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Document 62004CJ0127

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 9 de Fevereiro de 2006.
    Declan O'Byrne contra Sanofi Pasteur MSD Ltd e Sanofi Pasteur SA.
    Pedido de decisão prejudicial: High Court of Justice (England & Wales), Queen's Bench Division - Reino Unido.
    Directiva 85/374/CEE - Responsabilidade decorrente dos produtos defeituosos - Conceito de "colocação em circulação' do produto - Fornecimento do produtor a uma filial detida a 100%.
    Processo C-127/04.

    Colectânea de Jurisprudência 2006 I-01313

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2006:93

    Processo C‑127/04

    Declan O'Byrne

    contra

    Sanofi Pasteur MSD Ltd, anteriormente Aventis Pasteur MSD Ltd

    e

    Sanofi Pasteur SA, anteriormente Aventis Pasteur SA

    [pedido de decisão prejudicial apresentado pela High Court of Justice (England & Wales), Queen's Bench Division]

    «Directiva 85/374/CEE – Responsabilidade decorrente dos produtos defeituosos – Conceito de ‘colocação em circulação’ do produto – Fornecimento do produtor a uma filial detida a 100%»

    Conclusões do advogado‑geral L. A. Geelhoed apresentadas em 2 de Junho de 2005 

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 9 de Fevereiro de 2006 

    Sumário do acórdão

    1.     Aproximação das legislações – Responsabilidade decorrente dos produtos defeituosos –Directiva 85/374

    (Directiva 85/374 do Conselho, artigo 11.°)

    2.     Aproximação das legislações – Responsabilidade decorrente dos produtos defeituosos –Directiva 85/374

    (Directiva 85/374 do Conselho, artigos 1.° e 3.°)

    1.     O artigo 11.° da Directiva 85/374, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros em matéria de responsabilidade decorrente dos produtos defeituosos, que fixa um prazo de presunção dos direitos conferidos à vítima de dez anos a contar da data de colocação em circulação do produto, deve ser interpretado no sentido de que um produto é colocado em circulação quando sai do processo de fabrico realizado pelo produtor e entra num processo de comercialização em que se encontra no estado de oferta ao público com vista a ser utilizado ou consumido.

    Não é importante que o produto seja vendido directamente pelo produtor ao utilizador ou ao consumidor ou que essa venda seja efectuada através de um ou vários elos de uma cadeia de distribuição. Assim, quando um dos elos da cadeia de distribuição está estreitamente ligado ao produtor, essa ligação tem por consequência que essa entidade possa ser considerada estar implicada no processo de fabrico do produto em causa.

    (cf. n.os 27‑29, 32, disp. 1)

    2.     Quando é intentada uma acção baseada na Directiva 85/374 relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros em matéria de responsabilidade decorrente dos produtos defeituosos, contra uma sociedade erradamente considerada produtora de um produto, quando, na realidade, este foi fabricado por outra sociedade, compete, em princípio, ao direito nacional fixar as condições em que é possível proceder à substituição de uma parte por outra no âmbito de uma acção desta natureza.

    Um órgão jurisdicional nacional que examina as condições a que essa substituição está subordinada deve, porém, velar pelo respeito do âmbito de aplicação ratione personae da directiva, conforme determinado pelos artigos 1.° e 3.° da mesma, na medida em que a identificação do círculo de responsáveis feita pelas referidas disposições deve ser considerada exaustiva.

    (cf. n.os 35, 39, disp. 2)




    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

    9 de Fevereiro de 2006 (*)

    «Directiva 85/374/CEE – Responsabilidade decorrente dos produtos defeituosos – Conceito de ‘colocação em circulação’ do produto – Fornecimento do produtor a uma filial detida a 100%»

    No processo C‑127/04,

    que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pela High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Reino Unido), por decisão de 18 de Novembro de 2003, entrado no Tribunal de Justiça em 8 de Março de 2004, no processo

    Declan O’Byrne

    contra

    Sanofi Pasteur MSD Ltd, antiga Aventis Pasteur MSD Ltd,

    Sanofi Pasteur SA, antiga Aventis Pasteur SA,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: P. Jann (relator), presidente de secção, K. Schiemann, K. Lenaerts, E. Juhász e M. Ilešič, juízes,

    advogado‑geral: L. A. Geelhoed,

    secretário: M. Ferreira, administradora principal,

    vistos os autos e após a audiência de 7 de Abril de 2005,

    vistas as observações apresentadas:

    –       em representação de D. O’Byrne, por S. Maskrey, QC, e H. Preston, barrister, mandatados por K. Pickup, solicitor,

    –       em representação da Sanofi Pasteur MSD Ltd e da Sanofi Pasteur SA, por G. Leggatt, QC, e P. Popat, barrister,

    –       em representação do Governo italiano, por I. M. Braguglia, na qualidade de agente, assistido por P. Gentili, avvocato dello Stato,

    –       em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por X. Lewis e G. Valero Jordana, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 2 de Junho de 2005,

    profere o presente

    Acórdão

    1       O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 11.° da Directiva 85/374/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1985, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros em matéria de responsabilidade decorrente dos produtos defeituosos (JO L 210, p. 29; EE 13 F19 p. 8, a seguir «directiva»).

    2       Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe D. O’Byrne à Sanofi Pasteur MSD Ltd, antiga Aventis Pasteur MSD Ltd (a seguir «APMSD»), e à Sanofi Pasteur SA, antiga Aventis Pasteur SA (a seguir «APSA»), devido à colocação em circulação por estas últimas de uma vacina alegadamente defeituosa, cuja administração terá causado lesões graves a D. O’Byrne.

     Quadro jurídico

     Regulamentação comunitária

    3       A directiva prevê, no seu artigo 1.°, que «[o] produtor é responsável pelo dano causado por um defeito do seu produto».

    4       O artigo 3° da directiva, que define o conceito de produtor, tem a seguinte redacção:

    «1.      O termo ‘produtor’ designa o fabricante de um produto acabado, o produtor de uma matéria‑prima ou o fabricante de uma parte componente, e qualquer pessoa que se apresente como produtor pela aposição sobre o produto do seu nome, marca ou qualquer outro sinal distintivo.

    2.      Sem prejuízo da responsabilidade do produtor, qualquer pessoa que importe um produto na Comunidade tendo em vista uma venda, locação, locação financeira ou qualquer outra forma de distribuição no âmbito da sua actividade comercial, será considerada como produtor do mesmo, na acepção da presente directiva, e responsável nos mesmos termos que o produtor.

    3.      Quando não puder ser identificado o produtor do produto, cada fornecedor será considerado como produto[r], salvo se indicar ao lesado, num prazo razoável, a identidade do produtor ou daquele que lhe forneceu o produto. O mesmo se aplica no caso de um produto importado, se este produto não indicar o nome do importador referido no n.° 2, mesmo se for indicado o nome do produtor.»

    5       O artigo 7.° da directiva dispõe:

    «O produtor não é responsável nos termos da presente directiva se provar:

    a)      Que não colocou o produto em circulação;

    […]»

    6       O décimo considerando da directiva indica que «um prazo de prescrição uniforme para a acção de indemnização é vantajoso tanto para o lesado como para o produtor». A este respeito, o artigo 11.° da directiva prevê:

    «Os Estados‑Membros estabelecerão na sua legislação que os direitos concedidos ao lesado nos termos da presente directiva se extinguem no termo de [um] período de dez anos a contar da data em que o produtor colocou em circulação o produto que causou o dano, excepto se a vítima tiver intentado uma acção judicial contra o produtor durante este período.»

     Legislação nacional

    7       A directiva foi transposta no Reino Unido pela primeira parte da Lei de 1987 relativa à protecção dos consumidores (Consumer Protection Act 1987, a seguir «Act 1987»), que entrou em vigor no dia 1 de Março de 1988. A Section 4 desta lei tem a seguinte redacção:

    «(1)      Em qualquer acção de responsabilidade civil intentada ao abrigo da presente parte […] resultante de produtos defeituosos, o demandado poderá eximir‑se à responsabilidade se demonstrar:

    […]

    (b)      que nunca forneceu o produto a terceiro; ou

    […]

    (d)      que o defeito não existia no momento pertinente;

    […]»

    8       Além disso, o Act 1987 adita à Lei de 1980 relativa à prescrição (Limitation Act 1980) uma nova Section 11 A, cuja Subsection 3 prevê:

    «Nenhuma acção ao abrigo da presente Section pode ser intentada depois de decorrido o prazo de dez anos a contar do momento pertinente […]; a presente Subsection tem por efeito extinguir o direito de acção findo o referido período de dez anos, quer esse direito de acção tenha ou não expirado e quer o prazo previsto nas disposições seguintes deste Act tenha ou não começado a correr.»

     Tramitação processual do processo principal e questões prejudiciais

    9       Resulta dos próprios termos da decisão de reenvio que o jovem D. O’Byrne foi vacinado, em 3 de Novembro de 1992, com uma dose da vacina anti‑haemophilus, num consultório médico estabelecido no Reino Unido.

    10     Na sequência da vacinação, esse jovem sofreu graves lesões. Os seus consultores jurídicos sustentam que o dano foi causado pelo facto de a vacina que lhe foi administrada ser defeituosa.

    11     O produtor da vacina foi a Pasteur Mérieux Sérums et Vaccins SA, sociedade de direito francês que, depois de ter alterado a sua firma, passou a denominar‑se APSA.

    12     Em 18 de Setembro de 1992, a APSA enviou um lote de doses de vacina, entre as quais se encontrava a que foi administrada ao jovem D. O’Byrne, à Mérieux UK Ltd, sociedade de direito inglês que também alterou a sua denominação, para APMSD. Esta última sociedade, que era uma filial detida a 100% pela APSA e que era a distribuidora dos produtos daquela no Reino Unido, recebeu o lote em causa no dia 22 de Setembro seguinte. Na altura do fornecimento, a APSA enviou uma factura à APMSD, que foi devidamente liquidada por esta última.

    13     Numa data posterior desconhecida, a APMSD vendeu uma parte do lote das doses de vacina ao Ministério da Saúde do Reino Unido, que foi entregue por aquela sociedade directamente a um hospital designado por esse ministério. Por sua vez, o hospital forneceu‑a ao consultório médico no qual o jovem foi vacinado em 3 de Novembro de 1992.

    14     Em 2 de Novembro de 2000, os consultores jurídicos do demandante no processo principal intentaram uma primeira acção de indemnização contra a APMSD, alegando que esta última era a fabricante do produto.

    15     Em 7 de Outubro de 2002, foi intentada uma segunda acção contra a APSA. Os consultores jurídicos indicaram que só se aperceberam claramente e pela primeira vez no Verão de 2002 que o fabricante do produto era, na realidade, a APSA e não a APMSD.

    16     No âmbito deste segundo processo, a APSA alegou que a acção contra ela tinha prescrito. Sustenta que, na medida em que o produto entrou em circulação com o seu fornecimento à APMSD em 18 de Setembro de 1992, que o recebeu em 22 de Setembro de seguinte, a acção, só tendo sido intentada em 7 de Outubro de 2002, teve início depois da expiração do prazo de prescrição de dez anos previsto na Section 11 A, Subsection 3, do Act 1987, que constitui uma transposição do artigo 11.° da directiva.

    17     Segundo os consultores jurídicos do demandante no processo principal, a acção não prescreveu. Com efeito, a colocação em circulação do produto só ocorreu a partir do momento em que este foi fornecido pela APMSD ao hospital designado pelo Ministério da Saúde. Esse fornecimento foi efectuado menos de dez anos antes da segunda acção ter sido intentada.

    18     Contudo, os referidos consultores jurídicos pediram, em 10 de Março de 2003, ao órgão jurisdicional de reenvio que declarasse, para todos os efeitos legais, no âmbito da primeira acção jurisdicional, que foi intentada em 2 de Novembro de 2000, que a APMSD foi substituída pela APSA.

    19     Foi nestas circunstâncias que a High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)      Numa interpretação correcta do artigo 11.° da directiva, se um produto tiver sido fornecido, mediante contrato de compra e venda, por um fabricante francês a uma filial inglesa que lhe pertence integralmente e esta por sua vez o fornecer a outra entidade, considera‑se que o mesmo foi colocado em circulação:

    a)      no momento em que sai da sociedade francesa; ou

    b)      no momento em que chega à sociedade inglesa; ou

    c)      no momento em que sai da sociedade inglesa; ou

    d)      no momento em que chega à entidade que recebe o produto da sociedade inglesa?

    2)      Se for proposta uma acção na qual se reivindicam os direitos conferidos ao demandante pela directiva, em relação a um produto alegadamente defeituoso, contra uma sociedade (A), no pressuposto erróneo de que A é o seu produtor, quando na realidade o produtor não foi A mas sim a sociedade (B), é lícito aos Estados‑Membros conferirem aos seus tribunais, através das suas disposições nacionais, o poder discricionário de considerarem que a referida acção equivale a uma ‘acção judicial [intentada] contra o produtor’, na acepção do artigo 11.° da directiva?

    3)      O artigo 11.° da directiva, correctamente interpretado, permite a um Estado‑Membro conferir a um tribunal o poder discricionário de permitir que B substitua A na posição de demandado numa acção como a referida na segunda questão, supra (a seguir ‘acção relevante’), no caso de:

    a)      ter expirado o prazo de dez anos a que se refere o artigo 11.°;

    b)      a acção relevante ter sido proposta contra A antes do termo do prazo de dez anos; e

    c)      não ter sido proposta uma acção contra B, relativamente ao produto que causou os danos alegados pelo demandante, antes do termo do prazo de dez anos?»

     Quanto à primeira questão

    20     Com a primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, no essencial, se, num caso em que um produto é transferido por uma sociedade produtora para uma filial de distribuição e vendido por esta a um terceiro, o artigo 11.° da directiva deve ser interpretado no sentido de que a colocação em circulação do produto ocorre no momento da transmissão do produto da sociedade produtora para a filial ou quando esse produto é transferido por esta última para o referido terceiro.

    21     O demandante no processo principal, o Governo italiano e a Comissão das Comunidades Europeias consideram que a colocação em circulação de um produto depende da perda de controlo do produtor sobre esse produto ou que ela ocorre quando o produto é objecto de uma transferência para uma pessoa em relação à qual o produtor não exerce autoridade. O que conta é a entrada do produto na cadeia de distribuição pelo fornecimento a um terceiro. Em seu entender, uma filial detida a 100% pelo produtor, como a que está em causa no processo principal, pode não ser considerada um terceiro.

    22     As demandadas no processo principal consideram, pelo contrário, que o facto de o produto deixar o lugar efectivo da sua produção é pertinente para a definição da colocação em circulação, sem que o fornecimento do mesmo a uma filial possa ter um papel determinante a esse respeito.

    23     A título liminar, deve observar‑se que a directiva não define o conceito de «colocação em circulação» a que se referem designadamente o artigo 7.°, alínea a), da directiva, relativo à possibilidade de o produtor se eximir da sua responsabilidade, e o artigo 11.°, consagrado à prescrição dos direitos conferidos à vítima em aplicação da mesma directiva.

    24     No que se refere ao conceito de colocação em circulação considerado no âmbito do artigo 7.° da directiva, o Tribunal de Justiça decidiu que a isenção de responsabilidade por inexistência de colocação do produto em circulação visa antes de mais os casos em que outra pessoa que não o produtor fez sair o produto do processo de fabrico. Estão igualmente excluídas do âmbito de aplicação da directiva as utilizações do produto contra a vontade do produtor, quando, por exemplo, o processo de fabrico não esteja ainda concluído, bem como as utilizações para fins privados ou em situações idênticas (acórdão de 10 de Maio de 2001, Veedfald, C‑203/99, Colect., p. I‑3569, n.° 16).

    25     No mesmo contexto, o Tribunal de Justiça decidiu, no n.° 15 do acórdão Veedfald, já referido, que os casos taxativamente enumerados no artigo 7.° da directiva, em que o produtor pode eximir‑se da sua responsabilidade, devem ser objecto de uma interpretação estrita. Esta interpretação destina‑se a assegurar os interesses das vítimas de um dano causado por um produto defeituoso.

    26     Em compensação, o artigo 11.° da directiva, que tem por objectivo limitar no tempo o exercício dos direitos conferidos à vítima pela directiva, tem um carácter neutro. Com efeito, conforme resulta do décimo considerando da directiva, a finalidade desta disposição é dar satisfação às necessidades de segurança jurídica no interesse das partes em causa. Assim, a determinação dos limites temporais dentro dos quais se deve inscrever a acção da vítima deve preencher critérios objectivos.

    27     À luz destas considerações, deve considerar‑se que um produto foi colocado em circulação, na acepção do artigo 11.° da directiva, quando o mesmo tenha saído do processo de fabrico realizado pelo produtor e tenha entrado num processo de comercialização em que se encontre no estado de oferta ao público com vista a ser utilizado ou consumido.

    28     Em princípio, é irrelevante, a este respeito, o facto de o produto ser vendido directamente pelo produtor ao utilizador ou ao consumidor ou que essa venda seja efectuada no âmbito de um processo de distribuição que comporte um ou mais operadores, como o evocado no artigo 3.°, n.° 3, da directiva.

    29     Ora, quando um dos elos da cadeia de distribuição está estreitamente ligado ao produtor, como, por exemplo, no caso de uma sociedade filial detida a 100% por este último, há que determinar se essa ligação tem por consequência que essa entidade esteja na realidade implicada no processo de fabrico do produto em causa.

    30     A apreciação dessa relação estreita deve efectuar‑se independentemente da questão de saber se se trata ou não de pessoas jurídicas distintas. Em compensação, é necessário saber se se trata de empresas que exercem actividades de produção diferentes ou, pelo contrário, de empresas em que uma, a sociedade filial, age simplesmente como distribuidor ou como depositário do produto fabricado pela sociedade‑mãe. Compete aos órgãos jurisdicionais nacionais determinar, à luz das circunstâncias de cada caso e da situação factual do processo que lhes é submetido, se as relações entre o produtor e a outra entidade são estreitas a ponto de o conceito de produtor na acepção dos artigos 7.° e 111.° da directiva englobar igualmente esta última entidade e de a transmissão do produto de uma dessas entidades para a outra não implicar a colocação em circulação do mesmo na acepção das referidas disposições.

    31     De qualquer forma, contrariamente ao que as demandadas no processo principal sustentam, o facto de os produtos serem facturados a uma sociedade filial e de esta última pagar o respectivo preço de forma semelhante a qualquer outro comprador não é determinante. O mesmo se diga da questão de saber qual das entidades deve ser considerada titular do direito de propriedade dos produtos.

    32     Por isso, deve responder‑se à primeira questão que o artigo 11.° da directiva deve ser interpretado no sentido de que um produto é colocado em circulação quando sai do processo de fabrico realizado pelo produtor e entra num processo de comercialização em que se encontra no estado de oferta ao público com vista a ser utilizado ou consumido.

     Quanto às segunda e terceira questões

    33     Com as segunda e terceira questões, que devem ser examinadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, no essencial, se, quando é intentada uma acção contra uma sociedade erradamente considerada produtora de um produto quando, na realidade, este foi fabricado por outra sociedade, os órgãos jurisdicionais nacionais podem considerar que essa acção é dirigida contra essa sociedade produtora e colocar esta na posição de ré, em substituição da sociedade inicialmente demandada.

    34     A este respeito, deve observar‑se que a directiva não se pronuncia sobre os mecanismos processuais a pôr em prática quando uma vítima intenta uma acção de responsabilidade civil decorrente de produtos defeituosos e comete um erro relativo à pessoa do produtor. Assim, compete ao direito processual nacional fixar as condições em que se pode proceder a uma substituição de uma parte por outra no âmbito de uma acção desta natureza.

    35     Contudo, deve recordar‑se que o círculo dos responsáveis contra os quais o lesado tem o direito de intentar uma acção ao abrigo do regime de responsabilidade previsto pela directiva é definido nos artigos 1.° e 3.° da mesma (acórdão de 10 de Janeiro de 2006, Skov e Bilka, C‑402/03, ainda não publicado na Colectânea, n.° 32). Uma vez que a directiva prossegue uma harmonização total dos aspectos que regula, a identificação do círculo de responsáveis feita por estas disposições deve ser considerada exaustiva (acórdão Skov e Bilka, já referido, n.° 33).

    36     Os artigos 1.° e 3.°, n.° 1, da directiva imputam a responsabilidade que esta institui ao produtor, que é definido, designadamente, como o fabricante de um produto acabado.

    37     É apenas nos casos taxativamente enumerados que outras pessoas podem ser consideradas produtores, a saber, quem se apresentar como tal pela aposição do seu nome, marca ou outro sinal distintivo no produto (artigo 3.°, n.° 1, da directiva), quem importar um produto na Comunidade (artigo 3.°, n.° 2) e o fornecedor que, quando o produtor não puder ser identificado, não indique ao lesado, num prazo razoável, a identidade do produtor ou de quem lhe forneceu o produto (artigo 3.°, n.° 3).

    38     Quando o órgão jurisdicional nacional examina as condições às quais a substituição de uma parte por outra num determinado litígio está subordinada, deve velar por que o âmbito de aplicação ratione personae da directiva, conforme determinado pelo artigo 3.° da mesma, seja respeitado.

    39     Deve, por isso, responder‑se às segunda e terceira questões que, quando é intentada uma acção contra uma sociedade erradamente considerada produtora de um produto, quando, na realidade, este foi fabricado por outra sociedade, compete, em princípio, ao direito nacional fixar as condições em que é possível proceder à substituição de uma parte por outra no âmbito de uma acção desta natureza. Um órgão jurisdicional nacional que examina as condições a que essa substituição está subordinada deve, porém, velar pelo respeito do âmbito de aplicação ratione personae da directiva, conforme determinado pelos artigos 1.° e 3.° da mesma.

     Quanto às despesas

    40     Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

    1)      O artigo 11.° da Directiva 85/374/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1985, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros em matéria de responsabilidade decorrente dos produtos defeituosos, deve ser interpretado no sentido de que um produto é colocado em circulação quando sai do processo de fabrico realizado pelo produtor e entra num processo de comercialização em que se encontra no estado de oferta ao público com vista a ser utilizado ou consumido.

    2)      Quando é intentada uma acção contra uma sociedade erradamente considerada produtora de um produto, quando, na realidade, este foi fabricado por outra sociedade, compete, em princípio, ao direito nacional fixar as condições em que é possível proceder à substituição de uma parte por outra no âmbito de uma acção desta natureza. Um órgão jurisdicional nacional que examina as condições a que essa substituição está subordinada deve, porém, velar pelo respeito do âmbito de aplicação ratione personae da Directiva 85/374, conforme determinado pelos artigos 1.° e 3.° da mesma.

    Assinaturas


    * Língua do processo: inglês.

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