitos - Critérios objectivos e não discriminatórios.
    Processo C-133/09.

    Colectânea de Jurisprudência 2010 I-08747

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2010:563

    Processo C‑133/09

    József Uzonyi

    contra

    Mezőgazdasági és Vidékfejlesztési Hivatal Központi Szerve

    (pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Fővárosi Bíróság)

    «Agricultura – Política agrícola comum – Regimes de apoio directo – Regulamento (CE) n.° 1782/2003 – Artigo 143.°‑B‑A – Pagamento específico para o açúcar – Concessão – Decisão dos novos Estados‑Membros – Requisitos – Critérios objectivos e não discriminatórios»

    Sumário do acórdão

    Agricultura – Política agrícola comum – Regimes de apoio directo – Regras comuns – Pagamento específico para o açúcar

    (Regulamento n.° 1782/2003 do Conselho, Artigo 143.°‑B‑A, n.° 1)

    O artigo 143.°‑B‑A, n.° 1, do Regulamento n.° 1782/2003, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio directo no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores e altera os Regulamentos n.° 2019/93, n.° 1452/2001, n.° 1453/2001, n.° 1454/2001, n.° 1868/94, n.° 1251/1999, n.° 1254/1999, n.° 1673/2000, n.° 2358/71 e n.° 2529/2001, conforme alterado pelo Regulamento n.° 319/2006, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que exclui do direito ao pagamento específico para o açúcar um agricultor não titular de direitos de entrega e que entrega beterraba sacarina a um fabricante de açúcar através de um integrador titular desses direitos, quando essa regulamentação concede um pagamento específico a um agricultor titular de direitos de entrega que entrega beterraba sacarina directamente a um fabricante de açúcar, bem como a um agricultor não titular de direitos de entrega, membro de um agrupamento de produtores, que entrega beterraba sacarina a um fabricante de açúcar através desse agrupamento, titular dos direitos de entrega.

    (cf. n.° 46, disp.)







    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

    30 de Setembro de 2010 (*)

    «Agricultura – Política agrícola comum – Regimes de apoio – Regulamento (CE) n.° 1782/2003 – Artigo 143.°‑B‑A – Pagamento específico para o açúcar – Concessão – Decisão dos novos Estados‑Membros – Requisitos – Critérios objectivos e não discriminatórios»

    No processo C‑133/09,

    que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pela Fővárosi Bíróság (Hungria), por decisão de 23 de Fevereiro de 2009, entrado no Tribunal de Justiça em 8 de Abril de 2009, no processo

    József Uzonyi

    contra

    Mezőgazdasági és Vidékfejlesztési Hivatal Központi Szerve,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

    composto por: J.‑C. Bonichot, presidente de secção, C. Toader, K. Schiemann, L. Bay Larsen (relator) e A. Prechal, juízes,

    advogado‑geral: J. Mazák,

    secretário: B. Fülöp, administrador,

    vistos os autos e após a audiência de 8 de Julho de 2010,

    vistas as observações apresentadas:

    –        em representação de J. Uzonyi, por Y. Uzonyi, ügyvéd,

    –        em representação do Governo húngaro, por R. Somssich, M. Fehér e K. Szíjjártó, na qualidade de agentes,

    –        em representação da Comissão Europeia, por B. Simon e F. Clotuche‑Duvieusart, na qualidade de agentes,

    vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

    profere o presente

    Acórdão

    1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 143.°‑B‑A, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1782/2003 do Conselho, de 29 de Setembro de 2003, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio directo no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores e altera os Regulamentos (CEE) n.° 2019/93, (CE) n.° 1452/2001, (CE) n.° 1453/2001, (CE) n.° 1454/2001, (CE) n.° 1868/94, (CE) n.° 1251/1999, (CE) n.° 1254/1999, (CE) n.° 1673/2000, (CEE) n.° 2358/71 e (CE) n.° 2529/2001 (JO L 270, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 319/2006 do Conselho, de 20 de Fevereiro de 2006 (JO L 58, p. 32, a seguir «Regulamento n.° 1782/2003»).

    2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre J. Uzonyi e o Mezőgazdasági és Vidékfejlesztési Hivatal Központi Szerve (órgão central do Instituto da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, a seguir «Hivatal»), a respeito de um pedido de pagamento específico para o açúcar.

     Quadro jurídico

     Direito comunitário

    3        O artigo 143.°‑B‑A do Regulamento n.° 1782/2003, intitulado «Pagamento específico para o açúcar», dispõe no seu n.° 1, primeiro parágrafo:

    «Em derrogação do artigo 143.°‑B, os novos Estados‑Membros que aplicam o regime de pagamento único por superfície podem decidir até 30 de Abril de 2006 conceder, relativamente aos anos de 2006, 2007 e 2008, um pagamento específico para o açúcar aos agricultores elegíveis nos termos do regime de pagamento único por superfície. Deve ser concedido com base em critérios objectivos e não discriminatórios, como sejam:

    –        as quantidades de beterraba açucareira, cana‑de‑açúcar ou chicória abrangidas por contratos de entrega celebrados nos termos do artigo 19.° do Regulamento (CE) n.° 1260/2001;

    –        as quantidades de açúcar ou xarope de inulina produzidas de acordo com o Regulamento (CE) n.° 1260/2001;

    –        o número médio de hectares ocupados por beterraba açucareira, cana‑de‑açúcar ou chicória utilizados para a produção de açúcar ou xarope de inulina e abrangidos por contratos de entrega celebrados nos termos do artigo 19.° do Regulamento (CE) n.° 1260/2001;

    e em relação a um período representativo, que pode ser diferente de produto para produto, de uma ou mais das campanhas de comercialização de 2004/2005, 2005/2006 e 2006/2007, a determinar pelos Estados‑Membros antes de 30 de Abril de 2006.»

    4        O artigo 1.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 2011/2006 do Conselho, de 19 de Dezembro de 2006, que adapta o Regulamento (CE) n.° 1782/2003 que estabelece regras comuns para os regimes de apoio directo no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores, o Regulamento (CE) n.° 318/2006 que estabelece a organização comum de mercado no sector do açúcar e o Regulamento (CE) n.° 320/2006 que estabelece um regime temporário de reestruturação da indústria açucareira na Comunidade, em virtude da adesão da Bulgária e da Roménia à União Europeia (JO L 384, p. 1), entrado em vigor em 1 de Janeiro de 2007, substituiu o segundo período do artigo 143.°‑B‑A, n.° 1, primeiro parágrafo, pelo texto seguinte:

    «Deve ser concedido em relação a um período representativo, que pode ser diferente de produto para produto, de uma ou mais das campanhas de comercialização de 2004/2005, 2005/2006 e 2006/2007, a determinar pelos Estados‑Membros antes de 30 de Abril de 2006, com base em critérios objectivos e não discriminatórios:

    –        as quantidades de beterraba açucareira, cana‑de‑açúcar ou chicória abrangidas por contratos de entrega celebrados nos termos do artigo 19.° do Regulamento (CE) n.° 1260/2001 ou do artigo 6.° do Regulamento (CE) n.° 318/2006, consoante o caso,

    –        as quantidades de açúcar ou xarope de inulina produzidas de acordo com o Regulamento (CE) n.° 1260/2001 ou com o Regulamento (CE) n.° 318/2006, consoante o caso,

    –        o número médio de hectares ocupados por beterraba açucareira, cana‑de‑açúcar ou chicória utilizados para a produção de açúcar ou xarope de inulina e abrangidos por contratos de entrega celebrados nos termos do artigo 19.° do Regulamento (CE) n.° 1260/2001 ou do artigo 6.° do Regulamento (CE) n.° 318/2006, consoante o caso.»

    5        Esta alteração, que não aplicável ratione temporis ao processo principal, é invocada pelo aí recorrido, a título de elemento de interpretação do artigo 143.°‑B‑A do Regulamento n.° 1782/2003.

     Legislação nacional

    6        O artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento 48/2006 (VI.22.) do Ministério da Agricultura e do Desenvolvimento Rural (FVM), relativo ao pagamento específico para o açúcar concedido aos agricultores elegíveis no âmbito do pagamento único por superfície (Magyar Közlöny 2006/75, a seguir «regulamento do Ministério da Agricultura e do Desenvolvimento Rural»), dispõe:

    «São elegíveis para o pagamento os agricultores que:

    a)      sejam elegíveis para o pagamento único por superfície nos termos da lei específica durante o exercício de referência;

    b)      disponham de um direito de entrega de beterraba durante o período de referência ou de um contrato baseado na quota de açúcar da Eslovénia;

    c)      tenham cumprido as suas obrigações resultantes do direito de entrega de beterraba sacarina.

    [...]»

    7        O direito de entrega corresponde à quantidade de beterraba sacarina necessária ao fabrico da quantidade de açúcar abrangida pela quota de açúcar atribuída ao Estado‑Membro nos termos do direito comunitário.

    8        O artigo 5.° do regulamento do Ministério da Agricultura e do Desenvolvimento Rural refere:

    «1)      O pedido de pagamento deve ser acompanhado dos seguintes documentos comprovativos:

    a)      comprovativo fornecido pelo Conselho do açúcar relativo à quantidade (expressa em toneladas) de direitos de entrega (a 16%) do requerente em 1 de Julho de 2004 e em 1 de Julho de 2005 (calculada de modo uniforme com base num rendimento de 140 kg/t);

    b)      comprovativo fornecido pelo organismo gestor titular das quotas para a transformação da beterraba sacarina relativo à quantidade (expressa em toneladas) de beterraba sacarina ‘A’ e ‘B’ (a 16%) entregue ao abrigo de contratos de cultura nas campanhas de comercialização de 2004/2005 ou 2005/2006 (os comprovativos das empresas de transformação serão eventualmente corrigidos de forma a ser tido em conta de modo uniforme um rendimento em açúcar de 140 kg);

    c)      um comprovativo fornecido pela federação regional competente dos produtores de beterraba sacarina de que o requerente cumpriu as suas obrigações resultantes dos seus direitos de entrega;

    d)      qualquer outro comprovativo da sua elegibilidade.

    2)      No que respeita aos membros de agrupamentos de produtores, os transformadores atestarão a quantidade total entregue pelo agrupamento de produtores, o qual deverá atestar as quantidades entregues pelos membros no interior do agrupamento.

    [...]»

     Processo principal e questão prejudicial

    9        Em 28 de Junho de 2006, J. Uzonyi, recorrente no processo principal, apresentou ao Hivatal, relativamente a 2006, um pedido de pagamento específico para o açúcar pela sua produção de beterraba sacarina entregue através de um integrador, operador que desempenha um papel de intermediação, de coordenação e de assistência à actividade de produção dos agricultores que integra.

    10      Contudo, J. Uzonyi só conseguiu demonstrar os seus direitos de entrega de beterraba e o cumprimento das obrigações relativas a esses direitos relativamente ao integrador.

    11      Por decisão de 18 de Abril de 2007, o Hivatal indeferiu o seu pedido com o fundamento de que não era elegível para a ajuda, pois não tinham sido entregues os documentos comprovativos exigidos no artigo 5.°, n.° 1, do regulamento do Ministério da Agricultura e do Desenvolvimento Rural.

    12      J. Uzonyi interpôs recurso gracioso dessa decisão de indeferimento.

    13      Foi negado provimento ao recurso gracioso por decisão de 6 de Julho de 2007 do Ministro da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, pelo qual actua o Hivatal, recorrido no processo principal.

    14      Em apoio do indeferimento, considerou‑se que só são elegíveis para o pagamento os agricultores que disponham de direitos de entrega de beterraba e que tenham cumprido as obrigações relativas a esses direitos. Assim, uma vez que os comprovativos em anexo ao pedido não eram relativos a direitos de entrega e ao cumprimento das respectivas obrigações pelo próprio requerente, mas sim pelo integrador, não estavam preenchidos os requisitos do artigo 5.°, n.° 1, do regulamento do Ministério da Agricultura e do Desenvolvimento Rural.

    15      J. Uzonyi recorreu da decisão de indeferimento para o órgão jurisdicional de reenvio. Invoca a existência de uma discriminação entre os produtores que entregam por si próprios a beterraba sacarina e os que entregam beterraba sacarina através de integradores. Pede que se aplique por analogia o artigo 5.°, n.° 2, do regulamento do Ministério da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, relativo às entregas de beterraba através de agrupamentos de produtores.

    16      O recorrido no processo principal alega no tribunal de reenvio que a aplicação de critérios objectivos e não discriminatórios diz respeito ao período representativo para o qual remete o artigo 143.°‑B‑A do Regulamento n.° 1782/2003 e não às pessoas elegíveis para o pagamento referidas nessa disposição. Entende que esta afirmação tem apoio na alteração introduzida no artigo 143.°‑B‑A do Regulamento n.° 1782/2003 pelo artigo 1.°, n.° 2, do Regulamento n.° 2011/2006. Essa alteração apenas precisou a redacção da norma, sem mudar o seu sentido. Tanto antes como depois da alteração, a aplicação de critérios objectivos e não discriminatórios apenas respeita, portanto, ao período representativo.

    17      O órgão jurisdicional de reenvio considera que os artigos 2.° e 5.° do regulamento do Ministério da Agricultura e do Desenvolvimento Rural excluem do pagamento os agricultores que não estejam directamente ligados por contrato ao fabricante de açúcar, mas que tenham celebrado um contrato de cultura com um integrador titular de direitos de entrega em função das áreas exploradas pelos produtores integrados. Com efeito, esses agricultores não podem demonstrar serem eles próprios titulares dos direitos de entrega exigidos pelo regulamento do Ministério da Agricultura e do Desenvolvimento Rural para efeitos de obtenção do pagamento.

    18      O mesmo órgão jurisdicional refere que, em contrapartida, os agricultores membros de um agrupamento de produtores que não estão directamente ligados por contrato ao fabricante de açúcar, mas que tenham celebrado um contrato de cultura com um agrupamento titular de direitos de entrega em função das áreas exploradas pelos membros do agrupamento, podem obter um pagamento específico para o açúcar ao abrigo das disposições do artigo 5.°, n.° 2, do regulamento do Ministério da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, apresentando o comprovativo fornecido pelo agrupamento.

    19      Entende que há que ter em conta a jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, segundo a qual o artigo 34.°, n.° 2, segundo parágrafo, CE, que proíbe qualquer discriminação no âmbito da política agrícola comum, mais não é do que a expressão específica do princípio geral da igualdade.

    20      O órgão jurisdicional de reenvio considera que a redacção da disposição comunitária a interpretar não é clara, tendo ainda em conta que essa disposição foi posteriormente alterada. Acrescenta que, se o Tribunal de Justiça vier a declarar que, por força do artigo 143.°‑B‑A do Regulamento n.° 1782/2003, os produtores de beterraba que a entregam através de um integrador são tão elegíveis para o pagamento específico para o açúcar como os que entregam por si próprios, esse pagamento pode, então, ser concedido, pelo ano de 2006, ao recorrente no processo principal e a muitos outros demandantes que interpuseram recursos actualmente pendentes, através de uma aplicação analógica do artigo 5.°, n.° 2, do regulamento do Ministério da Agricultura e do Desenvolvimento Rural.

    21      Neste contexto, a Fővárosi Bíróság decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

    «Decorre da frase ‘[d]eve ser concedido com base em critérios objectivos e não discriminatórios’ do artigo 143.°‑B‑A, n.° 1, do Regulamento […] n.° 1782/2003, na versão em vigor até 31 de Dezembro de 2006, que não era possível estabelecer uma distinção para efeitos do direito ao pagamento específico, relativamente ao pagamento único por superfície para o açúcar, consoante os agricultores entregassem directamente (eles próprios) ou indirectamente (através de uma empresa integradora) a beterraba açucareira para transformação?»

     Quanto à questão prejudicial

    22      Com a sua questão, lida à luz dos fundamentos da decisão de reenvio, o órgão jurisdicional nacional pergunta, no essencial, se o artigo 143.°‑B‑A, n.° 1, do Regulamento n.° 1782/2003 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional como a do processo principal, que exclui do direito ao pagamento específico para o açúcar um agricultor não titular de direitos de entrega e que entregue beterraba sacarina a um fabricante de açúcar através de um integrador titular desses direitos, quando essa regulamentação concede um pagamento específico a um agricultor titular de direitos de entrega que entrega beterraba sacarina directamente a um fabricante de açúcar, bem como a um agricultor não titular de direitos de entrega, membro de um agrupamento de produtores, que entrega beterraba sacarina a um fabricante de açúcar através desse agrupamento, titular dos direitos de entrega.

    23      Para dar uma resposta a esta questão, há que determinar se essa regulamentação nacional institui uma discriminação proibida pelo artigo 143.°‑B‑A do Regulamento n.° 1782/2003.

    24      Em face das alegações do recorrido no processo principal, há que observar a título preliminar que:

    –        o artigo 143.°‑B‑A do Regulamento n.° 1782/2003, em todas as versões linguísticas da sua redacção aplicável no litígio no processo principal, dispõe claramente que o pagamento específico para o açúcar é concedido com base em critérios objectivos e não discriminatórios aos agricultores elegíveis no âmbito do regime de pagamento único por superfície;

    –        nenhuma das versões linguísticas desse artigo estabelece uma relação entre critérios objectivos e não discriminatórios, por um lado, e a determinação dos períodos representativos, por outro.

    25      A posterior alteração do artigo 143.°‑B‑A resultante do artigo 1.°, n.° 2, do Regulamento n.° 2011/2006 não põe isso em causa.

    26      Com efeito, embora não se possa excluir a possibilidade de, por excepção, uma norma de alteração poder servir de elemento de interpretação da norma alterada, essa possibilidade está excluída a priori quando a norma anterior é clara em todas as suas versões linguísticas.

    27      De qualquer forma, verifica‑se que a norma de alteração invocada no presente processo não é clara em todas as suas dezanove versões linguísticas disponíveis. Com efeito, em seis delas, as versões dinamarquesa, estónia, francesa, húngara, polaca e portuguesa, contém diferenças de redacção, fontes, pelo menos, de ambiguidade na questão de saber se a aplicação de critérios objectivos e não discriminatórios se impõe à concessão do pagamento ou à determinação do período representativo.

    28      Acresce que as outras treze versões linguísticas, as versões espanhola, checa, alemã, grega, inglesa, italiana, letã, lituana, neerlandesa, eslovena, eslovaca, finlandesa e sueca, têm o mesmo sentido claro que a disposição a interpretar.

    29      Deve considerar‑se, pois, que o artigo 143.°‑B‑A do Regulamento n.° 1782/2003 sujeita a concessão de um pagamento específico para o açúcar pelos novos Estados‑Membros à aplicação, por estes, de critérios objectivos e não discriminatórios.

    30      Assim, mais não faz do que reproduzir a proibição de discriminação prevista no artigo 34.°, n.° 2, segundo parágrafo, CE.

    31      A este respeito, segundo jurisprudência assente, a proibição de qualquer discriminação no âmbito da política agrícola comum mais não é do que a expressão específica do princípio geral da igualdade, que exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de modo igual, excepto se esse tratamento diferente for objectivamente justificado (v., designadamente, a propósito do artigo 34.°, n.° 2, segundo parágrafo, CE, acórdãos de 11 de Julho de 2006, Franz Egenberger, C‑313/04, Colect.,. p. I‑6331, n.° 33; de 11 de Junho de 2009, Agrana Zucker, C‑33/08, Colect., p. I‑5035, n.° 46; e de 20 de Maio de 2010, Agrana Zucker, C‑365/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 42).

    32      O Regulamento n.° 319/2006 inseriu o artigo 143.°‑B‑A no Regulamento n.° 1782/2003 na sua versão anterior às alterações introduzidas neste.

    33      Resulta do segundo, sexto, sétimo e nono a décimo primeiro considerandos do Regulamento n.° 319/2006 que este tem por objectivo assegurar um apoio ao rendimento dos «agricultores» que produzem beterraba sacarina e que sejam elegíveis no âmbito do regime de pagamento único por superfície.

    34      O referido regulamento não estabelece nenhuma ligação entre a concessão de um pagamento específico para o açúcar e o modo de entrega, directa ou indirecta, da beterraba sacarina pelos agricultores aos fabricantes de açúcar. Também não estabelece uma ligação entre o pagamento específico para o açúcar e a circunstância de o agricultor ser ou não titular de direitos de entrega.

    35      À luz do objectivo do Regulamento n.° 319/2006, os agricultores que produzem beterraba sacarina estão, portanto, em situações comparáveis, quer entreguem os seus produtos directamente quer indirectamente a um fabricante de açúcar e sejam ou não eles próprios titulares de direitos de entrega previstos numa regulamentação nacional.

    36      Ora, segundo a interpretação do direito nacional aplicável ao processo principal, dada pelo órgão jurisdicional de reenvio e por ele confirmada em resposta a um pedido de esclarecimentos feito pelo Tribunal de Justiça devido a divergências de interpretação desse direito surgidas nas observações escritas nele apresentadas, um agricultor integrado, não titular de direitos de entrega, que entregue beterraba sacarina ao fabricante através de um integrador titular dos direitos de entrega não tem direito a receber directamente um pagamento específico para o açúcar, ao contrário, por um lado, de um agricultor titular de direitos de entrega que a ela proceda por si próprio ou, por outro, de um agricultor não titular de direitos de entrega que entregue a beterraba ao fabricante de açúcar através de um agrupamento de produtores titular desses direitos, do qual é membro.

    37      Daqui resulta que uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal trata de modo diferente situações comparáveis.

    38      Há que verificar, portanto, se essa diferença de tratamento é objectivamente justificada.

    39      Nas suas observações escritas, o Governo húngaro alega que o integrador tem geralmente melhores condições de proceder às operações administrativas relativas ao pagamento específico para o açúcar. A solução seguida pelo direito nacional é geralmente mais favorável ao produtor. Favorece uma gestão eficaz dos processos, só tendo a Administração de se pronunciar sobre os pedidos dos integradores e não sobre os pedidos de todos os produtores integrados.

    40      Na fase oral, o Governo húngaro precisou que, na sua opinião, para preencher os requisitos do artigo 143.°‑B‑A do Regulamento n.° 1782/2003, o próprio integrador deve ser elegível para o regime de pagamento único por superfície.

    41      Refira‑se, porém, que, segundo a interpretação do órgão jurisdicional de reenvio, a pertença de um agricultor a um agrupamento de produtores titular dos direitos de entrega não obsta à concessão directa de um pagamento específico para o açúcar a esse agricultor, mesmo apesar de não ser o próprio interessado o titular dos direitos de entrega.

    42      Verifica‑se, assim, que os agricultores membros de um agrupamento de produtores podem apresentar por si próprios um pedido de pagamento específico para o açúcar sem lhes serem oponíveis quaisquer considerações sobre o facto de ser mais eficaz um tratamento colectivo dos pedidos. Ora, essas considerações tanto podem valer para essa categoria de agricultores como para a categoria de agricultores integrados, que não são titulares de direitos de entrega.

    43      De resto, admitindo que essas considerações pudessem ser oponíveis aos agricultores integrados ou membros de um agrupamento que não fornecessem por si próprios os fabricantes de açúcar, não poderiam constituir em todas as circunstâncias uma justificação objectiva de um tratamento diferente desses dois tipos de agricultores em face de um agricultor que fornecesse por si próprio o fabricante de açúcar.

    44      Em particular, não poderiam ser invocadas se os requisitos previstos para a concessão do pagamento específico acabassem por ter o efeito de privar os agricultores em causa do direito a esse pagamento, por exemplo nos casos em que:

    –        esses agricultores, confrontados com uma omissão do intermediário, não fossem autorizados a apresentar directamente, em vez dele, um pedido de pagamento específico;

    –        a apresentação de um pedido de pagamento específico pelo intermediário por conta dos agricultores estivesse sujeita à condição de ele próprio ser elegível para o regime de pagamento único por superfície, quando o artigo 143.°‑B‑A do Regulamento n.° 1782/2003 só prevê esse requisito quanto ao agricultor candidato ao pagamento específico e não quanto ao intermediário que o representa.

    45      Consequentemente, há que concluir que uma diferença de tratamento como a que está em causa no processo principal não é objectivamente justificada.

    46      Há que responder, portanto, à questão submetida que o artigo 143.°‑B‑A, n.° 1, do Regulamento n.° 1782/2003 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que exclui do direito ao pagamento específico para o açúcar um agricultor não titular de direitos de entrega e que entrega beterraba sacarina a um fabricante de açúcar através de um integrador titular desses direitos, quando essa regulamentação concede um pagamento específico a um agricultor titular de direitos de entrega que entrega beterraba sacarina directamente a um fabricante de açúcar, bem como a um agricultor não titular de direitos de entrega, membro de um agrupamento de produtores, que entrega beterraba sacarina a um fabricante de açúcar através desse agrupamento, titular dos direitos de entrega.

    47      De qualquer forma, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se lhe é possível dar à regulamentação nacional uma interpretação conforme com o direito comunitário aplicável.

     Quanto às despesas

    48      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

    O artigo 143.°‑B‑A, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1782/2003 do Conselho, de 29 de Setembro de 2003, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio directo no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores e altera os Regulamentos (CEE) n.° 2019/93, (CE) n.° 1452/2001, (CE) n.° 1453/2001, (CE) n.° 1454/2001, (CE) n.° 1868/94, (CE) n.° 1251/1999, (CE) n.° 1254/1999, (CE) n.° 1673/2000, (CEE) n.° 2358/71 e (CE) n.° 2529/2001, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 319/2006 do Conselho, de 20 de Fevereiro de 2006, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que exclui do direito ao pagamento específico para o açúcar um agricultor não titular de direitos de entrega e que entrega beterraba sacarina a um fabricante de açúcar através de um integrador titular desses direitos, quando essa regulamentação concede um pagamento específico a um agricultor titular de direitos de entrega que entrega beterraba sacarina directamente a um fabricante de açúcar, bem como a um agricultor não titular de direitos de entrega, membro de um agrupamento de produtores, que entrega beterraba sacarina a um fabricante de açúcar através desse agrupamento, titular dos direitos de entrega.

    Assinaturas


    * Língua do processo: húngaro.

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