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Document 62008CJ0392

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 25 de Março de 2010.
    Comissão Europeia contra Reino de Espanha.
    Incumprimento de Estado - Directiva 96/82/CE - Controlo dos perigos decorrentes de acidentes graves envolvendo substâncias perigosas - Artigo 11.º, n.º 1, alínea c) - Obrigação de elaborar planos de emergência externos - Prazo.
    Processo C-392/08.

    Colectânea de Jurisprudência 2010 I-02537

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2010:164

    Processo C‑392/08

    Comissão Europeia

    contra

    Reino de Espanha

    «Incumprimento de Estado – Directiva 96/82/CE – Controlo dos perigos decorrentes de acidentes graves envolvendo substâncias perigosas – Artigo 11.°, n.° 1, alínea c) – Obrigação de elaborar planos de emergência externos – Prazo»

    Sumário do acórdão

    Ambiente – Controlo dos perigos associados a acidentes graves que envolvem substâncias perigosas – Directiva 96/82

    [Directiva 96/82 do Conselho, artigo 11.°, n.° 1, alínea c)]

    A elaboração dos planos de emergência externos prevista no artigo 11.°, n.° 1, alínea c), da Directiva 96/82, relativa ao controlo dos perigos associados a acidentes graves que envolvem substâncias perigosas, insere‑se num processo em várias fases, que inclui, na primeira, a elaboração de planos de emergência internos pelos operadores dos estabelecimentos em que se encontram grandes quantidades de substâncias perigosas e a transmissão das informações necessárias às autoridades competentes, as quais, numa segunda fase, elaboram os referidos planos de emergência externos, seguindo‑se, numa terceira fase, o reexame e, se necessário, a revisão e a actualização dos planos de emergência internos e externos por parte, respectivamente, dos operadores dos estabelecimentos e das referidas autoridades.

    É verdade que os n.os 1 e 4 do artigo 11.° da Directiva 96/82 não fixam prazos para a primeira e terceira fases. Contudo, o facto de, nessa disposição, não ser fixado expressamente um prazo para a elaboração dos planos de emergência externos não significa, em si mesmo, que os Estados‑Membros não estejam sujeitos a prazos para cumprir a obrigação de os elaborarem.

    Resulta da interdependência entre os planos de emergência internos e externos, cuja coordenação permite assegurar a eficácia do mecanismo previsto no artigo 11.° da directiva que as autoridades competentes são obrigadas a elaborar os planos de emergência externos dentro de um prazo que, por um lado, não possa pôr em causa o efeito útil das disposições do referido artigo, mas que, por outro, tenha em conta o tempo necessário para a finalização dos planos, ou seja, dentro de um prazo razoável a contar da data em que os dados sejam transmitidos pelos operadores em causa.

    Aliás, se é certo que, nos termos do artigo 11.°, n.° 1, da referida directiva, a obrigação de elaborar planos de emergência externos está ligada à obrigação de os operadores dos estabelecimentos em causa comunicarem às autoridades competentes as informações necessárias para a elaboração dos planos, não deixa de ser verdade que a mesma disposição impõe aos Estados‑Membros a obrigação de zelar por que aqueles operadores prestem as informações necessárias nos prazos estabelecidos. Nestas condições, o facto de, em alguns casos, as autoridades competentes não disporem das informações necessárias dentro desses prazos não justifica a inexistência de planos de emergência externos.

    (cf. n.os 13‑14, 17, 21, 25)







    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

    25 de Março de 2010 (*)

    «Incumprimento de Estado – Directiva 96/82/CE – Controlo dos perigos associados a acidentes graves que envolvem substâncias perigosas – Artigo 11.°, n.° 1, alínea c) – Obrigação de elaborar planos de emergência externos – Prazo»

    No processo C‑392/08,

    que tem por objecto uma acção por incumprimento nos termos do artigo 226.° CE, entrada em 9 de Setembro de 2008,

    Comissão Europeia, representada por S. Pardo Quintillán e A. Sipos, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    demandante,

    contra

    Reino de Espanha, representado por B. Plaza Cruz, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    demandado,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

    composto por: K. Lenaerts, presidente de secção, R. Silva de Lapuerta, E. Juhász, T. von Danwitz e D. Šváby (relator), juízes,

    advogada‑geral: J. Kokott,

    secretário: R. Grass,

    vistos os autos,

    ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 10 de Dezembro de 2009,

    profere o presente

    Acórdão

    1        Na petição inicial, a Comissão das Comunidades Europeias pede ao Tribunal de Justiça que declare que o Reino de Espanha, não tendo elaborado planos de emergência externos para todos os estabelecimentos sujeitos ao disposto no artigo 9.° da Directiva 96/82/CE do Conselho, de 9 de Dezembro de 1996, relativa ao controlo dos perigos associados a acidentes graves que envolvem substâncias perigosas (JO 1997, L 10, p. 13), não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 11.°, n.° 1, alínea c), da referida directiva.

     Quadro jurídico

    2        Nos termos do seu artigo 1.°, a Directiva 96/82 tem como objecto a prevenção de acidentes graves que envolvem substâncias perigosas e a limitação das suas consequências para o homem e o ambiente, tendo em vista assegurar, de maneira coerente e eficaz, níveis de protecção elevados em toda a Comunidade Europeia.

    3        O artigo 11.° da Directiva 96/82 estabelece:

    «1. Os Estados‑Membros devem assegurar que, em relação a todos os estabelecimentos a que se aplica o disposto no artigo 9.°:

    a)      Seja elaborado pelo operador um plano de emergência interno a aplicar no interior do estabelecimento:

    –        no caso dos novos estabelecimentos, antes da sua entrada em funcionamento,

    –        no caso de estabelecimentos existentes ainda não sujeitos ao disposto na Directiva 82/501/CEE [do Conselho, de 24 de Junho de 1982, relativa aos riscos de acidentes graves de certas actividades industriais (JO L 230, p. 1)], no prazo de três anos a contar da data prevista no n.° 1 do artigo 24.°,

    –        no caso dos outros estabelecimentos, no prazo de dois anos a contar da data prevista no n.° 1 do artigo 24.°;

    b)      O operador forneça às autoridades competentes, para lhes permitir elaborar o plano de emergência externo, as informações necessárias nos seguintes prazos:

    –        no caso dos novos estabelecimentos, antes do início da sua entrada em funcionamento,

    –        no caso de estabelecimentos existentes ainda não sujeitos ao disposto na Directiva 82/501/CEE, no prazo de três anos a contar da data prevista no n.° 1 do artigo 24.°,

    –        no caso dos outros estabelecimentos, no prazo de dois anos a contar da data prevista no n.° 1 do artigo 24.°;

    c)      Seja elaborado pelas autoridades designadas para o efeito pelos Estados‑Membros um plano de emergência externo para a intervenção no exterior do estabelecimento.

    2.      Os planos de emergência devem ser elaborados com os seguintes objectivos:

    –        circunscrever e controlar os incidentes de modo a minimizar os seus efeitos e a limitar os danos ocasionados no homem, no ambiente e nos bens,

    –        aplicar as medidas necessárias, para proteger o homem e o ambiente dos efeitos de acidentes graves,

    –        comunicar as informações necessárias ao público e aos serviços ou autoridades pertinentes da região,

    –        prever disposições para a reabilitação e o saneamento do ambiente na sequência de um acidente grave.

    Os planos de emergência devem incluir as informações enumeradas no anexo IV.

    […]

    4.      Os Estados‑Membros devem estabelecer um sistema que garanta que os planos de emergência internos e externos são reexaminados, ensaiados e, se necessário, revistos e actualizados pelos operadores e pelas autoridades designadas, com uma periodicidade adequada que não deve exceder três anos. Este reexame terá em conta as alterações ocorridas nos estabelecimentos em questão, nos serviços de emergência relevantes, bem como os novos conhecimentos técnicos e os conhecimentos no domínio das medidas necessárias em caso de acidentes graves.

    […]»

    4        Os Estados‑Membros, ex vi dos artigos 24.° e 25.° da Directiva 96/82, estavam obrigados a pôr em vigor as disposições necessárias para dar cumprimento à directiva, o mais tardar, até 3 de Fevereiro de 1999.

     Procedimento pré‑contencioso

    5        Considerando que o artigo 11.°, n.° 1, alínea c), da Directiva 96/82 não foi respeitado pelo Reino de Espanha, a Comissão, em 23 de Março de 2007, desencadeou o processo de incumprimento previsto no artigo 226.° CE, instando aquele Estado‑Membro a apresentar as suas observações.

    6        Por ofícios de 12 e 25 de Junho de 2007, as autoridades espanholas responderam à notificação para cumprir da Comissão, informando‑a do número de estabelecimentos abrangidos pelas disposições da Directiva 96/82 e do número de estabelecimentos que dispunham de plano de emergência externo.

    7        Constatando, perante essas informações, que continuava a haver estabelecimentos que não dispunham desse plano, a Comissão emitiu, em 23 de Outubro de 2007, um parecer fundamentado, em que convidou o Reino de Espanha a tomar as medidas necessárias para dar cumprimento a esse parecer no prazo de dois meses a contar da data da sua recepção.

    8        Por carta de 10 de Janeiro de 2008, as autoridades espanholas responderam ao referido parecer, precisando que, dentre os estabelecimentos em causa, que eram 238 em 2005 e 280 em Dezembro de 2007, 186 dispunham de um plano de emergência externo aprovado. Observaram ainda que, embora o artigo 11.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 96/82 fixe, aos operadores dos estabelecimentos em causa, prazos para o cumprimento da obrigação de prestar as informações necessárias às autoridades competentes, não estabelece nenhum prazo para essas autoridades elaborarem planos de emergência externos.

    9        Tendo considerado que a situação continuava a ser insatisfatória, a Comissão intentou a presente acção.

     Quanto à acção

    10      O Reino de Espanha admite que, na data em que expirou o prazo fixado no parecer fundamentado, ou seja, em 23 de Dezembro de 2007, 94 estabelecimentos situados no seu território e abrangidos pelo artigo 9.° da Directiva 96/82 não estavam ainda dotados de um plano de emergência externo.

    11      Contudo, o Reino de Espanha alega que o artigo 11.°, n.° 1, alínea c), da Directiva 96/82 não fixa às autoridades competentes nenhum prazo para a elaboração de planos de emergência externos e que estas não podem dispor do mesmo prazo que é fixado no artigo 11.°, n.° 1, alínea a), da directiva para os operadores dos estabelecimentos em causa elaborarem planos de emergência internos. A título subsidiário, o Reino de Espanha acrescenta que o facto de esses operadores não transmitirem, como previsto no artigo 11.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 96/82, as informações necessárias permite justificar, em qualquer caso, a inexistência de um plano de emergência externo no caso de alguns dos estabelecimentos em causa. Por fim, informa que foram elaborados sete planos de emergência externos, no decurso do ano de 2008.

    12      Saliente‑se, a título preliminar, que as disposições do artigo 11.° da Directiva 96/82, que se refere aos estabelecimentos em que se encontram grandes quantidades de substâncias perigosas, constituem um conjunto de normas que têm como objectivo assegurar a existência de um sistema coerente e eficaz de limitação das consequências dos acidentes graves.

    13      A elaboração dos planos de emergência externos insere‑se, assim, num processo em várias fases, que inclui, na primeira, a elaboração de planos de emergência internos pelos operadores dos estabelecimentos em causa e a transmissão das informações necessárias às autoridades competentes, as quais, numa segunda fase, elaboram os referidos planos de emergência externos, seguindo‑se, numa terceira fase, o reexame e, se necessário, a revisão e a actualização dos planos de emergência internos e externos por parte, respectivamente, dos operadores dos estabelecimentos e das referidas autoridades.

    14      É verdade que os n.os 1 e 4 do artigo 11.° da Directiva 96/82 não fixam prazos para a primeira e terceira fases. Contudo, o facto de, nessa disposição, não ser fixado expressamente um prazo para a elaboração dos planos de emergência externos não significa, em si mesmo, que os Estados‑Membros não estejam sujeitos a prazos para cumprir a obrigação de os elaborarem.

    15      Com efeito, aquela obrigação seria esvaziada de conteúdo e o sistema de protecção instituído pelo artigo 11.° da Directiva 96/82 ficaria privado de qualquer efeito útil se a elaboração dos referidos planos pelas autoridades competentes pudesse ficar indefinidamente em suspenso.

    16      Nesta matéria, cumpre salientar que os planos de emergência internos e externos, nos termos do artigo 11.°, n.° 2, da Directiva 96/82, são elaborados com o objectivo de circunscrever e controlar os acidentes, por forma a minimizar os seus efeitos e a limitar os danos causados ao homem, ao ambiente e aos bens, e para aplicar as medidas necessárias para proteger o homem e o ambiente dos efeitos de acidentes graves.

    17      Além disso, resulta do anexo IV da Directiva 96/82, relativo às informações que devem constar dos planos de emergência, que existe uma interdependência entre os planos de emergência internos e externos, cuja coordenação permite assegurar a eficácia do mecanismo previsto no artigo 11.° da Directiva 96/82.

    18      Daqui decorre que as autoridades nacionais competentes devem utilizar sem delongas, na elaboração dos planos de emergência externos, as informações prestadas pelos operadores dos estabelecimentos em causa.

    19      Assim é, especialmente, no caso de algumas informações cuja rápida desactualização pode tornar ineficaz um plano de emergência que nelas se baseie. De resto, é esta a razão pela qual os Estados‑Membros, nos termos do artigo 11.°, n.° 4, da Directiva 96/82, estão obrigados a instituir um sistema que garanta que os planos de emergência internos e externos serão reexaminados e, se necessário, revistos e actualizados com uma periodicidade adequada que não deve exceder três anos.

    20      Por conseguinte, o prazo de cumprimento da obrigação prevista no artigo 11.°, n.° 1, alínea c), da directiva só pode, em princípio, começar a correr depois da transmissão das referidas informações.

    21      À luz das considerações precedentes, há que concluir que as autoridades competentes são obrigadas a elaborar os planos de emergência externos previstos no artigo 11.° da Directiva 96/82, dentro de um prazo que, por um lado, não possa pôr em causa o efeito útil das disposições desse artigo, mas que, por outro, tenha em conta o tempo necessário para a finalização dos planos, ou seja, dentro de um prazo razoável a contar da data em que os dados sejam transmitidos pelos operadores em causa.

    22      No caso em apreciação, não se contesta que, desde há muitos anos, não existem planos de emergência externos para todos os estabelecimentos em causa.

    23      A este respeito, importa salientar que o artigo 11.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 96/82 estabelece diversos prazos em função das diferentes categorias de estabelecimentos. Mas tem de se concluir que a data‑limite para os operadores dos estabelecimentos em causa nessa disposição transmitirem às autoridades competentes as informações necessárias para a elaboração dos planos de emergência externos foi fixada quer em momento anterior ao início da exploração dos estabelecimentos quer, o mais tardar, em 3 de Fevereiro de 2002, i. e., três anos após o prazo de transposição da directiva.

    24      Ora, o lapso de tempo decorrido entre esta data e a data de expiração do prazo fixado no parecer fundamentado, a saber, 23 de Dezembro de 2007, manifestamente, não é razoável, pelo que não se pode justificar, no caso em apreço, a não elaboração de planos de emergência externos para todos os estabelecimentos em causa.

    25      Aliás, se é certo que, nos termos do artigo 11.°, n.° 1, da Directiva 96/82, a obrigação de elaborar planos de emergência externos está ligada à obrigação de os operadores dos estabelecimentos em causa comunicarem às autoridades competentes as informações necessárias para a elaboração dos planos, não deixa de ser verdade que a mesma disposição impõe aos Estados‑Membros a obrigação de zelar por que aqueles operadores prestem as informações necessárias nos prazos estabelecidos. Nestas condições, o facto de, em alguns casos, as autoridades competentes não disporem das informações necessárias dentro desses prazos não justifica, como salientou a advogada‑geral no n.° 20 das suas conclusões, a inexistência de planos de emergência externos.

    26      Quanto à elaboração de vários planos de emergência externos no ano de 2008, basta referir que, segundo jurisprudência constante, a existência do incumprimento deve ser apreciada em função da situação do Estado‑Membro no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, não podendo as alterações posteriores ser tomadas em consideração pelo Tribunal de Justiça (v., entre outros, acórdão de 6 de Dezembro de 2007, Comissão/Alemanha, C‑456/05, Colect., p. I‑10517, n.° 15).

    27      Nestas condições, a acção da Comissão tem de ser considerada procedente.

    28      Por consequência, há que declarar que, não tendo elaborado planos de emergência externos para todos os estabelecimentos referidos no artigo 9.° da Directiva 96/82, o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 11.°, n.° 1, alínea c), da mesma.

     Quanto às despesas

    29      Por força do disposto no artigo 69,°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação do Reino de Espanha e tendo este sido vencido, há que condená‑lo nas despesas.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara e decide:

    1)      Não tendo elaborado planos de emergência externos para todos os estabelecimentos referidos no artigo 9.° da Directiva 96/82/CE do Conselho, de 9 de Dezembro de 1996, relativa ao controlo dos perigos associados a acidentes graves que envolvem substâncias perigosas, o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 11.°, n.° 1, alínea c), da mesma.

    2)      O Reino de Espanha é condenado nas despesas.

    Assinaturas


    * Língua do processo: espanhol.

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