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Document 62007CJ0127

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 16 de Dezembro de 2008.
    Société Arcelor Atlantique et Lorraine e outros contra Premier ministre, Ministre de l’Écologie et du Développement durable e Ministre de l'Économie, des Finances et de l'Industrie.
    Pedido de decisão prejudicial: Conseil d'État - França.
    Ambiente - Prevenção e redução integradas da poluição - Regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa - Directiva 2003/87/CE - Âmbito de aplicação - Inclusão das instalações do sector siderúrgico - Exclusão das instalações do sector químico e do sector dos metais não ferrosos - Princípio da igualdade de tratamento.
    Processo C-127/07.

    Colectânea de Jurisprudência 2008 I-09895

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2008:728

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

    16 de Dezembro de 2008 ( *1 )

    «Ambiente — Prevenção e redução integradas da poluição — Regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa — Directiva 2003/87/CE — Âmbito de aplicação — Inclusão das instalações do sector siderúrgico — Exclusão das instalações do sector químico e do sector dos metais não ferrosos — Princípio da igualdade de tratamento»

    No processo C-127/07,

    que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.o CE, apresentado pelo Conseil d’État (França), por decisão de 8 de Fevereiro de 2007, entrado no Tribunal de Justiça em 5 de Março de 2007, no processo

    Société Arcelor Atlantique et Lorraine e o.

    contra

    Premier ministre,

    Ministre de l’Écologie et du Développement durable,

    Ministre de l’Économie, des Finances et de l’Industrie,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

    composto por: V. Skouris, presidente, P. Jann, C. W. A. Timmermans, A. Rosas, K. Lenaerts, M. Ilešič, A. Ó Caoimh e T. von Danwitz (relator), presidentes de secção, G. Arestis, A. Borg Barthet, J. Malenovský, U. Lõhmus e E. Levits, juízes,

    advogado-geral: M. Poiares Maduro,

    secretário: M.-A. Gaudissart, chefe de unidade,

    vistos os autos e após a audiência de 11 de Março de 2008,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação da Société Arcelor Atlantique et Lorraine e o., por W. Deselaers, Rechtsanwalt, e P. Lignières, avocat,

    em representação do Governo francês, por G. de Bergues, L. Butel e S. Gasri, na qualidade de agentes,

    em representação do Parlamento Europeu, por L. Visaggio e I. Anagnostopoulou, na qualidade de agentes,

    em representação do Conselho da União Europeia, por P. Plaza García, K. Michoel e E. Karlsson, na qualidade de agentes,

    em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por J.-B. Laignelot e U. Wölker, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 21 de Maio de 2008,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a validade da Directiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Directiva 96/61/CE do Conselho (JO L 275, p. 32), conforme alterada pela Directiva 2004/101/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Outubro de 2004 (JO L 338, p. 18, a seguir «Directiva 2003/87»).

    2

    Este pedido foi apresentado pelo Conseil d’État no âmbito de um litígio que opõe a Société Arcelor Atlantique et Lorraine e o. ao Premier ministre, ao ministre de l’Écologie et du Développement durable e ao ministre de l’Économie, des Finances et de l’Industrie, a respeito da transposição da Directiva 2003/87 para a ordem jurídica francesa.

    Quadro jurídico

    Direito internacional

    3

    Em 9 de Maio de 1992, foi adoptada em Nova Iorque a Convenção-Quadro das Nações Unidas relativa às alterações climáticas (a seguir «convenção-quadro»), cujo objectivo último é estabilizar as concentrações na atmosfera de gases com efeito de estufa a um nível que evite uma interferência antropogénica perigosa com o sistema climático. Em 11 de Dezembro de 1997, as partes na convenção-quadro adoptaram, com base nesta, o Protocolo de Quioto à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as alterações climáticas (a seguir «protocolo de Quioto»), que entrou em vigor em 16 de Fevereiro de 2005.

    4

    O objectivo deste protocolo consiste em reduzir o total das emissões de seis gases com efeito de estufa, entre os quais o dióxido de carbono (a seguir «CO2 »), pelo menos 5% em relação aos níveis de 1990, no período de 2008 a 2012. As partes referidas no anexo I da convenção-quadro comprometem-se a fazer com que as suas emissões de gases com efeito de estufa não ultrapassem uma percentagem que lhes é atribuída pelo protocolo de Quioto, podendo cumprir conjuntamente as suas obrigações. O compromisso global assumido pela Comunidade Europeia e pelos seus Estados-Membros ao abrigo do protocolo de Quioto consiste numa redução total das emissões de gases com efeito de estufa de 8% em relação aos níveis de emissões de 1990, no período de compromisso acima referido.

    Direito comunitário

    5

    O Conselho da União Europeia aprovou em nome da Comunidade, por um lado, a convenção-quadro pela Decisão 94/69/CE, de 15 de Dezembro de 1993, relativa à celebração da Convenção-Quadro das Nações Unidas relativa às alterações climáticas (JO 1994, L 33, p. 11), e, por outro, o protocolo de Quioto pela Decisão 2002/358/CE, de 25 de Abril de 2002, relativa à aprovação, em nome da Comunidade Europeia, do Protocolo de Quioto da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as alterações climáticas e ao cumprimento conjunto dos respectivos compromissos (JO L 130, p. 1). De acordo com o artigo 2.o, n.o 1, desta última decisão, a Comunidade e os seus Estados-Membros cumprem conjuntamente o compromisso global por eles assumido ao abrigo do protocolo de Quioto.

    6

    Considerando que a transacção de direitos de emissão de gases com efeito de estufa será, em conjunto com outras medidas, parte integrante e essencial da estratégia comunitária na luta contra as alterações climáticas, a Comissão das Comunidades Europeias apresentou, em 8 de Março de 2000, o Livro Verde sobre a transacção de direitos de emissão de gases com efeito de estufa na União Europeia [COM (2000) 87 final] (a seguir «Livro Verde»).

    7

    Com base no artigo 175.o, n.o 1, CE, a Comissão apresentou, em 23 de Outubro de 2001, uma proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à criação do quadro de comércio de direitos de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade Europeia e que altera a Directiva 96/61/CE do Conselho [COM (2001) 581 final] (a seguir «proposta de directiva»), que conduziu à adopção da Directiva 2003/87.

    8

    Segundo o seu quinto considerando, essa directiva tem por objectivo contribuir para o cumprimento, em condições eficazes, dos compromissos de redução das emissões antropogénicas de gases com efeito de estufa assumidos pela Comunidade e pelos seus Estados-Membros no âmbito do protocolo de Quioto, em conformidade com a Decisão 2002/358, através da implementação de um mercado europeu de licenças de emissão de gases com efeito de estufa (a seguir «licenças de emissão») que seja eficiente e apresente a menor redução possível do desenvolvimento económico e do emprego.

    9

    Nos termos do vigésimo terceiro considerando da referida directiva, o comércio de licenças de emissão deverá «fazer parte de um conjunto completo e coerente de políticas e medidas executadas ao nível dos Estados-Membros e da Comunidade». Conforme precisa o seu vigésimo quinto considerando, «[a] fim de se obterem importantes reduções das emissões, deverão ser aplicadas, tanto a nível nacional como comunitário, políticas e medidas que abranjam, não apenas os sectores industrial e da energia, mas todos os sectores económicos da União Europeia».

    10

    O artigo 1.o da Directiva 2003/87 define o seu objecto nos seguintes termos:

    «A presente directiva cria um regime de comércio de licenças de emissão […] na Comunidade […], a fim de promover a redução das emissões de gases com efeito de estufa em condições que ofereçam uma boa relação custo-eficácia e sejam economicamente eficientes.»

    11

    De acordo com o seu artigo 2.o, n.o 1, a Directiva 2003/87 aplica-se às emissões provenientes das actividades enumeradas no seu anexo I e aos seis gases com efeito de estufa enumerados no seu anexo II, designadamente o CO2. O referido anexo I refere certas actividades no sector da energia, da produção e da transformação de metais ferrosos e da indústria mineral, bem como actividades realizadas em instalações industriais destinadas ao fabrico de pasta de papel e em instalações industriais destinadas ao fabrico de papel e cartão, na medida em estas instalações emitam CO2.

    12

    O artigo 4.o da Directiva 2003/87 enuncia:

    «Os Estados-Membros devem assegurar que, a partir de 1 de Janeiro de 2005, nenhuma instalação realize qualquer actividade enumerada no anexo I de que resultem emissões especificadas em relação a essa actividade, a não ser que o seu operador seja detentor de um título emitido pela autoridade competente de acordo com o disposto nos artigos 5.o e 6.o, […].»

    13

    Em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Directiva 2003/87, o título de emissão de gases com efeito de estufa, pelo qual é permitida a emissão de gases com efeito de estufa de uma parte ou da totalidade de uma instalação, é emitido pela autoridade competente mediante prova de que o operador é capaz de monitorizar e comunicar as emissões desses gases. Nos termos do n.o 2 do mesmo artigo, esse título deve incluir, designadamente, «[a] obrigação de devolver licenças de emissão equivalentes ao total das emissões da instalação em cada ano civil, verificadas em conformidade com o artigo 15.o, no prazo de quatro meses a contar do termo do ano em causa».

    14

    A atribuição da quantidade total de licenças de emissão aos operadores das instalações visadas pela Directiva 2003/87 realiza-se, em conformidade com o artigo 9.o desta directiva, com base num plano nacional de atribuição de licenças de emissão elaborado pelos Estados-Membros de acordo com os critérios enumerados no anexo III da mesma directiva.

    15

    Segundo o artigo 10.o da referida directiva, os Estados-Membros devem atribuir gratuitamente, pelo menos, 95% das licenças de emissão para o período de três anos com início em 1 de Janeiro de 2005 e, pelo menos, 90% dessas licenças para o período de cinco anos seguinte. Em conformidade com o artigo 12.o, n.o 1, da mesma directiva, as licenças de emissão atribuídas podem ser transferidas, sendo comercializáveis entre pessoas no interior da Comunidade, bem como, em determinadas condições, entre pessoas no interior da Comunidade e pessoas de países terceiros.

    16

    Nos termos do artigo 16.o, n.o 3, da Directiva 2003/87:

    «Os Estados-Membros devem assegurar que os operadores de instalações que não devolvam, até 30 de Abril de cada ano, licenças de emissão suficientes para cobrir as suas emissões no ano anterior sejam obrigados a pagar uma multa pelas emissões excedentárias. A multa por emissões excedentárias será igual a 100 euros por cada tonelada de equivalente [CO2 ] emitida pela instalação relativamente à qual o operador não tenha devolvido licenças. O pagamento da multa por emissões excedentárias não dispensa o operador da obrigação de devolver uma quantidade de licenças de emissão equivalente às emissões excedentárias aquando da devolução das licenças de emissão relativas ao ano civil subsequente.»

    17

    Além disso, a Directiva 2003/87 prevê, no seu artigo 30.o, n.o 2, que a Comissão deve elaborar, até 30 de Junho de 2006, um relatório — se adequado, acompanhado de propostas — sobre a aplicação da mesma directiva, tendo em consideração, entre outros aspectos, «[a] forma e a conveniência da alteração do anexo I a fim de incluir outros sectores relevantes, nomeadamente os sectores da indústria química, do alumínio e dos transportes, bem como outras actividades e emissões de gases com efeito de estufa que não sejam as enumeradas no anexo II, com vista a aumentar a eficiência económica do regime».

    18

    Para esse efeito, a Comissão apresentou, em 13 de Novembro de 2006, a comunicação ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões relativa à construção de um mercado global do carbono [COM (2006) 676 final]. Em 20 de Dezembro de 2006, a Comissão apresentou uma proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 2003/87, de modo a incluir as actividades da aviação no regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade [COM (2006) 818 final]. Além disso, mediante uma proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Directiva 2003/87, a fim de melhorar e alargar o regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa da Comunidade [COM (2008) 16 final], de 23 de Janeiro de 2008, essa instituição pretende, designadamente, alargar o âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 através da inclusão na mesma de novos gases e de novas categorias de actividades, como a produção e a transformação de metais não ferrosos, a produção de alumínio e a indústria química.

    Direito nacional

    19

    A transposição da Directiva 2003/87 para o direito francês foi efectuada pelo Despacho n.o 2004-330, de 15 de Abril de 2004, relativo à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa (JORF de 17 de Abril de 2004, p. 7089), o qual introduziu, nomeadamente, os artigos L.229-5 a L.229-19 do Código do Ambiente. As normas de execução desses artigos foram aprovadas pelo Decreto n.o 2004-832, de 19 de Agosto de 2004 (JORF de 21 de Agosto de 2004, p. 14979), que foi modificado pelo Decreto n.o 2005-189, de 25 de Fevereiro de 2005 (JORF de 26 de Fevereiro de 2005, p. 3498, a seguir «Decreto n.o 2004-832»). O anexo do Decreto n.o 2004-832 limita-se a reproduzir o anexo I da Directiva 2003/87.

    Litígio no processo principal e questão prejudicial

    20

    As recorrentes no processo principal são empresas do sector siderúrgico que solicitaram às autoridades francesas competentes a revogação do artigo 1.o do Decreto n.o 2004-832, na medida em que declara este decreto aplicável às instalações do sector siderúrgico. Não tendo havido resposta aos seus pedidos, interpuseram no Conseil d’État um recurso de anulação das decisões tácitas de indeferimento desses pedidos, com fundamento em abuso de poder, tendo ainda pedido que fosse ordenado às referidas autoridades que procedessem à revogação pretendida. Em apoio do seu recurso, invocaram a violação de vários princípios com valor constitucional, como o direito de propriedade, a liberdade de empresa e o princípio da igualdade.

    21

    O Conseil d’État julgou improcedentes os fundamentos invocados pelas recorrentes no processo principal, com excepção do relativo à violação do princípio constitucional da igualdade gerada por um tratamento diferente de situações comparáveis. A este último respeito, observa, na sua decisão de reenvio, que as indústrias do plástico e do alumínio emitem gases com efeito de estufa idênticos àqueles cujas emissões a Directiva 2003/87 pretendeu limitar e que estas indústrias produzem materiais que substituem parcialmente os produzidos pela indústria siderúrgica, com a qual se encontram, portanto, numa situação de concorrência. O Conseil d’État entende que, apesar de a decisão de não incluir imediatamente as indústrias do plástico e do alumínio no regime de comércio de licenças de emissão ter sido tomada tendo em consideração a sua quota-parte nas emissões totais de gases com efeito de estufa e a necessidade de assegurar a implementação progressiva de um sistema global, a questão de saber se a diferença de tratamento entre as indústrias em causa é objectivamente justificada suscita dificuldades sérias.

    22

    Tendo em conta estas considerações, o Conseil d’État decidiu sobrestar na sua decisão e colocar ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

    «A Directiva [2003/87] [é válida] à luz do princípio da igualdade, na medida em que estabelece que o regime de comércio de licenças de emissão […] é aplicável às instalações do sector siderúrgico, sem nel[e] incluir as indústrias do alumínio e do plástico[?]»

    Quanto à questão prejudicial

    23

    O princípio geral da igualdade de tratamento, enquanto princípio geral do direito comunitário, exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de modo igual, excepto se esse tratamento for objectivamente justificado (v., nomeadamente, acórdãos de 13 de Dezembro de 1984, Sermide, 106/83, Recueil, p. 4209, n.o 28; de 5 de Outubro de 1994, Crispoltoni e o., C-133/93, C-300/93 e C-362/93, Colect., p. I-4863, n.os 50 e 51, e de 11 de Julho de 2006, Franz Egenberger, C-313/04, Colect., p. I-6331, n.o 33).

    24

    Por considerar que os sectores da siderurgia, do plástico e do alumínio se encontram numa situação comparável, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o legislador comunitário, ao excluir os sectores do plástico e do alumínio do âmbito de aplicação da Directiva 2003/87, violou esse princípio no que se refere ao sector siderúrgico. Por conseguinte, o reenvio prejudicial apenas tem por objecto a questão de saber se o legislador comunitário violou esse princípio ao injustificadamente tratar de forma diferenciada situações comparáveis.

    Quanto ao tratamento diferenciado de situações comparáveis

    25

    A violação do princípio da igualdade de tratamento através de um tratamento diferenciado pressupõe que as situações em causa sejam comparáveis no que respeita a todos os elementos que as caracterizam.

    26

    Os elementos que caracterizam situações diferentes e, portanto, o seu carácter comparável devem ser determinados e apreciados à luz do objecto e do objectivo do acto comunitário que institui a distinção em causa. Além disso, devem ser tidos em consideração os princípios e objectivos do domínio do qual releva o acto em questão (v., neste sentido, acórdãos de 27 de Outubro de 1971, Rheinmühlen Düsseldorf, 6/71, Recueil, p. 823, n.o 14, Colect., p. 305; de 19 de Outubro de 1977, Ruckdeschel e o., 117/76 e 16/77, Recueil, p. 1753, n.o 8, Colect., p. 619; de 5 de Outubro de 1994, Alemanha/Conselho, C-280/93, Colect., p. I-4973, n.o 74, e de 10 de Março de 1998, T. Port, C-364/95 e C-365/95, Colect., p. I-1023, n.o 83).

    27

    No caso em apreço, há que apreciar a validade da Directiva 2003/87 no que diz respeito à inclusão do sector siderúrgico no seu âmbito de aplicação e à exclusão desse mesmo âmbito do sector químico e do sector dos metais não ferrosos, sectores aos quais pertencem, segundo as observações escritas apresentadas ao Tribunal de Justiça, respectivamente, os sectores do plástico e do alumínio.

    28

    De acordo com o seu artigo 1.o, a Directiva 2003/87 tem por objecto a instituição de um regime de comércio de licenças de emissão na Comunidade. Conforme resulta dos pontos 4.2 e 4.3 do Livro Verde, a Comunidade pretendeu introduzir, por via dessa directiva, esse regime ao nível das empresas, cobrindo, portanto, as actividades económicas.

    29

    De acordo com o seu quinto considerando, a Directiva 2003/87 tem por objectivo instituir esse regime a fim de contribuir para o cumprimento dos compromissos da Comunidade e dos seus Estados-Membros ao abrigo do protocolo de Quioto, que visa reduzir as emissões de gases com efeito de estufa na atmosfera para um nível que evite uma interferência antropogénica perigosa no sistema climático e cujo objectivo último consiste na protecção do ambiente.

    30

    A política da Comunidade no domínio do ambiente, no qual se integra o acto legislativo em causa no processo principal e que tem a protecção do ambiente como um dos seus objectivos principais, visa, segundo o artigo 174.o, n.o 2, CE, atingir um nível de protecção elevado e baseia-se, designadamente, nos princípios da precaução, da acção preventiva e do poluidor-pagador (v. acórdãos de 5 de Maio de 1998, National Farmers’ Union e o., C-157/96, Colect., p. I-2211, n.o 64, e de 1 de Abril de 2008, Parlamento e Dinamarca/Comissão, C-14/06 e C-295/06, Colect., p. I-1649, n.o 75 e a jurisprudência aí indicada).

    31

    Embora o objectivo último do regime de comércio de licenças de emissão seja a protecção do ambiente através de uma redução das emissões de gases com efeito de estufa, esse regime não reduz, por si só, essas emissões, antes encorajando e fornecendo incentivos para que se encontrem formas de alcançar uma redução das referidas emissões para um nível preciso ao menor custo possível, como resulta, nomeadamente, do ponto 3 do Livro Verde e do ponto 2 do preâmbulo da proposta de directiva. O benefício ambiental depende do rigor com que se determina a quantidade total de licenças de emissão concedidas, que equivale ao limite global de emissões autorizado pelo referido regime.

    32

    Daqui também se conclui que a lógica económica subjacente ao regime de comércio de licenças de emissão consiste em garantir que as reduções de emissões de gases com efeito de estufa necessárias à obtenção de um resultado ambiental predeterminado sejam realizadas ao menor custo. Nomeadamente, ao autorizar a venda das licenças de emissão atribuídas, esse regime visa incitar quem nele participa a emitir uma quantidade de gases com efeito de estufa inferior aos direitos de emissão que lhe tenham sido inicialmente atribuídos, para que ceda o excedente a outro participante que tenha produzido uma quantidade de emissões superior aos direitos de emissão que lhe tenham sido atribuídos.

    33

    Assim, o bom funcionamento do regime de comércio de licenças de emissão implica que exista uma procura e uma oferta de licenças de emissão da parte dos participantes nesse regime, o que implica igualmente que a potencial redução das emissões imputáveis às actividades abrangidas por esse regime pode variar, inclusive consideravelmente. Além disso, como resulta do Livro Verde, quanto maior for o âmbito do sistema, maior será a variação dos custos do cumprimento dos compromissos de cada uma das empresas, e maiores as possibilidades de baixar os custos a nível global.

    34

    Resulta do exposto que, à luz do objecto da Directiva 2003/87, dos seus objectivos referidos no n.o 29 do presente acórdão e dos princípios em que se baseia a política da Comunidade no domínio do ambiente, as diferentes fontes de emissão de gases com efeito de estufa que se integrem numa actividade económica se encontram, em princípio, numa situação comparável, dado que toda e qualquer emissão de gases com efeito de estufa é susceptível de contribuir para uma perturbação perigosa do sistema climático e que todo e qualquer sector da economia emissor desses gases pode contribuir para o funcionamento do regime de comércio de licenças de emissão.

    35

    Importa ainda frisar, por um lado, que o vigésimo quinto considerando da Directiva 2003/87 enuncia que, a fim de se obterem importantes reduções das emissões, deverão ser aplicadas políticas e medidas que abranjam todos os sectores económicos da União Europeia e, por outro, que o artigo 30.o da Directiva 2003/87 prevê a obrigação de realizar uma revisão com vista a incluir outros sectores no seu âmbito de aplicação.

    36

    Resulta do exposto que, no que diz respeito à comparabilidade dos sectores em questão para efeitos da Directiva 2003/87, a eventual existência de uma relação de concorrência entre esses sectores não pode constituir um critério determinante, como o advogado-geral afirmou no n.o 43 das suas conclusões.

    37

    Contrariamente ao que é alegado pelas instituições que apresentaram observações ao Tribunal de Justiça, também não é essencial para apreciar a comparabilidade desses sectores a quantidade de CO2 emitida por cada um deles, atentos, nomeadamente, os objectivos da Directiva 2003/87 e o funcionamento do regime de comércio de licenças de emissão, conforme descritos nos n.os 31 a 33 do presente acórdão.

    38

    Por conseguinte, para efeitos do exame da validade da Directiva 2003/87 à luz do princípio da igualdade de tratamento, os sectores da siderurgia, da química e dos metais não ferrosos encontram-se numa situação comparável, embora sejam tratados de modo diferente.

    Quanto à desvantagem resultante de um tratamento diferenciado de situações comparáveis

    39

    Segundo a jurisprudência, para que se possa imputar ao legislador comunitário uma violação do princípio da igualdade de tratamento, é necessário que tenha tratado de modo diferente situações comparáveis, causando uma desvantagem para certas pessoas em relação a outras (v. acórdãos de 13 de Julho de 1962, Klöckner-Werke e Hoesch/Alta Autoridade, 17/61 e 20/61, Recueil, p. 615, em especial p. 652, Colect. 1962-1964, p. 131; de 15 de Janeiro de 1985, Finsider/Comissão, 250/83, Recueil, p. 131, n.o 8, e de 22 de Maio de 2003, Connect Austria, C-462/99, Colect., p. I-5197, n.o 115).

    40

    A este respeito, o Parlamento, o Conselho e a Comissão sustentam que a inclusão do sector siderúrgico no âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 não coloca esse sector numa situação desfavorável em relação ao sector químico e ao sector dos metais não ferrosos, uma vez que estes últimos devem teoricamente ser harmonizados aos objectivos fixados pelos acordos internacionais aplicáveis, através de meios economicamente menos vantajosos. Segundo as referidas instituições, o cumprimento dos compromissos de redução das emissões de gases com efeito de estufa não pode limitar-se à aplicação do regime de comércio de licenças de emissão. Com efeito, este regime completa as medidas adoptadas pelos Estados-Membros relativamente às actividades e aos sectores temporariamente excluídos do âmbito de aplicação da Directiva 2003/87.

    41

    Esse argumento não pode ser acolhido.

    42

    A subordinação de certos sectores, e, assim, das recorrentes no processo principal, ao regime comunitário de comércio de licenças de emissão implica, para cada operador abrangido, por um lado, a obrigação de ser detentor de um título de emissão de gases com efeito de estufa e, por outro, a obrigação de restituir uma quantidade de licenças de emissão correspondente às emissões totais das suas instalações durante um período determinado, sob pena de sanções pecuniárias. Se as emissões de uma instalação ultrapassam as quantidades conferidas, no quadro de um plano nacional de atribuição de licenças de emissão, ao operador em causa, este terá de adquirir licenças de emissão suplementares através do recurso ao regime de comércio de licenças de emissão.

    43

    Em contrapartida, ao nível comunitário não existem obrigações jurídicas análogas, destinadas a reduzir as emissões de gases com efeito de estufa, para os operadores de instalações não abrangidas pelo anexo I da Directiva 2003/87. Por conseguinte, a inclusão de uma actividade económica no âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 cria, para os operadores abrangidos, uma desvantagem em relação aos operadores que exercem actividades não incluídas nesse âmbito de aplicação.

    44

    Mesmo supondo que, como a Comissão defende, a subordinação a esse regime não implica necessária e sistematicamente consequências económicas desfavoráveis, a existência de uma desvantagem não pode, só por esse motivo, ser negada, uma vez que a desvantagem a considerar à luz do princípio da igualdade de tratamento também pode ser susceptível de influir na situação jurídica da pessoa afectada por uma desigualdade de tratamento.

    45

    Por outro lado, como o advogado-geral observou no n.o 41 das suas conclusões, e contrariamente ao alegado pelas instituições que apresentaram observações ao Tribunal de Justiça, a desvantagem dos operadores de instalações dos sectores sujeitos à Directiva 2003/87 não pode ser compensada por medidas nacionais não determinadas pelo direito comunitário.

    Quanto à justificação da desigualdade de tratamento

    46

    O princípio da igualdade de tratamento não é, porém, violado se a desigualdade de tratamento entre o sector siderúrgico, por um lado, e os sectores químico e dos metais ferrosos, por outro, for justificada.

    47

    Uma desigualdade de tratamento é justificada quando seja baseada num critério objectivo e razoável, isto é, quando esteja relacionada com um objectivo legalmente admissível prosseguido pela legislação em causa, e seja proporcionada em relação ao objectivo prosseguido pelo tratamento em questão (v., neste sentido, acórdãos de 5 de Julho de 1977, Bela-Mühle Bergmann, 114/76, Recueil, p. 1211, n.o 7, Colect., p. 451; de 15 de Julho de 1982, Edeka Zentrale, 245/81, Recueil, p. 2745, n.os 11 e 13; de 10 de Março de 1998, Alemanha/Conselho, C-122/95, Colect., p. I-973, n.os 68 e 71, e de 23 de Março de 2006, Unitymark e North Sea Fishermen’s Organisation, C-535/03, Colect., p. I-2689, n.os 53, 63, 68 e 71).

    48

    Uma vez que está aqui em causa um acto legislativo comunitário, incumbe ao legislador comunitário demonstrar a existência de critérios objectivos apresentados como justificação e submeter ao Tribunal de Justiça os elementos necessários à verificação, por este, da existência dos referidos critérios (v., neste sentido, acórdãos de 19 de Outubro de 1977, Moulins et Huileries de Pont-à-Mousson e Providence agricole de la Champagne, 124/76 e 20/77, Recueil, p. 1795, n.o 22, Colect., p. 625, e de 10 de Março de 1998, Alemanha/Conselho, já referido, n.o 71).

    Observações apresentadas ao Tribunal

    49

    A este respeito, o Parlamento, o Conselho e a Comissão recordam o carácter de novidade do regime de comércio de licenças de emissão instituído pela Directiva 2003/87 e a sua complexidade, tanto no plano político e económico como no plano da regulamentação necessária. Esse regime encontra-se em fase de lançamento. A sua revisão prevista no artigo 30.o da referida directiva, actualmente em discussão, é baseada não só nos progressos obtidos na monitorização das emissões de gases com efeito de estufa mas também na experiência adquirida nesta primeira fase de aplicação.

    50

    Assim, o legislador comunitário considerou oportuno apenas incluir no âmbito de aplicação inicial da Directiva 2003/87 o CO2, que representa mais de 80% das emissões de gases com efeito de estufa na Comunidade, e um número relativamente limitado de sectores económicos que contribuem de forma considerável para as emissões globais desse gás com efeito de estufa. O âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 assim determinado cobre actualmente cerca de 10000 instalações, que representam quase metade das emissões de CO2 ao nível comunitário e, por conseguinte, importantes fontes pontuais de emissões desse gás.

    51

    Os critérios de escolha que conduzem a incluir ou não certos sectores no âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 devem, por conseguinte, ser apreciados à luz das considerações expostas.

    52

    Um dos critérios objectivos essenciais para determinar o âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 foi o nível das emissões directas de CO2 de um determinado sector. Referindo-se a um relatório intitulado «Economic Evaluation of Sectoral Emission Reduction Objectives for Climate Change. Top-Down Analysis of Greenhouse Gas Emission Reduction Possibilities in the EU, Final Report, March 2001», elaborado por P. Capros, N. Kouvaritakis e L. Mantzos, o Parlamento, o Conselho e a Comissão observam que, em 1990, as emissões de CO2 ascenderam, respectivamente, a 174,8 milhões de toneladas no sector siderúrgico, a 26,2 milhões de toneladas no sector químico e a 16,2 milhões de toneladas no sector dos metais não ferrosos.

    53

    Quanto ao sector químico, as referidas instituições alegam ainda que o grande número de instalações abrangidas por esse sector, mais precisamente cerca de 34000, teria agravado consideravelmente a complexidade administrativa do sistema de comércio de licenças de emissão na sua fase inicial. Ora, a exequibilidade administrativa também constitui um critério legítimo para apreciar a oportunidade de uma acção legislativa.

    54

    Acresce que, pelo menos num primeiro momento, qualquer diferença de tratamento era proporcionada e o legislador comunitário não ultrapassou os limites da ampla margem de apreciação de que dispunha na determinação do âmbito de aplicação do regime de comércio de licenças de emissão instituído. Desde o momento em que foi instaurado, esse regime incluiu os maiores emissores de CO2, os quais, dispondo de um número relativamente limitado de instalações fixas, eram os que estavam melhor preparados para lançar o referido sistema.

    55

    As recorrentes no processo principal alegam, fazendo referência a uma estatística do registo europeu das emissões de poluentes relativa ao ano de 2001, que o sector químico emite uma quantidade de CO2 substancialmente mais elevada do que a indicada pelo Parlamento, pelo Conselho e pela Comissão. Além disso, a inclusão no âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 das empresas químicas que emitem uma quantidade de CO2 superior a um determinado limiar, não colocava problemas no plano administrativo, dado que quase 59% das emissões globais de CO2 do sector químico provêm de apenas 96 instalações.

    56

    Quanto ao sector do alumínio, a sua exclusão do âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 de forma alguma foi objectivamente justificada pelo legislador comunitário. A quantidade de emissões directas não pode justificar a exclusão desse sector. Resulta do próprio estudo referido pelas instituições que apresentaram observações ao Tribunal de Justiça que o sector do alumínio emite 16,2 milhões de toneladas de CO2, ao passo que o sector da pasta de papel e do papel, incluído no âmbito de aplicação da Directiva 2003/87, apenas emite 10,6 milhões de toneladas desse gás com efeito de estufa.

    Apreciação do Tribunal

    57

    O Tribunal de Justiça reconheceu ao legislador comunitário, no exercício das competências que lhe são conferidas, um amplo poder de apreciação quando a sua acção implique escolhas de natureza política, económica e social e quando seja chamado a efectuar apreciações e avaliações complexas (v. acórdão de 10 de Janeiro de 2006, IATA e ELFAA, C-344/04, Colect., p. I-403, n.o 80). Além disso, quando é chamado a reestruturar ou a criar um sistema complexo, é-lhe permitido recorrer a uma abordagem por etapas (v., neste sentido, acórdãos de 29 de Fevereiro de 1984, Rewe-Zentrale, 37/83, Recueil, p. 1229, n.o 20; de 18 de Abril de 1991, Assurances du crédit/Conselho e Comissão, C-63/89, Colect., p. I-1799, n.o 11, e de 13 de Maio de 1997, Alemanha/Parlamento e Conselho, C-233/94, Colect., p. I-2405, n.o 43) e actuar, nomeadamente, em função da experiência adquirida.

    58

    Todavia, mesmo na presença desse poder, o legislador comunitário deve basear a sua escolha em critérios objectivos e adequados à finalidade prosseguida pela legislação em causa (v., neste sentido, acórdãos de 15 de Setembro de 1982, Kind/CEE, 106/81, Recueil, p. 2885, n.os 22 e 23, e Sermide, já referido, n.o 28), tendo em conta todos os elementos factuais e os dados técnicos e científicos disponíveis no momento da adopção do acto em questão (v., neste sentido, acórdão de 14 de Julho de 1998, Safety Hi-Tech, C-284/95, Colect., p. I-4301, n.o 51).

    59

    No exercício do seu poder de apreciação, o legislador comunitário deve, além do objectivo principal de protecção do ambiente, ter plenamente em conta os interesses em presença (v., a respeito de medidas no domínio agrícola, acórdãos de 10 de Março de 2005, Tempelman e van Schaijk, C-96/03 e C-97/03, Colect., p. I-1895, n.o 48, e de 12 de Janeiro de 2006, Agrarproduktion Staebelow, C-504/04, Colect., p. I-679, n.o 37). No âmbito do exame dos condicionalismos ligados a diferentes medidas possíveis, deve ter-se em conta que, embora a importância dos objectivos prosseguidos seja susceptível de justificar consequências económicas negativas, inclusivamente consideráveis, para determinados operadores (v., neste sentido, acórdãos de 13 de Novembro de 1990, Fedesa e o., C-331/88, Colect., p. I-4023, n.os 15 a 17, e de 15 de Dezembro de 2005, Grécia/Comissão, C-86/03, Colect., p. I-10979, n.o 96), o exercício do poder de apreciação do legislador comunitário não pode conduzir a resultados manifestamente menos adequados do que os decorrentes de outras medidas igualmente apropriadas para a prossecução desses objectivos.

    60

    No caso em apreço, é pacífico que, por um lado, o regime de comércio de licenças de emissão introduzido pela Directiva 2003/87 é um regime novo e complexo cuja implementação e funcionamento poderiam ter sido perturbados pelo envolvimento de um número demasiado elevado de participantes e que, por outro, a delimitação inicial do âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 foi ditada pelo objectivo de abarcar uma massa crítica de participantes necessária para a instauração desse regime.

    61

    Tendo em conta a novidade e a complexidade do referido regime, a delimitação inicial do âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 e a abordagem gradual adoptada, que se baseia, nomeadamente, na experiência adquirida na primeira fase da sua aplicação, no intuito de não perturbar a implementação desse regime, inscrevem-se na margem de apreciação de que dispunha o legislador comunitário.

    62

    A este respeito, cumpre observar que, embora o referido legislador pudesse legitimamente basear-se nessa abordagem gradual para instituir o regime de comércio de licenças de emissão, está obrigado, nomeadamente à luz dos objectivos da Directiva 2003/87 e da política comunitária no domínio do ambiente, a proceder à revisão das medidas instauradas, em especial no que se refere aos sectores abrangidos pela Directiva 2003/87, em intervalos razoáveis, conforme está, aliás, previsto no artigo 30.o desta directiva.

    63

    Todavia, como o advogado-geral observou em particular no n.o 48 das suas conclusões e tendo em conta o princípio da igualdade de tratamento, a margem de apreciação de que o legislador comunitário dispunha para seguir uma abordagem gradual não o podia dispensar de recorrer, para efeitos da determinação dos sectores que considerava aptos a ser incluídos desde o início no âmbito de aplicação da Directiva 2003/87, a critérios objectivos baseados em dados técnicos e científicos disponíveis no momento da adopção desta.

    64

    No que se refere, em primeiro lugar, ao sector químico, resulta da génese da Directiva 2003/87 que este sector abrange um número particularmente elevado de instalações, concretamente cerca de 34000, não só em função das emissões que produzem mas também em função do número de instalações actualmente incluídas no âmbito de aplicação da Directiva 2003/87, que é de cerca de 10000.

    65

    A inclusão desse sector no âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 teria, por conseguinte, dificultado a gestão e agravado os encargos administrativos do regime de comércio de licenças de emissão, pelo que não podia ser excluída a eventualidade de uma perturbação do funcionamento desse regime quando da sua aplicação, por efeito da referida inclusão. Acresce que o legislador comunitário pôde considerar que as vantagens da exclusão da totalidade do sector na fase inicial de aplicação do regime de comércio de licenças de emissão primavam sobre as vantagens da sua não inclusão, para efeitos da realização do objectivo da Directiva 2003/87. Resulta do exposto que o legislador comunitário fez prova bastante de que se baseou em critérios objectivos para excluir do âmbito de aplicação da Directiva 2003/87, na primeira fase de aplicação do regime de comércio de licenças de emissão, o sector químico na sua totalidade.

    66

    O argumento das recorrentes no processo principal segundo o qual a inclusão no âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 das empresas do referido sector que emitissem uma quantidade de CO2 superior a um determinado limiar não teria colocado problemas no plano administrativo não põe em causa a apreciação que precede.

    67

    Com efeito, a estatística que invocam diz respeito a dados relativos a «estabelecimentos», conforme resulta do artigo 1.o da Decisão 2000/479/CE da Comissão, de 17 de Julho de 2000, relativa à criação de um registo europeu das emissões de poluentes (EPER) nos termos do artigo 15.o da Directiva 96/61/CE do Conselho relativa à prevenção e controlo integrados da poluição (IPPC) (JO L 192, p. 36). Ora, um estabelecimento na acepção dessa decisão não constitui uma instalação na acepção da Directiva 2003/87, uma vez que resulta das definições constantes do anexo A 4 da referida decisão que um estabelecimento desse tipo é um «[c]omplexo industrial composto por uma ou mais instalações situadas no mesmo local, em que um operador realiza uma ou mais actividades do anexo I». Assim, os dados invocados pelas recorrentes no processo principal só dizem respeito a estabelecimentos, não precisando o número de instalações abrangidas.

    68

    Por conseguinte, os dados apresentados pelas recorrentes no processo principal em apoio do seu argumento acima referido não permitem ao Tribunal de Justiça verificar a alegação de que um pequeno número de instalações do sector químico era responsável por uma parte considerável das emissões globais de CO2 desse sector, pelo que o legislador comunitário devia tê-lo incluído parcialmente no âmbito de aplicação da Directiva 2003/87.

    69

    Face às considerações que precedem e tendo em conta a abordagem gradual em que se baseia a Directiva 2003/87, o tratamento diferenciado do sector químico em relação ao sector da siderurgia pode ser considerado justificado na primeira fase de aplicação do regime de comércio de licenças de emissão.

    70

    No atinente, em segundo lugar, ao sector dos metais não ferrosos, resulta do relatório científico mencionado no n.o 52 do presente acórdão, no qual, segundo as observações do Parlamento, do Conselho e da Comissão, o legislador comunitário se baseou para elaborar e adoptar a Directiva 2003/87, que, em 1990, as emissões directas desse sector ascenderam a 16,2 milhões de toneladas de CO2, ao passo que o sector siderúrgico emitiu 174,8 milhões de toneladas deste gás.

    71

    Tendo em conta a sua intenção de delimitar o âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 de modo a não perturbar a exequibilidade administrativa do regime de comércio de licenças de emissão na sua fase inicial, em razão do envolvimento de um número demasiado elevado de participantes, o legislador comunitário não estava obrigado a recorrer exclusivamente ao meio consistente em introduzir, para cada sector da economia emissor de CO2, um limiar de emissão, com vista a realizar o objectivo prosseguido. Assim, em circunstâncias como as que presidiram à adopção da Directiva 2003/87, o legislador podia, quando da introdução desse regime, delimitar validamente o âmbito dessa directiva por via de uma abordagem sectorial, sem exceder os limites do poder de apreciação de que dispunha.

    72

    A diferença do nível de emissões directas entre os dois sectores em causa é de tal forma substancial que o tratamento diferenciado desses sectores pode, na primeira fase de aplicação do regime de comércio de licenças de emissão e atenta a abordagem gradual em que se baseia a Directiva 2003/87, ser considerado justificado, sem que exista a necessidade de o legislador comunitário tomar em consideração as emissões indirectas imputáveis aos diferentes sectores.

    73

    Por conseguinte, há que concluir que o legislador comunitário não violou o princípio da igualdade de tratamento, submetendo a um tratamento diferenciado situações comparáveis, ao excluir do âmbito de aplicação da Directiva 2003/87 o sector químico e o sector dos metais não ferrosos.

    74

    Tendo em conta as considerações que precedem, cumpre responder à questão colocada que o exame da Directiva 2003/87 à luz do princípio da igualdade de tratamento não revelou elementos susceptíveis de afectar a sua validade na medida em que submete o sector siderúrgico ao regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa, mas não inclui no âmbito de aplicação deste regime o sector químico e o sector dos metais não ferrosos.

    Quanto às despesas

    75

    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

     

    O exame da Directiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Directiva 96/61/CE do Conselho, conforme alterada pela Directiva 2004/101/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Outubro de 2004, à luz do princípio da igualdade de tratamento não revelou elementos susceptíveis de afectar a sua validade na medida em que submete o sector siderúrgico ao regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa, mas não inclui no âmbito de aplicação deste regime o sector químico e o sector dos metais não ferrosos.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: francês.

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