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Document 62007CJ0139

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 29 de Junho de 2010.
Comissão Europeia contra Technische Glaswerke Ilmenau GmbH.
Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Acesso aos documentos das instituições - Regulamento (CE) n.º 1049/2001 - Documentos relativos a procedimentos de controlo dos auxílios de Estado - Excepção relativa à protecção dos objectivos das actividades de inquérito - Obrigação da instituição em causa de proceder a um exame concreto e individual do conteúdo dos documentos objecto do pedido de acesso.
Processo C-139/07 P.

Colectânea de Jurisprudência 2010 I-05885

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2010:376

Processo C‑139/07 P

Comissão Europeia

contra

Technische Glaswerke Ilmenau GmbH

«Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Acesso aos documentos das instituições – Regulamento (CE) n.° 1049/2001 – Documentos relativos a procedimentos de controlo dos auxílios de Estado – Excepção relativa à protecção dos objectivos das actividades de inquérito – Obrigação da instituição em causa de proceder a um exame concreto e individual do conteúdo dos documentos objecto do pedido de acesso»

Sumário do acórdão

Comunidades Europeias – Instituições – Direito de acesso do público aos documentos – Regulamento n.° 1049/2001 – Excepções ao direito de acesso aos documentos

(Artigo 255.° CE; Regulamento n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 7.°, n.° 2, terceiro travessão; Regulamento n.° 659/1999 do Conselho, artigo 20.°)

Para justificar a recusa de acesso a um documento cuja divulgação foi requerida, não basta, em princípio, que esse documento seja relativo a uma actividade mencionada no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão. A instituição em causa deve igualmente fornecer explicações quanto à questão de saber de que modo o acesso ao referido documento poderia prejudicar concreta e efectivamente o interesse protegido por uma excepção prevista neste artigo No entanto, a instituição comunitária em causa pode basear‑se, a este respeito, em presunções gerais aplicáveis a certas categorias de documentos, uma vez que considerações de ordem geral semelhantes podem aplicar‑se a pedidos de divulgação respeitantes a documentos da mesma natureza.

Relativamente aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado, tais presunções gerais podem resultar do Regulamento n.° 659/1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.°] do Tratado CE, e da jurisprudência relativa ao direito de consultar os documentos do processo administrativo da Comissão. Este regulamento, em especial o seu artigo 20.°, não prevê um direito de acesso aos documentos do processo administrativo da Comissão a favor dos interessados, com excepção do Estado‑Membro responsável pela concessão do auxílio Com efeito, se esses interessados pudessem ter acesso, com fundamento no Regulamento n.° 1049/2001, aos documentos do processo administrativo da Comissão, o regime de controlo dos auxílios de Estado poderia ser posto em causa.

Assim, para efeitos da interpretação da excepção prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, há que ter em conta a circunstância de que os interessados diferentes do Estado‑Membro em causa nos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado não dispõem do direito de consultar os documentos do processo administrativo da Comissão e, por conseguinte, reconhecer a existência de uma presunção geral segundo a qual a divulgação dos documentos do processo administrativo poderia, em princípio, pôr em causa a protecção dos objectivos das actividades de inquérito.

Esta presunção geral não exclui o direito de os referidos interessados demonstrarem que um dado documento cuja divulgação é requerida não está coberto por tal presunção ou que existe um interesse público superior que justifica a divulgação do documento em causa ao abrigo do artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001.

(cf. n.os 53‑56, 58, 61, 62)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

29 de Junho de 2010 (*)

«Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Acesso aos documentos das instituições – Regulamento (CE) n.° 1049/2001 – Documentos relativos a procedimentos de controlo dos auxílios de Estado – Excepção relativa à protecção dos objectivos das actividades de inquérito – Obrigação da instituição em causa de proceder a um exame concreto e individual do conteúdo dos documentos objecto do pedido de acesso»

No processo C‑139/07 P,

que tem por objecto um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância nos termos do artigo 56.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, interposto em 28 de Fevereiro de 2007,

Comissão Europeia, representada por V. Kreuschitz, P. Aalto e C. Docksey, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

Technische Glaswerke Ilmenau GmbH, com sede em Ilmenau (Alemanha), representada por C. Arhold e N. Wimmer, Rechtsanwälte,

recorrente em primeira instância,

apoiada por:

Reino da Dinamarca, representado por B. Weis Fogh, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

interveniente no presente recurso,

República da Finlândia, representada por J. Heliskoski, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

Reino da Suécia, representado por K. Wistrand, S. Johannesson e K. Petkovska, na qualidade de agentes,

intervenientes em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, A. Tizzano, J. N. Cunha Rodrigues, K. Lenaerts, R. Silva de Lapuerta e C. Toader, presidentes de secção, A. Rosas, K. Schiemann, E. Juhász, G. Arestis (relator) e T. von Danwitz, juízes,

advogada-geral: J. Kokott,

secretários: H. von Holstein, secretário adjunto, e B. Fülöp, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 16 de Junho de 2009,

ouvidas as conclusões da advogada-geral na audiência de 8 de Setembro de 2009,

profere o presente

Acórdão

1        Através do presente recurso, a Comissão das Comunidades Europeias pede a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 14 de Dezembro de 2006, Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão (T‑237/02, Colect., p. II‑5131, a seguir «acórdão recorrido»), com o qual este anulou a decisão da Comissão de 28 de Maio de 2002 (a seguir «decisão controvertida») na parte em que recusa o acesso a documentos relativos aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado concedidos à Technische Glaswerke Ilmenau GmbH (a seguir «TGI»).

 Quadro jurídico

2        O artigo 255.° CE assegura, a todos os cidadãos da União e a todas as pessoas singulares ou colectivas que residam ou tenham a sua sede social num Estado‑Membro, o direito de acesso aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho da União Europeia e da Comissão, sob reserva dos princípios e condições a definir pelo Conselho por razões de interesse público ou privado.

3        O Regulamento (CE) n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43), foi adoptado com fundamento no artigo 255.°, n.° 2, CE.

4        O quarto, sexto e décimo primeiro considerandos do referido regulamento têm a seguinte redacção:

«(4)      O presente regulamento destina-se a permitir o mais amplo efeito possível do direito de acesso do público aos documentos e a estabelecer os respectivos princípios gerais e limites, em conformidade com o disposto no n.° 2 do artigo 255.° do Tratado CE.

[…]

(6)      Deverá ser concedido maior acesso aos documentos nos casos em que as instituições ajam no exercício dos seus poderes legislativos, incluindo por delegação, embora simultaneamente, preservando a eficácia do processo decisório institucional. O acesso directo a estes documentos deverá ser tão amplo quanto possível.

[…]

(11)      Em princípio, todos os documentos das instituições deverão ser acessíveis ao público. No entanto, determinados interesses públicos e privados devem ser protegidos através de excepções. É igualmente necessário que as instituições possam proteger as suas consultas e deliberações internas, se tal for necessário para salvaguardar a sua capacidade de desempenharem as suas funções. […]»

5        Sob o título «Objectivo», o artigo 1.° do Regulamento n.° 1049/2001 enuncia, na sua alínea a), que este tem por objectivo «definir os princípios, as condições e os limites que, por razões de interesse público ou privado, regem o direito de acesso aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (adiante designados ‘instituições’), previsto no artigo 255.° do Tratado CE, de modo a que o acesso aos documentos seja o mais amplo possível».

6        Sob a epígrafe «Beneficiários e âmbito de aplicação», o artigo 2.° deste mesmo regulamento reconhece, no seu n.° 1, a todos os cidadãos da União e a todas as pessoas singulares ou colectivas que residam ou tenham a sua sede social num Estado‑Membro um direito de acesso aos documentos das instituições, «sob reserva dos princípios, condições e limites estabelecidos no presente regulamento». O n.° 3 deste mesmo artigo prevê que o regulamento se aplica a todos os documentos na posse de uma instituição, ou seja, aos documentos por ela elaborados ou recebidos que se encontrem na sua posse, «em todos os domínios de actividade da União Europeia».

7        Nos termos do artigo 3.°, alínea a), do Regulamento n.° 1049/2001, para efeitos deste, entende-se por «documento» «qualquer conteúdo, seja qual for o seu suporte (documento escrito em suporte papel ou electrónico, registo sonoro, visual ou audiovisual) sobre assuntos relativos às políticas, acções e decisões da competência da instituição».

8        Intitulado «Excepções», o artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001 prevê:

«[…]

2.      As instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a protecção de:

–      […]

–      processos judiciais e consultas jurídicas,

–      objectivos de actividades de inspecção, inquérito e auditoria,

excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

3.       O acesso a documentos, elaborados por uma instituição para uso interno ou por ela recebidos, relacionados com uma matéria sobre a qual a instituição não tenha decidido, será recusado, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

O acesso a documentos que contenham pareceres para uso interno, como parte de deliberações e de consultas preliminares na instituição em causa, será recusado mesmo após ter sido tomada a decisão, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

[…]

6.      Quando só algumas partes do documento pedido forem abrangidas por qualquer das excepções, as restantes partes do documento serão divulgadas.

7.       As excepções previstas nos n.os 1 a 3 só são aplicáveis durante o período em que a protecção se justifique com base no conteúdo do documento. […]»

9        O artigo 6.° do Regulamento n.° 1049/2001, intitulado «Pedidos», dispõe, no seu n.° 1, que «os pedidos de acesso a documentos devem ser apresentados […] de forma suficientemente precisa para que a instituição possa identificar os documentos» e que «o requerente não é obrigado a declarar as razões do pedido». O n.° 2 do referido artigo prevê que, «[s]e o pedido não for suficientemente preciso, a instituição solicitará ao requerente que o clarifique e prestar-lhe-á assistência para o efeito». O n.° 3 deste mesmo artigo dispõe que, «[n]o caso do pedido de um documento muito extenso ou de um elevado número de documentos, a instituição em causa poderá concertar-se informalmente com o requerente tendo em vista encontrar uma solução equitativa».

10      Por outro lado, o Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho, de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.°] do Tratado CE (JO L 83, p. 1), define os procedimentos aplicáveis ao exercício, pela Comissão, do poder que lhe é conferido pelo artigo 88.° CE para se pronunciar sobre a compatibilidade dos auxílios de Estado com o mercado comum.

11      Sob a epígrafe «Direitos das partes interessadas», o artigo 20.° do Regulamento n.° 659/1999 prevê:

«1.      Qualquer parte interessada pode apresentar observações nos termos do artigo 6.° na sequência da decisão da Comissão de iniciar o procedimento formal de investigação. Todas as partes interessadas que tenham apresentado observações e todos os beneficiários de um auxílio individual receberão cópia da decisão da Comissão nos termos do artigo 7.°

2.      Qualquer parte interessada pode informar a Comissão sobre qualquer alegado auxílio ilegal e qualquer utilização abusiva de um auxílio. Quando a Comissão considerar que, com base nas informações de que dispõe, não há motivos suficientes para analisar o caso, informará a parte interessada desse facto. Quando a Comissão tomar uma decisão sobre um caso que diga respeito às informações fornecidas, enviará cópia dessa decisão à parte interessada.

3.      A seu pedido, qualquer parte interessada obterá cópia de qualquer decisão nos termos dos artigos 4.° e 7.°, do n.° 3 do artigo 10.° e do artigo 11.°»

 Factos na origem do litígio

12      Por carta de 1 de Dezembro de 1998, a República Federal da Alemanha notificou à Comissão diversas medidas que tinham por objectivo a consolidação financeira da TGI, entre as quais uma dispensa parcial de pagamento e um empréstimo bancário.

13      Em 4 de Abril de 2000, a Comissão deu início ao procedimento formal de investigação, previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE, relativamente à referida dispensa de pagamento e ao referido empréstimo, ao qual foi atribuída a referência C 19/2000.

14      A Comissão, por decisão de 12 de Junho de 2001, na qual limitou a sua apreciação à medida de dispensa de pagamento, declarou que esta medida constituía um auxílio de Estado incompatível com o mercado comum. A TGI impugnou esta decisão interpondo, em 28 de Agosto de 2001, um recurso de anulação para o Tribunal de Primeira Instância, ao qual foi negado provimento por acórdão de 8 de Julho de 2004, Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão (T‑198/01, Colect., p. II‑2717), confirmado em sede de recurso para o Tribunal de Justiça por acórdão de 11 de Janeiro de 2007 (C‑404/04 P).

15      Em 3 de Julho de 2001, a Comissão abriu um segundo procedimento formal de investigação, sob a referência C 44/2001, ao abrigo do artigo 88.°, n.° 2, CE, relativo, designadamente, ao empréstimo bancário.

16      Por carta de 24 de Outubro de 2001, a TGI apresentou observações no âmbito do segundo procedimento formal de investigação e solicitou à Comissão, por um lado, acesso a uma versão não confidencial do processo e, por outro, a possibilidade de apresentar, subsequentemente, novas observações. Este pedido foi indeferido pela Comissão por carta de 23 de Novembro de 2001.

17      Por carta de 1 de Março de 2002, a TGI pediu, com fundamento no Regulamento n.° 1049/2001, acesso a todos os documentos constantes dos processos da Comissão relativos aos auxílios de Estado a seu favor, em especial do processo registado sob a referência C 44/2001, bem como a todos os documentos constantes dos processos da Comissão relativos aos auxílios de Estado a favor da empresa Schott Glas, com excepção dos segredos comerciais relativos a outras empresas.

18      Por carta de 27 de Março de 2002, a Comissão indeferiu o pedido de acesso, indicando, nomeadamente, que os documentos solicitados estavam abrangidos pela excepção prevista no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001. A Comissão esclareceu ainda que os documentos respeitantes à TGI são documentos que fazem parte do procedimento formal de investigação em curso no processo com a referência C 44/2001.

19      Por carta de 15 de Abril de 2002, a TGI enviou ao secretário‑geral da Comissão um pedido confirmativo de acesso aos mesmos documentos, em aplicação do artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001.

20      Através da decisão controvertida, o secretário‑geral da Comissão indeferiu este pedido de acesso, confirmando assim o indeferimento já comunicado à TGI, com o fundamento de que a divulgação destes diferentes documentos poderia prejudicar a protecção dos objectivos das actividades de inspecção e de inquérito, estando esta excepção ao direito de acesso expressamente prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

21      A referida decisão indica além disso que, uma vez que o pedido da TGI implicaria que lhe fosse facultado o acesso a um documento que continha uma descrição pormenorizada de um projecto da Schott Glas, tal acesso poderia prejudicar gravemente os interesses comerciais desta sociedade, interesses que são expressamente protegidos por uma excepção ao direito de acesso prevista no artigo 4.°, n.° 2, do referido regulamento. Por outro lado, a mesma decisão precisa que a possibilidade de tornar acessíveis as partes dos documentos solicitados não abrangidas pelas excepções foi examinada, mas que se concluiu que esses documentos não podiam ser divididos em partes confidenciais e em partes não confidenciais. Finalmente, é igualmente indicado na decisão que, no caso vertente, nenhum interesse público superior justificava a divulgação dos documentos em questão.

22      Em 2 de Outubro de 2002, após o segundo procedimento formal de investigação com a referência C 44/2001, a Comissão adoptou a decisão C(2002) 2147 final, na qual declara, designadamente, que o empréstimo bancário concedido à TGI constituía um auxílio de Estado incompatível com o mercado comum. A TGI impugnou esta decisão interpondo, em 17 de Dezembro de 2002, um recurso de anulação para o Tribunal de Primeira Instância (processo T‑378/02), processo que terminou com um despacho de cancelamento datado de 16 de Maio de 2007.

 Tramitação do processo no Tribunal de Primeira Instância e acórdão recorrido

23      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 8 de Agosto de 2002, a TGI interpôs um recurso de anulação da decisão controvertida, excepto na parte em que esta última recusa o acesso aos documentos directamente relacionados com o procedimento em curso de controlo dos auxílios de Estado relativos à Schott Glas. O Reino da Suécia e a República da Finlândia foram autorizados a intervir em apoio dos pedidos da TGI.

24      A Comissão, por seu turno, apoiada pela Schott Glas, concluiu pedindo que o Tribunal de Primeira Instância negasse provimento ao recurso.

25      No acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância, por um lado, julgou inadmissível o recurso na parte em que tinha por objecto a anulação de um pretenso indeferimento tácito de acesso aos documentos relativos ao «processo de auxílio encerrado no quadro da privatização da Jenaer Schott Glas» e, por outro, anulou a decisão controvertida na parte em que recusa o acesso a documentos relativos aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado concedidos à TGI.

26      Em especial, no quadro do fundamento suscitado pela TGI baseado na violação do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, relativo à excepção ao direito de acesso resultante da protecção dos objectivos de inspecção, inquérito e auditoria, o Tribunal de Primeira Instância começou por salientar, no n.° 76 do acórdão recorrido, que os documentos visados no pedido de acesso dizem efectivamente respeito a uma actividade «de inquérito» na acepção do n.° 2, terceiro travessão, do referido artigo e declarou, no n.° 77 do acórdão, que a simples circunstância de um documento respeitar a um interesse protegido por uma excepção não basta para justificar a aplicação desta última. Acrescentou que tal aplicação só pode, em princípio, ser justificada na hipótese de a instituição ter previamente apreciado, em primeiro lugar, se o acesso ao documento é concreta e efectivamente susceptível de prejudicar o interesse protegido e, em segundo lugar, nas hipóteses referidas no artigo 4.°, n.os 2 e 3, do dito regulamento, se não existe um interesse público superior que justifique a divulgação do documento em causa. O Tribunal de Primeira Instância concluiu que o exame a que deve proceder, em princípio, a instituição a fim de aplicar uma excepção deve ser efectuado em concreto e deve resultar dos fundamentos da decisão.

27      O Tribunal de Primeira Instância indicou seguidamente, no n.° 78 do dito acórdão, que decorre do Regulamento n.° 1049/2001 que todas as excepções mencionadas nos n.os 1 a 3 do seu artigo 4.° são enunciadas como devendo ser aplicadas «a um documento». No mesmo número, indicou igualmente, referindo‑se ao n.° 70 do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Abril de 2005, Verein für Konsumenteninformation/Comissão (T‑2/03, Colect., p. II‑1121), que este exame concreto deve, pois, ser realizado para cada documento a que se refere o pedido.

28      Fazendo novamente referência a este último acórdão, o Tribunal de Primeira Instância, no n.° 79 do acórdão recorrido, sublinhou que só um exame concreto e individual, por oposição a um exame abstracto e global, pode permitir à instituição apreciar a possibilidade de conceder um acesso parcial ao requerente, em conformidade com o disposto no artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001, e que, no que diz respeito à aplicação ratione temporis das excepções ao direito de acesso, o n.° 7 do mencionado artigo 4.° prevê que as excepções a que se referem os n.os 1 a 3 do regulamento só são aplicáveis durante o período em que a protecção se justifique com base «no conteúdo do documento». Declarou seguidamente, no n.° 80 do mesmo acórdão, que, no caso em apreço, não resulta dos fundamentos da decisão controvertida que a Comissão tenha procedido a uma apreciação concreta e individual do conteúdo dos documentos objecto do pedido de acesso.

29      Por outro lado, o Tribunal de Primeira Instância, no n.° 85 do acórdão recorrido, salientou que a obrigação que incumbe a uma instituição de proceder a uma apreciação concreta e individual do conteúdo dos documentos a que se refere o pedido de acesso constitui uma solução de princípio, que se aplica a todas as excepções mencionadas nos n.os 1 a 3 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, seja qual o for domínio a que estejam ligados os documentos solicitados, quer se trate, nomeadamente, do domínio dos acordos, decisões e práticas concertadas ou do controlo dos auxílios públicos.

30      No entanto, no n.° 86 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância acrescentou que o referido exame pode não ser necessário quando, devido às circunstâncias específicas do caso concreto, seja manifesto que o acesso aos documentos deve ser recusado ou, pelo contrário, concedido. Assim poderia acontecer, segundo o Tribunal de Primeira Instância, designadamente, se determinados documentos estivessem manifestamente cobertos na totalidade por uma excepção ao direito de acesso ou, ao invés, fossem manifestamente acessíveis na totalidade, ou, por último, tivessem sido já objecto de uma apreciação concreta e individual por parte da instituição em circunstâncias similares.

31      A fim de examinar, como enunciado no n.° 87 do acórdão recorrido, se o pedido da TGI tinha por objecto documentos em relação aos quais, devido às circunstâncias do caso concreto, não era necessário proceder a esse exame concreto e individual, o Tribunal de Primeira Instância sublinhou, no n.° 88 do mesmo acórdão, que, na decisão controvertida, a Comissão justificou a aplicação da excepção respeitante à protecção dos objectivos das actividades de inspecção e inquérito referindo que, no âmbito dos inquéritos em curso a respeito da compatibilidade de um auxílio de Estado com o mercado único, é indispensável existir uma cooperação leal e uma confiança mútua entre a Comissão, o Estado‑Membro e as empresas em questão, a fim de que as várias «partes» se possam exprimir livremente, e que a divulgação de documentos relativos a estes inquéritos «poderia prejudicar o tratamento do exame [da] denúncia, comprometendo o referido diálogo».

32      O Tribunal de Primeira Instância considerou, no n.° 89 do acórdão recorrido, que uma apreciação em termos tão gerais, aplicável ao conjunto do processo administrativo relativo aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado concedidos à TGI, não demonstrava que existissem no caso em apreço circunstâncias específicas que permitissem considerar que não era necessário proceder a um exame concreto e individual dos documentos que o compunham. Mais especificamente, segundo o Tribunal de Primeira Instância, não demonstrava que esses documentos estivessem manifestamente cobertos na totalidade por uma excepção ao direito de acesso.

33      Além disso, no n.° 92 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância considerou paradoxal evocar a necessidade de um diálogo franco e directo entre a Comissão, o Estado‑Membro e as «empresas em questão», no quadro de um clima de cooperação leal e de confiança mútua, para recusar precisamente a uma das «partes» em questão o conhecimento de todos os elementos de informação que se prendiam directamente com o próprio objecto das discussões.

34      Finalmente, o Tribunal de Primeira Instância concluiu, no n.° 100 do acórdão recorrido, que a acusação respeitante à falta de um exame concreto e individual dos documentos visados no pedido de acesso devia ser acolhida e que a recusa pura e simples de acesso oposta pela Comissão à TGI estava, por conseguinte, ferida de erro de direito. Consequentemente, o Tribunal de Primeira Instância declarou, no n.° 1 do dispositivo do acórdão recorrido, que a Comissão tinha violado o artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001 e que a decisão controvertida devia, portanto, ser anulada na parte em que recusava o acesso a documentos relativos aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado concedidos à TGI, sem que fosse necessário examinar os demais fundamentos de anulação invocados pela TGI e pelo Reino da Suécia. Por outro lado, no n.° 3 do dispositivo do mesmo acórdão, o Tribunal de Primeira Instância condenou a Comissão a suportar as suas próprias despesas e três quartos das despesas efectuadas pela TGI.

 Pedidos das partes perante o Tribunal de Justiça

35      Através do presente recurso, a Comissão pede, por um lado, a anulação do acórdão recorrido na medida em que este anula a decisão controvertida e, por outro, a condenação da TGI nas despesas.

36      A TGI, a República da Finlândia e o Reino da Suécia concluem pedindo que seja negado provimento ao recurso. Pedem igualmente ao Tribunal de Justiça que condene a Comissão nas despesas.

37      Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 4 de Março de 2008, o Reino da Dinamarca foi autorizado a intervir em apoio da TGI, em aplicação do artigo 93.°, n.° 7, do Regulamento de Processo, ou seja, apenas através de observações a apresentar na fase oral.

 Quanto ao presente recurso

38      Em apoio do seu recurso, a Comissão suscita cinco fundamentos, baseados, em primeiro lugar, na interpretação errada do artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001, em segundo lugar, na violação da vontade do legislador, em terceiro lugar, na inobservância dos termos do artigo 4.° deste regulamento, em quarto lugar, na violação do artigo 255.° CE à luz das disposições e da finalidade do referido regulamento e, em quinto lugar, na existência de outros erros de direito no acórdão recorrido.

39      O primeiro fundamento invocado pela Comissão, baseado na interpretação errada do artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001, divide‑se em duas partes.

 Argumentos das partes

40      Na primeira parte do seu primeiro fundamento, a Comissão alega que o Tribunal de Primeira Instância interpretou erradamente o artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001, ao considerar, nos n.os 87 a 89 do acórdão recorrido, que não se verificavam «circunstâncias específicas do caso concreto», como enunciado no n.° 86 do referido acórdão, que permitissem considerar que não era necessário proceder a um exame concreto e individual dos documentos referidos no pedido de acesso apresentado pela TGI ao abrigo do dito regulamento.

41      Ora, segundo a Comissão, existem efectivamente «circunstâncias específicas do caso concreto» em razão das quais era manifesto que o acesso solicitado pela TGI devia ser recusado. Considera, a este respeito, que a inexistência de um direito de consultar o processo por parte de interessados diferentes do Estado‑Membro em causa nos procedimentos de auxílios de Estado, como resulta da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Primeira Instância, deve ser reconhecida como uma «circunstância específica do caso concreto», isto sem excluir que o Regulamento n.° 1049/2001 contradiga a referida jurisprudência.

42      Daqui resulta que, segundo a Comissão, as «circunstâncias específicas do caso concreto» demonstram manifestamente que havia que recusar o acesso a «todos os documentos constantes dos processos da Comissão em todos os processos de auxílios relativos à empresa TGI», sem ter de efectuar previamente um exame concreto e individual dos referidos documentos, e que estes últimos estavam plenamente cobertos pela excepção ao direito de acesso prevista no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001.

43      Por outro lado, a Comissão sustenta que existe uma contradição entre os n.os 86 e 89 do acórdão recorrido. Neste último número, o Tribunal de Primeira Instância procura uma prova da existência de circunstâncias específicas para demonstrar que um exame concreto e individual dos documentos não é necessário, quando tinha declarado, no referido n.° 86, que essas circunstâncias devem ser manifestas e não têm de ser provadas.

44      A TGI, o Reino da Dinamarca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia sustentam que os argumentos apresentados pela Comissão no quadro da primeira parte do seu primeiro fundamento não são procedentes e que, portanto, esta primeira parte deve ser rejeitada.

45      A TGI considera que a inexistência de um direito de consultar o processo por parte de interessados diferentes do Estado‑Membro em causa nos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado não pode, em si, constituir um obstáculo a um direito de acesso aos documentos ao abrigo do Regulamento n.° 1049/2001. Salienta que o facto de se tratar de documentos relativos a um procedimento de controlo dos auxílios de Estado não justifica um tratamento específico. Do mesmo modo, a circunstância de o Regulamento n.° 1049/2001 não reconhecer um direito de consulta do processo por parte dos referidos interessados neste tipo de procedimentos também não é suficientemente específica para que não se possa proceder a um exame individual dos documentos objecto de um pedido de acesso apresentado ao abrigo do Regulamento n.° 1049/2001.

46      A TGI precisa ainda que as «circunstâncias específicas do caso concreto» devem ir além da simples circunstância de o processo em causa se referir ao domínio dos auxílios de Estado. Segundo a TGI, deve tratar‑se de circunstâncias específicas «do caso concreto», e não de circunstâncias comuns que se verificam geralmente em matéria de auxílios de Estado. Caso contrário, isso equivaleria a uma isenção por categoria para os procedimentos de controlo dos auxílios de Estado e, consequentemente, à inaplicabilidade do Regulamento n.° 1049/2001 no âmbito destes, o que a Comissão refutou.

47      A República da Finlândia, por seu turno, acrescenta que pouco importa que o requerente seja o beneficiário de um auxílio de Estado ou outra pessoa referida no artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1049/2001. Dado que esta última disposição se aplica indistintamente a todos os pedidos de acesso, não reserva ao dito beneficiário uma posição menos favorável do que aquela que reconhece a outros requerentes no caso de um pedido de acesso aos documentos relativos a um procedimento de controlo dos auxílios de Estado.

48      O Reino da Suécia alega que o princípio da transparência, garantido pelo Regulamento n.° 1049/2001, e o princípio dos direitos de defesa, dos quais faz parte o direito de consultar o processo nos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado, são dois princípios distintos que não têm o mesmo objectivo e que, portanto, a jurisprudência relativa aos direitos de defesa nos referidos procedimentos não é pertinente para o tratamento de um pedido de acesso aos documentos das instituições apresentado ao abrigo do mencionado regulamento.

49      Por outro lado, a TGI considera que incumbia à Comissão fazer prova da existência de circunstâncias específicas, uma vez que era ela, Comissão, que invocava uma excepção a uma regra de princípio segundo a qual há que proceder a um exame concreto e individual dos documentos objecto do pedido de acesso. Por conseguinte, segundo a TGI, não incumbia ao Tribunal de Primeira Instância determinar oficiosamente se tais circunstâncias se verificavam.

 Apreciação do Tribunal

50      A título liminar, importa indicar que o pedido apresentado pela TGI tem por objecto a totalidade do processo administrativo relativo aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado que lhe tinham sido concedidos.

51      Deve recordar‑se que, adoptado com fundamento no artigo 255.°, n.° 2, CE, o Regulamento n.° 1049/2001 visa, como indicam o seu quarto considerando e o seu artigo 1.°, conferir ao público um direito de acesso aos documentos das instituições o mais amplo possível. Resulta igualmente do referido regulamento, designadamente do décimo primeiro considerando e do artigo 4.°, que prevê um regime de excepções a este respeito, que este direito de acesso não deixa de estar sujeito a certos limites baseados em razões de interesse público ou privado.

52      No caso vertente, a Comissão tinha precisamente recusado comunicar à TGI documentos relativos aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado que lhe tinham sido concedidos, invocando a excepção ao direito de acesso prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, baseada na protecção dos objectivos das actividades de inspecção, inquérito e auditoria. Como resulta do n.° 76 do acórdão recorrido, estes documentos, como referidos no pedido de acesso apresentado pela TGI com fundamento neste regulamento, enquadram‑se efectivamente no âmbito de uma actividade «de inquérito» na acepção da dita disposição.

53      É verdade que, para justificar a recusa de acesso a um documento cuja divulgação foi requerida, não basta, em princípio, que esse documento seja relativo a uma actividade mencionada no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001. A instituição em causa deve igualmente fornecer explicações quanto à questão de saber de que modo o acesso ao referido documento poderia prejudicar concreta e efectivamente o interesse protegido por uma excepção prevista neste artigo (v. acórdão de 1 de Julho de 2008, Suécia e Turco/Conselho, C‑39/05 P e C‑52/05 P, Colect., p. I‑4723, n.° 49).

54      No entanto, o Tribunal de Justiça reconheceu que a instituição comunitária em causa pode basear‑se, a este respeito, em presunções gerais aplicáveis a certas categorias de documentos, uma vez que considerações de ordem geral semelhantes podem aplicar‑se a pedidos de divulgação respeitantes a documentos da mesma natureza (v. acórdão Suécia e Turco/Conselho, já referido, n.° 50).

55      Relativamente aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado, tais presunções gerais podem resultar do Regulamento n.° 659/1999 e da jurisprudência relativa ao direito de consultar os documentos do processo administrativo da Comissão. Importa recordar, a este respeito, que, nos termos do seu segundo considerando, o Regulamento n.° 659/1999 visa codificar a prática constante da Comissão relativamente à aplicação do artigo 88.° CE, prática que foi desenvolvida e estabelecida em conformidade com a jurisprudência.

56      O Regulamento n.° 659/1999, em especial o seu artigo 20.°, não prevê um direito de acesso aos documentos do processo administrativo da Comissão a favor dos interessados no quadro do procedimento de controlo iniciado em conformidade com o artigo 88.°, n.° 2, CE.

57      Em contrapartida, o artigo 6.°, n.° 2, do referido regulamento dispõe que as observações recebidas pela Comissão, no quadro do mencionado procedimento de controlo, são comunicadas ao Estado‑Membro em causa, o qual tem em seguida a possibilidade de responder a essas observações num prazo determinado. Com efeito, o procedimento de controlo dos auxílios de Estado, tendo em conta a sua economia geral, é um procedimento iniciado em relação ao Estado‑Membro responsável pela concessão do auxílio e a Comissão não tem o direito de utilizar na sua decisão final, sob pena de violar os direitos de defesa, informações que esse Estado não tenha podido comentar (acórdão de 24 de Setembro de 2002, Falck e Acciaierie di Bolzano/Comissão, C‑74/00 P e C‑75/00 P, Colect., p. I‑7869, n.° 81).

58      Resulta do que precede que os interessados, com excepção do Estado‑Membro responsável pela concessão do auxílio, não dispõem, no âmbito do procedimento de controlo dos auxílios de Estado, do direito de consultar os documentos do processo administrativo da Comissão. Para interpretar a excepção prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, há que ter em conta esta circunstância. Com efeito, se esses interessados pudessem ter acesso, com fundamento no Regulamento n.° 1049/2001, aos documentos do processo administrativo da Comissão, o regime de controlo dos auxílios de Estado poderia ser posto em causa.

59      É certo que o direito de consultar o processo administrativo no âmbito de um procedimento de controlo iniciado em conformidade com o artigo 88.°, n.° 2, CE e o direito de acesso aos documentos, nos termos do Regulamento n.° 1049/2001, se distinguem juridicamente, mas não é menos certo que conduzem a uma situação comparável do ponto de vista funcional. Com efeito, independentemente do fundamento jurídico com base no qual é concedido, o acesso ao processo permite aos interessados obter o conjunto das observações e dos documentos apresentados à Comissão, e, eventualmente, tomar posição sobre esses elementos nas suas próprias observações, o que é susceptível de modificar a natureza de tal procedimento.

60      Por outro lado, importa precisar que, diversamente dos casos em que as instituições comunitárias actuam como legislador, nos quais um acesso mais amplo aos documentos deveria ser autorizado em aplicação do sexto considerando do Regulamento n.° 1049/2001, como acontecia no processo que deu origem ao acórdão Suécia e Turco/Conselho, já referido, os documentos relativos aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado, como os solicitados pela TGI, inscrevem‑se no quadro das funções administrativas especificamente atribuídas às ditas instituições pelo artigo 88.° CE.

61      Resulta do conjunto das considerações que precedem que, para efeitos da interpretação da excepção prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, o Tribunal de Primeira Instância deveria, no acórdão recorrido, ter tido em conta a circunstância de que os interessados diferentes do Estado‑Membro em causa nos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado não dispõem do direito de consultar os documentos do processo administrativo da Comissão e, por conseguinte, reconhecer a existência de uma presunção geral segundo a qual a divulgação dos documentos do processo administrativo poderia, em princípio, pôr em causa a protecção dos objectivos das actividades de inquérito.

62      Esta presunção geral não exclui o direito de os referidos interessados demonstrarem que um dado documento cuja divulgação é requerida não está coberto por tal presunção ou que existe um interesse público superior que justifica a divulgação do documento em causa ao abrigo do artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001.

63      Não tendo tomado em consideração tal circunstância e ao julgar erradamente, nos n.os 87 a 89 do acórdão recorrido, que não se afigurava manifestamente, no caso em análise, que havia que recusar o acesso a todos os documentos relativos aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado objecto do pedido de acesso apresentado pela TGI com fundamento no Regulamento n.° 1049/2001, sem proceder previamente a um exame concreto e individual desses documentos, o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de interpretação do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do referido regulamento.

64      Consequentemente, a primeira parte do primeiro fundamento suscitada pela Comissão deve ser julgada procedente e, portanto, o acórdão recorrido deve ser anulado na medida em que anulou a decisão controvertida, não sendo necessário examinar a segunda parte deste fundamento nem os outros fundamentos invocados pela Comissão em apoio do presente recurso.

 Quanto ao recurso para o Tribunal de Primeira Instância

65      Em conformidade com o disposto no artigo 61.°, primeiro parágrafo, segundo período, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, este, em caso de anulação do acórdão recorrido, pode decidir o litígio, se estiver em condições de ser julgado. É o que acontece no caso em apreço.

66      O recurso da TGI para o Tribunal de Primeira Instância, na medida em que ainda não foi definitivamente decidido por aquele Tribunal, tinha por objecto a anulação da decisão controvertida na parte em que recusava o acesso a documentos relativos aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado concedidos à TGI e baseava‑se na violação, pela Comissão, do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001. Este fundamento de anulação da TGI dividia‑se em várias partes. Em primeiro lugar, a Comissão terá recusado o acesso aos documentos solicitados sem proceder a um exame concreto de cada um deles. Em segundo lugar, a referida instituição ter‑se‑á baseado erradamente nas soluções jurisprudenciais relativas à recusa de acesso aos documentos relativos aos processos por incumprimento contra um Estado‑Membro, que não são comparáveis com os procedimentos de controlo dos auxílios de Estado. Em terceiro lugar, a Comissão terá violado o direito a um acesso parcial. Em quarto lugar, a ponderação dos interesses, prevista no n.° 2 do referido artigo 4.°, deveria ter conduzido à divulgação dos documentos pedidos.

67      Ora, no que respeita à primeira parte, resulta dos n.os 61 e 63 do presente acórdão que, no caso vertente, a Comissão, ao abrigo do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, recusou legitimamente o acesso a todos os documentos relativos aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado objecto do pedido de acesso apresentado pela TGI com fundamento neste regulamento, e isto sem proceder previamente a um exame concreto e individual desses documentos.

68      Na falta de elementos resultantes do recurso, susceptíveis de refutar a presunção geral mencionada no n.° 61 do presente acórdão, a TGI não pode pretender que a Comissão deve proceder a tal exame, pelo que esta primeira parte deve ser rejeitada.

69      Resulta do que precede que a segunda parte é inoperante. Dado que o artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 permite, em princípio, recusar o acesso aos documentos que compõem o processo referente a um procedimento de controlo dos auxílios de Estado, uma fundamentação da recusa que se inspira igualmente em aspectos relativos aos processos por incumprimento contra um Estado‑Membro não torna a recusa irregular.

70      Por outro lado, a terceira e quarta partes são improcedentes. Com efeito, no seu recurso, a TGI não alega que uma parte dos documentos objecto do seu pedido não estava abrangida pela presunção geral referida no n.° 61 do presente acórdão nem o interesse público superior que seria susceptível de justificar a divulgação desses documentos. Como resulta do seu recurso, a TGI apenas invoca o seu interesse enquanto beneficiária do auxílio de Estado objecto dos procedimentos de controlo.

71      Consequentemente, deve ser negado provimento ao recurso interposto pela TGI para o Tribunal de Primeira Instância pedindo a anulação da decisão controvertida na parte em que recusa o acesso a documentos relativos aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado concedidos à TGI.

 Quanto às despesas

72      Nos termos do artigo 122.°, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas. Por força do disposto no artigo 69.°, n.° 2, do mesmo regulamento, aplicável ao processo de recurso das decisões do Tribunal de Primeira Instância nos termos do seu artigo 118.°, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. O n.° 4, primeiro parágrafo, do referido artigo 69.° prevê que os Estados‑Membros que intervenham no processo devem suportar as respectivas despesas.

73      Tendo o recurso da Comissão sido julgado procedente e uma vez que deve ser negado provimento ao recurso da TGI para o Tribunal de Primeira Instância, há que condenar a TGI a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efectuadas pela Comissão tanto em primeira instância como no presente recurso, em conformidade com os pedidos desta última.

74      O Reino da Dinamarca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia suportam as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

1)      Os n.os 1 e 3 do dispositivo do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias de 14 de Dezembro de 2006, Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão (T‑237/02), são anulados.

2)      É negado provimento ao recurso interposto para o Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias pedindo a anulação da decisão da Comissão das Comunidades Europeias de 28 de Maio de 2002 na parte em que recusa o acesso a documentos relativos aos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado concedidos à Technische Glaswerke Ilmenau GmbH.

3)      A Technische Glaswerke Ilmenau GmbH é condenada a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efectuadas pela Comissão Europeia tanto em primeira instância como no âmbito do presente recurso.

4)      O Reino da Dinamarca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia suportam as suas próprias despesas.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.

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