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Document 62006CO0492

Despacho do Tribunal de Justiça (Sexta Secção) de 4 de Outubro de 2007.
Consorzio Elisoccorso San Raffaele contra Elilombarda Srl e Azienda Ospedaliera Ospedale Niguarda Ca’ Granda di Milano.
Pedido de decisão prejudicial: Consiglio di Stato - Itália.
Contratos públicos - Directiva 89/665/CEE) - Processo de recurso em matéria de adjudicação de contratos públicos - Pessoas às quais os processos de recurso podem ser acessíveis - Associação temporária proponente - Direito de cada um dos membros de uma associação temporária interpor um recurso individualmente.
Processo C-492/06.

Colectânea de Jurisprudência 2007 I-08189

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2007:583

Processo C‑492/06

Consorzio Elisoccorso San Raffaele

contra

Elilombarda Srl

e

Azienda Ospedaliera Ospedale Niguarda Ca’ Granda di Milano

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Consiglio di Stato)

«Contratos públicos – Directiva 89/665/CEE – Processo de recurso em matéria de adjudicação de contratos públicos – Pessoas que podem ter acesso aos processos de recurso – Associação temporária concorrente – Direito de cada um dos membros de uma associação temporária interpor individualmente recurso»

Despacho do Tribunal de Justiça (Sexta Secção) de 4 de Outubro de 2007 

Sumário do despacho

Aproximação das legislações – Processos de recurso em matéria de adjudicação de contratos de direito público de fornecimentos e de obras – Directiva 89/665

(Directiva 89/665 do Conselho, artigo 1.°)

O artigo 1.° da Directiva 89/665, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos, alterada pela Directiva 92/50, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que, segundo o direito nacional, um dos membros de uma associação temporária sem personalidade jurídica que tenha participado, enquanto tal, num processo de adjudicação de um contrato público e à qual o referido contrato não tenha sido adjudicado, possa interpor, a título individual, um recurso da decisão de adjudicação deste.

(cf. n.° 31, disp.)







DESPACHO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção)

4 de Outubro de 2007 (*)

«Contratos públicos – Directiva 89/665/CEE – Processo de recurso em matéria de adjudicação de contratos públicos – Pessoas que podem ter acesso aos processos de recurso – Associação temporária concorrente – Direito de cada um dos membros de uma associação temporária interpor individualmente recurso»

No processo C‑492/06,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Consiglio di Stato (Itália), por decisão de 21 de Fevereiro de 2006, entrado no Tribunal de Justiça em 28 de Novembro de 2006, no processo

Consorzio Elisoccorso San Raffaele,

contra

Elilombarda Srl,

Azienda Ospedaliera Ospedale Niguarda Ca’ Granda di Milano,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

composto por: P. Kūris, presidente de secção, L. Bay Larsen (relator) e J.‑C. Bonichot, juízes,

advogado‑geral: Y. Bot,

secretário: R. Grass,

propondo‑se o Tribunal de Justiça decidir, por meio de despacho fundamentado, em conformidade com o disposto no artigo 104.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do seu Regulamento de Processo,

ouvido o advogado‑geral,

profere o presente

Despacho

1       O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 1.° da Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos (JO L 395, p. 33), alterada pela Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992 (JO L 209, p. 1, a seguir «Directiva 89/665»).

2       Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre o Consorzio Elisoccorso San Raffaele (a seguir «Consorzio») e a Elilombarda Srl (a seguir «Elilombarda»), líder de uma associação temporária em vias de constituição, acerca de um processo de adjudicação de um contrato público.

 Quadro jurídico

 Regulamentação comunitária

3       O artigo 1.° da Directiva 89/665 dispõe:

«1.      Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para garantir que, no que se refere aos processos de adjudicação abrangidos pelo âmbito de aplicação das Directivas 71/305/CEE, 77/62/CEE e 92/50/CEE […], as medidas necessárias para garantir que as decisões tomadas pelas entidades adjudicantes possam ser objecto de recursos eficazes e, sobretudo, tão rápidos quanto possível, nas condições previstas nos artigos seguintes e, [nomeadamente], no n.° 7, do artigo 2.°, com o fundamento de que essas decisões tenham violado o direito comunitário em matéria de contratos públicos ou as regras nacionais que transpõem esse direito. […]

3.      Os Estados‑Membros garantirão que os processos de recurso sejam acessíveis, de acordo com as regras que os Estados‑Membros podem determinar, pelo menos a qualquer pessoa que esteja ou tenha estado interessada em obter um determinado contrato de fornecimento público ou de obras públicas e que tenha sido ou possa vir a ser lesada por uma alegada violação. Os Estados‑Membros podem, em particular, exigir que a pessoa que pretenda utilizar tal processo tenha informado, previamente, a entidade adjudicante da alegada violação e da sua intenção de interpor recurso.»

4       O artigo 2.°, n.° 1, desta directiva prevê:

«1.      Os Estados‑Membros velarão por que as medidas tomadas para os efeitos dos recursos referidos no artigo 1.° prevejam os poderes que permitam:

[…]

b)      anular ou fazer anular as decisões ilegais, incluindo suprimir as especificações técnicas, económicas ou financeiras discriminatórias que constem dos documentos do concurso, dos cadernos de encargos ou de qualquer outro documento relacionado com o processo de adjudicação do contrato em causa;

[…]»

5       Nos termos do artigo 26.°, n.° 1, da Directiva 92/50:

«As propostas podem ser apresentadas por agrupamentos de prestadores de serviços. Não se pode exigir que estes grupos tenham uma determinada forma jurídica para efeitos de apresentação da proposta; no entanto, o agrupamento escolhido poderá ser obrigado a fazê‑lo quando lhe for atribuído o contrato.»

 Legislação nacional

6       A legislação nacional em matéria de adjudicação de contratos públicos de obras, de fornecimentos e de serviços [v., respectivamente, lei n.° 109, de 11 de Fevereiro de 1994 (GURI n.° 41, de 19 de Fevereiro de 1994), Decreto legislativo n.° 358, de 24 de Julho de 1992 (GURI n.° 188, de 11 de Agosto de 1992), e Decreto legislativo n.° 157, de 17 de Março de 1995 (GURI n.° 104, de 6 de Maio de 1995)], não exclui nem limita a faculdade de as diferentes empresas que fazem parte de uma «associação temporária» ou de um «agrupamento de empresas» de actuarem judicialmente a título individual.

7       Segundo jurisprudência assente do Consiglio di Stato, as empresas que são membros de uma associação temporária ou de um agrupamento de empresas têm o direito de impugnar individualmente os actos que dizem respeito ao contrato público no qual participaram.

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

8       Em 30 de Novembro de 2004, a Azienda Ospedaliera Niguarda Ca’ Granda di Milano publicou, enquanto entidade adjudicante, um anúncio de concurso que tinha por objecto, nomeadamente, um serviço de socorro aéreo por helicóptero, no montante de 25 900 000 euros.

9       Foram apresentadas duas propostas. A primeira pela Elilombarda, na qualidade de líder de uma associação temporária em vias de constituição entre ela própria e a Helitalia SpA, a segunda pelo Consorzio, composto pela Elilario Italia SpA e pela Air Viaggi San Raffaele Srl.

10     Em 28 de Abril de 2005, a entidade adjudicante atribuiu o contrato ao Consorzio, ao qual a decisão foi notificada em 10 de Maio de 2005.

11     A Elilombarda interpôs um recurso desta decisão, entre outras, em seu nome próprio e a título individual, no Tribunale amministrativo regionale della Lombardia (a seguir «TAR Lombardia»).

12     No âmbito deste processo, o Consórcio suscitou uma questão prévia de inadmissibilidade, alegando que o recurso foi interposto não pela associação temporária em vias de constituição, que, em sua opinião, era a única habilitada a actuar judicialmente para a protecção do seu interesse em ser adjudicatária do contrato, mas por um dos operadores económicos que formam esta associação.

13     Referindo‑se à jurisprudência do Consiglio di Stato, o TAR Lombardia considerou improcedente a questão prévia de inadmissibilidade e, dando provimento ao recurso, anulou as medidas adoptadas pela entidade adjudicante.

14     O Consorzio interpôs recurso para o Consiglio di Stato que, a título preliminar, deve examinar a decisão do TAR Lombardia relativa à admissibilidade do recurso interposto pela Elilombarda.

15     Na sua decisão de reenvio o Consiglio di Stato sublinha, por um lado, que a legislação nacional em matéria de adjudicação de contratos públicos não exclui nem limita a faculdade de as diferentes empresas que fazem parte de uma associação actuarem judicialmente a título individual e, por outro, que o TAR Lombardia aplicou efectivamente os princípios consagrados a este respeito pela sua jurisprudência.

16     Todavia, interroga‑se, tendo em conta o que o Tribunal de Justiça decidiu no seu acórdão de 8 de Setembro de 2005, Espace Trianon e Sofibail (C‑129/04, Colect., p. I‑7805), se o artigo 1.° da Directiva 89/665 se opõe a um recurso interposto, a título individual, por um dos membros de uma associação temporária de uma decisão de adjudicação de um contrato.

17     Neste contexto, o Consiglio di Stato decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 1.° da Directiva 89/665/CEE […] deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que, segundo o direito nacional, o recurso de uma decisão de adjudicação de um contrato possa ser interposto, a titulo individual, por um dos membros de uma associação temporária sem personalidade jurídica que tenha participado, enquanto tal, num processo de adjudicação de um contrato público e à qual o referido contrato não tenha sido adjudicado?»

 Quanto à questão prejudicial

18     Nos termos do artigo 104.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, quando a resposta a uma questão prejudicial possa ser claramente deduzida da jurisprudência, o Tribunal de Justiça pode, depois de ouvir o advogado‑geral, a qualquer momento, decidir por meio de despacho fundamentado.

19     Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o artigo 1.° da Directiva 89/665 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que, segundo o direito nacional, um dos membros de uma associação temporária sem personalidade jurídica que tenha participado, enquanto tal, num processo de adjudicação de um contrato público e à qual o referido contrato não tenha sido adjudicado, possa interpor, a título individual, um recurso da decisão de adjudicação deste.

20     A este respeito, há que recordar que, por força do artigo 1.°, n.° 3, da referida directiva, os Estados‑Membros são obrigados a assegurar que os processos de recurso previstos por esta são acessíveis, «pelo menos», a qualquer pessoa que esteja ou tenha estado interessada em obter um determinado contrato público e que tenha sido ou possa vir a ser lesada por uma alegada violação do direito comunitário em matéria de contratos públicos ou de regras nacionais que transpõem este direito.

21     Daqui decorre que a Directiva 89/665 apenas prevê as condições mínimas que devem ser preenchidas pelos processos de recurso existentes nas ordens jurídicas nacionais, a fim de garantir o respeito das normas de direito comunitário em matéria de contratos públicos (v. acórdão de 19 de Junho de 2003, GAT, C‑315/01, Colect., p. I‑6351, n.° 45 e jurisprudência citada).

22     No seu acórdão Espace Trianon e Sofibail, já referido, o Tribunal de Justiça interpretou o artigo 1.° da Directiva 89/665 para efeitos da sua aplicação a uma situação na qual a ordem jurídica interna exigia que um recurso de anulação de uma decisão de adjudicação de um contrato público fosse interposto por todos os membros que formavam uma associação temporária.

23     Referindo‑se a uma situação como a que é objecto das questões prejudiciais que lhe foram submetidas, o Tribunal de Justiça salientou, nos n.os 19 a 21 desse acórdão, que:

–       uma associação temporária podia ser considerada uma pessoa que tem interesse em obter a adjudicação de um contrato público na acepção do artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 89/665, uma vez que, tendo apresentado uma proposta no concurso público em causa, tinha demonstrado o seu interesse em obter a adjudicação do contrato e que

–       nada se opunha, no processo principal, a que os membros da associação temporária interpusessem conjuntamente, na qualidade de associados ou em nome próprio, um recurso de anulação das decisões controvertidas.

24     O Tribunal de Justiça concluiu assim, no n.° 22 do referido acórdão, que a regra processual em causa não limitava o acesso a tais recursos de uma forma contrária ao artigo 1.°, n.° 3, da Directiva 89/665.

25     Consequentemente, o Tribunal de Justiça decidiu que o artigo 1.° da referida directiva não se opõe a que, segundo o direito nacional de um Estado‑Membro, apenas a totalidade dos membros de uma associação temporária sem personalidade jurídica que tenha participado, enquanto tal, num processo de adjudicação de um contrato público e à qual o referido contrato não tenha sido adjudicado, possa interpor um recurso da decisão de adjudicação deste.

26     Ao decidir neste sentido, como salientaram com razão a Elilombarda e a Comissão das Comunidades Europeias nas suas observações escritas, o Tribunal de Justiça apenas determinou, tendo em consideração as circunstâncias próprias do litígio no processo principal, um limiar mínimo de acesso aos recursos em matéria de concursos, garantido pela Directiva 89/665.

27     O Tribunal de Justiça de modo algum excluiu que outros Estados‑Membros possam, no seu direito nacional, conceder um acesso mais vasto aos referidos recursos, consagrando um conceito de legitimidade mais amplo do que o mínimo garantido pela referida directiva.

28     Com efeito, na falta de uma disposição específica desta, competente à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro determinar, em particular, se e em que condições a legitimidade em matéria de recursos pode ser alargada às empresas que fazem parte de uma associação que participou num concurso enquanto tal.

29     A este respeito, há que precisar que, estando em causa modalidades processuais de recursos judiciais destinados a garantir a protecção dos direitos conferidos pelo direito comunitário aos candidatos e aos concorrentes lesados por decisões de entidades adjudicantes, estas não devem pôr em causa o efeito útil da Directiva 89/665 (v. acórdão de 12 de Dezembro de 2002, Universale‑Bau e o., C‑470/99, Colect., p. I‑11617, n.° 72), cujo objectivo é garantir que as decisões ilegais das entidade adjudicantes possam ser objecto de recursos eficazes e tão rápidos quanto possível.

30     Todavia, diferentemente do que alega o Governo cipriota, uma interpretação do artigo 1.° da referida directiva que permita alargar a legitimidade judicial a cada um dos membros de uma associação temporária que tenha participado num processo de adjudicação de um contrato público não compromete este objectivo, afigurando‑se, pelo contrário, susceptível de contribuir para a sua realização.

31     Por conseguinte, há que responder à questão colocada que o artigo 1.° da Directiva 89/665 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que, segundo o direito nacional, um dos membros de uma associação temporária sem personalidade jurídica que tenha participado, enquanto tal, num processo de adjudicação de um contrato público e à qual o referido contrato não tenha sido adjudicado, possa interpor, a título individual, um recurso da decisão de adjudicação deste.

 Quanto às despesas

32     Revestindo o processo, quanto às partes no processo principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sexta Secção) declara:

O artigo 1.° da Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos, alterada pela Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que, segundo o direito nacional, um dos membros de uma associação temporária sem personalidade jurídica que tenha participado, enquanto tal, num processo de adjudicação de um contrato público e à qual o referido contrato não tenha sido adjudicado, possa interpor, a título individual, um recurso da decisão de adjudicação deste.

Assinaturas


* Língua do processo: italiano.

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