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Dokument 62008TO0481

Despacho do Tribunal Geral (Quinta Secção) de 8 de Fevereiro de 2010.
Alisei contra Comissão Europeia.
Recurso de anulação - Acções externas e FED - Encerramento de uma auditoria e adopção do relatório final - Acto que se insere num quadro puramente contratual - Incompetência - Inexistência de afectação directa - Inadmissibilidade - Acção de indemnização - Inadmissibilidade manifesta.
Processo T-481/08.

Colectânea de Jurisprudência 2010 II-00117

ECLI-nummer: ECLI:EU:T:2010:32

DESPACHO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

8 de Fevereiro de 2010 ( *1 )

No processo T-481/08,

Alisei, com sede em Roma (Itália), representada por F. Sciaudone, R. Sciaudone, S. Gobbato, R. Rio e A. Neri, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por P. van Nuffel e L. Prete, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objecto, por um lado, um pedido de anulação da decisão alegadamente contida na carta da Comissão de 19 de Agosto de 2008, relativa ao reembolso de uma parte dos adiantamentos pagos à recorrente no âmbito de determinados projectos de cooperação para o desenvolvimento e de ajuda humanitária financiados pelo orçamento comunitário ou pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento (FED) e, por outro, um pedido de indemnização pelos danos alegadamente sofridos pela recorrente devido ao comportamento adoptado pela Comissão,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção),

composto por: M. Vilaras (relator), presidente, M. Prek e V. M. Ciucă, juízes,

secretário: E. Coulon,

profere o presente

Despacho

Quadro jurídico e contratual

Contratos entre a Alisei e a Comissão

1

A recorrente, Alisei, é uma associação sem fins lucrativos de direito italiano, constituída por acto de 20 de Janeiro de 1998, após a fusão das associações sem fins lucrativos de direito italiano Cidis e Nuova Frontiera. Entre e , a recorrente celebrou com a Comissão das Comunidades Europeias 22 contratos de subvenção nos termos do título VI («Subvenções») da primeira parte, bem como do título IV («Acções externas») da segunda parte do Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 do Conselho, de , que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO L 248, p. 1, a seguir «Regulamento Financeiro»).

2

As condições gerais que regem 17 [ALI 08, ALI 41, ALI 44, ALI 46, ALI 03, ALI 04, ALI 06, ALI 07, ALI 17, ALI 18, ALI 19, ALI 25, ALI 39, ALI 42, ALI 45, ALI 47 e ALI 48] desses 22 contratos contêm uma cláusula nos termos da qual «qualquer litígio entre a Comissão e [a recorrente] que decorra da execução do […] contrato e que não possa ser resolvido através de resolução amigável pelas partes será submetido aos tribunais de Bruxelas».

3

As condições gerais que regem cinco daqueles 22 contratos atribuem aos tribunais de Bruxelas competência para a resolução de litígios que possam surgir no âmbito da respectiva execução caso as partes não tenham conseguido solucionar o seu diferendo no termo de uma tentativa de resolução amigável e/ou de um processo de conciliação.

4

Por outro lado, as condições gerais que regem os 22 contratos acima referidos prevêem a possibilidade de serem efectuados, nomeadamente pelos serviços competentes da Comissão, verificações e controlos de utilização da subvenção concedida.

Contratos entre a Alisei e países terceiros financiados pelo FED

5

O Fundo Europeu de Desenvolvimento (FED) foi estabelecido para financiar a cooperação entre a Comunidade Europeia e os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP), inicialmente através de um anexo ao Tratado CEE, e posteriormente através de acordos internos dos Estados-Membros reunidos no Conselho. Até à data, houve 10 FED sucessivos e a celebração dos acordos internos relativos a esses FED tinha uma duração equivalente à duração dos diversos acordos e convenções através dos quais a Comunidade Europeia e os seus Estados-Membros estabeleceram essa parceria especial com os Estados ACP. Os montantes com que os FED foram dotados não foram inscritos no orçamento geral das Comunidades Europeias, o que explica que a sua gestão tenha sido regida por um Regulamento Financeiro específico para cada FED.

6

Relativamente ao sexto, sétimo, oitavo e nono FED, a sua criação foi prevista, respectivamente, pela Terceira Convenção ACP-CEE, assinada em Lomé em 8 de Dezembro de 1984 (JO 1986, L 86, p. 3, a seguir «Convenção de Lomé III»), pela Quarta Convenção ACP-CEE, assinada em Lomé em (JO 1991, L 229, p. 3, a seguir «Convenção de Lomé IV»), pelo Acordo que altera a Convenção de Lomé IV, assinada na Maurícia, em (JO 1998, L 156, p. 3, a seguir «Acordo de Maurícia») e pelo Acordo de parceria entre os Estados do grupo ACP, por um lado, e a Comunidade Europeia e os seus Estados-Membros, por outro, assinado em Cotonu, em (JO L 317, p. 3, a seguir «Acordo de Cotonu»).

7

Estes acordos e convenções prevêem, salvo disposição em contrário, os projectos ou programas financiados através de subvenção do FED implicam a celebração de um acordo de financiamento entre a Comissão e o Estado ou Estados ACP em questão. Esta convenção especifica, nomeadamente, o compromisso financeiro do Fundo assim como as regras e condições de financiamento (v. artigo 222.o, n.o 1, da Convenção de Lomé III, artigo 291.o, n.os 1 e 2, da Convenção de Lomé IV, não alterado pelo Acordo de Maurícia, e artigo 17.o, n.os 1 e 2, do anexo IV, intitulado «Processos de execução e de gestão», do Acordo de Cotonu).

8

Por outro lado, esses mesmos acordos e convenções criaram a figura do ordenador principal do FED. Este é nomeado pela Comissão. É responsável pela gestão dos recursos do FED (v. artigo 226.o, n.o 1, da Convenção de Lomé III, artigo 311.o, n.o 1, da Convenção de Lomé IV, não alterado pelo Acordo de Maurícia e artigo 34.o, n.o 1, do anexo IV do Acordo de Cotonu).

9

O financiamento dos quatro FED acima mencionados foi objecto de quatro acordos internos entre os Estados-Membros reunidos no Conselho, a saber, o Acordo interno 86/126/CEE, relativo ao financiamento e à gestão das ajudas da Comunidade (JO 1986, L 86, p. 210), a Decisão 91/482/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia (JO L 263, p. 1), o Acordo interno entre os representantes dos governos dos Estados-Membros, reunidos no seio do Conselho, relativo ao financiamento e à gestão das ajudas da Comunidade no âmbito do Segundo Protocolo Financeiro da Convenção de Lomé IV (JO 1998, L 156, p. 108), e ao Acordo interno 2000/770/CE entre os representantes dos governos dos Estados-Membros, reunidos no Conselho, relativo ao financiamento e à gestão da ajuda concedida pela Comunidade no âmbito do protocolo financeiro do Acordo de Cotonu e à concessão de assistência financeira aos países e territórios ultramarinos aos quais se aplica a Parte IV do Tratado CE (JO L 317, p. 355).

10

As normas de aplicação destes quatro acordos internos foram objecto, respectivamente, do Regulamento Financeiro 86/548/CEE, de 11 de Novembro de 1986, aplicável ao Sexto FED (JO L 325, p. 42), do Regulamento Financeiro 91/491/CEE, de , aplicável à Cooperação para o Financiamento do Desenvolvimento no âmbito da Convenção de Lomé IV (JO L 266, p. 1), do Regulamento Financeiro 98/430/CE, de , aplicável à Cooperação para o Financiamento do Desenvolvimento no âmbito da Convenção de Lomé IV (JO L 191, p. 53), e do Regulamento Financeiro de , aplicável ao Nono FED (JO L 83, p. 1).

11

Estes quatro regulamentos prevêem que a Comissão assegura a gestão do FED sob a sua própria responsabilidade e nomeia, designadamente, o ordenador principal do FED, bem como o seu contabilista (v. artigo 10.o, n.o 1, e artigos 11.o e 13.o do Regulamento Financeiro 86/548, artigo 9.o, n.o 1 e artigos 11.o e 13.o do Regulamento Financeiro 91/491, artigo 13.o, n.o 1, e artigo 15.o, n.o 1, do título II «Gestão das dotações do FED cuja execução financeira é assegurada pela Comissão» do Regulamento Financeiro 98/430, bem como o artigo 1.o, n.o 2, e os artigos 18.o e 27.o do Regulamento Financeiro de 27 de Março de 2003 aplicável ao nono FED). Os três primeiros regulamentos financeiros acima referidos no n.o 10 criam, além disso, a figura do auditor financeiro. Em contrapartida, o artigo 133.o, n.o 2, do Regulamento Financeiro de aplicável ao nono FED prevê que as autorizações correspondentes aos FED anteriores, efectuadas antes da entrada em vigor do Acordo de Cotonu, em , continuarão a ser executadas em conformidade com as regras aplicáveis a esses FED, excepto no que respeita, nomeadamente, às funções do auditor financeiro, a que se aplicam as disposições do referido regulamento. Este último regulamento não prevê a função do auditor financeiro.

12

Os Regulamentos Financeiros 86/548, 91/491 e 98/430, aplicáveis, respectivamente, ao sexto, sétimo e oitavo FED, prevêem que, em princípio, qualquer crédito apurado, líquido e exigível devido ao FED no âmbito da execução das dotações do FED deve ser objecto de uma ordem de cobrança do ordenador principal. Contudo, o ordenador principal pode renunciar à cobrança de uma dívida. O registo das ordens de cobrança é da responsabilidade do contabilista, a quem cabe fazer diligências no sentido de assegurar, na data prevista, a cobrança da respectiva dívida. O contabilista informa o ordenador principal da não cobrança das dívidas nos prazos previstos e, se necessário, dá início ao processo de recuperação (v. artigos 15.o e 16.o do Regulamento Financeiro 86/548, artigo 15.o, n.o 2 e artigo 16.o, do Regulamento Financeiro n.o 91/491, artigo 18.o, n.o 2, e artigo 19.o do Regulamento Financeiro n.o 98/430).

13

O Regulamento Financeiro de 27 de Março de 2003 aplicável ao nono FED contém disposições análogas nos seus artigos 45.o a 47.o Contudo, foram acrescentadas algumas disposições suplementares no que respeita a cobranças. Em primeiro lugar, o artigo 45.o, primeiro parágrafo, do referido regulamento, dispõe que a ordem de cobrança é «acompanhada de uma nota de débito dirigida ao devedor», a qual é igualmente emitida pelo ordenador principal do FED. Em segundo lugar, o artigo 46.o, n.o 2, do mesmo Regulamento Financeiro dispõe que, se não tiver tido lugar a cobrança efectiva de uma dívida, o tesoureiro do FED deve «iniciar de imediato o processo de recuperação, por qualquer via de direito adequada, incluindo, se necessário, a compensação. Se esta não for possível, o contabilista deve recorrer à execução do título, quer em conformidade com o n.o 2 do artigo 44.o quer com base num título obtido pela via contenciosa». Em terceiro lugar, o artigo 44.o, n.o 2, desse regulamento, prevê que «a Comissão pode formalizar o apuramento de um crédito a cargo de pessoas que não sejam Estados, numa decisão que constituirá título executivo em condições idênticas às previstas no artigo 256.o do Tratado [CE]».

14

Entre 24 de Abril de 2002 e , a recorrente celebrou dez contratos de prestação de serviços que foram financiados pelo FED. A recorrente celebrou seis contratos com a Comissão, agindo na vez e lugar da República Democrática do Congo, que foram financiados pelo sexto FED, um contrato com a República de Angola, que foi financiado pelo sétimo FED, um contrato com a República da Guiné Equatorial, que foi financiado pelo oitavo FED, e dois contratos com a República Gabonesa e com a República Democrática de São Tomé e Príncipe, que foram financiados pelo nono FED.

15

Todos estes contratos são regidos pelas disposições do caderno geral de encargos relativo a contratos de prestação de serviços financiados pelo FED, que consta do anexo IV da Decisão n.o 3/90 do Conselho dos Ministros ACP-CEE, de 29 de Março de 1990, que adopta a regulamentação geral, às condições gerais dos cadernos de encargos e às regras processais de conciliação e arbitragem aplicáveis aos contratos de obras, de fornecimento e de prestação de serviços financiados pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento (FED) e relativos à sua aplicação (JO L 382, p. 1), conforme completados ou alterados pelo contrato.

16

No que respeita aos litígios relativos ao contrato, o artigo 45.2 do referido caderno geral de encargos, intitulado «Resolução de litígios», prevê o processo que deve ser seguido para a resolução amigável de litígios. No caso de este processo falhar, o artigo 45.3 do referido caderno geral de encargos indica que as partes podem acordar que o litígio seja resolvido por conciliação dentro de um determinado prazo, com a intervenção de um terceiro. O artigo 45.5 desse caderno de encargos acrescenta que «[n]a falta de uma resolução amigável ou de uma resolução por conciliação dentro do prazo limite especificado, o litígio deverá ser resolvido […] [s]e se tratar de um contrato transnacional […] [d]e acordo com a legislação nacional do Estado da entidade contratante ou com as suas práticas internacionais estabelecidas, caso as partes contratantes assim o decidam […] ou [p]or arbitragem, de acordo com as regras processuais adoptadas em conformidade com a Convenção».

17

O disposto no artigo 45.5 não foi completado nem alterado nos dez contratos em questão. Além disso, não se prevê em nenhum desses contratos que os litígios devem ser resolvidos de acordo com a legislação ou as práticas do Estado em causa, devendo assim os litígios entre as partes desses contratos ser resolvidos através do mecanismo da arbitragem. As regras processuais de arbitragem a que se faz referência no artigo 45.5 são as que constam do anexo V da Decisão n.o 3/90.

18

Além disso, a recorrente celebrou dois contratos respectivamente com a República do Congo e com a República da Costa do Marfim, que foram financiados, respectivamente, pelo oitavo e pelo nono FED. O artigo 13.o das condições gerais aplicáveis a cada um desses contratos prevê um processo de resolução amigável dos litígios entre as partes desses contratos, bem como a possibilidade de submeter o litígio, de comum acordo, à Comissão. Nos termos desse mesmo artigo, caso falhem os procedimentos acima referidos, cada parte pode submeter o litígio aos tribunais do Estado da administração contratante.

Antecedentes do litígio

19

Em 27 de Agosto de 2004, o Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) instaurou um inquérito contra a recorrente, do qual esta foi informada em . O OLAF efectuou, nesse âmbito, entre e , uma série de buscas nas instalações da recorrente em Milão. Durante esse período, funcionários de uma empresa externa de revisão de contas efectuaram igualmente uma busca nas referidas instalações da recorrente.

20

Por carta de 6 de Março de 2006, o OLAF enviou à recorrente, para que esta apresentasse comentários, o seu relatório de controlo e de verificação, elaborado na sequência das buscas que tiveram lugar entre e , bem como o projecto de relatório da empresa externa de revisão de contas acima referida. O OLAF enviou igualmente uma cópia dessa carta ao Serviço de Cooperação da Comissão (Europaid). A recorrente apresentou as suas observações sobre o referido relatório em .

21

Por carta de 3 de Maio de 2006, o Europaid informou a recorrente de que as constatações feitas nos relatórios acima referidos suscitavam dúvidas sobre o carácter elegível das despesas cuja recuperação tinha sido requerida por esta no âmbito de diferentes projectos. Por conseguinte, o Europaid ponderava determinar a realização de uma auditoria e, entretanto, relativamente aos contratos em curso e aos programas de trabalho abrangidos pelo seu âmbito de competência, suspender todos os pagamentos a efectuar a favor da recorrente.

22

Após um encontro entre os representantes da Comissão e da recorrente, em 16 de Maio de 2006, o Europaid confirmou à recorrente, por carta de , a sua intenção de determinar a realização de uma auditoria para verificar o carácter elegível das despesas por esta declaradas. Por carta de , o Europaid comunicou à recorrente, por um lado, a identidade do revisor externo ao qual a realização da auditoria havia sido confiada e, por outro, os projectos abrangidos por essa auditoria.

23

A auditoria começou com uma fase preparatória nas instalações da recorrente entre 12 e . Esta fase preparatória da auditoria visava identificar e localizar a documentação necessária para o inquérito. A partir de foram efectuadas inspecções no local. Em realizou-se um encontro preliminar de encerramento entre o revisor externo e a recorrente, na presença dos representantes da Comissão. Em realizou-se um encontro entre o revisor externo e a recorrente, igualmente na presença dos representantes da Comissão. Este encontro pôs termos às inspecções no local.

24

Por cartas de 18 de Janeiro, , e , a recorrente formulou determinadas críticas relativas ao revisor externo ao qual tinha sido confiada a auditoria, bem como à realização dessa auditoria. O Europaid respondeu às três primeiras cartas da recorrente por cartas de , e .

25

Por carta de 20 de Julho de 2007, a Comissão enviou à recorrente, para que esta apresentasse comentários, uma versão consolidada do projecto de relatório de auditoria acompanhado das suas próprias observações. A Comissão convidou igualmente a recorrente a pronunciar-se sobre a cobrança de um montante de 6433424,80 euros e informou-a da intenção da Comissão de instaurar um procedimento contraditório por erro profissional grave e não execução grave das suas obrigações contratuais, nos ternos dos artigos 93.o, 96.o e 114.o do Regulamento Financeiro, bem como de a excluir, por um período de dois anos, de qualquer participação nos procedimentos de adjudicação e de subvenção financiados pela Comunidade. A Comissão concedeu à recorrente um prazo de um mês para fazer formular as suas observações sobre esta questão.

26

A esta carta da Comissão seguiu-se uma troca de correspondência entre as partes, tendo a recorrente enviado cinco cartas ao Europaid, datadas, respectivamente, de 20 e e de , de e , tendo o Europaid enviado à recorrente cartas, datadas, respectivamente, de e e de .

27

Por carta de 19 de Agosto de 2008, a Comissão enviou à recorrente o relatório final da auditoria, que lhe havia sido comunicado pelo auditor externo em . A Comissão respondeu igualmente às cartas da recorrente de e e informou-a da abertura de um procedimento de cobrança, em data que lhe seria posteriormente comunicada pelo ordenador competente, de um montante total de 4750121 euros, referente às somas indevidamente recebidas no âmbito dos 34 contratos em causa.

Processo e pedidos das partes

28

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 5 de Novembro de 2008, a recorrente interpôs o presente recurso, no qual pede que o Tribunal Geral se digne:

anular a decisão alegadamente contida na carta de 19 de Agosto de 2008;

condenar a Comissão no ressarcimento do dano sofrido pela recorrente;

condenar a Comissão nas despesas.

29

Por requerimento separado, apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 19 de Janeiro de 2009, a Comissão suscitou uma excepção de inadmissibilidade nos termos do artigo 114.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

julgar o recurso inadmissível;

condenar a recorrente nas despesas.

30

A recorrente apresentou as suas observações relativas à excepção de inadmissibilidade em 4 de Março de 2009. Nas suas observações, a recorrente pediu ao Tribunal Geral que se digne:

julgar improcedente a excepção de inadmissibilidade;

condenar a Comissão nas despesas.

31

No âmbito de uma medida de organização do processo prevista no artigo 64.o do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral convidou a Comissão a apresentar determinados documentos. Esta última acedeu a este pedido no prazo fixado.

32

Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 2 de Julho de 2009, a recorrente pediu que fossem adoptadas «medidas de organização do processo» com o objectivo de que, por um lado, fosse ordenado à Comissão que apresentasse, na íntegra, o contrato que esta celebrou com o revisor externo responsável por efectuar a auditoria acima referida (v. n.os 21 e 22 supra) e, por outro, que o Tribunal Geral procedesse à audição, na qualidade de testemunhas, do director-geral do Europaid e de um sócio da sociedade externa à qual foi confiada a realização da auditoria.

33

A Comissão apresentou as suas observações sobre este pedido em 17 de Julho de 2009. Alegou que o pedido da recorrente visa, na realidade, a adopção de diligências de instrução e deve ser julgado inadmissível ou, a título subsidiário, improcedente.

34

Por requerimento separado, apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de Setembro de 2009, a recorrente solicitou a adopção de uma medida de organização do processo destinada a que a Comissão fosse convidada a precisar se o revisor de contas externo efectuou uma auditoria nos termos das «normas contabilísticas internacionais» ou se realizou um «procedimento acordado», regido pelas «normas internacionais sobre os serviços conexos 4400 — Missões de análise de informações financeiras com base em procedimentos acordados», não previsto no contrato celebrado entre este revisor e a Comissão.

35

Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 1 de Dezembro de 2009, a recorrente apresentou o contrato celebrado entre a Comissão e o revisor externo e invocou dois novos fundamentos em apoio do seu recurso.

Questão de direito

36

Por força do disposto no artigo 114.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, se uma das partes o pedir, o Tribunal Geral pode pronunciar-se sobre a inadmissibilidade antes de conhecer do mérito da causa. Nos termos do n.o 3 desse mesmo artigo, a tramitação ulterior do processo é oral, salvo decisão em contrário do Tribunal Geral. Além disso, por força do disposto no artigo 111.o do Regulamento de Processo, se um recurso for manifestamente desprovido de fundamento jurídico, o Tribunal Geral pode, pondo desde logo termo à instância, decidir mediante despacho fundamentado.

37

No presente caso, o Tribunal Geral considera que está suficientemente esclarecido pelos documentos juntos aos autos e que não há que dar início à fase oral.

Quanto ao pedido de anulação

Argumentos das partes

38

A Comissão alega que a carta de 19 de Agosto de 2008 se insere num quadro puramente contratual, regido pelas disposições dos diversos contratos que são objecto dessa carta. Ora, as condições contratuais aplicáveis aos contratos celebrados entre a recorrente e a Comissão não continham nenhuma cláusula compromissória de atribuição de competência ao Tribunal Geral para dirimir o presente litígio, prevendo, pelo contrário, que os órgãos jurisdicionais de Bruxelas são competentes para dirimir qualquer litígio relativo a esses mesmos contratos. Os outros contratos referidos na mesma carta, celebrados entre a recorrente e um determinado número de países terceiros e financiados pelo FED, seriam regidos por condições contratuais segundo as quais os diferendos relativos a esses contratos deveriam ser dirimidos «de acordo com a legislação nacional do Estado da entidade contratante». O Tribunal Geral não é assim de modo nenhum competente para dirimir os litígios relativos a todos esses contratos. Além disso, atendendo ao quadro contratual no qual a carta de se insere, esta não constitui um acto susceptível de ser objecto de um recurso de anulação no Tribunal Geral.

39

A Comissão acrescenta que, de todo o modo, atendendo à sua redacção, a carta de 19 de Agosto de 2008 não poder ser considerada um acto que produz efeitos jurídicos vinculativos, sendo, quando muito, um acto preparatório, não susceptível de ser impugnado através de um recurso de anulação.

40

A recorrente admite que o Tribunal Geral não é competente para conhecer dos litígios relativos aos 34 contratos que são objecto da carta de 19 de Agosto de 2008. Alega no entanto que a afirmação da Comissão segundo a qual a referida carta se insere num quadro meramente contratual e que, por conseguinte, não constitui um acto que pode ser impugnado através de um recurso de anulação no Tribunal Geral, se baseia numa interpretação errada e parcial dessa carta, bem como no desconhecimento do objecto e do conteúdo do pedido de anulação.

41

Segundo a recorrente, a Comissão, na sua carta de 19 de Agosto de 2008, não se limitou a responder às suas afirmações relativas à suspensão dos pagamentos e às pretensas irregularidades da auditoria e a anunciar a abertura de um procedimento de cobrança. A Comissão enviou-lhe igualmente o relatório final da auditoria e informou-a de que considerava que esse relatório constituía uma base técnica legítima e fiável, atentas as consequências a extrair deste processo. Por outras palavras, a Comissão, através da carta de , validou as conclusões do revisor externo e adoptou o relatório final.

42

O pedido de anulação tem precisamente por objecto este aspecto específico da carta de 19 de Agosto de 2008, pedido esse através do qual a recorrente contesta a decisão da Comissão, adoptada no âmbito das suas prerrogativas administrativas, de considerar encerrada e resolvida a auditoria confiada a um revisor externo e de assim validar todas as conclusões e adoptar o relatório final.

43

Além disso, a violação de alguns dos seus direitos e de determinados princípios gerais de direito, invocada na petição, diz respeito à adopção e à aprovação do relatório em causa enquanto acto que resulta da vontade e dos poderes de uma administração no exercício das suas prerrogativas de poder público, e não às eventuais relações contratuais entre a recorrente e a Comissão. Trata-se, assim, de queixas relativas não à violação de disposições contratuais específicas, mas à violação de princípios gerais de direito.

44

A jurisprudência relativa à admissibilidade de um recurso de anulação de um acto que se insere num contexto contratual não é, no caso em apreço, pertinente. Por um lado, a carta de 19 de Agosto de 2008 não constitui nem uma ordem de cobrança nem uma nota de débito, como foi, aliás, reconhecido pela Comissão. Por outro, nessa mesma carta, a Comissão considerou encerrada e regular a auditoria confiada a um revisor externo e validou as suas conclusões. Dissocia-se, assim, do quadro contratual no qual essa carta se insere, tanto mais por também ter por objecto contratos celebrados com um determinado número de países, financiados exclusivamente pelo FED.

45

A recorrente alega igualmente que, na medida em que na carta de 19 de Agosto de 2008 a Comissão encerrou definitivamente a auditoria confiada a um revisor externo, esta considerou que aquela auditoria era regular e validou as conclusões do revisor externo ao adoptar o relatório final, facto que alterou a sua situação jurídica. Com efeito, a recorrente alega ter passado do estatuto de «credora de uma série de pagamentos ainda a receber» a um estatuto de «devedora, pelo menos em potência, de montantes já pagos e que actualmente objecto de objecções contabilísticas». Por outro lado, por a recorrente aplicar os princípios da prudência aplicáveis em matéria contabilística, a referida carta obrigou-a a apagar do seu balanço credor um montante superior a 2 milhões de euros e a inscrever no seu lugar uma dívida imprevista de 4,7 milhões de euros.

46

A recorrente afirma que ainda que a carta de 19 de Agosto pudesse parcialmente ser considerada um acto preparatório, na medida em que a Comissão respondeu às suas queixas e antecipou a abertura de um procedimento de cobrança, a parte dessa carta relativa ao encerramento da auditoria e à adopção do relatório final reveste um carácter definitivo e é destacável do contexto contratual, na acepção do acórdão de 22 de Abril de 2007, Geotronics/Comissão (C-395/95 P, Colect., p. I2271, n.os 12 a 15), cuja solução é aplicável por analogia ao presente caso, pelo que essa carta pode ser objecto de um recurso de anulação. Esta interpretação é ainda confirmada pelas observações apresentadas pela Comissão ao Provedor de Justiça europeu em resposta a uma queixa apresentada pela recorrente.

Apreciação do Tribunal

47

No âmbito de um recurso de anulação, o juiz controla a legalidade dos actos adoptados pelas instituições destinados a produzir efeitos jurídicos vinculativos relativamente a terceiros e que alteram de forma caracterizada a sua situação jurídica (despacho do Tribunal Geral de 10 de Abril de 2008, Imelios/Comissão, T-97/07, ainda não publicado na Colectânea; v. igualmente, neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de , IBM/Comissão, 60/81, Recueil p. 2639, n.o 9, e de , Reynolds Tobacco e o./Comissão, C-131/03 P, Colect., p. I-7795, n.o 54).

48

Quando se trate de actos ou de decisões cuja elaboração se processa em várias fases, nomeadamente no termo de um processo interno, em princípio só constituem um acto impugnável as medidas que fixam definitivamente a posição da instituição no termo desse processo, com excepção das medidas intermediárias, cujo objectivo é preparar a decisão final (acórdão IBM/Comissão, n.o 47 supra, n.o 10, e acórdão do Tribunal Geral de 7 de Março de 2002, Satellimages TV5/Comissão, T-96/99, Colect., p. II-1425, n.o 32).

49

Só seria de outra forma se decisões ou actos adoptados no decurso do procedimento preparatório constituíssem, eles mesmos, o final de um procedimento especial distinto daquele que deve permitir à instituição pronunciar-se sobre o mérito (acórdão IBM/Comissão, n.o 47 supra, n.o 11 e despacho do Tribunal Geral de 9 de Junho de 2004, Camós Grau/Comissão, T-96/03, ColectFP, pp. I-A-157 e II-707, n.o 30).

50

Além disso, os actos adoptados pelas instituições que se inscrevem num quadro puramente contratual de que são indissociáveis não figuram, por força da sua natureza, no número dos actos cuja anulação pode ser requerida ao Tribunal Geral (despachos do Tribunal Geral de 10 de Maio de 2004, Musée Grévin/Comissão, T-314/03 e T-378/03, Colect., p. II-1421, n.o 64, e Imelios/Comissão, n.o 47 supra, n.o 22).

51

No presente caso, há que analisar se a carta de 19 de Agosto de 2008 constitui um acto susceptível de ser objecto de um recurso de anulação perante o Tribunal Geral. A recorrente alega que tal é o caso na medida em que essa carta, por um lado, contém uma decisão que põe termo a um procedimento administrativo de auditoria, confiado pela Comissão a um revisor externo e, por outro, adopta o relatório de auditoria redigido por esse revisor.

52

Em primeiro lugar, relativamente aos 22 contratos referidos no n.o 1 supra, há que sublinhar que, para proteger os seus direitos decorrentes dos referidos contratos e assegurar a boa execução por parte da recorrente das obrigações que lhe incumbem por força dos mesmos, a Comissão pode proceder aos controlos e às verificações que lhe pareçam necessários e adequados. Esses controlos e essas verificações são, aliás, expressamente autorizados pelos próprios termos dos contratos em causa (v. n.o 4 supra).

53

Neste contexto, a Comissão pode encarregar um revisor externo de efectuar, por sua conta, uma auditoria e de lhe comunicar as conclusões dessa auditoria sob a forma de relatório. Pode igualmente, se as conclusões desse relatório lhe parecerem exactas e justificadas, basear-se nessas conclusões para invocar, perante as instâncias competentes, os direitos de que se julga titular por força dos contratos em causa.

54

Daqui decorre que, relativamente aos 22 contratos, a auditoria efectuada pelo revisor externo escolhido pela Comissão constitui um exercício, por parte desta última, dos seus direitos decorrentes desses contratos e insere-se, assim, no contexto contratual definido por esses contratos.

55

Por conseguinte, ainda que a carta de 19 de Agosto de 2008 devesse ser entendida no sentido de que põe termo ao processo de auditoria relativo aos acima referidos 22 contratos e de que valida as conclusões do revisor externo através da adopção do relatório final, a carta não é, ao contrário do que a recorrente alega, dissociável do contexto contratual constituído por esses contratos e não pode ser qualificada de acto susceptível de ser objecto de um recurso de anulação no Tribunal Geral. O pedido de anulação da decisão alegadamente contida nessa carta, na parte em que visa os 22 contratos é, assim, inadmissível.

56

Por outro lado, este pedido não pode ser requalificado na parte em que alega a violação, por parte da Comissão, das obrigações que lhe incumbem por força do disposto nos 22 contratos acima referidos e por não ter, assim, sido interposto ao abrigo de uma cláusula compromissória que atribui competência ao Tribunal Geral para se pronunciar sobre o litígio. Com efeito, é ao recorrente que cabe seleccionar o fundamento jurídico do seu recurso e não ao juiz comunitário escolher ele mesmo a base legal mais apropriada (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Março de 2005, Espanha/Eurojust, C-160/03, Colect., p. I-2077, n.o 35; despachos do Tribunal Geral de , Evropaïki Dynamiki/Comissão, T-205/05, anão publicado na Colectânea, n.o 38, e Imelios/Comissão, já referido no n.o 47 supra, n.o 19).

57

Seja como for, ainda que o pedido de anulação, na parte em que visa a carta de 19 de Agosto de 2008 relativa aos 22 contratos, pudesse ser requalificado, aquele pedido seria inadmissível, por o Tribunal Geral ser manifestamente incompetente para conhecer do pedido.

58

Com efeito, o Tribunal Geral só é competente para dirimir, em primeira instância, os litígios de natureza contratual que lhe são submetidos por pessoas singulares ou colectivas por força de uma cláusula compromissória. Não existindo essa cláusula, o Tribunal Geral alargaria a sua competência jurisdicional para além dos litígios cujo conhecimento lhe é reservado de forma restritiva (despacho do Tribunal Geral de 3 de Outubro de 1997, Mutual Aid Administration Services/Comissão, T-186/96, Colect., p. II-1633, n.o 47).

59

Ora, no presente caso, os 22 contratos referidos no n.o 1 supra não contêm nenhuma cláusula compromissória que atribua competência ao Tribunal Geral para dirimir o presente litígio, estipulando, pelo contrário, que cabe aos órgãos jurisdicionais de Bruxelas dirimir os litígios relativos a esses contratos.

60

Em segundo lugar, quanto à parte em que a carta de 19 de Agosto de 2008 se refere aos 12 contratos mencionados nos n.os 14 e 18 supra, celebrados entre a recorrente e determinados Estados ACP e financiados pelo FED, há que salientar que, segundo jurisprudência constante em matéria de adjudicação de concursos públicos que beneficiam de uma contribuição financeira do FED, as intervenções dos representantes da Comissão, quer se trate de aprovações ou de recusa de aprovações, de vistos ou de recusa de vistos, se destinam apenas a verificar se as condições do financiamento comunitário estão ou não preenchidas e não têm por objecto nem podem ter por efeito a violação do princípio segundo o qual os concursos em causa continuam a ser concursos nacionais cuja preparação, negociação e conclusão é da responsabilidade dos Estados beneficiários (acórdãos do Tribunal de Justiça de , STS/Comissão, 126/83, Recueil, p. 2769, n.o 16, e de , CMC e o./Comissão, 118/83, Recueil, p. 2325, n.o 28).

61

De facto, as empresas concorrentes ou adjudicatárias dos concursos em causa só mantêm relações jurídicas com o Estado beneficiário responsável pelo contrato e os actos dos representantes da Comissão não podem ter por efeito substituir, na parte que lhes diz respeito, por uma decisão dessa instituição a decisão do Estado ACP, único competente para celebrar e assinar esse contrato (acórdãos do Tribunal de Justiça STS/Comissão, n.o 60 supra, n.o 18; de 14 de Janeiro de 1993, Italsolar/Comissão C-257/90, Colect., p. I-9, n.o 22, e de , Forafrique Burkinabe/Comissão, C-182/91, Colect., p. I-2161, n.o 23).

62

Estas considerações, válidas para os contratos de prestação de serviços referidos no n.o 14 supra, celebrados na sequência de um concurso público nacional organizado pelo Estado ACP em causa, são igualmente válidas, por analogia, para os contratos de subvenção celebrados por um Estado ACP referidos no n.o 18 supra.

63

Contudo, estas considerações não são, por si só, suficientes para concluir pela inadmissibilidade de um recurso de anulação interposto contra um acto da Comissão adoptado no exercício das suas competências próprias, por um particular afectado por esse acto e ao qual este é formalmente dirigido, ainda que o referido acto se inscreva no âmbito de um procedimento de natureza contratual (v., neste sentido, acórdão Geotronics/Comissão, já referido, n.o 46 supra, n.os 13 e 14).

64

Para que o Tribunal Geral se possa pronunciar sobre a admissibilidade do pedido de anulação, na parte relativa aos 12 contratos celebrados entre a recorrente, por um lado, e os diferentes Estados ACP, por outro, há por conseguinte que determinar se essa carta, formalmente enviada à recorrente, contém efectivamente uma decisão da Comissão, adoptada no exercício das suas competências próprias, que é susceptível de ser objecto de um recurso de anulação perante o Tribunal Geral.

65

A própria recorrente admite que, tendo-lhe a Comissão, na carta de 19 de Agosto de 2008, comunicado que lhe seria em breve enviada uma nota de débito, essa carta não constitui um acto que produz efeitos jurídicos vinculativos que a afectem. No entanto, alega que na referida carta a Comissão não se limita a responder às suas queixas relativas à auditoria realizada por um revisor externo a pedido da Comissão, mas adopta uma decisão formal que põe termo a um procedimento administrativo de auditoria e valida as conclusões do revisor externo ao adoptar o relatório final. Esta decisão pode ser objecto de um recurso de anulação perante o Tribunal Geral.

66

A este respeito, há que salientar que uma auditoria realizada no âmbito dos contratos financiados pelo FED tem necessariamente por objecto a verificação da regularidade das operações financeiras efectuadas no âmbito da execução desses contratos. Nesse contexto, podem constatar-se irregularidades que justificam uma obrigação de reembolsar determinados montantes ao FED.

67

Contudo, os créditos devidos ao FED que sejam constatados após uma auditoria efectuada pela Comissão ou a seu pedido não têm origem na própria auditoria, mas na violação das obrigações contratuais por uma das partes do contrato financiado pelo FED. Com efeito, o relatório de auditoria limita-se a constatar as eventuais irregularidades já existentes, bem como os créditos que daí resultam. Não altera assim, em nada, a situação jurídica do devedor desses créditos. Aliás, este tem a possibilidade de contestar as constatações e as conclusões do relatório de auditoria perante a o órgão jurisdicional competente, no âmbito de qualquer litígio que tenha por objecto os créditos em questão.

68

O argumento da recorrente segundo o qual a adopção do relatório a obrigou a alterar o seu balanço através da anulação de um crédito e da inscrição, em lugar deste, de uma dívida imprevista não pode conduzir a uma conclusão contrária, na medida em que, tal como já foi observado, o relatório de auditoria não implica a obrigação de a recorrente alterar a sua própria contabilidade, que é da sua exclusiva responsabilidade.

69

Há igualmente que recordar que compete à Comissão, por força dos acordos e convenções que instituíram os diferentes FED, bem como por força dos respectivos regulamentos financeiros, assegurar a gestão desses FED. Neste contexto, a Comissão tem não só o direito, mas também o dever, de se assegurar, antes de proceder a qualquer pagamento de fundos comunitários, que as condições para esses pagamentos se encontram efectivamente preenchidas e, para esse efeito, aquela tem nomeadamente de procurar obter as informações necessárias para assegurar uma gestão económica dos recursos do FED (acórdão do Tribunal Geral de 11 de Julho de 1996, International Procurement Services/Comissão, T-175/94, Colect., p. II-729, n.o 45; v. igualmente, neste sentido, acórdão CMC e o./Comissão, já referido no n.o 60 supra, n.os 44 e 47).

70

Como foi já acima referido nos n.os 12 e 13, o ordenador principal do FED, nomeado pela Comissão, tem de emitir uma ordem de cobrança relativamente a qualquer crédito apurado como certo, líquido e exigível que seja devido ao FED. Esta ordem é enviada ao contabilista, nomeado igualmente pela Comissão. Este último diligencia no sentido de assegurar a cobrança das receitas do FED e se na data de vencimento prevista na ordem de cobrança a cobrança efectiva não tiver tido lugar o contabilista deve informar deste facto o gestor orçamental competente do FED e inicia o processo de recuperação. O Regulamento Financeiro de 27 de Março de 2003 aplicável ao nono FED acrescenta que a ordem de cobrança é acompanhada de uma nota de débito, dirigida ao devedor.

71

O apuramento de um crédito devido ao FED num relatório de auditoria relativo a contratos financiados pelo FED pode assim dar lugar à elaboração da respectiva ordem de cobrança bem como, se necessário, de uma nota de débito dirigida ao devedor.

72

Contudo, tal como já foi declarado, uma nota de débito constitui uma simples informação dada ao devedor relativa a uma obrigação que resulta de um contrato financiado pelo nono FED, contrato esse do qual a Comissão não era parte. Se o devedor não pagar o montante exigido, a Comissão pode renunciar à cobrança do crédito, proceder a uma compensação, ou recorrer à execução coerciva, podendo esta produzir-se por decisão executória ou por título executivo obtido por via contenciosa. Deste modo, a nota de débito não tem carácter executório, sendo antes um simples acto preparatório que precede a eventual adopção de uma decisão da Comissão de instaurar ou não o processo de cobrança, quer instaurando um processo contencioso, quer adoptando uma decisão com força de título executivo. Por conseguinte, a nota de débito não constitui uma medida que fixa definitivamente a posição da Comissão, não produz efeitos jurídicos vinculativos de molde a afectar os interesses do recorrente e, por conseguinte, não é susceptível de ser objecto de recurso de anulação (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 17 de Abril de 2008, Cestas/Comissão, T-260/04, Colect., p. II-701, n.os 75 e 76).

73

Esta conclusão é igualmente válida para as ordens de cobrança, previstas em todos os Regulamentos Financeiros que regem os quatro FED em causa no presente processo. Para além de essas ordens não serem sequer dirigidas ao devedor na medida em que revestem um carácter puramente interno por serem dirigidas apenas ao contabilista, criam apenas a obrigação de este último, em caso de não cobrança do crédito em questão, dar início ao procedimento de cobrança, através dos diferentes meios acima descritos.

74

Não é assim de modo nenhum certo que um relatório de auditoria que tenha detectado a existência de créditos devidos ao FED dê lugar a um acto que produz efeitos jurídicos vinculativos susceptíveis de afectar os interesses do devedor. Tal não sucederá, claramente, se a Comissão decidir renunciar ao processo de cobrança do crédito. Também não será o caso se a Comissão decidir dar início ao processo de cobrança através da via contenciosa, caso em que será directamente interposto um recurso nos órgãos jurisdicionais competentes. Nesta última situação, como já foi salientado, o devedor terá possibilidade de contestar as conclusões da auditoria no âmbito desse processo.

75

Ainda que se admitisse que um relatório de auditoria relativo a contratos financiados pelo FED pudesse culminar num acto posterior, que produz efeitos jurídicos vinculativos relativamente a uma das partes contratantes, o referido relatório de auditoria constituiria apenas um acto preparatório desse acto posterior, único acto que afecta o interessado. Uma decisão da Comissão que encerra a auditoria e valida as conclusões do revisor externo através da adopção do relatório final não é assim susceptível, nos termos da jurisprudência referida nos n.os 47 e 48 supra, de ser objecto de um recurso de anulação no Tribunal Geral.

76

É sem razão que a recorrente invoca, a este respeito, um alegado procedimento administrativo de auditoria. Nenhum dos Regulamentos Financeiros mencionados no n.o 11 supra contém disposições relativas às auditorias de contratos financiados pelo FED. Embora tal não signifique que a própria Comissão esteja impedida de efectuar, ou de pedir a um revisor externo que efectue por sua conta, as referidas auditorias, não é menos exacto que não está em causa, nessa hipótese, um procedimento de auditoria especial e distinto, alegadamente encerrado através de uma decisão que aprovou o relatório de auditoria. A jurisprudência referida no n.o 49 supra não é assim pertinente para o presente processo.

77

Resulta de todas as considerações acima efectuadas que o pedido de anulação da decisão alegadamente contida na carta de 19 de Agosto de 2008 é igualmente inadmissível na parte em que essa carta se refere aos 12 contratos celebrados entre a recorrente e os diferentes Estados ACP e financiados pelo FED e deve, assim, ser julgado inteiramente improcedente.

78

Em terceiro lugar, a conclusão segundo a qual o pedido de anulação da decisão alegadamente contida na carta de 19 de Agosto de 2008 é inadmissível, tanto relativamente aos 22 contratos referidos no n.o 1 supra como relativamente aos 12 contratos referidos nos n.os 14 e 18 supra, não é posta em causa pela argumentação apresentada pela recorrente no requerimento apresentado em (v. n.o 35 supra).

79

Em substância, a recorrente alega que, embora o contrato celebrado entre a Comissão e o revisor externo, anexado àquele requerimento, previsse que o referido revisor efectuaria uma «auditoria» nos termos das «normas contabilísticas internacionais», a Comissão, em seguida, e sem alterar formalmente o contrato, aceitou que o revisor procedesse apenas a verificações de acordo com um «procedimento acordado». A recorrente alega que este facto confirma a bondade dos fundamentos invocados na petição e invoca dois novos fundamentos, relativos, respectivamente, à violação da «obrigação de imparcialidade da acção administrativa» e ao abuso ou ao desvio de poder.

80

Ainda que essas afirmações fossem admissíveis e fundamentadas, não demonstram de modo nenhum que a carta de 19 de Agosto de 2008 contém uma decisão susceptível de ser objecto de um recurso de anulação no Tribunal Geral. Quando muito, tendem a demonstrar o carácter irregular da auditoria efectuada pelo revisor externo a pedido da Comissão. Ora, como já foi sublinhado, essa auditoria inscreve-se num âmbito contratual do qual é indissociável.

Quando ao pedido de indemnização

Argumentos das partes

81

A Comissão alega que o comportamento alegadamente prejudicial que lhe é apontado pela recorrente no âmbito do seu pedido de indemnização se refere ao facto de a Comissão não ter executado correctamente ou de não ter executado as suas obrigações decorrentes dos diferentes contratos de financiamento que celebrou, por ter suspendido determinados pagamentos. Esta conclusão é confirmada pela leitura das partes da petição relativas ao carácter alegadamente ilícito do comportamento da Comissão, à existência de um nexo de causalidade entre aquele comportamento e o dano alegadamente sofrido pela recorrente, bem como à sua extensão.

82

Segundo a Comissão, verificar o carácter alegadamente ilegal do comportamento que a recorrente lhe aponta pressupõe assim que se analisem os direitos e os deveres que lhe incumbem nos termos do contrato em causa. Ora, não existindo nos referidos contratos uma cláusula compromissória de atribuição de competência ao Tribunal Geral para dirimir o presente litígio, essa análise excede a competência do Tribunal Geral. A Comissão considera por conseguinte que a recorrente, através do seu pedido de indemnização, procura obter um resultado que apenas pode obter através da propositura de uma acção de responsabilidade contratual nos órgãos jurisdicionais competentes. O pedido de indemnização é, assim, manifestamente inadmissível.

83

Na petição, a recorrente invoca em apoio do seu pedido de indemnização que a Comissão não lhe comunicou rapidamente a sua decisão, adoptada em Novembro de 2005, de suspender todos os pagamentos a seu favor bem como a recusa da Comissão de lhe prestar esclarecimentos a esse respeito e de se encontrar com os seus representantes. Esse comportamento durou vários meses, até a Comissão a ter informado, por carta, em Maio de 2006, da referida decisão. Segundo a recorrente, este comportamento da Comissão está viciado pelos mesmos fundamentos de ilegalidade que foram invocados em apoio do pedido de anulação e constituem igualmente uma violação dos princípios da boa administração e da transparência por parte da Comissão.

84

Relativamente ao nexo de causalidade entre o comportamento apontado à Comissão e o dano que alega ter sofrido, bem como a dimensão deste, a recorrente alega que por não ter tido conhecimento da decisão da Comissão de suspender os pagamentos a seu favor, prosseguiu a realização de diversos projectos sem alterar a sua estrutura operacional e os seus programas de despesas e contraiu, por conseguinte, novas «dívidas» tanto devido à realização de outros projectos nos quais participava como ao seu envolvimento em diversos procedimentos contenciosos. A recorrente sofreu igualmente um dano moral «muito grave». Por outro lado, a recorrente invoca a responsabilidade extracontratual da Comunidade devido a um comportamento não faltoso.

85

Nas suas observações respeitantes à excepção de inadmissibilidade, a recorrente alega que a argumentação da Comissão relativa à inadmissibilidade do pedido de indemnização se baseia numa desvirtuação do conteúdo da sua petição. Resulta da leitura global da parte da petição consagrada ao pedido de indemnização que a recorrente pede a reparação do dano que sofreu por a Comissão não a ter informado em tempo útil da decisão de suspender todos os pagamentos a seu favor. O pedido de indemnização baseia-se assim na violação dos princípios da transparência e da boa administração da justiça por parte da Comissão, e nos outros fundamentos de ilegalidade invocados em apoio do pedido de anulação.

86

O facto de a recorrente pedir a título de indemnização pelo dano material que sofreu montantes claramente distintos dos pagamentos a que teria direito nos termos dos contratos em questão e de procurar um ressarcimento pelos danos morais confirma a natureza não contratual do pedido de indemnização e, por conseguinte, a admissibilidade do pedido de indemnização.

Apreciação do Tribunal

87

Há que salientar, em primeiro lugar, que, segundo jurisprudência assente, a responsabilidade extracontratual da Comunidade na acepção do artigo 288.o, segundo parágrafo, CE, por actuação ilícita dos seus órgãos depende do preenchimento de um conjunto de requisitos, a saber, a ilegalidade do comportamento censurado às instituições, a realidade do dano e a existência de um nexo de causalidade entre o comportamento alegado e o dano invocado (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 1982, Oleifici Mediterranei/CEE, 26/81, Recueil p. 3057, n.o 16; acórdãos do Tribunal Geral International Procurement Services/Comissão, n.o 69 supra, n.o 44, e de , Oleifici Italiani/Comissão, T-267/94, Colect., p. II-1239, n.o 20).

88

Em segundo lugar, segundo jurisprudência assente, a responsabilidade extracontratual da Comunidade por facto lícito só existe se estiverem preenchidas três condições cumulativas, a saber, a realidade do dano alegadamente sofrido, o nexo de causalidade entre este e o acto imputado às instituições da Comunidade bem como o carácter anormal e especial do dano alegado (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Junho de 2000, Dorsch Consult/Conselho e Comissão, C-237/98 P, Colect., p. I-4549, n.os 19 e 53, e despacho do Tribunal de Justiça de , Galileo International Technology e o./Comissão, C-325/06 P, não publicado na Colectânea, n.o 76).

89

Em terceiro e último lugar, nos termos do artigo 21.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, aplicável aos processos que correm no Tribunal Geral por força do artigo 53.o, primeiro parágrafo, do mesmo Estatuto, e do artigo 44.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo, a petição deve indicar o objecto do litígio e conter uma exposição sumária dos fundamentos invocados. Estes elementos devem ser suficientemente claros e precisos para permitir que a parte demandada prepare a sua defesa e que o Tribunal Geral se pronuncie sobre a acção, sendo caso disso sem mais informações. Para garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, para que uma acção seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que aquela se baseia resultem, pelo menos sumariamente, mas de forma coerente e compreensível, da própria petição (despachos do Tribunal Geral de 28 de Abril de 1993, De Hoe/Comissão, T-85/92, Colect., p. II-523, n.o 20; de , Asia Motor France e. o./Comissão, T-152/98, Colect., p. II-1703, n.o 49, e acórdão do Tribunal Geral de , Ismeri Europa/Tribunal de Contas, T-277/97, Colect., p. II-1825, n.os 28 e 29).

90

Tratando-se de um pedido de indemnização tendente à reparação do dano alegadamente sofrido devido à suspensão por parte da Comissão dos pagamentos a seu favor, a recorrente, para se conformar com as suas obrigações acima referidas, tem de apresentar na sua petição os elementos de facto e de direito que estão na origem da alegada obrigação da Comissão de efectuar pagamentos a seu favor ou, pelo menos, de a informar em tempo útil da decisão de suspender esses pagamentos.

91

Tais esclarecimentos são, antes de mais, necessários para que o Tribunal Geral possa verificar se a acção tem efectivamente por objecto a responsabilidade extracontratual da Comunidade, tanto por facto ilícito como por facto lícito, ou se visa, pelo contrário, a sua responsabilidade contratual, caso em que, como decorre da jurisprudência referida no n.o58 supra, o Tribunal Geral só é competente para conhecer da acção se os contratos em causa contiverem uma cláusula compromissória que o designe competente para conhecer dos litígios relativos à sua execução.

92

Contudo, há que reconhecer que embora a recorrente invoque, na sua petição, uma alegada suspensão de todos os pagamentos a seu favor decidida pela Comissão logo em Novembro de 2005, a recorrente não esclarece de modo nenhum quais os pagamentos a que teria direito caso não tivesse havido essa suspensão, nem, ainda menos, se esses pagamentos teriam origem em contratos celebrados entre a recorrente e a Comissão ou se decorrem directamente de disposições aplicáveis que aliás não foram referidas na petição. Daqui resulta que, relativamente ao pedido de indemnização, a petição não respeita as exigências mínimas previstas no artigo 44.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo.

93

O facto de, na petição, a recorrente se referir exclusivamente à responsabilidade extracontratual da Comunidade e à alegada violação, por parte da Comissão, dos princípios da boa administração e da transparência, não põe em causa estas conclusões.

94

Com efeito, tratando-se de um litígio de natureza contratual, a simples invocação de normas jurídicas que não decorrem de um contrato, mas que se impõem às partes, não pode conduzir a uma alteração da natureza contratual do litígio e eximir, por conseguinte, a parte que invoca tais normas do órgão jurisdicional competente. Se assim não fosse, a natureza do litígio e, consequentemente, o órgão jurisdicional competente seriam susceptíveis de mudar em função das normas invocadas pelas partes, situação que contrariaria as normas de atribuição de competência material aos diferentes órgãos jurisdicionais (acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Maio de 2009, Guigard/Comissão, C-214/08 P, não publicado na Colectânea, n.o 43).

95

Por outro lado, as instituições estão sujeitas a obrigações que decorrem do princípio geral da boa administração relativamente aos seus administrados, exclusivamente no âmbito do exercício das suas responsabilidades administrativas. Em contrapartida, quando a relação entre a Comissão e a parte recorrente é claramente de natureza contratual, esta última pode apenas imputar à Comissão violações de estipulações contratuais ou violações do direito aplicável ao contrato (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 3 de Junho de 2009, Comissão/Burie Onderzoek en advies, T-179/06, não publicado na Colectânea, n.o 118).

96

Decorre destas considerações que a recorrente não se podia ter limitado a invocar, na petição, a responsabilidade extracontratual da Comunidade e a alegada violação, por parte da Comissão, dos princípios da boa administração e da transparência, e devia ter esclarecido a origem, contratual ou não, das obrigações que a Comissão terá violado quando decidiu suspender todos os pagamentos à recorrente e quando se absteve, durante um longo período, de comunicar essa suspensão à recorrente.

97

Resulta do exposto que o pedido de indemnização é inadmissível e deve ser julgado improcedente.

98

Esta conclusão não é posta em causa pela argumentação desenvolvida pela recorrente no requerimento que apresentou em 1 de Dezembro de 2009 (v. n.o 35 supra). Essa argumentação é irrelevante para o pedido de indemnização, uma vez que diz respeito à auditoria efectuada por um revisor externo a pedido da Comissão e refere-se, assim, a um período posterior àquele que é abrangido pelo pedido de indemnização. Com efeito, de acordo com as afirmações da própria recorrente, o alegado comportamento ilícito da Comissão cessou com o envio da carta do Europaid, de , que informou a recorrente da suspensão de todos os pagamentos a seu favor. Ora, a auditoria apenas teve início em (v. n.os 21 e 23 supra).

99

Seja como for, ainda que a petição devesse ser interpretada no sentido de que os pagamentos abrangidos pela suspensão alegadamente decidida em Novembro de 2005 têm origem nos 34 contratos acima referidos e que foram objecto da auditoria ordenada pela Comissão, há que referir, por um lado, que, relativamente aos 22 contratos celebrados entre a Comissão e a recorrente, referidos no n.o 1 supra, uma alegada violação, por parte da Comissão, das suas obrigações decorrentes destes contratos a faria incorrer em responsabilidade contratual e daria lugar a um litígio de natureza contratual sobre o qual Tribunal Geral não se pode pronunciar quando não exista uma cláusula compromissória que lhe atribua competência.

100

Por outro lado, relativamente aos 12 contratos referidos nos n.os 14 e 18 supra, celebrados entre a recorrente e alguns Estados ACP e financiados pelo FED, é certo que as considerações feitas nos n.os 60 e 62 supra não podem afectar as vias de recurso judicial contra a Comissão de que qualquer interessado dispõe, no âmbito de processos iniciados nos termos dos artigos 235.o e 238.o, segundo parágrafo, CE (acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de Setembro de 1985, Murri/Comissão, 33/82, Recueil, p. 2759, n.o 35).

101

No entanto, já foi declarado que caso um diferendo contratual entre um Estado ACP e o seu co-contratante no âmbito de um contrato financiado pelo FED não tenha sido resolvido previamente, consensualmente ou através das vias de recurso previstas no contrato, como a arbitragem, a contraparte fica incapaz de provar que o comportamento da Comissão relativo a esse diferendo lhe causou um dano diferente do dano cuja reparação terá de solicitar ao Estado ACP em causa, de acordo com as vias jurisdicionais adequadas. Nesse caso, um pedido de indemnização apresentado por essa mesma parte contra a Comissão nos termos do artigo 235.o CE e do artigo 288.o, segundo parágrafo, CE, deve ser julgado improcedente na medida em que a demandante não provou a existência de um nexo de causalidade entre o comportamento imputado à Comissão e o dano alegado (v., neste sentido, acórdãos Murri/Comissão, n.o 100 supra, n.os 36 a 39, e International Procurement Services/Comissão, n.o 69 supra, n.os 58 a 61).

102

É precisamente o que sucede no presente caso, no que respeita aos 12 contratos acima referidos, celebrados entre a recorrente e diferentes Estados ACP. Com efeito, de acordo com as alegações da própria recorrente, o dano a que se refere o seu pedido de indemnização tem origem na suspensão dos pagamentos a seu favor que, através da celebração daqueles contratos, os Estados ACP se tinham comprometido a efectuar, caso todas as condições previstas a este respeito se encontrassem preenchidas.

103

Ora, cabia à recorrente, e cabe-lhe sempre caso considere que tem direito a tal, pedir aos Estados ACP em causa, de acordo com as vias jurisdicionais adequadas, a reparação de um eventual dano resultante da alegada violação por parte dos referidos Estados das suas obrigações decorrentes dos contratos em questão. Por conseguinte, devendo o pedido de indemnização ser entendido no sentido de que tem por objecto a reparação do dano alegadamente sofrido pela recorrente devido à suspensão dos pagamentos previstos nos 12 contratos em causa, há que julgar aquele pedido improcedente por ser manifestamente desprovido de qualquer fundamento jurídico.

104

Decorre de todas as considerações feitas que há igualmente que julgar o pedido de indemnização improcedente devendo, por conseguinte, negar-se provimento ao recurso na íntegra. Nestas condições, não há que ordenar as medidas requeridas pela recorrente nos seus pedidos de 2 de Julho e de (n.os 32 e 34 supra), independentemente da sua natureza jurídica exacta, a saber, quer sejam medidas de organização do processo ou diligências de instrução. Com efeito, segundo a recorrente, essas medidas destinam-se a fornecer mais esclarecimentos sobre a natureza das instruções dadas pela Comissão ao revisor externo encarregue de proceder à auditoria, questão que não é pertinente para a resolução do litígio.

Quanto às despesas

105

Nos termos do artigo 87.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas, em conformidade com os pedidos da Comissão.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A Alisei é condenada nas despesas.

 

Feito no Luxemburgo, em 8 de Fevereiro de 2010.

O secretário

E. Coulon

O presidente

M. Vilaras


( *1 ) Língua do processo: italiano.

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