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Document 62006CJ0055

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 24 de Abril de 2008.
Arcor AG & Co. KG contra Bundesrepublik Deutschland.
Pedido de decisão prejudicial: Verwaltungsgericht Köln - Alemanha.
Telecomunicações - Regulamento (CE) n.º 2887/2000 - Acesso ao lacete local - Princípio da fixação das tarifas com base numa orientação para os custos - Custos - Juros relativos ao capital investido - Amortizações dos activos imobilizados - Avaliação das infra-estruturas locais de telecomunicações - Custos actuais e custos históricos - Base de cálculo - Custos reais - Custos históricos e custos previsionais - Justificação dos custos - Modelo analítico ascendente e descendente - Regulamentação nacional pormenorizada - Margem de apreciação das autoridades reguladoras nacionais - Fiscalização judicial - Autonomia processual dos Estados-Membros - Princípios de equivalência e de efectividade - Impugnação judicial das decisões de autorização das tarifas do operador notificado pelos beneficiários - Ónus da prova - Procedimento de supervisão e processo jurisdicional.
Processo C-55/06.

Colectânea de Jurisprudência 2008 I-02931

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2008:244

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

24 de Abril de 2008 ( *1 )

«Telecomunicações — Regulamento (CE) n.o 2887/2000 — Acesso ao lacete local — Princípio da fixação das tarifas com base numa orientação para os custos — Custos — Juros relativos ao capital investido — Amortizações dos activos imobilizados — Avaliação das infra-estruturas locais de telecomunicações — Custos actuais e custos históricos — Base de cálculo — Custos reais — Custos históricos e custos previsionais — Justificação dos custos — Modelo analítico ascendente e descendente — Regulamentação nacional pormenorizada — Margem de apreciação das autoridades reguladoras nacionais — Fiscalização judicial — Autonomia processual dos Estados-Membros — Princípios da equivalência e da efectividade — Impugnação judicial das decisões de autorização das tarifas do operador notificado pelos beneficiários — Ónus da prova — Procedimento de supervisão e processo jurisdicional»

No processo C-55/06,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.o CE, apresentado pelo Verwaltungsgericht Köln (Alemanha), por decisão de 26 de Janeiro de 2006, entrado no Tribunal de Justiça em 2 de Fevereiro de 2006, no processo

Arcor AG & Co. KG,

contra

Bundesrepublik Deutschland,

sendo interveniente:

Deutsche Telekom AG,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente de secção, G. Arestis (relator), R. Silva de Lapuerta, E. Juhász e T. von Danwitz, juízes,

advogado-geral: M. Poiares Maduro,

secretário: C. Strömholm, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 21 de Março de 2007,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Arcor AG & Co. KG, por K. Kleinlein, Rechtsanwalt e G. Metaxas, dikigoros,

em representação da Bundesrepublik Deutschland, por M. Deutsch, Rechtsanwalt,

em representação da Deutsche Telekom AG, por F. Hölscher e U. Karpenstein, Rechtsanwälte,

em representação do Governo alemão, por M. Lumma e C. Schulze-Bahr, na qualidade de agentes,

em representação do Governo lituano, por D. Kriaučiūnas, na qualidade de agente,

em representação do Governo neerlandês, por H. G. Sevenster e P. van Ginneken, na qualidade de agentes,

em representação do Governo austríaco, por C. Pesendorfer, na qualidade de agente,

em representação do Governo do Reino Unido, por C. Gibbs e G. Peretz, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por G. Braun e M. Shotter, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 18 de Julho de 2007,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 1.o, n.o 4, 3.o, n.o 3, e 4.o, n.os 1 a 3, do Regulamento (CE) n.o 2887/2000 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2000, relativo à oferta de acesso desagregado ao lacete local (JO L 336, p. 4).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Arcor AG & Co. KG (a seguir «Arcor») à Bundesrepublik Deutschland, relativamente a uma autorização parcial das tarifas da Deutsche Telekom AG (a seguir «Deutsche Telekom») para o acesso ao lacete local.

Quadro jurídico

Regulamentação comunitária

Regulamento n.o 2887/2000

3

O quinto, sexto, décimo primeiro e décimo terceiro a décimo quinto considerandos do Regulamento n.o 2887/2000 enunciam o seguinte:

«(5)

A oferta directa de novos lacetes em fibra óptica de elevada capacidade aos principais utilizadores constitui um mercado específico, que está a desenvolver-se em condições de concorrência, com novos investimentos. O presente regulamento refere-se, por conseguinte, ao acesso aos lacetes locais metálicos, sem prejuízo das obrigações nacionais no que se refere a outros tipos de acesso às infra-estruturas locais.

(6)

Não seria economicamente viável para os novos operadores duplicar toda a infra-estrutura de acesso local em fio metálico do operador histórico num prazo razoável. As infra-estruturas alternativas, como a televisão por cabo, os satélites e os lacetes locais sem fios não oferecem de momento a mesma funcionalidade nem a mesma ubiquidade, embora as situações dos diferentes Estados-Membros possam variar.

[…]

(11)

As regras de determinação dos custos e de tarifação das linhas de assinante e recursos conexos deverão ser transparentes, não-discriminatórias e objectivas, para garantir a equidade. As regras de tarifação devem possibilitar ao fornecedor do lacete local a cobertura dos custos pertinentes incorridos e a obtenção de um lucro razoável, de modo a garantir o desenvolvimento a longo prazo e a modernização das infra-estruturas de acesso local. As regras de tarifação devem igualmente promover uma concorrência equitativa e sustentável, sem perder de vista a necessidade do investimento em infra-estruturas alternativas, e garantir que não haja distorções da concorrência, nomeadamente uma compressão das margens entre os preços dos serviços por grosso e a retalho do operador notificado. É importante que as autoridades responsáveis pela concorrência sejam consultadas a este respeito.

[…]

(13)

Na Recomendação 2000/417/CE, de 25 de Maio de 2000, sobre o acesso separado à linha de assinante: permitir o fornecimento concorrencial de uma ampla gama de serviços de comunicações electrónicas, incluindo serviços multimédia de banda larga e Internet de elevado débito (JO L 156, p. 44), e na Comunicação de 26 de Abril de 2000 (JO C 272, p. 55), a Comissão forneceu orientações detalhadas com o objectivo de assistir as autoridades reguladoras nacionais na regulação equitativa das diferentes formas de oferta de acesso desagregado ao lacete local.

(14)

De acordo com o princípio da subsidiariedade consagrado no artigo 5.o do Tratado, o objectivo de assegurar um quadro harmonizado para a oferta de acesso desagregado ao lacete local a fim de possibilitar o fornecimento de uma infra-estrutura de comunicações de classe mundial e a preços moderados e de uma ampla gama de serviços às empresas e cidadãos na Comunidade não pode ser realizado pelos Estados-Membros de forma segura, harmonizada e atempada, podendo, pois, ser melhor alcançado pela Comunidade. De acordo com o princípio da proporcionalidade consagrado no mesmo artigo, as disposições do presente regulamento não excedem o necessário para atingir esse objectivo. Estas disposições são adoptadas sem prejuízo de disposições nacionais conformes com o direito comunitário que estabeleçam medidas mais pormenorizadas […]

(15)

O presente regulamento vem complementar o quadro regulamentar das telecomunicações, em especial as Directivas 97/33/CE e 98/10/CE; […]»

4

O artigo 1.o deste regulamento, intitulado «Objectivo e âmbito de aplicação», tem a seguinte redacção:

«1.   O presente regulamento tem por objectivo intensificar a concorrência e estimular a inovação tecnológica no mercado do acesso local, através do estabelecimento de condições harmonizadas para o acesso desagregado ao lacete local, de forma a incentivar a competitividade na prestação de uma vasta gama de serviços de comunicações electrónicas.

2.   O presente regulamento aplica-se ao acesso desagregado ao lacete local e recursos conexos dos operadores notificados tal como definidos na alínea a) do artigo 2.o

[…]

4.   O presente regulamento não prejudica os direitos dos Estados-Membros de manterem ou introduzirem medidas conformes com o direito comunitário que integrem disposições mais pormenorizadas que as do presente diploma e/ou que extravasem do seu âmbito de aplicação, nomeadamente no que se refere a outros tipos de acesso a infra-estruturas locais.»

5

Nos termos do artigo 2.o do referido regulamento, entende-se por:

«a)

‘Operador notificado’, o operador de redes telefónicas públicas fixas designado pelas autoridades reguladoras nacionais [a seguir ‘ARN’] como tendo poder de mercado significativo no mercado de oferta de serviços e redes telefónicas públicas fixas nos termos do anexo 1, parte 1, da Directiva 97/33/CE ou da Directiva 98/10/CE;

b)

‘Beneficiário’, um terceiro devidamente autorizado nos termos da Directiva 97/13/CE ou habilitado a prestar serviços de comunicações ao abrigo da legislação nacional e que seja elegível para efeitos de acesso desagregado ao lacete local;

c)

‘Lacete local’, o circuito físico em pares de condutores metálicos entrançados que liga o ponto terminal da rede nas instalações do assinante ao repartidor principal ou a uma instalação equivalente da rede telefónica pública fixa;

[…]»

6

O artigo 3.o, n.os 2 e 3, do Regulamento n.o 2887/2000, intitulado «Oferta de acesso desagregado», dispõe:

«2.   A partir de 31 de Dezembro de 2000, os operadores notificados devem dar resposta aos pedidos razoáveis de acesso desagregado aos lacetes locais e recursos conexos, em condições transparentes, equitativas e não discriminatórias. Os pedidos dos beneficiários só podem ser recusados com base em critérios objectivos relacionados com a exequibilidade técnica ou com a necessidade de manter a integridade da rede. Sempre que o acesso for recusado, a parte afectada pode iniciar o processo de resolução de litígios referido no n.o 5 do artigo 4.o Os operadores notificados devem facultar aos beneficiários recursos equivalentes aos que facultam aos seus próprios serviços ou às empresas suas associadas, nas mesmas condições e nos mesmos prazos.

3.   Sem prejuízo do n.o 4 do artigo 4.o, os operadores notificados devem aplicar preços de acesso desagregado ao lacete local e aos recursos conexos fixados com base numa orientação para os custos.»

7

O artigo 4.o deste regulamento, intitulado «Supervisão pela [ARN]», prevê:

«1.   [A ARN] deve assegurar que os preços para o acesso desagregado ao lacete local favoreçam o estabelecimento de uma concorrência leal e sustentável.

2.   [A ARN] deve ser competente para:

a)

Impor modificações à oferta de referência para o acesso desagregado ao lacete local e recursos conexos, incluindo os preços, sempre que tais modificações se justifiquem; e

b)

Exigir que os operadores notificados prestem as informações pertinentes para a aplicação do presente regulamento.

3.   [A ARN] pode intervir, sempre que se justifique, por sua própria iniciativa para garantir a não discriminação, a concorrência leal, a eficiência económica e o máximo benefício para os utilizadores.

4.   Quando [a ARN] determinar que o mercado do acesso local é suficientemente competitivo, deverá desonerar os operadores notificados da obrigação estabelecida no n.o 3 do artigo 3.o de fixarem preços orientados para os custos.

5.   Os litígios entre operadores relacionados com as matérias abrangidas pelo presente regulamento ficam sujeitos aos processos nacionais de resolução de litígios estabelecidos em conformidade com a Directiva 97/33/CE e devem ser objecto de um tratamento rápido, equitativo e transparente.»

Antigo quadro regulamentar em matéria de telecomunicações (a seguir «AQR»)

— Directiva 90/387/CEE

8

A Directiva 90/387/CEE do Conselho, de 28 de Junho de 1990, relativa à realização do mercado interno dos serviços de telecomunicações mediante a oferta de uma rede aberta de telecomunicações (JO L 192, p. 1), na redacção dada pela Directiva 97/51/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Outubro de 1997 (JO L 295, p. 23, a seguir «Directiva 90/387»), aplicável à data dos factos no processo principal, diz respeito, segundo o seu artigo 1.o, n.o 1, à harmonização das condições para um acesso e uma utilização abertos e eficientes em matéria de redes públicas de telecomunicações e, eventualmente, dos serviços públicos de telecomunicações.

9

Segundo o artigo 2.o, n.o 8, desta directiva, entende-se por «condições de oferta de rede aberta»:

«as condições […] relativas ao acesso aberto e eficiente às redes públicas de telecomunicações e, em certos casos, aos serviços públicos de telecomunicações e à utilização eficiente dessas redes e serviços.

Sem prejuízo da sua aplicação caso a caso, as condições de oferta de rede aberta podem incluir condições harmonizadas relativamente ao seguinte:

interfaces técnicas, incluindo, sempre que necessário, a definição e a instalação de pontos terminais da rede,

condições de utilização,

princípios tarifários,

acesso às frequências e aos números/endereços/nomes, sempre que necessário, conforme o quadro de referência do anexo».

10

O artigo 3.o, n.o 1, da Directiva 90/387 estabelece que:

«As condições de oferta de uma rede aberta devem obedecer aos seguintes princípios fundamentais:

devem basear-se em critérios objectivos,

devem ser transparentes e publicadas de forma adequada,

devem garantir uma igualdade de acesso e não devem ser discriminatórias, nos termos do direito comunitário.»

11

O artigo 5.o-A, n.o 3, da referida directiva prevê o seguinte:

«Os Estados-Membros devem garantir a existência de mecanismos adequados ao nível nacional que confiram ao interessado afectado por uma decisão da [ARN] o direito de recorrer para um órgão independente das partes envolvidas.»

12

A Directiva 90/387 tem um anexo, intitulado «Quadro de referência para a aplicação das condições de oferta de rede aberta», cujo ponto 3, relativo aos princípios tarifários harmonizados, tem a seguinte redacção:

«Os princípios tarifários devem ser coerentes com os princípios enunciados no n.o 1 do artigo 3.o

Esses princípios implicam, nomeadamente, o seguinte:

as tarifas devem basear-se em critérios objectivos e, até que a concorrência tenha como efeito a manutenção de preços baixos para os utilizadores, devem orientar-se, em princípio, pelos custos, no pressuposto de que a fixação do nível tarifário real continuará a ser matéria da legislação nacional e não está sujeita às condições de oferta de rede aberta. A [ARN] competente pode dispensar da aplicação do requisito da orientação pelos custos um organismo que deixou de ter poder significativo de mercado relevante. Um dos objectivos deve ser a definição de princípios tarifários eficientes em toda a Comunidade, garantindo simultaneamente a prestação de um serviço geral a toda a população,

as tarifas devem ser transparentes e devidamente publicadas,

para dar aos utilizadores a possibilidade de escolherem entre os diferentes elementos do serviço, e na medida em que a tecnologia o permita, as tarifas devem ser suficientemente discriminadas, de acordo com as regras de concorrência do Tratado. Nomeadamente, as características suplementares introduzidas para oferecer determinados complementos de serviços específicos devem, regra geral, ser facturadas independentemente das características incluídas na oferta de base e do transporte propriamente dito,

as tarifas devem ser não discriminatórias e garantir a igualdade de tratamento, excepto no caso de restrições compatíveis com o direito comunitário.

Os encargos de acesso aos recursos ou serviços da rede devem respeitar os princípios acima enunciados e as regras de concorrência do Tratado bem como devem ter em conta o princípio da repartição equitativa dos custos globais dos recursos utilizados e a necessidade de uma taxa de remuneração razoável dos investimentos efectuados e, nos casos adequados, o financiamento do serviço universal de acordo com o disposto na Directiva ‘Interligação’.

Poderão existir diferentes tarifas, principalmente para ter em conta o excesso de tráfego em períodos de ponta e a ausência de tráfego durante os períodos vazios, desde que a diferença entre as tarifas seja comercialmente justificável e não colida com os princípios acima referidos.»

— Directiva 97/33/CE

13

A Directiva 97/33/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Junho de 1997, relativa à interligação no sector das telecomunicações com o objectivo de assegurar o serviço universal e a interoperabilidade através da aplicação dos princípios da oferta de rede aberta (ORA) (JO L 199, p. 32), aplicável à data dos factos no processo principal, prevê no seu décimo considerando o seguinte:

«Considerando que a fixação de preços para a interligação constitui um factor fundamental na determinação da estrutura e da intensidade da concorrência no processo de transformação num mercado liberalizado; que as organizações com um poder de mercado significativo devem poder demonstrar que os seus preços de interligação são fixados com base em critérios objectivos, respeitam os princípios da transparência e da orientação de custos e são suficientemente discriminados em termos de elementos de rede e de serviços oferecidos; que a publicação de uma lista de serviços, preços, termos e condições de interligação reforça as necessárias transparência e não discriminação; que deve ser possível uma flexibilidade dos métodos de fixação dos preços do tráfego de interligação, inclusive para a fixação de preços baseados na capacidade; que o nível de preços deve promover a produtividade e incentivar a entrada eficiente e sustentável no mercado e não deve ser inferior a um limite calculado através da utilização de custos incrementais de longo prazo e de métodos de afectação e imputação de custos baseados nos custos reais, nem superior a um limite estabelecido com base no custo específico de fornecimento da interligação em causa; considerando que taxas de interligação baseadas num nível de preços intimamente relacionado com os custos incrementais de longo prazo de fornecimento do acesso à interligação são adequadas para encorajar o rápido desenvolvimento de um mercado aberto e concorrencial.»

14

Nos termos do seu artigo 1.o, a Directiva 97/33 estabelece um quadro regulamentar que assegura na Comunidade Europeia a interligação das redes de telecomunicações e, em particular, a interoperabilidade dos serviços, assim como uma oferta de serviço universal num ambiente de mercados abertos e concorrenciais.

15

Nos termos do artigo 2.o desta directiva, entende-se por «interligação» a ligação física e lógica das redes de telecomunicações utilizadas por uma mesma organização ou por uma organização diferente, de modo a permitir aos utilizadores de uma organização comunicarem com os utilizadores da mesma ou de outra organização, ou acederem a serviços prestados por outra organização.

16

O artigo 7.o da referida directiva, intitulado «Princípios aplicáveis aos encargos de interligação e aos sistemas de contabilização dos custos», prevê o seguinte:

«[…]

2.   Os encargos de interligação seguirão os princípios da transparência e da orientação em função dos custos. A prova de que os encargos decorrem dos custos reais, incluindo uma taxa de compensação do investimento razoável, incumbe à organização que oferece a interligação às suas funcionalidades. […]

3.   As [ARN] assegurarão a publicação, nos termos do n.o 1 do artigo 14.o, de uma oferta de interligação de referência. A oferta de interligação de referência incluirá a descrição das interligações oferecidas, discriminadas segundo componentes de acordo com as necessidades do mercado, bem como as respectivas condições de oferta, incluindo tarifas.

Poderão ser estabelecidas diferentes tarifas, termos e condições de interligação para diferentes categorias de organizações autorizadas a fornecer redes e serviços sempre que tais diferenças possam ser objectivamente justificadas com base no tipo de interligação fornecida e/ou nas condições nacionais de licenciamento relevantes. As [ARN] deverão assegurar que tais diferenças não dêem origem a distorções de concorrência e, em especial, que a organização aplique tarifas, termos e condições de interligação adequadas ao facultar a interligação com os seus próprios serviços ou aos das suas empresas filiais ou associadas […]

A [ARN] terá a possibilidade de impor alterações à oferta de interligação de referência sempre que tais alterações se justifiquem.

O anexo IV contém uma lista de elementos exemplificativos que servem de ilustração à forma como poderão ser construídas as taxas de interligação, bem como as estruturas e elementos tarifários. Nos casos em que uma organização introduza alterações à oferta de interligação de referência publicada, as correcções que tenham sido exigidas pela [ARN] poderão ter efeitos retroactivos a contar da data de introdução da alteração.

[…]

5.   A Comissão elaborará […] recomendações sobre os sistemas de contabilidade de custos e separação de contas relativos à interligação. As [ARN] assegurarão que os sistemas de contabilização dos custos usados pelas organizações em causa sejam adequados à aplicação dos requisitos constantes do presente artigo e documentados de modo suficientemente pormenorizado, como indicado no anexo V.

As [ARN] assegurarão que, mediante pedido, seja apresentada ao requerente uma descrição do sistema de contabilização dos custos na qual sejam indicadas as principais categorias de custos e as regras aplicadas para a imputação destes últimos à interligação. A conformidade com o sistema de contabilização dos custos será verificada pela [ARN] ou outro organismo competente, independente da organização de telecomunicações e aprovado pela [ARN]. Será publicada anualmente uma declaração relativa à conformidade.

[…]»

17

O anexo IV da Directiva 97/33, intitulado «Lista dos elementos exemplificativos de cálculo das taxas de interligação», tem a seguinte redacção:

«As taxas de interligação são função das taxas efectivamente cobráveis às partes interligadas.

A estrutura das tarifas é função das grandes categorias em que as taxas de interligação se subdividem, como por exemplo:

taxas para cobertura da instalação inicial da interligação física, baseadas nos custos de fornecimento dos serviços específicos da interligação solicitada (por exemplo: equipamento e funcionalidades específicos, ensaio da compatibilidade),

taxas de aluguer para cobertura da utilização corrente do equipamento e outras funcionalidades (manutenção da conexão, etc.),

taxas variáveis por serviços adicionais e suplementares (por exemplo, acesso a serviços de listas, assistência de telefonista, recolha de dados, cobrança, facturação, serviços comutados e avançados, etc.),

taxas de tráfego pelo encaminhamento do tráfego de e para a rede interligada (por exemplo, custos de comutação e de transmissão), que podem ser aplicáveis por minuto e/ou em função da capacidade suplementar de rede necessária.

Os elementos de cálculo das tarifas são função do preço estabelecido para cada componente da rede ou outro serviço prestado à entidade interligada.

As tarifas e taxas de interligação têm de obedecer aos princípios de orientação e transparência de custos, conforme estabelecido no n.o 2 do artigo 7.o

[…]»

18

O anexo V da Directiva 97/33, intitulado «Sistemas de contabilização dos custos da interligação», indica, a título exemplificativo, alguns elementos que podem ser integrados no sistema de contabilização acima referido. Este anexo tem a seguinte redacção:

«O n.o 5 do artigo 7.o prevê a particularização do sistema de contabilização, indicando-se a título de exemplo, na lista que se segue, alguns dos elementos que podem ser integrados em tal sistema.

O objectivo da publicação destas informações é tornar transparente o cálculo das taxas de interligação, de modo a que outros intervenientes no mercado estejam em condições de confirmar que as taxas foram calculadas de forma razoável e adequada.

Este objectivo deve ser tomado em consideração pela [ARN] e pelas organizações afectadas na determinação do nível do pormenor das informações a publicar.

A lista abaixo indica os elementos a incluir nas informações publicadas.

1) Método de referência para a contabilização dos custos

Por exemplo, distribuição dos custos totais, custos incrementais médios a longo prazo, custos marginais, custos específicos, custos directos integrados, etc.,

incluindo a(s) base(s) de cálculo dos custos utilizada(s),

ou seja, custos históricos (baseados nas despesas efectivamente incorridas em equipamentos e sistemas) ou custos previsionais (baseados numa estimativa dos custos de substituição de equipamentos e sistemas).

2) Elementos de custos incluídos na tarifa de interligação

Identificação de todos os componentes individuais dos custos que constituem, no seu conjunto, as taxas de interligação, incluindo o elemento lucro.

3) Níveis e métodos de imputação de custos, nomeadamente o tratamento dos custos conjuntos e comuns

Elementos sobre o nível de análise dos custos directos e sobre o nível e método de inclusão dos custos conjuntos e comuns nas taxas de interligação.

4) Convenções contabilísticas

Ou seja, convenções contabilísticas utilizadas no tratamento dos custos e que abrangem:

o período de amortização para as principais categorias de elementos do activo imobilizado (por exemplo, terrenos, edifícios, equipamentos, etc.),

o tratamento, em termos de receitas/custos de capital, de outras rubricas importantes das despesas (por exemplo), sistemas e suportes lógicos informáticos, investigação e desenvolvimento, desenvolvimento de novas actividades, construções directas e indirectas, reparações e manutenção, encargos financeiros, etc.).

[…]»

— Directiva 98/10/CE

19

A Directiva 98/10/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Fevereiro de 1998, relativa à aplicação da oferta de rede aberta (ORA) à telefonia vocal e ao serviço universal de telecomunicações num ambiente concorrencial (JO L 101, p. 24), aplicável à data dos factos do processo principal, tem por objecto, segundo o seu artigo 1.o, a harmonização das condições de acesso e utilização, abertos e eficientes, das redes telefónicas públicas fixas e dos serviços telefónicos públicos fixos, num ambiente de mercados abertos e concorrenciais, de acordo com os princípios da oferta de rede aberta.

20

O artigo 17.o desta directiva, intitulado «Princípios tarifários», prevê:

«[…]

2.   As tarifas de utilização da rede telefónica pública fixa e dos serviços telefónicos públicos fixos respeitarão os princípios básicos da orientação em função dos custos, estabelecidos no anexo […] da Directiva 90/387/CEE.

3.   Sem prejuízo do n.o 3 do artigo 7.o da Directiva 97/33/CE ‘Interligação’, as tarifas de acesso e utilização da rede telefónica pública fixa serão independentes do tipo de aplicação escolhido pelos utilizadores, salvo se estes solicitarem serviços ou facilidades diferentes.

[…]»

21

O artigo 18.o, n.os 1 e 2, da referida directiva, intitulado «Princípios de contabilização dos custos», dispõe:

«1.   Os Estados-Membros garantirão que os sistemas de contabilização dos custos aplicados pelas organizações que, nos termos do artigo 17.o, tenham a obrigação de seguir o princípio da orientação em função dos custos no estabelecimento das suas tarifas sejam adequados à aplicação desse mesmo artigo e que a observância desses sistemas seja verificada por um organismo competente independente dessas organizações. As [ARN] garantirão que seja publicada anualmente uma declaração relativa àquela observância.

2.   As [ARN] assegurarão que seja posta à sua disposição, quando pedida, uma descrição dos sistemas de contabilização dos custos referidos no n.o 1 que evidencie as principais categorias de custos e as regras para a imputação de custos ao serviço de telefonia vocal. As [ARN] comunicarão à Comissão, a pedido desta, informações sobre os sistemas de contabilização dos custos aplicados pelas organizações em causa.»

— Recomendação 98/195/CE

22

Em 8 de Janeiro de 1998, a Comissão adoptou a Recomendação 98/195/CE relativa à interligação num mercado das telecomunicações liberalizado (Parte 1 — Determinação dos preços da interligação (JO L 73, p. 42).

— Recomendação 98/322/CE

23

Em 8 de Abril de 1998, a Comissão adoptou, nos termos do artigo 7.o, n.o 5, da Directiva 97/33, a Recomendação 98/322/CE relativa à interligação num mercado das telecomunicações liberalizado (Parte 2 — Separação de contas e contabilização dos custos) (JO L 141, p. 6).

— Recomendação 2000/417/CE

24

Em 25 de Maio de 2000, a Comissão adoptou a Recomendação 2000/417/CE sobre a oferta separada de acesso à linha de assinante: permitir o fornecimento concorrencial de uma ampla gama de serviços de comunicações electrónicas, incluindo serviços multimédia de banda larga e Internet de elevado débito (JO L 156, p. 44).

— Comunicação sobre o acesso separado à linha de assinante

25

Em 23 de Setembro de 2000, a Comissão publicou a Comunicação 2000/C 272/10 «Oferta separada de acesso à linha de assinante: permitir o fornecimento concorrencial de uma ampla gama de serviços de comunicações electrónicas, incluindo serviços multimédia de banda larga e internet de elevado débito».

Novo quadro regulamentar

26

Em 7 de Março de 2002, o Parlamento Europeu e o Conselho adoptaram quatro directivas relativas ao novo quadro regulamentar aplicável às comunicações electrónicas (a seguir o «NQR»), a saber, a Directiva 2002/19/CE relativa ao acesso e interligação de redes de comunicações electrónicas e recursos conexos (directiva «acesso») (JO L 108, p. 7), a Directiva 2002/20/CE relativa à autorização de redes e serviços de comunicações electrónicas (directiva «autorização») (JO L 108, p. 21), a Directiva 2002/21/CE relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações electrónicas («directiva-quadro») (JO L 108, p. 33), e a Directiva 2002/22/CE relativa ao serviço universal e aos direitos dos utilizadores em matéria de redes e serviços de comunicações electrónicas (directiva «serviço universal») (JO L 108, p. 51).

27

Os artigos 26.o e 28.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Directiva 2002/21 revogaram, designadamente, as Directivas 90/387, 97/33 e 98/10, com efeitos a partir de 25 de Julho de 2003.

28

Nos termos do artigo 19.o das Directivas 2002/19 e 2002/20, do artigo 29.o da Directiva 2002/21 e do artigo 39.o da Directiva 2002/22, as referidas directivas entram em vigor na data da sua publicação no Jornal Oficial das Comunidades Europeias, no caso, em 24 de Abril de 2002.

Legislação nacional

Lei das telecomunicações

29

O § 24 da Lei das telecomunicações (Telekommunikationsgesetz), de 25 de Julho de 1996 (BGBl. 1996 I, p. 1120, a seguir «TKG 1996»), na versão aplicável no processo principal, determina:

«(1)   As tarifas devem ser orientadas para os custos de uma prestação de serviços eficiente e devem corresponder às exigências estabelecidas no n.o 2. […]

(2)   As tarifas não podem

1.

conter suplementos que só se possam impor devido à posição dominante de um fornecedor no mercado de telecomunicações em causa, na acepção do § 19 da lei contra as restrições à concorrência,

2.

conter minorações que restrinjam as possibilidades concorrenciais de outras empresas num mercado de telecomunicações, ou

3.

conferir a alguns operadores vantagens relativamente a outros operadores que recorram a serviços de telecomunicações equivalentes ou similares no mercado de telecomunicações em causa,

salvo se for feita prova de um motivo objectivamente justificado.»

30

O § 27, n.o 1, da TKG 1996 prevê que a ARN autorize as tarifas, com base nos custos de uma prestação de serviços eficiente por cada prestação, ou com base no nível, por ela fixado, das taxas de evolução média das tarifas a pagar por um pacote de serviços. O n.o 4 da mesma disposição habilita o Governo federal a precisar, através de regulamentos, o regime dos tipos de autorização e a fixar as condições em que a ARN deve decidir qual dos procedimentos enunciados no n.o 1 se aplica.

Regulamento relativo às tarifas

31

O Regulamento relativo às tarifas no ramo das telecomunicações (Telekommunikations-Entgeltregulierungsverordnung), de 1 de Outubro de 1996 (BGBl. 1996 I, p. 1492, a seguir «TEntgV»), compreende, designadamente, as seguintes disposições:

«§ 2

(1)   A empresa que tenha apresentado o pedido de autorização das tarifas, referido no § 27, n.o 1, da TKG [1996] deve apresentar os seguintes documentos relativamente à prestação em causa em cada caso:

1.

uma descrição detalhada da prestação, incluindo dados relativos à sua qualidade, assim como um projecto das condições gerais;

2.

dados sobre o volume de negócios realizado nos cinco anos anteriores e sobre o volume de negócios previsto para o ano do pedido e para os quatro anos seguintes;

3.

dados sobre os volumes de vendas e, se possível, sobre a elasticidade dos preços da procura no período visado no ponto 2;

4.

dados sobre a evolução dos diferentes custos visados no n.o 2 (justificativos dos custos) e a evolução das margens sobre os custos variáveis no período visado no ponto 2;

5.

dados sobre o impacto financeiro para a clientela, no que se refere designadamente à estrutura da procura dos clientes privados e comerciais assim como para os concorrentes que recebem a prestação enquanto prestação prévia; e

6.

em caso de diferenciação das tarifas, dados sobre os efeitos para os grupos de utilizadores abrangidos pela diferenciação bem como uma justificação objectiva da diferenciação preconizada.

(2)   Os justificativos dos custos na acepção do ponto 4 do n.o 1 devem incluir os custos que possam ser directamente atribuídos à prestação (custos específicos) e os custos que não possam ser directamente atribuídos à prestação (custos gerais). No que respeita aos custos gerais, há que indicar e explicar de que forma são imputados às diferentes prestações. Para efectuar essa imputação, a empresa requerente deve ter em conta os critérios das directivas do Conselho adoptadas por força do artigo 6.o da Directiva 90/387/CEE do Conselho, de 28 de Junho de 1990, relativa à realização do mercado interno dos serviços de telecomunicações mediante a oferta de uma rede aberta de telecomunicações […]. Os justificativos dos custos na acepção da primeira frase devem ainda conter uma exposição:

1.

do método de avaliação dos custos;

2.

do montante dos custos com o pessoal, das amortizações, dos juros do capital aplicado e das despesas com os materiais;

3.

da utilização da capacidade projectada e atingida no período de referência; e

4.

dos recursos utilizados para prestar o serviço, que estão na base do cálculo dos custos, incluindo os preços correspondentes, e especialmente as partes da rede de telecomunicações pública e os custos do uso destas partes.

(3)   A [ARN] pode recusar um pedido de autorização de tarifas, quando a empresa não apresentar todos os documentos referidos nos n.os 1 e 2.

§ 3

(1)   A [ARN] deve examinar os justificativos apresentados pela empresa requerente, a fim de verificar se e em que medida as tarifas propostas são fixadas com base nos custos de uma prestação de serviços eficiente na acepção do n.o 2.

(2)   Os custos de uma prestação de serviços eficiente resultam dos custos suplementares, a longo prazo, da prestação e de um suplemento razoável pelos custos gerais gerados independentemente do volume da prestação, incluindo, em cada caso, uma remuneração razoável do capital investido, na medida em que estes custos sejam necessários a essa prestação.

(3)   No âmbito do exame a que se refere o n.o 1, a [ARN] deve, além disso, utilizar, a título comparativo, os preços e os custos de empresas que forneçam prestações equivalentes em mercados similares numa situação de concorrência. A este propósito, devem ser tomadas em conta as especificidades dos mercados de referência.

(4)   Na medida em que os custos justificados nos termos do disposto no § 2, n.o 2, excedam os custos da prestação de serviços eficiente referida no mesmo n.o 2, serão considerados despesas não necessárias para efeitos de uma prestação de serviços eficiente. Essas despesas, bem como outras despesas neutras, só serão tidas em conta no âmbito da autorização tarifária se — e enquanto — tal decorrer de uma obrigação legal para esse efeito, ou se a empresa requerente apresentar outra justificação objectiva.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

32

A Deutsche Telekom é um operador notificado de redes telefónicas públicas fixas, na acepção do Regulamento n.o 2887/2000.

33

A Arcor, anteriormente denominada Mannesmann Arcor AG & Co, é um beneficiário na acepção do mesmo regulamento e, a esse título, fornece, designadamente, ligações telefónicas ISDN a clientes finais. No entanto, estas ligações só podem ser utilizadas se a Arcor dispuser de um acesso desagregado ao respectivo lacete local na rede de telecomunicações da Deutsche Telekom.

34

Como resulta da decisão de reenvio, em 30 de Setembro de 1998, a Arcor celebrou com a Deutsche Telekom um primeiro contrato relativo ao acesso desagregado aos lacetes locais desta última.

35

Em 8 de Março de 1999, a Arcor apresentou à Comissão uma denúncia, nos termos do artigo 86.o do Tratado CE (actual artigo 82.o CE), contra a Deutsche Telekom, relativamente aos preços facturados por esta para o acesso às suas redes locais, comportando cada uma destas diversos lacetes locais para os assinantes.

36

Por decisão de 30 de Março de 2001, rectificada em 17 de Abril seguinte, a ARN, a saber, o Bundesnetzagentur (rede federal da electricidade, do gás, das telecomunicações, dos correios e dos caminhos de ferro), autorizou parcialmente as tarifas da Deutsche Telekom para o acesso desagregado ao seu lacete local (assinatura mensal para utilização da linha, despesas únicas de activação e de cancelamento), a partir de 1 de Abril de 2001, comportando estas tarifas numerosas variantes de acesso a preços diferentes. Segundo a decisão de reenvio, relativamente à assinatura mensal, a autorização expirava em 31 de Março de 2003 e, quanto ao demais, o mais tardar, em 31 de Março de 2002.

37

Em 30 de Abril de 2001, a Arcor interpôs recurso para o órgão jurisdicional competente, pedindo a anulação parcial da decisão de autorização acima referida, pelo facto de as tarifas autorizadas serem demasiado elevadas. A este respeito, alegou, designadamente, que o valor do investimento que constitui o lacete local foi avaliado de forma errada através da aplicação de um modelo analítico dos custos e do método das anuidades, sem ter em conta outros custos e despesas. Segundo a Arcor, esta avaliação permitiu calcular as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local, não com base nos custos da rede existente mas com base em custos fictícios relativos à implementação de uma nova rede local.

38

Através da Decisão 2003/707/CE da Comissão, de 21 de Maio de 2003, relativa a um processo de aplicação do artigo 82.o do Tratado CE (Processos COMP/C-1/37.451, 37.578, 37.579 — Deutsche Telekom AG) (JO L 263, p. 9), foi aplicada à Deutsche Telekom uma coima no montante de 12,6 milhões de EUR, em razão de infracções ao disposto no artigo 82.o, alínea a), CE que esta cometeu ao cobrar tarifas não equitativas aos operadores da concorrência e aos seus utilizadores finais pelo acesso à rede local, o que restringiu, em ampla medida, a concorrência no mercado dos serviços de acesso à rede local.

39

Foi nestas condições que o Verwaltungsgericht Köln decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

O artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento […] n.o 2887/2000 deve entender-se no sentido de que as condições de orientação pelos custos estabelecidas pelo artigo 3.o, n.o 3, do mesmo regulamento constituem exigências mínimas, significando isto que o direito nacional dos Estados-Membros não se pode afastar deste nível em prejuízo dos beneficiários?

2)

A exigência da orientação pelos custos estabelecida no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000 também engloba os juros calculados e as amortizações teóricas?

3)

Em caso de resposta afirmativa à segunda questão:

a)

A base de cálculo desses juros e dessas amortizações é o valor de substituição do activo imobilizado com dedução das amortizações já efectuadas até ao momento da avaliação ou a base do cálculo é unicamente o valor de substituição actual, expresso pelos preços correntes efectivos no momento da avaliação?

b)

Os custos invocados como base de cálculo dos juros calculados e das amortizações teóricas, especialmente os que não podem ser directamente associados à prestação (custos gerais), têm em todos os casos de ser comprovados por documentos que permitam reconstituir os custos do operador notificado?

c)

Em caso de resposta inteira ou parcialmente negativa à [terceira] questão, [alínea] b):

 

A comprovação dos custos pode, em vez disso, ser efectuada através de uma avaliação feita com recurso a um modelo analítico de custos?

 

A que exigências de metodologia e outras exigências substantivas deve esta avaliação alternativa obedecer?

d)

A [ARN] dispõe, no âmbito das competências que lhe confere o artigo 4.o, n.os 1 a 3, do Regulamento […] n.o 2887/2000, das denominadas margens de apreciação na verificação da orientação pelos custos, que estão apenas sujeitas a um controlo judicial limitado?

e)

Em caso de resposta afirmativa à [terceira] questão, [alínea] d):

 

Estas margens de apreciação também dizem respeito, em especial, ao método de cálculo dos custos e às questões da determinação dos juros calculados (em relação ao capital mutuado e/ou ao capital próprio) e dos períodos de amortização adequados?

 

Quais são os limites destas margens de apreciação?

f)

As exigências de orientação pelos custos servem, ou pelo menos também servem, para proteger os direitos dos concorrentes com a qualidade de beneficiários, com a consequência de estes concorrentes poderem recorrer à tutela judicial contra as taxas de acesso não fixadas em função dos custos?

g)

Recaem sobre o operador notificado as consequência negativas da impossibilidade de prova (ónus da prova), se, no âmbito do processo de supervisão estabelecido no artigo 4.o do Regulamento […] n.o 2887/2000 ou no processo judicial que se lhe seguir, for impossível demonstrar total ou parcialmente os custos?

h)

Em caso de resposta afirmativa [à terceira] questão, [alíneas] f) e g):

 

Também impende sobre o operador notificado o ónus da prova da orientação pelos custos, se o concorrente com a qualidade de beneficiário intentar uma acção contra uma autorização de taxas de acesso concedida pela autoridade reguladora segundo o direito nacional, com o fundamento de que as taxas de acesso autorizadas são demasiado altas por não terem sido fixadas em função dos custos?»

Quanto às questões prejudiciais

40

Através de uma série de questões, o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que interprete diversas disposições do Regulamento n.o 2887/2000 e, em especial, as disposições relativas ao princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos.

41

Como resulta da decisão de reenvio, as questões colocadas suscitam quatro problemáticas distintas.

42

A primeira é relativa à definição do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, nos termos em que é enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000.

43

A segunda diz respeito ao âmbito de aplicação deste princípio, à luz das disposições previstas no artigo 1.o, n.o 4, do mesmo regulamento.

44

A terceira refere-se ao poder de apreciação das ARN no âmbito de aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos.

45

A quarta e última é relativa a aspectos processuais, designadamente, à fiscalização jurisdicional, precisamente quando há que aplicar o referido princípio.

46

É assim a partir desta base que se responderá às questões colocadas pelo órgão jurisdicional de reenvio.

Quanto à segunda e à terceira questão, alíneas a) a c), relativas à definição do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos

47

Sem pedir expressamente uma definição do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local e aos recursos conexos com base numa orientação para os custos, nos termos em que é enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000, o órgão jurisdicional de reenvio convida o Tribunal de Justiça a tomar posição, através da segunda questão, sobre os custos que devem ser tomados em consideração para fixar as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local, através da terceira questão, alínea a), sobre a base de cálculo desses custos e, através da terceira questão, alíneas b) e c), sobre a justificação dos referidos custos.

48

Antes de responder às questões acima referidas, há que constatar que o Regulamento n.o 2887/2000 não contém uma definição do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos.

49

Com efeito, como resulta dos termos do artigo 3.o, n.o 3, deste regulamento, este limita-se a fazer uma enunciação geral segundo a qual os operadores notificados aplicam as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos.

50

Nestas condições, convém examinar se há indicações relativas ao princípio da fixação das tarifas com base numa orientação para os custos, nas directivas do AQR e, em especial, nas Directivas 97/33 e 98/10, aplicáveis ao processo principal, que o Regulamento n.o 2887/2000 visa designadamente complementar, como resulta do seu décimo quinto considerando.

51

A este respeito, importa salientar que, de modo geral, o princípio da fixação das tarifas com base numa orientação para os custos figura em diversas directivas do AQR, como sejam as Directivas 97/33 e 98/10.

52

Com efeito, o artigo 7.o, n.o 2, da Directiva 97/33, que se refere não às tarifas, mas aos encargos de interligação, indica que estes seguirão os princípios da transparência e da orientação em função dos custos.

53

Pelo seu lado, o artigo 17.o, n.o 2, da Directiva 98/10 prevê que as tarifas de utilização da rede telefónica pública fixa e dos serviços telefónicos públicos fixos respeitarão os princípios básicos da orientação em função dos custos, estabelecidos no anexo da Directiva 90/387.

54

A este respeito, o ponto 3, segundo parágrafo, do referido anexo estipula que as tarifas se devem basear em critérios objectivos e se devem orientar, em princípio, pelos custos.

55

Contudo, há que constatar que, exceptuadas algumas precisões pontuais sobre o conceito de determinados custos na jurisprudência (v. acórdãos de 6 de Dezembro de 2001, Comissão/França, C-146/00, Colect., p. I-9767; de 25 de Novembro de 2004, KPN Telecom, C-109/03, Colect., p. I-11273; e de 13 de Julho de 2006, Mobistar, C-438/04, Colect., p. I-6675), as Directivas 97/33 e 98/10 não fornecem nenhuma definição do princípio da fixação das tarifas com base numa orientação para os custos.

56

Resulta do que precede que, de modo geral, o direito comunitário prevê, em diversos domínios do sector das telecomunicações, o princípio da fixação das tarifas, ou dos preços, com base numa orientação para os custos, sem precisar, em cada um dos domínios em causa o respectivo conteúdo, designadamente, a interligação, a telefonia vocal ou o lacete local.

57

Nestas condições, para definir o princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos há que tomar em consideração não apenas os termos deste princípio mas também o seu contexto e os objectivos prosseguidos pela regulamentação que prevê este princípio.

58

A este respeito, há que recordar, em primeiro lugar, que, segundo o sétimo considerando do Regulamento n.o 2887/2000, o acesso desagregado ao lacete local permite aos novos operadores entrar em concorrência com os operadores notificados, oferecendo serviços de transmissão de dados de débito elevado para o acesso permanente à Internet e para aplicações multimédia a partir da tecnologia da linha de assinante digital.

59

Além disso, nos termos do seu artigo 1.o, n.o 1, o Regulamento n.o 2887/2000 tem por objectivo intensificar a concorrência através do estabelecimento de condições harmonizadas para o acesso desagregado ao lacete local, de forma a incentivar a competitividade na prestação de uma vasta gama de serviços de comunicações electrónicas.

60

No entanto, o referido regulamento não prevê, para este efeito, um princípio segundo o qual as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local seriam fixadas livremente, dentro da lógica de um mercado concorrencial aberto, através das regras da oferta e da procura.

61

Com efeito, como resulta dos termos utilizados no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000, as tarifas são fixadas pelo operador notificado, não em função do jogo da livre concorrência mas através de uma orientação para os custos suportados pelo operador.

62

A este respeito, importa precisar que o artigo 4.o, n.o 4, do mesmo regulamento prevê que, quando a ARN determinar que o mercado do acesso local é suficientemente competitivo, deverá insentar os operadores notificados da obrigação de fixarem as tarifas com base numa orientação para os custos.

63

É igualmente neste sentido que, no artigo 1.o, n.o 6, da Recomendação 2000/417, que é referida no décimo terceiro considerando do Regulamento n.o 2887/2000, a Comissão precisa que, enquanto o nível da concorrência na rede de acesso local for insuficiente para impedir a fixação de tarifas excessivas para o acesso desagregado ao lacete local, se recomenda que essas tarifas sejam fixadas em conformidade com o princípio da fixação com base numa orientação para os custos.

64

Daqui resulta que o princípio da tarifação previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000 não respeita as regras de um mercado concorrencial aberto guiado pelas regras da oferta e da procura. Em contrapartida, este princípio impõe aos operadores notificados que fixem as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos durante um determinado período, de forma a permitir uma abertura gradual do mercado em causa à concorrência.

65

Em segundo lugar, resulta do décimo primeiro considerando do Regulamento n.o 2887/2000, lido em conjugação com o artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento, que, para o acesso desagregado ao lacete local, as tarifas devem ser fixadas com base numa orientação para os custos, no sentido de que as regras de tarifação devem permitir ao fornecedor do lacete local, no presente caso, o operador notificado, tal como a Deutsche Telekom, poder cobrir os respectivos custos já suportados.

66

Decorre consequentemente destas disposições que a regra da tarifação prevista no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000 impõe que, aquando da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao seu lacete local, o operador notificado tome em consideração elementos quantitativos que estejam relacionados com os custos que suportou para a implementação desse lacete.

67

Em terceiro lugar, e como também resulta do décimo primeiro considerando do Regulamento n.o 2887/2000, o operador notificado deve conseguir retirar da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao seu lacete local uma remuneração razoável por forma a assegurar o desenvolvimento a longo prazo e a modernização da infra-estrutura local de acesso.

68

Deste modo, no âmbito do acesso desagregado ao lacete local, o princípio da tarifação previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000 autoriza o operador notificado a cobrar aos outros operadores de telecomunicações uma remuneração susceptível de lhe permitir garantir, pelo menos, o bom funcionamento das infra-estruturas locais em caso de acesso desagregado destas.

69

Resulta das considerações que precedem que o princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000, deve ser entendido como a obrigação imposta aos operadores notificados, no âmbito da abertura gradual do mercado das telecomunicações à concorrência, de fixarem essas tarifas com base numa orientação para os custos suportados com a implementação do lacete local, retirando simultaneamente da fixação das referidas tarifas uma remuneração razoável por forma a permitir o desenvolvimento a longo prazo e a modernização das infra-estruturas de telecomunicações existentes.

Quanto à segunda questão, relativa aos custos

70

A título liminar, há que salientar que o Regulamento n.o 2887/2000 não contém disposição alguma que indique os custos que devem ser tomados em consideração quando o operador notificado propõe tarifas para o acesso desagregado ao seu lacete local.

71

No entanto, tal como foi designadamente indicado no n.o 67 do presente acórdão, resulta da leitura conjugada do décimo primeiro considerando do Regulamento n.o 2887/2000 e do artigo 3.o, n.o 3, deste regulamento que o operador notificado propõe as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local, em função dos custos já suportados para a implementação da rede local, e, através da remuneração cobrada, assegura a viabilidade económica da referida rede.

72

Decorre destas disposições que, devido ao fornecimento aos outros operadores de telecomunicações de um acesso desagregado ao seu lacete local, o operador notificado repercute, designadamente nas tarifas propostas, os custos relacionados com os investimentos efectuados. Deste modo, devem ser tomados em consideração, para fixar as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local, os custos em que o operador notificado teve de incorrer no âmbito dos investimentos efectuados para a implementação das suas infra-estruturas locais.

73

Esta conclusão é confirmada, em primeiro lugar, pelo anexo IV da Directiva 97/33, o qual se refere aos elementos exemplificativos de cálculo das taxas de interligação, a saber, as taxas efectivamente cobráveis às partes interligadas. Este anexo menciona, designadamente, as taxas para cobertura da instalação inicial da interligação física, as taxas de aluguer para cobertura da utilização corrente do equipamento e outras funcionalidades, as taxas variáveis por serviços adicionais e suplementares, assim como as taxas de tráfego pelo encaminhamento do tráfego de e para a rede interligada.

74

Neste âmbito, o anexo V da mesma directiva comporta, em segundo lugar, e a título exemplificativo, uma lista dos custos que devem ser tomados em consideração no âmbito da fixação das taxas de interligação e que se referem aos investimentos efectuados, como sejam, designadamente, os custos baseados nas despesas efectivamente incorridas em equipamentos e sistemas de interligação.

75

É nestas condições que o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça se os juros calculados e as amortizações teóricas fazem parte dos custos que devem ser tomados em consideração quando há que fixar as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local, nos termos do princípio enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000.

76

Mesmo que o órgão jurisdicional de reenvio, na sua questão, se refira de modo geral aos juros calculados e às amortizações teóricas, decorre da decisão de reenvio, do contexto do litígio do processo principal e das observações apresentadas no Tribunal de Justiça que há que analisar, em substância, se os juros relativos ao capital investido e as amortizações dos activos imobilizados utilizados para implementar infra-estruturas locais de telecomunicações fazem parte desses custos.

77

No que se refere aos juros relativos ao capital investido, trata-se de custos a tomar em consideração para fixar as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local, segundo o princípio enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000. Com efeito, esses custos representam o rendimento decorrente desse capital, caso não tivesse sido investido no lacete local.

78

Aplica-se o mesmo entendimento aos juros relativos a empréstimos, que representam, na realidade, o custo do endividamento no âmbito dos investimentos efectuados para a implementação do lacete local.

79

No que se refere às amortizações dos activos imobilizados utilizados para constituir a rede local, há que constatar que a tomada em consideração destas amortizações permite que se tome em conta a diminuição do valor real destes activos e constitui um custo para o operador notificado.

80

A este respeito, há que precisar que as referidas amortizações se referem aos investimentos efectuados pelo operador notificado para a implementação do lacete local e, consequentemente, fazem parte dos custos de exploração que devem ser tomados em consideração, nos termos do princípio da tarifação previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000.

81

Esta constatação é aliás confirmada pelo anexo V da Directiva 97/33, que dispõe que entre os elementos que podem ser integrados no sistema de contabilização dos custos figuram, designadamente, as convenções contabilísticas utilizadas no tratamento dos custos que abrangem o período de amortização das principais categorias de elementos do activo imobilizado.

82

Também neste sentido, a Recomendação 98/322, cujo anexo relativo às Orientações para a execução da separação de contas se refere, no seu ponto 4, aos custos de exploração dos operadores e considera como custos, ou seja, como custos suportados, a depreciação.

83

O mesmo ponto do anexo da Recomendação 98/322 faz também referência ao processo de imputação de custos, descrito no ponto 3 deste anexo, precisando que este processo é válido tanto para os custos de exploração como para os custos de capital, e refere expressamente, a este respeito, que a depreciação constitui uma categoria de custos de exploração.

84

Resulta de todas estas considerações que há que responder à segunda questão no sentido de que os juros relacionados com os capitais investidos e as amortizações dos activos imobilizados utilizados para implementar o lacete local fazem parte dos custos que devem ser tomados em consideração nos termos do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000.

Quanto à terceira questão, alínea a), relativa à base de cálculo dos custos

85

O órgão jurisdicional de reenvio convida o Tribunal de Justiça a pronunciar-se sobre a questão de saber se a base de cálculo dos custos que devem ser tomados em consideração no âmbito da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local é constituída pelo valor de substituição dos activos, com dedução das amortizações efectuadas até ao momento da avaliação, ou unicamente pelo valor de substituição actual, expresso pelos preços correntes na data da avaliação.

86

Através desta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se a base de cálculo dos custos deve assentar nos custos que representa a construção ex nihilo por um operador, que não o operador notificado, de uma nova infra-estrutura local de acesso para o fornecimento de serviços de telecomunicações equivalentes (a seguir «custo actual»), ou nos custos efectivamente suportados pelo operador notificado, tomando em consideração as amortizações já efectuadas (a seguir «custo histórico»).

87

Há que constatar desde já que o Regulamento n.o 2887/2000 não contém nenhum elemento relativo à base de cálculo dos custos que devem ser tomados em consideração no âmbito da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local.

88

Nestas condições, importa examinar se as Directivas 97/33 e 98/10, que o Regulamento n.o 2887/2000 visa complementar, contêm indicações a este respeito.

89

Em primeiro lugar, a este propósito, a Deutsche Telekom, o Governo alemão e a Bundesrepublik Deutschland, enquanto parte no processo principal, sustentam que, não obstante a falta de indicações no Regulamento n.o 2887/2000 e nas directivas do AQR aplicáveis no processo principal, há indicações significativas segundo as quais o legislador comunitário optou por um método de cálculo baseado nos custos actuais.

90

Decorrem indicações neste sentido, em primeiro lugar, do ponto 6 da Recomendação 98/195, que prevê que a imputação dos custos com base nos sectores de actividade tenha em conta os custos correntes, e não os custos históricos. Resulta igualmente do mesmo ponto desta recomendação que as ARN devem estabelecer prazos para a instauração, pelos operadores notificados, dos novos sistemas de contabilização dos custos baseados nos custos correntes, caso tais sistemas não estejam já implantados.

91

O mesmo resulta, em segundo lugar, do ponto 4 da Recomendação 98/322, que prevê que a avaliação dos activos da rede de um operador eficiente a preços previsionais ou correntes é um elemento fundamental da metodologia de contabilização pelos custos correntes.

92

Neste contexto, em terceiro lugar, a Recomendação 2000/417 confirma as indicações acima referidas, ao prever, no seu artigo 1.o, n.o 6, que, no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, são, regra geral, os custos actuais que devem ser tomados em consideração, a saber, os custos que representam no momento da avaliação da rede a construção de uma infra-estrutura moderna equivalente e eficaz e o fornecimento deste tipo de serviço.

93

Neste sentido, em quarto lugar, a Comunicação 2000/C 272/10 refere-se igualmente, no seu ponto 6, intitulado «Deveres das entidades reguladoras nacionais e das autoridades competentes em matéria de concorrência», ao sistema de tarifação baseado nos custos actuais.

94

Para responder a esta argumentação, é conveniente basear-se na Recomendação 2000/417, que tem por objecto, por comparação com as outras recomendações anteriormente citadas, especificamente, o acesso desagregado ao lacete local, e que se refere simultaneamente às Directivas 97/33 e 98/10. Com efeito, mesmo que as recomendações não se destinem a produzir efeitos vinculativos, os juízes nacionais são obrigados a ter em consideração as recomendações, para a resolução dos litígios que lhes são submetidos, nomeadamente quando elas esclarecem a interpretação de disposições nacionais adoptadas com o fim de garantir a sua aplicação ou quando têm por objecto completar disposições comunitárias com carácter vinculativo (v. acórdãos de 13 de Dezembro de 1989, Grimaldi, C-322/88, Colect., p. 4407, n.o 18, e de 11 de Setembro de 2003, Altair Chimica, C-207/01, Colect., p. I-8875, n.o 41). O artigo 1.o, n.o 6, da Recomendação 2000/417 prevê como princípio uma abordagem prospectiva baseada nos custos actuais. Com efeito, como resulta desta disposição, esta abordagem fomentará uma concorrência justa e sustentável e proporcionará novos incentivos ao investimento.

95

No entanto, resulta claramente desta mesma disposição que não está excluída uma outra abordagem destinada, designadamente, a evitar distorções de concorrência que se baseiem nos custos históricos. Deste modo, a ARN pode tomar em consideração cada situação concorrencial específica.

96

Em segundo lugar, a Deutsche Telekom, o Governo alemão e a Bundesrepublik Deutschland, enquanto parte no processo principal, sustentam que, ainda que se admita que não resulta do quadro regulamentar aplicável no processo principal que a base de cálculo dos custos se deve basear nos custos actuais, considerações económicas específicas ao sector das telecomunicações impõem, seja como for, como demonstra a prática seguida em determinados Estados-Membros, um método de cálculo baseado exclusivamente nesses custos.

97

A este respeito, há que considerar que, atendendo à evolução tecnológica no domínio das telecomunicações, não está excluído que o custo actual de determinados investimentos, relacionados designadamente com o material da rede instalada, seja susceptível, em determinadas situações, de ser inferior ao custo histórico.

98

Daqui resulta que a possibilidade de o operador notificado basear o cálculo dos custos exclusivamente nos custos actuais dos seus investimentos lhe permite, na realidade, escolher aqueles que lhe dariam a possibilidade de fixar as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local ao nível mais elevado, e não tomar em consideração os elementos de tarifação mais vantajosos para os beneficiários. Neste contexto, o operador notificado poderia, na realidade, contornar as regras relativas à fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos.

99

Há assim que constatar que um método de cálculo baseado exclusivamente nos custos actuais também não é o método mais adequado no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos.

100

Em terceiro lugar, a Arcor sustenta que há que tomar em consideração como base de cálculo os custos históricos, e não os custos actuais, uma vez que, neste último caso, um beneficiário, na acepção do Regulamento n.o 2887/2000, ficaria obrigado a remunerar o operador notificado a um preço excessivamente elevado, devido à idade das infra-estruturas locais de acesso, sem excluir, por outro lado, a hipótese de que a rede poderia já estar amortizada.

101

Há que recordar, a este respeito, num primeiro momento, que o acesso desagregado ao lacete local permite que os novos operadores de telecomunicações, devido à falta de infra-estruturas próprias, entrem em concorrência com os operadores notificados através da utilização das infra-estruturas destes últimos. Com efeito, tal como indicado no sexto considerando do Regulamento n.o 2887/2000, seria impossível abrir rapidamente o sector das telecomunicações à concorrência, se fosse necessário esperar que cada operador em causa construísse as suas próprias infra-estruturas locais.

102

É precisamente com o objectivo de evitar uma nova distorção da concorrência relacionada com a falta de novas redes para os operadores, para além dos operadores notificados, que o Regulamento n.o 2887/2000 previu o acesso desagregado ao lacete local.

103

Nestas condições, há que recordar, num segundo momento, que a regra da tarifação prevista no artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento permite que o fornecedor do lacete local cubra os respectivos custos ao mesmo tempo que consegue obter uma remuneração razoável a fim de garantir o desenvolvimento a longo prazo e a modernização das infra-estruturas de acesso local.

104

Consequentemente, se, como alega a Arcor, para a aplicação da regra da tarifação prevista no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000, a base de cálculo dos custos assentasse exclusivamente nos custos históricos, o que, eventualmente, devido à idade da rede, poderia levar a que se tomasse em consideração uma rede quase amortizada e, consequentemente, conduz a uma tarifa muito reduzida, o operador notificado ver-se-ia confrontado com uma situação caracterizada por desvantagens injustificadas.

105

Por um lado, ficaria obrigado a abrir a sua rede aos seus concorrentes e, consequentemente, a assumir a eventual perda de uma parte da sua clientela.

106

Por outro lado, a remuneração que receberia como contrapartida pelo fornecimento de um acesso desagregado ao lacete local não lhe permitiria obter um lucro razoável com a operação, sem esquecer que lhe incumbe, como indica o décimo primeiro considerando do Regulamento n.o 2887/2000, garantir o desenvolvimento a longo prazo e a modernização das infra-estruturas de acesso local.

107

A este respeito, há que acrescentar que os custos relativos à manutenção e à modernização da infra-estrutura local são calculados, seja como for, em função do valor real dos activos imobilizados do operador notificado.

108

Daqui resulta que a base de cálculo dos custos que devem ser tomados em consideração no âmbito da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local não se pode fundar exclusivamente nos custos históricos, uma vez que, se assim fosse, o operador notificado, por comparação com o beneficiário, ver-se-ia numa situação caracterizada por desvantagens injustificadas que o próprio Regulamento n.o 2887/2000 visa precisamente evitar. Com efeito, o objectivo deste regulamento é permitir que os beneficiários e o operador notificado operem simultaneamente no mercado, de modo a que seja estabelecida, a médio prazo, uma concorrência normal.

109

Resulta de todas as considerações que precedem que não há indicações, nem no Regulamento n.o 2887/2000 nem nas Directivas 97/33 e 98/10 do AQR, a favor de um método de cálculo fundado exclusivamente na base dos custos actuais ou dos custos históricos e que a tomada em consideração exclusiva de uma ou de outra base é susceptível de pôr em causa o objectivo desse regulamento, a saber, intensificar a concorrência através do estabelecimento de condições harmonizadas para o acesso desagregado ao lacete local, a fim de incentivar a competitividade na prestação de uma vasta gama de serviços de comunicações electrónicas.

110

Nestas condições, convém examinar, independentemente da referência feita pelo órgão jurisdicional de reenvio aos custos actuais e aos custos históricos, se, nas Directivas 97/33 e 98/10 que o Regulamento n.o 2887/2000 visa complementar, há outras indicações relativas à base de cálculo dos custos.

111

A este respeito, cabe salientar que, de acordo com o décimo considerando da Directiva 97/33, as tarifas devem promover a produtividade e incentivar a entrada eficiente e sustentável no mercado e não devem ser inferiores a um limite calculado através da utilização de custos incrementais de longo prazo e de métodos de afectação e imputação de custos baseados nos custos reais, nem superiores a um limite estabelecido com base no custo específico de fornecimento da interligação em causa.

112

Também neste sentido, o artigo 7.o, n.o 2, da mesma directiva prevê que as taxas de interligação respeitarão os princípios da transparência e da orientação em função dos custos e que é à organização que oferece a interligação às suas funcionalidades que incumbe provar que as taxas decorrem dos custos reais, incluindo uma taxa de compensação do investimento razoável.

113

De igual modo, o anexo IV da Directiva 97/33 qualifica as taxas de interligação como taxas efectivamente cobráveis às partes interligadas.

114

No anexo V da Directiva 97/33, o legislador comunitário refere-se ao «método de referência para a contabilização dos custos» e, quando há que determinar o método de cálculo destes custos, esse anexo indica como referência os «custos históricos», baseados nas despesas efectivamente efectuadas com equipamentos e sistemas, e os «custos previsionais», baseados numa estimativa dos custos de substituição de equipamentos e sistemas.

115

Resulta das disposições acima referidas que o princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos exige que sejam tomados em consideração custos reais, a saber, os custos já pagos pelo operador notificado e os custos previsionais baseados numa estimativa dos custos de substituição da rede ou de determinados elementos desta.

116

Não havendo regulamentação comunitária específica, cabe às autoridades reguladoras nacionais definirem as modalidades de determinação da base de cálculo em função da qual as amortizações devem ser tomadas em consideração.

117

Deste modo, segundo as disposições da Directiva 97/33, que se aplicam igualmente ao lacete local no âmbito do Regulamento n.o 2887/2000, o método de cálculo dos custos pode simultaneamente fundar-se em custos já pagos pelo operador notificado, o que pressupõe a tomada em consideração, como base de referência, dos custos com valor histórico, e em custos previsionais, o que não exclui a tomada em consideração, como base de referência, dos custos ao seu valor actual.

118

É nestas condições que as ARN têm de calcular os custos reais que devem ser tomados em consideração no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos.

119

Resulta de todas as considerações que precedem que há que responder à terceira questão, alínea a), no sentido de que, no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000, as ARN devem tomar em consideração, na determinação da base de cálculo dos custos do operador notificado, os custos reais, a saber, os custos já pagos pelo operador notificado, e os custos previsionais, baseando-se estes, se for caso disso, numa estimativa dos custos de substituição da rede ou de determinados elementos desta.

Quanto à terceira questão, alíneas b) e c), relativa à justificação dos custos

120

Através da sua terceira questão, alínea b), o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que determine se os custos que devem ser tomados em consideração no âmbito da aplicação do princípio da tarifação previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000 devem ser justificados através de documentos contabilísticos completos e compreensíveis.

121

Em caso de resposta negativa a esta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, através da sua terceira questão, alínea c), se os referidos custos podem ser justificados através de uma avaliação feita com recurso a um modelo de custos analítico, ascendente ou descendente. A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio pede igualmente ao Tribunal de Justiça que determine, designadamente, as exigências metodológicas dessa avaliação.

— Quanto à terceira questão, alínea b), relativa aos documentos contabilísticos

122

No que se refere à justificação, com base em documentos contabilísticos completos e compreensíveis, dos custos que devem ser tomados em consideração no âmbito da aplicação do princípio da tarifação previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000, há que constatar que nem este regulamento nem as Directivas 97/33 e 98/10 prevêem qualquer disposição a este respeito.

123

A Arcor sustenta, no entanto, que há indícios no anexo V da Directiva 97/33 de que o legislador comunitário pretendeu assegurar a adopção de um sistema de contabilização dos custos baseado em documentos detalhados de modo a que um operador notificado não possa contornar este sistema através do envio de documentos contabilísticos incompletos ou incompreensíveis, o que implicaria que as ARN recorressem a modelos teóricos de contabilização dos custos.

124

Ainda que se admita que tal foi o caso, não havendo uma disposição expressa neste sentido, não resulta exclusivamente do anexo V da Directiva 97/33 que existe uma obrigação de justificar em todos os casos, através de documentos completos e compreensíveis, os custos tomados em consideração no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos.

125

A este respeito, há que salientar que o artigo 4.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 2887/2000 prevê que a ARN deve ser competente para exigir que os operadores notificados prestem as informações pertinentes para a aplicação do referido regulamento.

126

Consequentemente, por força desta disposição, as ARN podem exigir informações, inclusivamente, quando se trate de documentos justificativos dos custos que devem ser tomados em consideração no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000.

127

Resulta do que precede que há que responder à terceira questão, alínea b), que, por força do artigo 4.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 2887/2000, a ARN pode exigir que o operador notificado lhe preste informações pertinentes sobre os documentos que justificam os custos tomados em consideração no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos. Não prevendo o direito comunitário nenhuma disposição relativa aos documentos contabilísticos que devem ser verificados, cabe exclusivamente às ARN, segundo o direito aplicável, examinar se, para as necessidades de contabilização dos custos, os documentos apresentados são os mais adequados.

— Quanto à terceira questão, alínea c), relativa aos modelos analíticos dos custos

128

No que se refere aos modelos analíticos dos custos, há que recordar, a título liminar, que, no âmbito do modelo analítico dos custos ascendente, também denominado modelo «bottom up», é necessário tomar em consideração o valor actual dos investimentos para construir uma nova rede. Este modelo baseia-se nos custos em que um operador teria incorrido para adquirir e explorar a sua própria rede. Pelo contrário, o modelo descendente, também denominado «top down», baseia-se nos custos em que efectivamente incorreu o operador notificado.

129

A este respeito, há que constatar desde já que nem o Regulamento n.o 2887/2000 nem as Directivas 97/33 e 98/10 contêm indicações concretas e concordantes sobre a questão colocada pelo órgão jurisdicional de reenvio.

130

Por outro lado, o quinto considerando da Recomendação 98/322 indica que os modelos ascendentes económicos se estão a tornar altamente sofisticados, sendo, contudo, imperfeitos, pelo que, num futuro próximo, é aconselhável conciliar ambas as abordagens, descendente e ascendente.

131

Resulta assim do Regulamento n.o 2887/2000 e dos textos do AQR aplicáveis ao processo principal que não há indicações que visem determinar de forma juridicamente bastante a orientação do legislador comunitário a favor de um modelo contabilístico ascendente ou descendente.

132

Na falta de qualquer outra precisão, há que constatar que o direito comunitário deixa às ARN, com base no direito aplicável, a opção de utilizar os métodos de contabilização dos custos que lhes pareçam, consoante o caso, ser os mais adequados.

133

Nestas condições, não há que responder à questão subsequente do órgão jurisdicional de reenvio, relativa às exigências metodológicas da avaliação baseada num modelo analítico dos custos, ascendente ou descendente.

134

Há assim que responder à terceira questão, alínea c), no sentido de que o direito comunitário não exclui a hipótese de que, no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, na falta de documentos contabilísticos completos e compreensíveis, as ARN determinem os custos baseando-se num modelo analítico dos custos, ascendente ou descendente.

Quanto à primeira questão, relativa ao âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos

135

Através da sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento n.o 2887/2000 deve ser entendido no sentido de que o princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, previsto no artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento, constitui uma exigência mínima, da qual o direito nacional dos Estados-Membros não se pode afastar em prejuízo dos beneficiários.

136

A este respeito, há que recordar que, segundo o artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento n.o 2887/2000, este regulamento não prejudica o direito de os Estados-Membros manterem ou introduzirem medidas conformes com o direito comunitário, que integrem disposições mais pormenorizadas que as do referido diploma e/ou que extravasem do seu âmbito de aplicação, nomeadamente, no que se refere a outros tipos de acesso a infra-estruturas locais.

137

Relativamente ao artigo 3.o, n.o 3, do mesmo regulamento, há igualmente que recordar que este regulamento se limita a enunciar, de forma genérica, que os operadores notificados devem fixar as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, sem mais precisões.

138

Atendendo ao teor das disposições acima referidas do Regulamento n.o 2887/2000 e ao contexto factual do litígio no processo principal, há que constatar que, através da sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, ao Tribunal de Justiça se medidas nacionais detalhadas, adoptadas em conformidade com o disposto no artigo 1.o, n.o 4, desse regulamento, são susceptíveis de tornar inaplicável o princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, nos termos em que este é enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento.

139

A este respeito, importa precisar, em primeiro lugar, que o artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento n.o 2887/2000 deixa, é certo, aos Estados-Membros a possibilidade de manterem ou introduzirem medidas que contenham disposições mais pormenorizadas do que aquelas que constam desse regulamento e, em especial, do que as relativas ao princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos.

140

Tal disposição não pode, no entanto, ser interpretada no sentido de que confere aos Estados-Membros a possibilidade de, através da manutenção ou da adopção de medidas nacionais, derrogarem o referido princípio.

141

Com efeito, resulta dos termos utilizados no artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento n.o 2887/2000 que esta disposição permite ao Estado-Membro em causa completar, através de disposições nacionais pormenorizadas, as disposições pertinentes deste regulamento, no caso, as relativas ao princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, mas não permite que aquelas disposições sejam derrogadas.

142

A possibilidade que o artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento n.o 2887/2000 confere ao Estado-Membro em causa impõe-se pelo facto de, tal como indicado nos n.os 48 e 49 do presente acórdão, este regulamento não conter nenhum elemento concreto sobre a definição deste princípio.

143

Consequentemente, a possibilidade de manter ou introduzir medidas que contenham disposições mais pormenorizadas, reconhecida no artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento n.o 2887/2000, autoriza os Estados-Membros a preverem, na sua legislação nacional, disposições susceptíveis de concretizar o princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, desde que essas disposições observem os limites impostos no artigo 1.o, n.o 4, do referido regulamento.

144

Por outro lado, há que recordar que a adopção do referido regulamento, tal como indicado no seu décimo quarto considerando, respeitou o princípio da subsidiariedade consagrado no artigo 5.o do Tratado e que é só neste contexto que se indica expressamente que os Estados-Membros conservam a possibilidade de estabelecer regras específicas no domínio em causa.

145

Além disso, é conveniente precisar que as partes no processo principal que apresentaram observações no Tribunal de Justiça não suscitaram o argumento de que o princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos poderia não ser aplicável devido às disposições do artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento n.o 2887/2000, por as disposições nacionais aplicáveis no processo principal, a saber, o § 24 da TKG 1996 e os §§ 2 e 3 da TEntgV, constituírem uma aplicação pormenorizada deste princípio.

146

Em contrapartida, foi alegado que o princípio da tarifação em causa no processo principal deve ser concretizado através de disposições nacionais no âmbito da margem de apreciação de que os Estados-Membros dispõem nesta matéria e que, de qualquer modo, esta margem de apreciação não foi ultrapassada no presente caso.

147

Nestas condições, coloca-se, em segundo lugar, a questão de saber se as disposições em causa no processo principal, tais como o §24 da TKG 1996 e os §§ 2 e 3 da TEntgV, constituem disposições pormenorizadas, na acepção do artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento n.o 2887/2000.

148

Não há dúvida de que a mera leitura destas disposições nacionais permite concluir que se trata de disposições pormenorizadas, na acepção do artigo 1.o, n.o 4, do referido regulamento.

149

Com efeito, as referidas disposições nacionais aplicam, no respeito do direito comunitário, o princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, através de medidas técnicas relativas, designadamente, às taxas e aos documentos que devem ser apresentados pela empresa que apresentou um pedido de autorização tarifária.

150

Resulta do que precede que há que responder à primeira questão no sentido de que a possibilidade conferida aos Estados-Membros, no artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento n.o 2887/2000, de adoptarem medidas nacionais pormenorizadas, não pode tornar inaplicável o princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, nos termos em que foi enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento.

Quanto à terceira questão, alínea e), relativa ao poder de apreciação das ARN no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos

151

Há que recordar que o artigo 4.o do Regulamento n.o 2887/2000, intitulado «Supervisão pela [ARN]», prevê, no seu n.o 1, que a ARN deve assegurar que as tarifas para o acesso desagregado ao lacete local favoreçam o estabelecimento de uma concorrência leal e sustentável.

152

A este título, o n.o 2 do mesmo artigo indica que a ARN deve ser competente para, por um lado, impor modificações à oferta de referência para o acesso desagregado ao lacete local e aos recursos conexos, incluindo os preços, sempre que tais modificações se justifiquem e, por outro, exigir que os operadores notificados prestem as informações pertinentes para a aplicação do presente regulamento.

153

Resulta destas disposições que as ARN dispõem de um poder alargado para intervir em diferentes aspectos da tarifação para o fornecimento de um acesso desagregado ao lacete local, incluindo o poder de alterar os preços e, portanto, as tarifas propostas.

154

A este respeito, importa recordar que, nos termos do princípio previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000, o nível das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local deve ser fixado com base numa orientação para os custos reais, a saber, os custos históricos e os custos previsionais em que o operador notificado incorreu.

155

Nestas condições, resulta que o poder alargado que o Regulamento n.o 2887/2000 reconhece às ARN relativamente à apreciação dos aspectos tarifários para o acesso desagregado ao lacete local se refere igualmente à avaliação dos custos suportados pelo operador notificado.

156

Deste modo, há que constatar que o poder alargado de que as ARN dispõem por força do artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 2887/2000 abrange igualmente os custos tomados em consideração, como sejam os juros relativos ao capital investido e as amortizações dos activos imobilizados, a base de cálculo destes e os modelos de justificação contabilística dos referidos custos.

157

Por outro lado, há que precisar que resulta igualmente das disposições do artigo 4.o, n.o 2, do referido regulamento que, no âmbito dos poderes alargados que estas disposições lhes conferem, as ARN dispõem igualmente de competências para iniciar o processo de fiscalização da tarifação para o acesso desagregado ao lacete local no sentido de que podem exigir informações relativas, designadamente, aos custos incorridos no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas com base numa orientação para os custos.

158

Daqui resulta que o Regulamento n.o 2887/2000 atribui às ARN não apenas um poder alargado mas também meios adequados que lhes permitem examinar da forma mais eficaz a correcta aplicação do princípio previsto no artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento.

159

Há assim que responder à terceira questão, alínea e), no sentido de que resulta das disposições do artigo 4.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 2887/2000 que, durante o exame das tarifas dos operadores notificados para o fornecimento de um acesso desagregado ao seu lacete local, à luz do princípio da tarifação enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento, as ARN dispõem de um poder alargado que abrange a apreciação dos diferentes aspectos dessas tarifas, incluindo o poder de alterar os preços e, portanto, as tarifas propostas. Este poder alargado abrange igualmente os custos suportados pelos operadores notificados, tais como os juros relativos ao capital investido e as amortizações dos activos imobilizados, a base de cálculo destes e os modelos de justificação contabilística dos referidos custos.

Quanto à terceira questão, alíneas d) e f) a h), relativa aos aspectos processuais relacionados com a aplicação do princípio da orientação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos

160

O órgão jurisdicional de reenvio convida o Tribunal de Justiça, em primeiro lugar, a tomar posição sobre o âmbito da fiscalização do juiz relativamente às decisões das ARN sobre a aplicação do princípio da tarifação enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000.

161

Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre a possibilidade de os operadores de telecomunicações abrangidos pela categoria, que o Regulamento n.o 2887/2000 qualifica de beneficiários, a saber, os terceiros concorrentes que operam no sector das telecomunicações, poderem contestar judicialmente as decisões das ARN que autorizam as tarifas dos operadores notificados para o fornecimento de um acesso desagregado ao seu lacete local.

162

Neste contexto, coloca-se, em terceiro e último lugar, a questão de saber a quem incumbe, designadamente durante um processo jurisdicional ou ainda durante o procedimento de supervisão previsto no artigo 4.o do Regulamento n.o 2887/2000, o ónus da prova da observância do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, a que se refere o artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento.

Quanto à terceira questão, alínea d), relativa ao âmbito da fiscalização jurisdicional

163

Há que constatar desde já que nem o Regulamento n.o 2887/2000 nem as directivas do AQR prevêem uma harmonização das regras nacionais relativas aos processos jurisdicionais aplicáveis, nem tão pouco, a este título, ao âmbito da fiscalização do juiz consoante a situação.

164

A este respeito, o Governo alemão, a Bundesrepublik Deutschland, enquanto parte no litígio no processo principal, e a Deutsche Telekom extraem argumento da jurisprudência segundo a qual, quando o direito comunitário reconhece às instituições da Comunidade um amplo poder de apreciação em razão das apreciações económicas complexas que efectuam no domínio em causa, a eventual fiscalização do juiz comunitário deve limitar-se a verificar se as medidas controvertidas não estão viciadas por erro manifesto ou desvio de poder, ou ainda se a instituição em causa não ultrapassou manifestamente os limites do seu poder de apreciação (v., nomeadamente, acórdãos de 21 de Janeiro de 1999, Upjohn, C-120/97, Colect., p. I-223, n.o 34, e de 9 de Junho de 2005, HLH Warenvertrieb e Orthica, C-211/03, C-299/03 e C-316/03 a C-318/03, Colect., p. I-5141, n.o 75).

165

Ao transpor por analogia esta jurisprudência para o processo principal, sustenta-se que as apreciações efectuadas pelas ARN, relativas à aplicação do princípio da tarifação previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000, a saber, as relativas aos custos a tomar em consideração, ao seu cálculo e à sua justificação contabilística no caso de uma avaliação fictícia das infra-estruturas locais de telecomunicações, constituem apreciações económicas complexas e, consequentemente, a fiscalização do juiz nacional deve ser igualmente limitada.

166

A este respeito, há que recordar que, segundo a jurisprudência, na falta de regulamentação comunitária na matéria, cabe ao ordenamento jurídico interno de cada Estado-Membro designar os órgãos jurisdicionais competentes e regular as modalidades processuais das acções judiciais destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos que para os particulares decorrem do direito comunitário, desde que, por um lado, essas modalidades não sejam menos favoráveis do que as das acções análogas de natureza interna (princípio da equivalência) e, por outro, não tornem impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária (princípio da efectividade) (v. acórdãos de 17 de Junho de 2004, Recheio — Cash & Carry, C-30/02, Colect., p. I-6051, n.o 17, e de 7 de Junho de 2007, van der Weerd e o., C-222/05 a C-225/05, Colect., p. I-4233, n.o 28 e jurisprudência citada).

167

Neste contexto, há que salientar que, como sustentam correctamente a Arcor e, num contexto mais geral, o Governo lituano, resulta do décimo primeiro considerando do Regulamento n.o 2887/2000, bem como dos artigos 3.o, n.os 2 e 3, e 4.o, n.o 3, do referido regulamento, que as ARN devem assegurar a aplicação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local, em condições transparentes, equitativas e não discriminatórias.

168

Cabe, consequentemente, ao juiz nacional garantir que as obrigações decorrentes do Regulamento n.o 2887/2000, relativas ao acesso desagregado ao lacete local, são respeitadas de acordo com modalidades conformes com o princípio da tarifação enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento, e isto nas condições acima referidas.

169

Daqui resulta que o direito comunitário não prevê nenhuma regra segundo a qual os Estados-Membros devem prever a instituição de uma forma especial de fiscalização das decisões das ARN relativas às tarifas do operador notificado para o acesso ao lacete local do operador notificado.

170

Decorre de todas as considerações que precedem que há que responder à terceira questão, alínea d), no sentido de que cabe em exclusivo aos Estados-Membros, no âmbito da autonomia processual de que dispõem, determinar, com observância dos princípios da equivalência e da efectividade da tutela jurisdicional, o órgão jurisdicional competente, a natureza do contencioso e, consequentemente, as modalidades da fiscalização do juiz, no que respeita às decisões das ARN relativas à autorização das tarifas dos operadores notificados para o acesso desagregado ao seu lacete local. Nestas condições, o órgão jurisdicional nacional deve assegurar que as obrigações resultantes do Regulamento n.o 2887/2000, para o acesso desagregado ao lacete local segundo modalidades conformes com o princípio da tarifação enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento, sejam efectivamente respeitadas em condições transparentes, equitativas e não discriminatórias.

Quanto à terceira questão, alínea f), relativa ao direito de recurso das decisões das ARN relativas às tarifas dos operadores notificados para o acesso desagregado ao seu lacete local

171

No âmbito da terceira questão, alínea f), o Tribunal de Justiça é, em substância, convidado a examinar se os beneficiários, na acepção do Regulamento n.o 2887/2000, podem contestar as decisões da ARN que autorizam as tarifas dos operadores notificados para o acesso desagregado ao seu lacete local ao abrigo das exigências em matéria de fixação das tarifas com base numa orientação para os custos.

172

Para responder a esta questão, é conveniente examinar o quadro regulamentar em que se inscreve o artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000.

173

A este respeito, há que recordar que, segundo os termos do artigo 5.o-A, n.o 3, da Directiva 90/387, os Estados-Membros devem garantir a existência de mecanismos adequados ao nível nacional, que confiram ao interessado afectado por uma decisão da ARN o direito de recorrer para um órgão independente das partes envolvidas.

174

A referida disposição constitui uma emanação do princípio da tutela jurisdicional efectiva, que constitui um princípio geral do direito comunitário, que decorre das tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros e foi consagrado pelos artigos 6.o e 13.o da Convenção Europeia para Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de Novembro de 1950, por força do qual incumbe aos órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros assegurar a tutela jurisdicional dos direitos conferidos aos cidadãos pelo direito comunitário (v., por analogia, acórdão de 21 de Fevereiro de 2008, Tele2 Telecommunication, C-426/05, Colect., p. I-0000, n.o 30 e jurisprudência citada).

175

Dado que uma decisão da ARN adoptada em relação com o artigo 4.o do Regulamento n.o 2887/2000 cai no âmbito de aplicação da Directiva 90/387, o artigo 5.o-A, n.o 3, desta directiva exige que o direito nacional preveja mecanismos adequados que confiram ao «interessado afectado» por essa decisão o direito de recorrer para um órgão independente. Esta garantia vale tanto para o destinatário da referida decisão como para os beneficiários na acepção do Regulamento n.o 2887/2000.

176

Relativamente ao direito de recurso dos terceiros, há que constatar que um beneficiário, não sendo destinatário de uma decisão da ARN, adquire a qualidade de«interessado afectado» quando os seus direitos são potencialmente afectados por uma tal decisão, devido, por um lado, ao seu conteúdo e, por outro, à actividade exercida ou pretendida por essa parte (v., por analogia, acórdão Tele2 Telecommunication, já referido, n.o 39).

177

No processo principal, há que constatar que a Arcor, ao ter concluído com o operador notificado um contrato que tem por objecto o acesso aos lacetes locais, é um interessado afectado na acepção do artigo 5.o-A, n.o 3, da Directiva 90/387, na medida em que uma decisão da ARN relativa às exigências em matéria de fixação das tarifas para o acesso desagregado aos lacete local com base numa orientação para os custos afecta necessariamente os seus direitos enquanto parte nesse contrato. Há, no entanto, que precisar que não se exige um vínculo contratual como o que existe no processo principal, para que os direitos de um beneficiário sejam potencialmente afectados por tal decisão.

178

Resulta do que precede que há que responder à terceira questão, alínea f), no sentido de que o artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2887/2000, lido em conjugação com o artigo 5.o-A, n.o 3, da Directiva 90/387, exige que os órgãos jurisdicionais nacionais interpretem e apliquem as regras processuais internas que regulam o exercício dos recursos de modo a que uma decisão da ARN relativa à autorização das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local possa ser contestada judicialmente, não apenas pela empresa destinatária de tal decisão mas também por beneficiários, na acepção do referido regulamento, cujos direitos sejam potencialmente afectados pela decisão.

Quanto à terceira questão, alíneas g) e h), relativa ao ónus da prova

179

Através da sua terceira questão, alíneas g) e h), o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que determine a quem incumbe o ónus da prova da observância do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, no âmbito do procedimento de supervisão previsto no artigo 4.o do Regulamento n.o 2887/2000, ou de um procedimento jurisdicional que tenha por objecto uma decisão da ARN relativa a uma autorização das referidas tarifas de um operador notificado.

180

No que se refere, em primeiro lugar, ao ónus da prova da observância do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, no âmbito do procedimento de supervisão previsto no artigo 4.o do Regulamento n.o 2887/2000, há que constatar desde já que nem este regulamento nem a Recomendação 2000/417 comportam qualquer disposição a este respeito.

181

Há assim que examinar se das directivas do AQR se pode retirar uma indicação neste sentido.

182

A este título, importa recordar que o artigo 7.o, n.o 2, da Directiva 97/33 prevê que o ónus da prova de que os encargos decorrem dos custos reais, incluindo uma taxa de compensação do investimento razoável, incumbe à organização que oferece a interligação às suas funcionalidades.

183

Daqui resulta que, nesta directiva, há disposições que permitem considerar que, no âmbito do procedimento administrativo de autorização das taxas, incumbe ao operador notificado determinar os elementos quantitativos em que se baseia a sua proposta de tarifação.

184

Para além desta constatação inequívoca constante do AQR, cabe igualmente salientar que, no âmbito do acesso desagregado ao lacete local, por um lado, o operador notificado tem de apresentar as suas tarifas à ARN, para que estas sejam autorizadas, e, por outro, ele é o único que pode fornecer informações sobre os custos relativos à implementação da sua rede.

185

Nestas condições, e na medida em que os elementos nos quais se baseia a tarifação proposta se referem, em primeiro lugar, ao operador notificado, há que concluir que incumbe a este último, no âmbito do procedimento de supervisão previsto no artigo 4.o do Regulamento n.o 2887/2000, apresentar os elementos de prova da observância do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos.

186

Esta constatação não abrange, no entanto, os beneficiários na acepção do Regulamento n.o 2887/2000.

187

Com efeito, na medida em que o direito comunitário não prevê nenhuma regra relativa ao ónus da prova da observância do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, no âmbito do procedimento de supervisão, cabe aos Estados-Membros determinar, nos termos das suas regras processuais e no âmbito do procedimento de supervisão previsto no artigo 4.o do Regulamento n.o 2887/2000, as modalidades de prova aplicáveis, incluindo a repartição do ónus desta prova entre a ARN que adoptou a decisão de autorização das tarifas do operador notificado e o beneficiário que contesta esta decisão.

188

No que se refere, em segundo lugar, ao ónus da prova da observância do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, no âmbito de um processo jurisdicional que tenha por objecto a decisão da ARN que autorizou as referidas tarifas de um operador notificado, importa salientar que não há a este título nenhuma precisão no Regulamento n.o 2887/2000 nem no AQR.

189

Daqui resulta que, não prevendo o direito comunitário nenhuma regra relativa ao ónus da prova da observância do referido princípio no âmbito de tal procedimento jurisdicional, cabe aos Estados-Membros determinar, nos termos das suas regras processuais, as modalidades de prova aplicáveis, incluindo a repartição do ónus desta prova entre a ARN que adoptou a decisão de autorização das tarifas do operador notificado e o beneficiário que contesta esta decisão.

190

A este respeito, há que precisar que esta competência reservada aos Estados-Membros não pode ser exercida sem que sejam respeitados os princípios da efectividade e da equivalência da tutela jurisdicional.

191

Com efeito, resulta da jurisprudência que os Estados-Membros devem assegurar que as modalidades de prova, designadamente as regras sobre a repartição do ónus da prova, aplicáveis aos recursos sobre litígios relativos a uma violação do direito comunitário, em primeiro lugar, não sejam menos favoráveis do que as relativas a recursos similares de natureza interna e, em segundo, não tornem impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício pelo particular dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária (v. acórdão de 3 de Fevereiro de 2000, Dounias, C-228/98, Colect., p. I-577, n.o 69 e jurisprudência citada).

192

Decorre do que precede que há que responder à terceira questão, alíneas g) e h), que o Regulamento n.o 2887/2000 deve ser interpretado no sentido de que, durante um procedimento de supervisão da tarifação do acesso desagregado ao lacete local, conduzido por uma ARN nos termos do artigo 4.o do referido regulamento, incumbe ao operador notificado provar que as suas tarifas respeitam o princípio da fixação das tarifas com base numa orientação para os custos. Em contrapartida, cabe aos Estados-Membros determinar a repartição do ónus da prova entre a ARN que adoptou a decisão de autorização das tarifas do operador notificado e o beneficiário que contesta essa decisão. Cabe, igualmente, aos Estados-Membros determinar, nos termos das suas regras processuais e com observância dos princípios comunitários da efectividade e da equivalência da tutela jurisdicional, as modalidades de repartição do ónus dessa prova, em caso de impugnação judicial de uma decisão da ARN relativa a uma autorização das tarifas de um operador notificado para o acesso desagregado ao seu lacete local.

Quanto às despesas

193

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

 

1)

Os juros relacionados com os capitais investidos e as amortizações dos activos imobilizados utilizados para implementar o lacete local fazem parte dos custos que devem ser tomados em consideração nos termos do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento (CE) n.o 2887/2000 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2000, relativo à oferta de acesso desagregado ao lacete local.

 

2)

No âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, previsto no artigo 3.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2887/2000, as autoridades reguladoras nacionais devem tomar em consideração, na determinação da base de cálculo dos custos do operador notificado, os custos reais, a saber, os custos já pagos pelo operador notificado, e os custos previsionais, baseando-se estes, se for caso disso, numa estimativa dos custos de substituição da rede ou de determinados elementos desta.

 

3)

Por força do artigo 4.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 2887/2000, a autoridade reguladora nacional pode exigir que o operador notificado lhe preste informações pertinentes sobre os documentos que justificam os custos tomados em consideração no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos. Não prevendo o direito comunitário nenhuma disposição relativa aos documentos contabilísticos que devem ser verificados, cabe exclusivamente às autoridades reguladoras nacionais, segundo o direito aplicável, examinar se, para as necessidades de contabilização dos custos, os documentos apresentados são os mais adequados.

 

4)

O direito comunitário não exclui a hipótese de que, no âmbito da aplicação do princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, na falta de documentos contabilísticos completos e compreensíveis, as autoridades reguladoras nacionais determinem os custos baseando-se num modelo analítico dos custos, ascendente ou descendente.

 

5)

A possibilidade conferida aos Estados-Membros, no artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento n.o 2887/2000, de adoptarem medidas nacionais pormenorizadas, não pode tornar inaplicável o princípio da fixação das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local com base numa orientação para os custos, nos termos em que foi enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento.

 

6)

Resulta das disposições do artigo 4.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 2887/2000 que, durante o exame das tarifas dos operadores notificados para o fornecimento de um acesso desagregado ao seu lacete local, à luz do princípio da tarifação enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento, as autoridades reguladoras nacionais dispõem de um poder alargado que abrange a apreciação dos diferentes aspectos dessas tarifas, incluindo o poder de alterar os preços e, portanto, as tarifas propostas. Este poder alargado abrange igualmente os custos suportados pelos operadores notificados, tais como os juros relativos ao capital investido e as amortizações dos activos imobilizados, a base de cálculo destes e os modelos de justificação contabilística dos referidos custos.

 

7)

Cabe em exclusivo aos Estados-Membros, no âmbito da autonomia processual de que dispõem, determinar, com observância dos princípios da equivalência e da efectividade da tutela jurisdicional, o órgão jurisdicional competente, a natureza do contencioso e, consequentemente, as modalidades da fiscalização do juiz, no que respeita às decisões das autoridades reguladoras nacionais relativas à autorização das tarifas dos operadores notificados para o acesso desagregado ao seu lacete local. Nestas condições, o órgão jurisdicional nacional deve assegurar que as obrigações resultantes do Regulamento n.o 2887/2000, para o acesso desagregado ao lacete local segundo modalidades conformes com o princípio da tarifação enunciado no artigo 3.o, n.o 3, do referido regulamento, sejam efectivamente respeitadas em condições transparentes, equitativas e não discriminatórias.

 

8)

O artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2887/2000, lido em conjugação com o artigo 5.o-A, n.o 3, da Directiva 90/387/CEE do Conselho, de 28 de Junho de 1990, relativa à realização do mercado interno dos serviços de telecomunicações mediante a oferta de uma rede aberta de telecomunicações, na redacção dada pela Directiva 97/51/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Outubro de 1997, exige que os órgãos jurisdicionais nacionais interpretem e apliquem as regras processuais internas que regulam o exercício dos recursos de modo a que uma decisão da autoridade reguladora nacional relativa à autorização das tarifas para o acesso desagregado ao lacete local possa ser contestada judicialmente, não apenas pela empresa destinatária de tal decisão mas também por beneficiários, na acepção do referido regulamento, cujos direitos sejam potencialmente afectados pela decisão.

 

9)

O Regulamento n.o 2887/2000 deve ser interpretado no sentido de que, durante um procedimento de supervisão da tarifação do acesso desagregado ao lacete local, conduzido por uma autoridade reguladora nacional nos termos do artigo 4.o do referido regulamento, incumbe ao operador notificado provar que as suas tarifas respeitam o princípio da fixação das tarifas com base numa orientação para os custos. Em contrapartida, cabe aos Estados-Membros determinar a repartição do ónus da prova entre a autoridade reguladora nacional que adoptou a decisão de autorização das tarifas do operador notificado e o beneficiário que contesta essa decisão. Cabe, igualmente, aos Estados-Membros determinar, nos termos das suas regras processuais e com observância dos princípios comunitários da efectividade e da equivalência da tutela jurisdicional, as modalidades de repartição do ónus dessa prova, em caso de impugnação judicial de uma decisão da autoridade reguladora nacional relativa a uma autorização das tarifas de um operador notificado para o acesso desagregado ao seu lacete local.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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