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Document 62008CJ0334

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 8 de Julho de 2010.
    Comissão Europeia contra República Italiana.
    Incumprimento de Estado - Recursos próprios da União - Recusa de pôr à disposição da União recursos próprios correspondentes a certas autorizações aduaneiras ilegais - Força maior - Comportamento fraudulento das autoridades aduaneiras - Responsabilidade dos Estados-Membros - Regularidade da inscrição dos direitos apurados na contabilidade separada.
    Processo C-334/08.

    Colectânea de Jurisprudência 2010 I-06869

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2010:414

    Processo C‑334/08

    Comissão Europeia

    contra

    República Italiana

    «Incumprimento de Estado – Recursos próprios da União – Recusa de pôr à disposição da União recursos próprios correspondentes a certas autorizações aduaneiras ilegais – Força maior – Comportamento fraudulento das autoridades aduaneiras – Responsabilidade dos Estados‑Membros – Regularidade da inscrição dos direitos apurados na contabilidade separada»

    Sumário do acórdão

    1.        Recursos próprios das Comunidades Europeias – Apuramento e colocação à disposição pelos Estados‑Membros

    [Regulamento n.° 1150/2000 do Conselho, artigo 17.°, n.os 1 e 2; Decisão 2000/597 do Conselho, artigo 2.°, n.° 1,alíneas a) e b), e 8.°, n.° 1]

    2.        Recursos próprios das Comunidades Europeias – Apuramento e colocação à disposição pelos Estados‑Membros

    (Regulamento n.° 1150/2000 do Conselho, artigo 17.°, n.° 2)

    3.        Recursos próprios das Comunidades Europeias – Apuramento e colocação à disposição pelos Estados‑Membros

    (Regulamento n.° 1150/2000 do Conselho, artigo 17.°, n.° 2; Decisão 2000/597 do Conselho, artigos 2.° e 8.°)

    4.        Recursos próprios das Comunidades Europeias – Apuramento e colocação à disposição pelos Estados‑Membros

    [Regulamento n.° 1150/2000 do Conselho, artigo 6.°, n.° 3, alíneas a) e b), e 17.°, n.° 2)

    1.        Os recursos próprios da União a que se refere o artigo 2.°, n.° 1, alíneas a) e b), da Decisão 2000/597 relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias, são, nos termos do artigo 8.°, n.° 1, da dita decisão, cobrados pelos Estados‑Membros e estes têm a obrigação de pôr esses recursos à disposição da Comissão. Por força do artigo 17.°, n.os 1 e 2, do Regulamento n.° 1150/2000, relativo à aplicação da Decisão 94/728/CE, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades, os Estados‑Membros são obrigados a tomar todas as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos apurados em conformidade com o artigo 2.° do mesmo regulamento sejam postos à disposição da Comissão. Os Estados‑Membros só estão dispensados dessa obrigação se a cobrança não pôde ser feita por razões de força maior ou quando se verifique que é definitivamente impossível proceder à cobrança por razões que lhes não podem ser imputadas.

    A este respeito, a actuação de qualquer órgão do Estado é, em princípio, atribuível a este. Um órgão compreende qualquer pessoa ou entidade que tem esse estatuto à luz do direito interno do Estado em causa. O facto de, pela sua actuação, tal pessoa ou entidade, habilitada ao exercício de prerrogativas de autoridade pública e actuando nessa qualidade, infringir a lei, exorbitar das suas competências ou contrariar as instruções dos seus superiores hierárquicos não é de molde a infirmar esta conclusão.

    (cf. n.os 34‑35, 39)

    2.        O conceito de força maior na acepção do artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, relativo à aplicação da Decisão 94/728/CE, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades, deve ser entendido no sentido de circunstâncias alheias a quem o invoca, anormais e imprevisíveis, cujas consequências não poderiam ter sido evitadas, apesar de todas as diligências desenvolvidas. Um dos elementos constitutivos do conceito de força maior é a verificação de um acontecimento alheio à pessoa que o invoca, isto é, a ocorrência de um facto que se produz externamente à esfera de intervenção dessa pessoa.

    O comportamento dos funcionários aduaneiros que, no exercício das suas funções, emitem autorizações ilegais não pode ser considerado alheio à Administração a que pertencem. Além disso, não está demonstrado que as consequências do referido comportamento, imputável ao Estado‑Membro, não poderiam ter sido evitadas, não obstante a diligência de que este Estado‑Membro fez prova. Por conseguinte, não pode este Estado‑Membro alegar a força maior para poder ser dispensado da obrigação de pôr à disposição da Comissão recursos próprios da União.

    (cf. n.os 42, 46‑47, 49)

    3.        Embora um erro cometido pelas autoridades aduaneiras de um Estado‑Membro tenha por efeito a não cobrança dos recursos próprios da União, esse erro não pode pôr em causa a obrigação do Estado‑Membro em causa de pagar os direitos que foram apurados e os juros de mora.

    Nestas condições, um Estado‑Membro que não proceda ao apuramento do direito da União sobre os recursos próprios e que não ponha o montante correspondente à disposição da Comissão, sem que esteja preenchida uma das condições previstas no artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, relativo à aplicação da Decisão 94/728/CE, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades, não cumpre as suas obrigações decorrentes do direito da União, designadamente dos artigos 2.° e 8.° da Decisão 2000/597, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias.

    (cf. n.os 50‑51)

    4.        A possibilidade de os Estados‑Membros se eximirem à sua obrigação de pôr à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos apurados exige não só o cumprimento dos requisitos enunciados no artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, relativo à aplicação da Decisão 94/728/CE, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades, alterado, mas também que os referidos direitos tenham sido regularmente inscritos na contabilidade B.

    Com efeito, o artigo 6.°, n.° 1, do dito regulamento prevê que os Estados‑Membros devem manter uma contabilidade dos recursos próprios junto do Tesouro ou do organismo que designarem. Em aplicação do n.° 3, alíneas a) e b), do mesmo artigo, os Estados‑Membros são obrigados a lançar na contabilidade A os direitos apurados nos termos do artigo 2.° deste regulamento, o mais tardar, no primeiro dia útil depois do dia 19 do segundo mês a seguir àquele em que o direito foi apurado, sem prejuízo da faculdade de inscrever na contabilidade B, no mesmo prazo, os direitos apurados «ainda não cobrados» e para os quais não tenha «sido fornecida qualquer caução», bem como os direitos apurados e «cobertos por garantias, que sejam objecto de contestação e possam vir a sofrer variações na sequência de eventuais diferendos».

    A inscrição dos recursos próprios na contabilidade B traduz, assim, uma situação excepcional caracterizada pelo facto de permitir aos Estados‑Membros, quer não pôr esses direitos à disposição da Comissão a partir do seu apuramento, porque ainda não foram cobrados, nos termos do artigo 6.°, n.° 3, alínea b), do Regulamento n.° 1150/2000, quer dispensá‑los de o fazer se os referidos direitos se revelarem incobráveis por razões de força maior ou por outras razões que não lhes sejam imputáveis, com base no artigo 17.°, n.° 2, deste regulamento.

    Nestas condições, a fim de poder beneficiar dessa situação excepcional, é necessário que a inscrição dos direitos apurados, na contabilidade B, tenha sido efectuada pelos Estados‑Membros, com observância do direito da União.

    (cf. n.os 65‑66, 68‑69)







    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

    8 de Julho de 2010 (*)

    «Incumprimento de Estado – Recursos próprios da União – Recusa de pôr à disposição da União recursos próprios correspondentes a certas autorizações aduaneiras ilegais – Força maior – Comportamento fraudulento das autoridades aduaneiras – Responsabilidade dos Estados‑Membros – Regularidade da inscrição dos direitos apurados na contabilidade separada»

    No processo C‑334/08,

    que tem por objecto uma acção por incumprimento nos termos do artigo 226.° CE, entrada em 18 de Julho de 2008,

    Comissão Europeia, representada por A. Aresu e A. Caeiros, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    demandante,

    contra

    República Italiana, representada por I. Bruni, na qualidade de agente, assistida por G. Albenzio, avvocato dello Stato, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    demandada,

    apoiada por:

    República Federal da Alemanha, representada por M. Lumma e B. Klein, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    interveniente,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

    composto por: J. N. Cunha Rodrigues (relator), presidente de secção, A. Rosas, U. Lõhmus, A. Ó Caoimh e A. Arabadjiev, juízes,

    advogada‑geral: J. Kokott,

    secretário: N. Nanchev, administrador,

    vistos os autos e após a audiência de 17 de Dezembro de 2009,

    ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 15 de Abril de 2010,

    profere o presente

    Acórdão

    1        Na sua petição, a Comissão das Comunidades Europeias pede ao Tribunal de Justiça que declare que a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 10.° CE, do artigo 8.° da Decisão 2000/597/CE, Euratom do Conselho, de 29 de Setembro de 2000, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias (JO L 253, p. 42), e dos artigos 2.°, 6.°, 10.°, 11.° e 17.° do Regulamento (CE, Euratom) n.° 1150/2000 do Conselho, de 22 de Maio de 2000, relativo à aplicação da Decisão 94/728/CE, Euratom, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades (JO L 130, p. 1), ao recusar pôr à disposição da Comissão os recursos próprios correspondentes à dívida aduaneira que se constituiu na sequência da emissão irregular, a partir de 27 de Fevereiro de 1997, pela Direzione Compartimentale delle Dogane per le Regioni Puglia e Basilicata (Direcção Regional das Alfândegas para as Regiões da Apúlia e da Basilicata), sita em Bari, de autorizações para criar e gerir, em Taranto, entrepostos aduaneiros de tipo C, e, posteriormente, das consecutivas autorizações para transformação sob controlo aduaneiro e para aperfeiçoamento activo, até à sua revogação em 4 de Dezembro de 2002.

     Quadro jurídico

    2        Em matéria de recursos próprios da União, a Decisão 94/728/CE, Euratom do Conselho, de 31 de Outubro de 1994, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias (JO L 293, p. 9), foi revogada e substituída, com efeitos a 1 de Janeiro de 2002, pela Decisão 2000/597.

    3        Nos termos do artigo 2.°, n.° 1, da Decisão 2000/597:

    «1.      Constituem recursos próprios inscritos no orçamento da União Europeia as receitas provenientes:

    b)      Dos direitos da pauta aduaneira comum e dos outros direitos estabelecidos ou a estabelecer pelas instituições das Comunidades sobre as trocas comerciais com países não membros […]

    […]»

    4        O artigo 8.°, n.° 1, da Decisão 2000/597 dispõe:

    «Os recursos próprios das Comunidades a que se refere o n.° 1, alíneas a) e b), do artigo 2.° serão cobrados pelos Estados‑Membros nos termos das disposições legislativas, regulamentares e administrativas nacionais que, se necessário, serão adaptadas às exigências da regulamentação comunitária.

    A Comissão procederá, a intervalos regulares, a uma análise das disposições nacionais que lhe tenham sido comunicadas pelos Estados‑Membros, informará os Estados‑Membros das adaptações que considere necessárias para garantir a respectiva conformidade com a regulamentação comunitária e apresentará um relatório à autoridade orçamental.

    Os Estados‑Membros colocarão à disposição da Comissão os recursos previstos no n.° 1, alíneas a) a d), do artigo 2.°»

    5        O artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1150/2000, que figura sob o título I deste, que tem por epígrafe «Disposições gerais», estabelece:

    «Para efeitos da aplicação do presente regulamento, um direito das Comunidades sobre os recursos próprios referidos no n.° 1, alíneas a) e b), do artigo 2.° da Decisão 94/728/CE, Euratom considera‑se apurado assim que se encontrem preenchidas as condições previstas na regulamentação aduaneira no que se refere ao registo de liquidação do montante do direito e à sua comunicação ao devedor.»

    6        O artigo 6.°, n.os 1 a 3, alíneas a) e b), do Regulamento n.° 1550/2000, que figura sob o título II deste, que tem por epígrafe «Contabilização dos recursos próprios», prevê:

    «1.      Será mantida pelo Tesouro de cada Estado‑Membro ou pelo organismo designado por cada Estado‑Membro uma contabilidade dos recursos próprios, discriminada segundo a natureza desses recursos.

    2.      Para efeitos da contabilidade dos recursos próprios, o mês contabilístico só pode ser encerrado a partir das 13 horas do último dia útil do mês do apuramento.

    3.      a)     Sem prejuízo do disposto na alínea b) do presente número, os direitos apurados nos termos do artigo 2.° serão lançados na contabilidade [correntemente designada ‘contabilidade A’] o mais tardar no primeiro dia útil seguinte ao dia 19 do segundo mês após aquele em que o direito tiver sido apurado;

             b)     Os direitos apurados e não inscritos na contabilidade referida na alínea a) por ainda não terem sido cobrados, nem ter sido fornecida qualquer caução, serão lançados numa contabilidade separada [correntemente designada ‘contabilidade B’], no prazo previsto na alínea a). Os Estados‑Membros podem proceder do mesmo modo [n]os casos em que os direitos apurados e cobertos por garantias sejam objecto de contestação e possam vir a sofrer variações na sequência de eventuais diferendos.»

    7        O artigo 9.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1150/2000, que figura sob o título III deste, que tem por epígrafe «Colocação à disposição dos recursos próprios», dispõe:

    «Segundo as regras definidas no artigo 10.°, cada Estado‑Membro inscreverá os recursos próprios a crédito da conta aberta para o efeito em nome da Comissão junto do Tesouro ou do organismo por ele designado. […]»

    8        Nos termos do artigo 10.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1150/2000, sob o mesmo título III:

    «Após dedução de 10% a título de despesas de cobrança nos termos do n.° 3 do artigo 2.° da Decisão 94/728/CE, Euratom, o lançamento dos recursos próprios referidos no n.° 1, alíneas a) e b), do artigo 2.° dessa decisão efectuar‑se‑á o mais tardar no primeiro dia útil seguinte ao dia 19 do segundo mês após aquele em que o direito tiver sido apurado nos termos do artigo 2.° do presente regulamento.

    Todavia, em relação aos direitos lançados na contabilidade [B], nos termos do n.° 3, alínea b), do artigo 6.°, o lançamento deve ser efectuado o mais tardar no primeiro dia útil seguinte ao dia 19 do segundo mês seguinte ao da cobrança dos direitos.»

    9        O artigo 11.° do Regulamento n.° 1150/2000 enuncia:

    «Qualquer atraso nos lançamentos na conta referida no n.° 1 do artigo 9.° implicará o pagamento, pelo Estado‑Membro em causa, de um juro a uma taxa igual à taxa de juro aplicada, na data do vencimento, no mercado monetário desse Estado‑Membro, aos financiamentos a curto prazo, acrescida de dois pontos. Essa taxa aumentará 0,25 pontos por cada mês de atraso. A taxa assim aumentada aplicar‑se‑á durante todo o período de atraso.»

    10      O artigo 17.°, n.os 1 e 2, do Regulamento n.° 1150/2000, que figura sob o título VII deste, que tem por epígrafe «Disposições relativas ao controlo», prevê:

    «1.      Os Estados‑Membros devem tomar todas as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos apurados nos termos do artigo 2.° sejam colocados à disposição da Comissão nas condições fixadas pelo presente regulamento.

    2.      Os Estados‑Membros só serão dispensados de colocar à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos apurados se não tiver sido possível efectuar a respectiva cobrança por motivos de força maior. Por outro lado, em casos específicos, os Estados‑Membros podem não colocar esses montantes à disposição da Comissão quando, após análise aprofundada de todos os dados relevantes do caso em questão, se verificar que lhes é absolutamente impossível proceder à cobrança por motivos alheios à sua vontade. Tais casos devem ser mencionados [n]o relatório previsto no n.° 3, desde que os respectivos montantes ultrapassem 10 000 euros, convertidos em moeda, nacional ao câmbio do primeiro dia útil do mês de Outubro do ano civil anterior; esse relatório deve incluir a indicação dos motivos que impediram o Estado‑Membro de colocar à disposição os montantes em causa. A Comissão disporá de um prazo de seis meses para, se for caso disso, comunicar as suas observações do Estado‑Membro em causa.»

    11      O Regulamento n.° 1150/2000 foi alterado pelo Regulamento (CE, Euratom) n.° 2028/2004 do Conselho, de 16 de Novembro de 2004 (JO L 352, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 1150/2000, alterado»), que entrou em vigor em 28 de Novembro de 2004.

    12      O artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, alterado, prevê:

    «Os Estados‑Membros serão dispensados de pôr à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos apurados que se verifique serem incobráveis:

    a)      Por razões de força maior; ou

    b)      Por outras razões que não lhes sejam imputáveis.

    Os montantes de direitos apurados serão declarados incobráveis por decisão da autoridade administrativa competente que verifica a impossibilidade de cobrança.

    Os montantes de direitos apurados serão considerados incobráveis o mais tardar após um período de cinco anos a contar da data em que o montante foi apurado nos termos do artigo 2.° ou, em caso de recurso administrativo ou judicial, da data da decisão definitiva, da sua notificação ou da sua publicação.

    Em caso de pagamento escalonado, o período máximo de cinco anos correrá a partir do último pagamento efectivo, na medida em que este não tenha saldado a dívida.

    Os montantes declarados ou considerados incobráveis serão retirados definitivamente da contabilidade [B] referida no n.° 3, alínea b), do artigo 6.° Serão mencionados em anexo ao extracto trimestral referido na alínea b) do n.° 4 do mesmo artigo bem como, se for caso disso, no extracto trimestral referido no n.° 5 desse artigo.»

     Procedimento pré‑contencioso

    13      Na sequência de uma queixa relativa a irregularidades aduaneiras presumidamente cometidas na circunscrição aduaneira de Taranto (Itália), a Comissão, por ofício de 27 de Outubro de 2003, solicitou às autoridades italianas esclarecimentos a esse propósito.

    14      Na sua resposta, estas autoridades transmitiram à Comissão um relatório de auditoria interna, de 18 de Fevereiro de 2003, do qual resultava que:

    –        em 27 de Fevereiro e 7 de Abril de 1997, as autoridades aduaneiras italianas competentes tinham concedido, designadamente à Fonderie SpA (a seguir «Fonderie»), uma série de autorizações para a criação de dois entrepostos aduaneiros privados de tipo C e a transformação de blocos de alumínio que aí se encontravam, os quais estão abrangidos pela posição pautal aduaneira 7601, à qual corresponde um direito aduaneiro de 6%, em resíduos de alumínio, que estão abrangidos pela posição pautal 7602, à qual corresponde uma isenção de direitos, utilizando o processo de transformação sob controlo aduaneiro;

    –        as autorizações em causa tinham sido emitidas em violação da legislação aduaneira comunitária e tiveram por consequência o não apuramento e a não cobrança de recursos próprios comunitários, no período compreendido entre 1997 e 2002, estimando‑se a dívida aduaneira em, aproximadamente, 46,6 biliões de liras italianas;

    –        após reclamação apresentada por uma sociedade do mesmo sector, as autoridades aduaneiras competentes revogaram as autorizações em questão, em 4 de Dezembro de 2002, e apuraram os direitos das Comunidades sobre os recursos próprios em causa;

    –        além das referidas sociedades, também alguns funcionários da alfândega italiana foram considerados responsáveis pelo montante da dívida aduaneira e pela emissão das autorizações ilícitas, tendo‑lhes sido movido procedimento criminal por «contrabando agravado» e «falsificação de documentos públicos».

    15      Por ofício de 30 de Setembro de 2005, as autoridades italianas comunicaram informações complementares à Comissão, das quais resultava que o montante total das receitas comunitárias desviadas se elevava a 22 730 818,35 euros e que este tinha sido inscrito, no decorrer dos meses de Março, Junho e Julho de 2003, na contabilidade B, em aplicação do artigo 6.°, n.° 3, alínea b), do Regulamento n.° 1150/2000.

    16      Após troca de correspondência entre as autoridades italianas e a Comissão, esta, em 23 de Março de 2007, dirigiu à República Italiana uma notificação para cumprir, convidando este Estado‑Membro a pôr à sua disposição, o mais rapidamente possível, o montante de 22 730 818,35 euros, correspondente aos recursos próprios que ele tinha apurado, e a inscrever esse montante no anexo do extracto mensal da contabilidade A, visado no artigo 6.°, n.° 3, alínea a), do Regulamento n.° 1150/2000.

    17      As autoridades italianas responderam por ofício de 7 de Maio de 2007, no qual exprimiam o seu desacordo com a posição adoptada pela Comissão. Em especial, as autoridades italianas sustentavam que, no caso concreto, se tratava, não de um «erro» ou de uma «negligência» das autoridades mas de efeitos lesivos de comportamentos intencionais de outrem, de natureza fraudulenta, que não podiam ser imputados ao Estado.

    18      Em 23 de Outubro de 2007, a Comissão dirigiu à República Italiana um parecer fundamentado, pedindo‑lhe que tomasse as medidas necessárias, no prazo de dois meses após a recepção do referido parecer, no sentido de transferir para a Comissão o montante de 22 730 818,35 euros a título de receitas próprias das Comunidades. Em 24 de Dezembro de 2007, as autoridades italianas responderam ao parecer fundamentado, reiterando as objecções referentes às acusações da Comissão.

    19      Nestas condições, a Comissão decidiu intentar a presente acção.

    20      Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 3 de Dezembro de 2008, foi admitida a intervenção da República Federal da Alemanha em apoio dos pedidos da República Italiana.

     Quanto à acção

     Quanto à acusação relativa à violação do artigo 8.° da Decisão 2000/597 e dos artigos 2.°, 6.°, 10.°, 11.° e 17.° do Regulamento n.° 1150/2000


     Argumentação das partes

    21      A Comissão, embora constate que as autoridades aduaneiras italianas entendem que quer a emissão irregular das autorizações quer o funcionamento dos regimes aduaneiros em causa constituem uma consequência da fraude organizada pelos funcionários nacionais, sustenta que o Estado italiano não pode declinar qualquer responsabilidade no que respeita às consequências dos actos administrativos praticados em seu nome. Assim, sem aguardar o resultado do procedimento criminal nem o termo do procedimento de cobrança junto dos devedores, o Estado italiano deve assumir as consequências financeiras das actuações dos seus próprios órgãos administrativos. É, por conseguinte, secundário saber se a irregularidade era imputável à Administração italiana, devido a erro ou fraude cometida por membros do seu pessoal, a uma falha de fiscalização adequada, ou ainda a uma prática irregular sistemática.

    22      A Comissão alega que, no contexto do sistema dos recursos próprios comunitários e tendo em conta o princípio da cooperação leal, é inadmissível que o Estado‑Membro fique isento de responsabilidade pelo montante da dívida aduaneira que se constituiu directamente em razão das acções cometidas pela sua própria Administração. Daí decorre que, no caso presente, não pode caber à Comunidade suportar o risco financeiro ligado às acções de cobrança a posteriori junto dos devedores.

    23      A República Italiana observa que os factos na origem deste processo estão incontestavelmente ligados a infracções passíveis de sanção penal. Uma vez que, no âmbito da responsabilidade penal, esta tem uma dimensão subjectiva, os factos em causa não podem, em caso algum, ser imputados à Administração a que pertencem os funcionários corruptos.

    24      A República Italiana lembra que, por força do artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, os Estados‑Membros não estão obrigados a pôr à disposição da Comissão os montantes cuja cobrança não pôde ser feita por motivos de força maior. Segundo este Estado‑Membro, os elementos que caracterizam a força maior encontram‑se reunidos quando o sujeito posto em causa fez o que estava normalmente em seu poder e, por razões independentes da sua vontade, ligadas a comportamentos dolosos e fraudulentos externos, não pôde impedir que fosse cometido um acto repreensível. Os comportamentos ilícitos dos funcionários constituem um acontecimento exterior à actuação da Administração e ao dever de fiscalização e de controlo a que ela estava obrigada. Não pode, por conseguinte, ser imputado ao Estado italiano uma responsabilidade objectiva pelo pagamento dos recursos comunitários, tendo em conta a propositura de acções nos órgãos jurisdicionais penais e civis contra os responsáveis dessas actuações e a diligência manifestada durante as fases de controlo e de repressão dessas actuações.

    25      A Comissão esclarece, na réplica, que se a força maior constitui, com efeito, uma circunstância que isenta de qualquer responsabilidade, é porque decorre de um acontecimento exterior ao organismo no âmbito do qual se produziu o acto lesivo a cujo efeito perverso este organismo está sujeito. No caso presente, ao invés, o acto doloso dos funcionários ocorreu no seio da própria Administração à qual é imputada a actividade dos agentes em questão. Por conseguinte, trata‑se, não de um caso de força maior mas da actuação ilegal de uma Administração nacional, directamente imputável à República Italiana.

    26      Este Estado‑Membro contrapõe que, quando um funcionário actua movido pelos seus interesses próprios e ilícitos, desinteressando‑se completamente da função institucional que detém, coloca‑se à margem do aparelho administrativo a que pertence. Se assim não fosse, qualquer comportamento, mesmo fraudulento, imputado a um funcionário nacional, deveria desencadear a responsabilidade da Administração, no caso vertente, do Estado‑Membro a que, abstractamente, o autor desse comportamento está vinculado.

    27      Na sua intervenção, a República Federal da Alemanha sustenta que a Comissão não podia, no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, reclamar a colocação à disposição dos recursos próprios, porque, nessa data, não existia o incumprimento imputado ao Estado‑Membro em causa.

    28      A República Federal da Alemanha refere, em primeiro lugar, que as autoridades italianas tinham acertadamente inscrito os recursos próprios em causa na contabilidade B, e não na contabilidade A, dado tratar‑se de direitos apurados que ainda não tinham sido cobrados, e que não tinha sido prestada nenhuma garantia. Por conseguinte, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que não havia a obrigação de transferir os montantes apurados da contabilidade B para a contabilidade A.

    29      Além disso, a República Federal da Alemanha lembra que resulta das disposições conjugadas dos artigos 6.°, n.° 3, alínea b), e 10.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1150/2000, alterado, enquanto princípio, que o dever de colocação à disposição dos direitos lançados na contabilidade B pressupõe a cobrança prévia dos montantes por cada Estado‑Membro.

    30      Este princípio só a título excepcional pode ser derrogado, com base no artigo 17.°, n.os 2 a 4, do Regulamento n.° 1150/2000, alterado. A República Federal da Alemanha acrescenta que estas disposições do Regulamento n.° 1150/2000, alterado, prevêem os requisitos de exoneração dos Estados‑Membros da sua obrigação de porem à disposição da Comunidade os recursos próprios inscritos na contabilidade B, entre os quais figura o requisito relativo à exigência de que os montantes se afigurem incobráveis. Segundo o Governo alemão, se este requisito não estiver preenchido, isto é, se os montantes que as autoridades nacionais declararam incobráveis pudessem, na realidade, ser cobrados, os Estados‑Membros estariam então sujeitos, excepcionalmente, à obrigação de pôr à disposição da Comissão os recursos próprios, mesmo antes da sua cobrança.

    31      Ora, no caso presente, as autoridades nacionais não declararam que os montantes em causa eram incobráveis, nem os incluíram na categoria de montantes reputados incobráveis. Nestas condições, seria necessário aguardar o termo do prazo de cinco anos, previsto no artigo 17.°, n.° 2, terceiro parágrafo, do Regulamento n.° 1150/2000, alterado, que corre desde a inscrição dos recursos na contabilidade B, para que a Comissão pudesse impor à República Italiana o pagamento dos referidos recursos. Dado que esse prazo não terminava antes de Julho de 2008, há que concluir que, no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, a saber, em finais de Dezembro de 2007, esse Estado‑Membro não tinha faltado ao cumprimento das suas obrigações.

    32      Na resposta, a Comissão objecta que, por força do artigo 40.°, quarto parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 93.°, n.° 4, do Regulamento de Processo deste, está vedado ao interveniente desenvolver, na intervenção, fundamentos que alterem ou deformem o quadro do litígio, tal como definido na petição inicial. A argumentação do Governo alemão relativamente ao Regulamento n.° 1150/2000, alterado, deve, assim, ser declarada inadmissível, uma vez que exorbita do quadro jurídico definido pelas partes e que não é pertinente, tendo em conta as observações formuladas pelas autoridades italianas.

    33      A referida argumentação é, de qualquer modo, infundada, uma vez que, por um lado, o processo especial previsto no artigo 17.°, n.os 2 a 4, do Regulamento n.° 1150/2000, alterado, é inoperante no seu conjunto e, por outro, não é aplicável o prazo de cinco anos nele previsto. No entendimento da Comissão, este processo apenas se pode aplicar aos recursos que figuram legitimamente na contabilidade B, que não podem, assim, ser postos à disposição das Comunidades, devido ao seu carácter incobrável. No caso presente, ao invés, os montantes em causa foram inscritos na contabilidade B, devido a um erro cometido pelas autoridades italianas, que os deveriam ter inscrito na contabilidade A, no momento da importação – e do desalfandegamento consecutivo – das mercadorias a que se referiam as autorizações emitidas ilegalmente por essas mesmas autoridades.

     Apreciação do Tribunal de Justiça

    34      Como resulta do artigo 8.°, n.° 1, da Decisão 2000/597, os recursos próprios da União a que se refere o artigo 2.°, n.° 1, alíneas a) e b), da dita decisão são cobrados pelos Estados‑Membros e estes têm a obrigação de pôr esses recursos à disposição da Comissão.

    35      Por força do artigo 17.°, n.os 1 e 2, do Regulamento n.° 1150/2000, os Estados‑Membros são obrigados a tomar todas as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos apurados em conformidade com o artigo 2.° do mesmo regulamento sejam postos à disposição da Comissão. Os Estados‑Membros só estão dispensados dessa obrigação se a cobrança não pôde ser feita por razões de força maior ou quando se verifique que é definitivamente impossível proceder à cobrança por razões que lhes não podem ser imputadas (v., neste sentido, acórdão de 15 de Novembro de 2005, Comissão/Dinamarca, C‑392/02, Colect., p. I‑9811, n.° 66).

    36      No caso presente, nem a existência de uma dívida aduaneira nem o montante dos recursos próprios são contestados, sendo este montante, de resto, apurado pelas autoridades italianas.

    37      A República Italiana alega que a não cobrança dos recursos próprios se deve, não a erros administrativos imputáveis às autoridades nacionais mas a comportamentos fraudulentos de funcionários aduaneiros que agiram em concertação com os responsáveis da sociedade implicada. Esse comportamento apenas poderia quebrar o nexo de causalidade existente entre a Administração e o acto lesivo, permitindo, assim, o reconhecimento de uma situação de força maior, na acepção do artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000.

    38      Este argumento não pode ser acolhido.

    39      Antes de mais, importa salientar que a actuação de qualquer órgão do Estado é, em princípio, atribuível a este. Um órgão compreende qualquer pessoa ou entidade que tem esse estatuto à luz do direito interno do Estado em causa. O facto de, pela sua actuação, tal pessoa ou entidade, habilitada ao exercício de prerrogativas de autoridade pública e actuando nessa qualidade, infringir a lei, exorbitar das suas competências ou contrariar as instruções dos seus superiores hierárquicos não é de molde a infirmar esta conclusão.

    40      No caso vertente, resulta do relatório de auditoria interna de 18 de Fevereiro de 2003, transmitido pela Administração aduaneira italiana à Comissão, que, por decisões, respectivamente, de 27 de Fevereiro e 7 de Abril de 1997, as autoridades aduaneiras competentes concederam à Fonderie autorizações ilegais para a criação de dois entrepostos aduaneiros privados de tipo C e a transformação de blocos de alumínio, que aí se encontravam, em resíduos de alumínio, sujeitando, consequentemente, os produtos em causa a um regime de isenção de direitos aduaneiros, quando estes estavam normalmente sujeitos a tais direitos.

    41      Resulta igualmente do referido relatório que as ilegalidades supramencionadas tiveram por consequência o não apuramento dos direitos sobre os recursos próprios da União e a não cobrança destes entre 1997 e 2002.

    42      É pacífico que, no momento em que as autorizações ilegais foram emitidas pelos funcionários aduaneiros, estes se encontravam no exercício das suas funções.

    43      Estes actos, praticados pelos funcionários no exercício das suas funções, devem, assim, ser considerados praticados no âmbito da própria Administração.

    44      Nestes termos, afigura‑se que a actuação ilegal da Administração nacional deve ser atribuída à República Italiana.

    45      Seguidamente, põe‑se a questão de saber se este Estado pode validamente invocar as razões de força maior, na acepção do artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, a fim de ser dispensado da obrigação de pôr à disposição os montantes correspondentes aos direitos apurados.

    46      Segundo jurisprudência assente, o conceito de força maior deve ser entendido no sentido de circunstâncias alheias a quem o invoca, anormais e imprevisíveis, cujas consequências não poderiam ter sido evitadas, apesar de todas as diligências desenvolvidas (v., designadamente, acórdãos de 5 de Fevereiro de 1987, Denkavit België, 145/85, Colect., p. 565, n.° 11, e de 5 de Outubro de 2006, Comissão/Alemanha, C‑105/02, Colect., p. I‑9659, n.° 89, e Comissão/Bélgica, C‑377/03, Colect., p. I‑9733, n.° 95).

    47      Um dos elementos constitutivos do conceito de força maior é a verificação de um acontecimento alheio à pessoa que o invoca, isto é, a ocorrência de um facto que se produz externamente à esfera de intervenção dessa pessoa.

    48      Por outro lado, como a advogada‑geral realçou no n.° 31 das suas conclusões, a República Italiana não pode, para tentar exonerar‑se de qualquer responsabilidade, opor a existência da força maior, alegando que as irregularidades cometidas foram detectadas, não através dos controlos habituais mas apenas na sequência de uma queixa apresentada por uma empresa concorrente. Dado que a causa para a não cobrança dos direitos aduaneiros entra, no caso concreto, na esfera de responsabilidade da República Italiana, as medidas concretas que teriam sido ou não susceptíveis de prevenir as actuações em causa já não são pertinentes.

    49      As considerações enunciadas nos números anteriores indicam que o comportamento dos funcionários aduaneiros em causa no caso concreto não pode ser considerado alheio à Administração a que pertencem. Além disso, não está demonstrado que as consequências do referido comportamento, imputável à República Italiana, não poderiam ter sido evitadas, não obstante a diligência de que este Estado‑Membro fez prova. Por conseguinte, não pode este Estado‑Membro alegar a força maior para poder ser dispensado da obrigação de pôr à disposição da Comissão recursos próprios da União.

    50      Por fim, relativamente à obrigação da República Italiana de pôr à disposição da Comissão o montante correspondente aos direitos apurados, importa lembrar que, de acordo com jurisprudência assente, embora um erro cometido pelas autoridades aduaneiras de um Estado‑Membro tenha por efeito a não cobrança dos recursos próprios da União, esse erro não pode pôr em causa a obrigação do Estado‑Membro em causa de pagar os direitos que foram apurados e os juros de mora (v., neste sentido, acórdão Comissão/Dinamarca, já referido, n.° 63, e acórdão de 19 de Março de 2009, Comissão/Itália, C‑275/07, Colect., p. I‑2005, n.° 100).

    51      Nestas condições, um Estado‑Membro que não proceda ao apuramento do direito da União sobre os recursos próprios e que não ponha o montante correspondente à disposição da Comissão, sem que esteja preenchida uma das condições previstas no artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, não cumpre as suas obrigações decorrentes do direito comunitário, designadamente dos artigos 2.° e 8.° da Decisão 2000/597 (v., neste sentido, acórdão de 18 de Outubro de 2007, Comissão/Dinamarca, C‑19/05, Colect., p. I‑8597, n.° 32).

    52      No que toca, por outro lado, à intervenção da República Federal da Alemanha em apoio dos pedidos da República Italiana, importa fazer as seguintes observações.

    53      Nos termos do artigo 40.°, quarto parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, as conclusões do pedido de intervenção devem limitar‑se a sustentar as conclusões de uma das partes.

    54      Também o artigo 93.°, n.° 5, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça dispõe, designadamente, que a intervenção contém os fundamentos e argumentos invocados pelo interveniente.

    55      Concluindo, à semelhança da República Italiana, pela negação de provimento do recurso da Comissão, a República Federal da Alemanha apresenta, na sua intervenção, um fundamento de defesa complementar relativamente àqueles que o referido Estado‑Membro apresentou para fundamentar a sua argumentação. Consequentemente, ao agir desse modo, a República Federal da Alemanha não violou as disposições acima referidas do Estatuto e do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça (v., neste sentido, acórdãos de 23 de Fevereiro de 1961, De Gezamenlijke Steenkolenmijnen in Limburg/Alta Autoridade, 30/59, Colect. 1954‑1961, p. 551, e de 15 de Julho de 2004, Espanha/Comissão, C‑501/00, Colect., p. I‑6717, n.os 131 a 157).

    56      O articulado de intervenção da República Federal da Alemanha deve, assim, ser apreciado pelo Tribunal de Justiça.

    57      O fundamento invocado pela República Federal da Alemanha, relativo à inexistência do incumprimento censurado à República Italiana no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, assenta na premissa de que as modificações introduzidas pelo Regulamento n.° 2028/2004 em relação ao Regulamento n.° 1150/2000, designadamente o artigo 17.°, n.° 2, deste, são aplicáveis no caso presente.

    58      Com efeito, a República Federal da Alemanha sustenta que, uma vez que as autoridades italianas não tinham declarado que os montantes em causa eram incobráveis e também não os tinham considerado como tal, seria necessário aguardar o termo do prazo de cinco anos, previsto no artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, alterado, que corre a partir da inscrição dos direitos apurados na contabilidade B – isto é, a contar dos meses de Março, Junho e Julho de 2003 –, para que a Comissão pudesse impor ao Governo italiano o pagamento dos referidos direitos. Não tendo esse prazo terminado antes de Julho de 2008, afigura‑se que a República Italiana não violou as suas obrigações no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, a saber, finais de Dezembro de 2007.

    59      A este propósito, importa lembrar que a presente acção por incumprimento visa obter a declaração de que a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União, por se ter recusado a pôr à disposição da Comissão recursos próprios da União resultantes de importações efectuadas entre o ano de 1997 e o ano de 2002, e cujos direitos apurados foram inscritos por esse Estado‑Membro na contabilidade B, no decurso dos meses de Março, Junho e Julho de 2003, quando o Regulamento n.° 2028/2004 só entrou em vigor em 28 de Novembro de 2004.

    60      Segundo jurisprudência assente, as regras processuais aplicam‑se, em geral, a todos os litígios pendentes no momento em que as mesmas entram em vigor, o que não acontece com as normas substantivas, que são habitualmente interpretadas no sentido de apenas se aplicarem a situações estabelecidas anteriormente à sua entrada em vigor (v., designadamente, acórdãos de 12 de Novembro de 1981, Meridionale Industria Salumi e o., 212/80 a 217/80, Recueil, p. 2735, n.° 9, e de 1 de Julho de 2004, Tsapalos e Diamantakis, C‑361/02 e C‑362/02, Colect., p. I‑6405, n.° 19).

    61      O artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, alterado, estabelece um novo procedimento que permite às autoridades administrativas dos Estados‑Membros declarar que determinados montantes de direitos apurados são incobráveis, ou considerar que os montantes de direitos apurados se presumem incobráveis, o mais tardar, após um período de cinco anos a contar da data em que o montante foi apurado. Esses montantes são definitivamente retirados da contabilidade B e, sem prejuízo da oposição da Comissão às razões invocadas pelos Estados‑Membros, baseadas na força maior ou noutras razões que não lhes sejam imputáveis, os Estados‑Membros ficam dispensados de pôr os referidos montantes à disposição dessa instituição.

    62      Com a alteração do artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, o legislador da União pretendeu criar um novo mecanismo processual, para obviar às insuficiências do antigo sistema de dupla contabilidade, ao prever que certos montantes de direitos apurados que não puderam ser cobrados deixem de figurar na contabilidade B, sem que os Estados‑Membros sejam obrigados a pô‑los à disposição da Comissão.

    63      Esse objectivo resulta, designadamente, do sexto considerando do Regulamento n.° 2028/2004, nos termos do qual «[o] sistema de dupla contabilidade, introduzido em 1989, tinha por objectivo estabelecer uma distinção a nível da cobrança efectiva dos direitos. Este sistema apenas respondeu parcialmente aos seus objectivos, quanto ao modo de apuramento da contabilidade [B]. Com efeito, os controlos do Tribunal de Contas Europeu e da Comissão detectaram anomalias recorrentes na contabilidade [B] que não permitem que esta contabilidade reflicta a realidade da situação em matéria de cobrança. Deverá, nomeadamente, expurgar‑se da contabilidade separada os montantes cuja cobrança se torna aleatória ao fim de um determinado período e cuja manutenção falseia o correspondente saldo.»

    64      Relativamente às disposições de natureza processual, há que aplicá‑las ao presente litígio, em conformidade com a jurisprudência recordada no n.° 60 do presente acórdão.

    65      Todavia, importa desde já realçar que a possibilidade de os Estados‑Membros se eximirem à sua obrigação de pôr à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos apurados exige não só o cumprimento dos requisitos enunciados no artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, alterado, mas também que os referidos direitos tenham sido regularmente inscritos na contabilidade B.

    66      Com efeito, o artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1150/2000 prevê que os Estados‑Membros devem manter uma contabilidade dos recursos próprios junto do Tesouro ou do organismo que designarem. Em aplicação do n.° 3, alíneas a) e b), do mesmo artigo, os Estados‑Membros são obrigados a lançar na contabilidade A os direitos apurados nos termos do artigo 2.° deste regulamento, o mais tardar, no primeiro dia útil depois do dia 19 do segundo mês a seguir àquele em que o direito foi apurado, sem prejuízo da faculdade de inscrever na contabilidade B, no mesmo prazo, os direitos apurados «ainda não cobrados» e para os quais não tenha «sido fornecida qualquer caução», bem como os direitos apurados e «cobertos por garantias, que sejam objecto de contestação e possam vir a sofrer variações na sequência de eventuais diferendos» (v., neste sentido, acórdão Comissão/Alemanha, já referido, n.° 74).

    67      Por outro lado, para efeitos de colocação à disposição dos recursos próprios, o artigo 9.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1550/2000 impõe que cada Estado‑Membro inscreva os recursos próprios a crédito da conta aberta para o efeito em nome da Comissão, segundo as regras definidas no artigo 10.° do mesmo regulamento. Em conformidade com o n.° 1 desta disposição, após dedução das despesas de cobrança, a inscrição dos recursos próprios efectuar‑se‑á, o mais tardar, no primeiro dia útil depois do dia 19 do segundo mês a seguir àquele em que o direito foi apurado nos termos do artigo 2.° do mesmo regulamento, com excepção dos direitos lançados na contabilidade B em aplicação do artigo 6.°, n.° 3, alínea b), deste regulamento, para os quais a inscrição deverá ser efectuada, o mais tardar, no primeiro dia útil depois do dia 19 do segundo mês a seguir ao da «cobrança» (v., neste sentido, acórdão Comissão/Alemanha, já referido, n.° 75).

    68      A inscrição dos recursos próprios na contabilidade B traduz, assim, uma situação excepcional caracterizada pelo facto de permitir aos Estados‑Membros, quer não pôr esses direitos à disposição da Comissão a partir do seu apuramento, porque ainda não foram cobrados, nos termos do artigo 6.°, n.° 3, alínea b), do Regulamento n.° 1150/2000, quer dispensá‑los de o fazer se os referidos direitos se revelarem incobráveis por razões de força maior ou por outras razões que não lhes sejam imputáveis, com base no artigo 17.°, n.° 2, deste regulamento.

    69      Nestas condições, a fim de poder beneficiar dessa situação excepcional, é necessário que a inscrição dos direitos apurados, na contabilidade B, tenha sido efectuada pelos Estados‑Membros, com observância do direito da União.

    70      No caso concreto, a falta de apuramento e de cobrança dos direitos sobre os recursos próprios da União decorrentes dos impostos sobre as importações feitas pela Fonderie entre o ano de 1997 e o ano 2002 tem origem no comportamento dos funcionários aduaneiros italianos, que, como o Tribunal de Justiça concluiu no n.° 44 do presente acórdão, deve ser imputada à República Italiana.

    71      Se o dito comportamento estivesse em conformidade com as obrigações impostas, designadamente, pelos artigos 2.°, n.os 1 e 2, e 6.°, n.° 3, alínea a), do Regulamento n.° 1150/2000, os direitos sobre os recursos próprios em causa teriam sido apurados a partir da realização das operações de importações e do consecutivo desalfandegamento e, assim, deveriam ter sido inscritos na contabilidade A, o mais tardar, no primeiro dia útil depois do dia 19 do segundo mês a seguir àquele em que foram apurados.

    72      Daí resulta que, como a advogada‑geral salientou no n.° 77 das suas conclusões, a República Italiana, por um lado, deve ser colocada, em relação ao período compreendido entre 1997 e 2002, numa situação equivalente à que lhe seria reservada se tivesse apurado os direitos e os tivesse inscrito na contabilidade A. Por outro lado, este Estado‑Membro não pode alegar que os requisitos para a inscrição na contabilidade B estão preenchidos, uma vez que, ao não apurar os direitos, ele próprio provocou a emergência dos requisitos de aplicação do artigo 6.°, n.° 3, alínea b), do Regulamento n.° 1150/2000.

    73      Tendo as autoridades italianas inscrito irregularmente os direitos sobre os recursos próprios na contabilidade B, não lhe são aplicáveis as disposições do artigo 17.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1150/2000, alterado.

    74      Assim, deve ser afastado o fundamento de defesa complementar suscitado pela República Federal da Alemanha.

     Quanto à acusação relativa à violação do artigo 10.° CE

    75      No que diz respeito ao artigo 10.° CE, igualmente invocado pela Comissão, basta referir que não há que declarar um incumprimento das obrigações gerais contidas nas disposições deste artigo, distinto do incumprimento declarado das obrigações mais específicas que incumbem à República Italiana por força do artigo 8.° da Decisão 2000/597 e dos artigos 2.°, 6.°, 10.°, 11.° e 17.° do Regulamento n.° 1150/2000 (v., neste sentido, acórdão de 18 de Outubro de 2007, Comissão/Dinamarca, já referido, n.° 36).

    76      Atento o que precede, é de declarar que, ao recusar pôr à disposição da Comissão os recursos próprios correspondentes à dívida aduaneira que se constituiu na sequência da emissão irregular, a partir de 27 de Fevereiro de 1997, pela Direzione Compartimentale delle Dogane per le Regioni Puglia e Basilicata, sita em Bari, de autorizações para criar e gerir, em Taranto, entrepostos aduaneiros de tipo C, e, posteriormente, das consecutivas autorizações para transformação sob controlo aduaneiro e para aperfeiçoamento activo, até à sua revogação em 4 de Dezembro de 2002, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 8.° da Decisão 2000/597 e dos artigos 2.°, 6.°, 10.°, 11.° e 17.° do Regulamento n.° 1150/2000.

     Quanto às despesas

    77      Por força do artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação da República Italiana e tendo esta sido vencida nos seus fundamentos, há que condená‑la nas despesas. Em conformidade com o disposto no n.° 4, primeiro parágrafo, do mesmo artigo, a República Federal da Alemanha suportará as suas próprias despesas.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

    1)      Ao recusar pôr à disposição da Comissão das Comunidades Europeias os recursos próprios correspondentes à dívida aduaneira que se constituiu na sequência da emissão irregular, a partir de 27 de Fevereiro de 1997, pela Direzione Compartimentale delle Dogane per le Regioni Puglia e Basilicata, sita em Bari, de autorizações para criar e gerir, em Taranto, entrepostos aduaneiros de tipo C, e, posteriormente, das consecutivas autorizações para transformação sob controlo aduaneiro e para aperfeiçoamento activo, até à sua revogação em 4 de Dezembro de 2002, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 8.° da Decisão 2000/597/CE, Euratom do Conselho, de 29 de Setembro de 2000, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias, e dos artigos 2.°, 6.°, 10.°, 11.° e 17.° do Regulamento (CE, Euratom) n.° 1150/2000 do Conselho, de 22 de Maio de 2000, relativo à aplicação da Decisão 94/728/CE, Euratom relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades.

    2)      A República Italiana é condenada nas despesas.

    3)      A República Federal da Alemanha suportará as suas próprias despesas.

    Assinaturas


    * Língua do processo: italiano.

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