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Document 62003TJ0057

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Segunda Secção) de 1 de Fevereiro de 2005.
Société provençale d'achat et de gestion (SPAG) SA contra Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI).
Marca comunitária - Processo de oposição - Pedido de marca nominativa comunitária HOOLIGAN - Marcas nominativas anteriores OLLY GAN - Elementos de facto ou de direito não submetidos ao IHMI - Admissibilidade - Risco de confusão.
Processo T-57/03.

Colectânea de Jurisprudência 2005 II-00287

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2005:29

Arrêt du Tribunal

Processo T‑57/03

Société provençale d’achat et de gestion (SPAG) SAS

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI)

«Marca comunitária – Processo de oposição – Pedido de marca nominativa comunitária HOOLIGAN – Marcas nominativas anteriores OLLY GAN – Elementos de facto ou de direito não submetidos ao IHMI – Admissibilidade – Risco de confusão»

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Segunda Secção) de 1 de Fevereiro 2005 

Sumário do acórdão

1.     Marca comunitária – Processo de recurso – Recurso para o juiz comunitário – Legalidade da decisão de uma Câmara de Recurso que se pronuncia num processo de oposição – Contestação mediante invocação de elementos de direito novos – Condições de admissibilidade

(Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 74.°, n.° 1)

2.     Marca comunitária – Disposições processuais – Processo de oposição – Exame limitado aos fundamentos invocados – Renome da marca anterior – Obrigação de as partes invocarem os factos e as provas em que se baseiam – Carácter distintivo intrínseco da marca anterior – Exame oficioso

(Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 74.°)

3.     Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Motivos relativos de recusa – Oposição do titular de uma marca anterior idêntica ou semelhante registada para produtos ou serviços idênticos ou semelhantes – Risco de confusão com a marca anterior – Marcas nominativas «HOOLIGAN» e «OLLY GAN»

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 8.°, n.° 1, alínea b)]

1.     Resulta do artigo 74.°, n.° 1, in fine, do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária que a Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos), ao pronunciar‑se sobre um recurso de uma decisão que põe termo a um processo de oposição, apenas pode fundamentar a sua decisão nos motivos relativos de recusa que a parte em causa invocou, bem como nos factos e provas que lhe dizem respeito apresentados pelas partes.

Os critérios de aplicação de um motivo relativo de recusa ou de qualquer outra disposição invocados como fundamentos dos pedidos formulados pelas partes fazem naturalmente parte dos elementos de direito submetidos ao exame do Instituto, o mesmo valendo para uma questão de direito que deva ser necessariamente examinada para a apreciação dos fundamentos invocados pelas partes e o deferimento ou indeferimento dos pedidos, mesmo que as partes não se tenham exprimido sobre essa questão e mesmo que o Instituto não se tenha pronunciado sobre esse aspecto. Do mesmo modo, quando se sustenta que o Instituto cometeu uma irregularidade no tratamento dos pedidos das partes, como, por exemplo, a violação do princípio do contraditório, esta alegada irregularidade faz também parte do quadro jurídico do processo.

Daqui resulta que os elementos de direito invocados no Tribunal e que não foram anteriormente submetidos às instâncias do Instituto não podem, na medida em que digam respeito a uma questão de direito que não era necessária para garantir a correcta aplicação do Regulamento n.° 40/94 tendo em conta os fundamentos e pedidos apresentados pelas partes, afectar a legalidade de uma decisão da Câmara de Recurso relativa à aplicação de um motivo relativo de recusa, uma vez que não se englobam no quadro jurídico do litígio tal como submetido à Câmara de Recurso. Assim, tais elementos são inadmissíveis.

Em contrapartida, quando uma norma jurídica deve ser aplicada ou uma questão de direito deve ser decidida para garantir a correcta aplicação do Regulamento n.° 40/94 tendo em conta os fundamentos e os pedidos apresentados pelas partes, um elemento de direito relacionado com tal questão pode ser invocado pela primeira vez no Tribunal.

Em conformidade com o princípio da igualdade de armas, os intervenientes que actuam no Tribunal estão sujeitos a essas regras de admissibilidade do mesmo modo que os recorrentes.

(cf. n.os 21‑23)

2.     Embora, de acordo com o artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária, o Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) deva examinar qualquer fundamento relativo ao carácter distintivo de uma marca em razão do seu renome, isso não acontece se não tiver havido invocação por uma parte tanto do renome das marcas anteriores como das provas desse renome. Com efeito, por um lado, uma vez que o renome de uma marca é, a priori, puramente conjectural, as partes têm de precisar suficientemente o seu pedido para permitir que o Instituto se pronuncie plenamente sobre as suas pretensões. Por outro lado, a apreciação do renome assenta, em princípio, em elementos de facto que as partes têm o dever de fornecer. Quando a parte que deduz a oposição pretende prevalecer‑se do facto de a sua marca ser bastante conhecida, tem o ónus de apresentar os elementos de facto, e se for caso disso, de prova que permitam ao Instituto verificar a materialidade de tal asserção.

No que se refere, em contrapartida, ao carácter distintivo intrínseco de uma marca anterior, o Instituto tem o dever de examinar, sendo caso disso, oficiosamente, esse elemento na sequência da dedução da oposição. Com efeito, diferentemente do que sucede com o renome, a apreciação do carácter distintivo intrínseco não pressupõe qualquer elemento de facto que deva ser apresentado pelas partes. Além disso, tal apreciação não está subordinada à apresentação pelas partes de fundamentos ou argumentos destinados a comprovar esse carácter distintivo intrínseco, uma vez que o Instituto pode, por si só, detectar e apreciar a sua existência com base no exame da marca anterior em que se baseou a oposição.

(cf. n.os 30, 32)

3.     Não existe, para os consumidores médios francês e português, risco de confusão entre o sinal nominativo HOOLIGAN, cujo registo enquanto marca comunitária é pedido para «vestuário e chapelaria» incluídos na classe 25 na acepção do Acordo de Nice, e as marcas nominativas OLLY GAN, registadas anteriormente como marca internacional com efeitos, designadamente, em Portugal e como marca nacional em França, e que diz respeito designadamente a vestuário incluído na mesma classe do referido Acordo, uma vez que os sinais em conflito, ainda que foneticamente semelhantes, são diferentes visual e conceptualmente, e que não pode afirmar‑se que as marcas anteriores tenham um forte carácter distintivo intrínseco, pelo que o público pertinente não será levado a confundir a marca requerida com as marcas anteriores, particularmente no domínio do vestuário.

(cf. n.os 56, 62, 65, 67, 69)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)
1 de Fevereiro de 2005(1)

«Marca comunitária – Processo de oposição – Pedido de marca nominativa comunitária HOOLIGAN – Marcas nominativas anteriores OLLY GAN – Elementos de facto ou de direito não submetidos ao IHMI – Admissibilidade – Risco de confusão»

No processo T-57/03,

Société provençale d'achat e de gestion (SPAG) SA, com sede em Marselha (França), representada por K. Manhaeve, advogado, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por U. Pfleghar e G. Schneider, na qualidade de agentes,

recorrido,

sendo as outras partes no processo decorrido na Câmara de Recurso do IHMI, intervenientes neste Tribunal,Frank Dann e Andreas Backer, residentes em Frankfurt am Main (Alemanha), representados por P. Baronikians, advogado,

que tem por objecto um recurso interposto da decisão da Segunda Câmara de Recurso do IHMI de 5 de Dezembro de 2002 (processo R 1072/2000‑2), relativa ao processo de oposição respeitante às marcas HOOLIGAN e OLLY GAN,



O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),



composto por: J. Pirrung, presidente, N. J. Forwood e S. Papasavvas, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador principal,

vista a petição entregue na Secretaria do Tribunal em 20 de Fevereiro de 2003,vista a contestação do IHMI entregue na Secretaria do Tribunal em 12 de Setembro de 2003,vista a resposta dos intervenientes entregue na Secretaria do Tribunal em 12 de Setembro de 2003,após a audiência de 28 de Setembro de 2004,

profere o presente



Acórdão




Antecedentes do litígio

1
Em 1 de Abril de 1996, Frank Dann e Andreas Backer (a seguir «intervenientes») apresentaram um pedido de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1 ), alterado.

2
A marca cujo registo foi pedido é o sinal nominativo HOOLIGAN.

3
Os produtos para os quais o registo foi pedido incluem‑se na classe 25 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, revisto e alterado, e correspondem à seguinte descrição: «vestuário e chapelaria».

4
Em 31 de Agosto de 1998, este pedido foi publicado no Boletim de Marcas Comunitárias n.° 65/98.

5
Em 30 de Novembro de 1998, a Société provençale d'achat et de gestion (SPAG) SA (a seguir «recorrente») deduziu oposição, ao abrigo do artigo 42.° do Regulamento n.° 40/94, contra a marca requerida, quanto a todos os produtos por ela abrangidos, baseando‑se em duas marcas anteriores de que é titular, a saber:

a marca nominativa internacional OLLY GAN n.° 575552, que produz efeitos nomeadamente na Alemanha, em Espanha, em Itália e em Portugal e é relativa a, nomeadamente, vestuário englobado na classe 25;

a marca nominativa francesa OLLY GAN n.° 1655245, relativa nomeadamente ao vestuário englobado na classe 25.

6
Em 26 de Maio de 1999, os intervenientes solicitaram que a recorrente fizesse prova do uso sério das marcas anteriores que invocara.

7
Por decisão de 15 de Setembro de 2000, a Divisão de Oposição do IHMI deferiu a oposição com o fundamento de que, em França e em Portugal, existia um risco de confusão em razão da identidade dos produtos abrangidos pelas marcas em conflito e da semelhança fonética e, consequentemente, conceptual dos sinais nominativos em causa.

8
Em 9 de Novembro de 2000, os intervenientes interpuseram recurso para o IHMI da decisão da Divisão de Oposição.

9
Por decisão de 5 de Dezembro de 2002 (processo R 1072/2000‑2, a seguir «decisão impugnada»), a Segunda Câmara de Recurso do IHMI anulou a decisão da Divisão de Oposição.

10
A Câmara de Recurso considerou, em substância, que o consumidor médio francês ou português tinha conhecimento do significado corrente da palavra inglesa «hooligan» e da sua ortografia e que pronunciava as marcas em conflito de modo diferente. A Câmara de Recurso concluiu daqui que não existia uma semelhança visual, fonética ou conceptual entre os sinais em conflito e, portanto, que não existia qualquer risco de confusão entre as marcas em conflito.


Pedidos das partes

11
A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

anular a decisão impugnada;

condenar o IHMI nas despesas.

12
O IHMI e os intervenientes concluem pedindo que o Tribunal se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar a recorrente nas despesas.


Quanto à admissibilidade dos elementos de facto e de direito aduzidos no Tribunal

Argumentos das partes

13
O IHMI alega, a título liminar, que o Tribunal não tem competência, no quadro do exame da legalidade da decisão impugnada, para reexaminar as circunstâncias de facto à luz de provas nele pela primeira vez apresentadas. E ainda que, não tendo a recorrente contestado na Câmara de Recurso a identidade dos produtos em causa, o uso das marcas, a pertinência exclusiva dos territórios francês e português e a ausência de semelhança visual entre os sinais em conflito, e tendo invocado pela primeira vez no Tribunal o elevado carácter distintivo das marcas anteriores em causa, tais questões já não podem ser abordadas no Tribunal, pois isso implicaria a modificação do objecto do litígio, em violação do artigo 135.°, n.° 4, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

14
A recorrente considera que o argumento relativo ao significado conceptual da marca OLLY GAN já fora anteriormente apresentado no IHMI. Limita‑se a oferecer o merecimento dos autos no que respeita à admissibilidade dos documentos que apresentou pela primeira vez no Tribunal, mas pede que um regime idêntico seja aplicado aos documentos apresentados pela primeira vez pelos intervenientes.

Apreciação do Tribunal

15
O artigo 63.° do Regulamento n.° 40/94 dispõe:

«1. As decisões das Câmaras de Recurso sobre recursos são susceptíveis de recurso para o Tribunal de Justiça.

2. O recurso terá por fundamento incompetência, preterição de formalidades essenciais, violação do Tratado, do presente regulamento ou de qualquer norma jurídica sobre a sua aplicação, ou desvio de poder.

3. O Tribunal de Justiça é competente para anular e para reformar a decisão impugnada.

4. O recurso está aberto a qualquer parte no processo na Câmara de Recurso, desde que a decisão dessa Câmara não tenha dado provimento às suas pretensões.

[...]»

16
O artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94 dispõe:

«1. No decurso do processo, o Instituto procederá ao exame oficioso dos factos; contudo, num processo respeitante a motivos relativos de recusa do registo, o exame limitar‑se‑á às alegações de facto e aos pedidos apresentados pelas partes.

2. O Instituto pode não tomar em consideração os factos que as partes não tenham alegado ou as provas que não tenham sido produzidas em tempo útil.»

17
Há que recordar que um recurso interposto no Tribunal ao abrigo do artigo 63.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 tem por finalidade a fiscalização da legalidade das decisões das Câmaras de Recurso [v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 2002, eCopy/IHMI (ECOPY), T‑247/01, Colect., p. II‑5301, n.° 46, e de 22 de Outubro de 2003, Éditions Albert René/IHMI – Trucco (Starix), T‑311/01, ainda não publicado na Colectânea, n.° 70, e a jurisprudência aí citada]. No quadro do Regulamento n.° 40/94, e por aplicação do artigo 74.° do mesmo regulamento, esta fiscalização deve ser efectuada por referência ao quadro factual e jurídico do litígio submetido à Câmara de Recurso [v., por analogia, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Março de 2003, Unilever/IHMI (Pastilha oval), T‑194/01, Colect., p. II‑383, n.° 16].

18
Há ainda que recordar que decorre da existência de continuidade funcional entre as diferentes instâncias do IHMI que, no âmbito de aplicação do artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94, a Câmara de Recurso está obrigada a fundamentar a sua decisão tendo em conta todos os elementos de facto e de direito presentes na decisão de que para ela se recorreu e também os elementos apresentados pela ou pelas partes, quer no processo perante a unidade que decidiu em primeira instância quer, unicamente com a ressalva do teor do n.° 2 desta disposição, no próprio processo de recurso. Em especial, a extensão do exame que a Câmara de Recurso está obrigada a efectuar da decisão de que para ela se recorreu não é, em princípio, determinada exclusivamente pelos fundamentos invocados pela ou pelas partes do processo que nela decorre [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 23 de Setembro de 2003, Henkel/IHMI – LHS (UK) (KLEENCARE), T‑308/01, ainda não publicado na Colectânea, n.os 29 e 32].

19
No que se refere ao quadro factual, resulta do artigo 74.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 que incumbe às partes produzir em tempo útil, no IHMI, os elementos de facto que pretendem invocar. Daqui resulta que o IHMI não pode ser acusado de qualquer ilegalidade relativamente a elementos de facto que não lhe foram submetidos.

20
Deste modo, os elementos de facto invocados no Tribunal que não tenham anteriormente sido submetidos a uma das instâncias do IHMI devem ser ignorados [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Março de 2003, Alcon/IHMI – Dr. Robert Winzer Pharma (BSS), T‑237/01, Colect., p. II‑411, n.os 61 e 62, confirmado em recurso pelo despacho do Tribunal de Justiça de 5 de Outubro de 2004, Alcon/IHMI, C‑192/03 P, ainda não publicado na Colectânea; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Março de 2003, DaimlerChrysler/IHMI (Calandre), T‑128/01, Colect., p. II‑701, n.° 18 ; de 3 de Julho de 2003, Alejandro/IHMI – Anheuser‑Busch (BUDMEN), T‑129/01, Colect., p. II‑2251, n.° 67; de 4 de Novembro de 2003, Díaz/IHMI – Granjas Castelló (CASTILLO), T‑85/02, ainda não publicado na Colectânea, n.° 46, e de 13 de Julho de 2004, Samar/IHMI – Grotto (GAS STATION), T‑115/03, ainda não publicado na Colectânea, n.° 13].

21
No que se refere ao quadro jurídico, há que observar que, num processo referente a motivos relativos de recusa, o exame do IHMI está, nos próprios termos do artigo 74.°, n.° 1, in fine, do Regulamento n.° 40/94, limitado às alegações de facto e aos pedidos apresentados pelas partes. Assim, a Câmara de Recurso, ao pronunciar‑se sobre um recurso de uma decisão que põe termo a um processo de oposição, apenas pode fundamentar a sua decisão nos motivos relativos de recusa que a parte em causa invocou, bem como nos factos e provas que lhe dizem respeito apresentados pelas partes [v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Junho de 2004, Ruiz‑Picasso e o./IHMI – DaimlerChrysler (PICARO), T‑185/02, ainda não publicado na Colectânea, n.° 28, e a jurisprudência aí citada]. Os critérios de aplicação de um motivo relativo de recusa ou de qualquer outra disposição invocados como fundamento dos pedidos formulados pelas partes fazem naturalmente parte dos elementos de direito submetidos ao exame do IHMI. A este respeito, há que precisar que uma questão de direito pode ter de ser decidida pelo IHMI mesmo que não tenha sido suscitada pelas partes, se a resolução dela for necessária para garantir a correcta aplicação do Regulamento n.° 40/94 tendo em conta os fundamentos e os pedidos apresentados pelas partes. Faz, pois, igualmente parte dos elementos de direito submetidos à Câmara de Recurso uma questão de direito que deva ser necessariamente examinada para a apreciação dos fundamentos invocados pelas partes e o deferimento ou indeferimento dos pedidos, mesmo que as partes não se tenham exprimido sobre essa questão e mesmo que o IHMI não se tenha pronunciado sobre esse aspecto. Do mesmo modo, quando se sustenta que o IHMI cometeu uma irregularidade no tratamento dos pedidos das partes, como, por exemplo, a violação do princípio do contraditório, esta alegada irregularidade faz também parte do quadro jurídico do processo.

22
Daqui resulta que os elementos de direito invocados no Tribunal e que não foram anteriormente submetidos às instâncias do IHMI não podem, na medida em que digam respeito a uma questão de direito que não era necessária para garantir a correcta aplicação do Regulamento n.° 40/94 tendo em conta os fundamentos e pedidos apresentados pelas partes, afectar a legalidade de uma decisão da Câmara de Recurso relativa à aplicação de um motivo relativo de recusa, uma vez que não se englobam no quadro jurídico do litígio tal como submetido à Câmara de Recurso. Assim, tais elementos são inadmissíveis. Em contrapartida, quando uma norma jurídica deve ser cumprida ou uma questão de direito deve ser decidida para garantir a correcta aplicação do Regulamento n.° 40/94 tendo em conta os fundamentos e os pedidos apresentados pelas partes, um elemento de direito relacionado com tal questão pode ser invocado pela primeira vez no Tribunal.

23
Há finalmente que precisar que estas regras quanto à admissibilidade dos elementos de facto se impõem também ao IHMI e aos intervenientes ao abrigo do artigo 134.° do Regulamento de Processo, quando actuam no Tribunal [v., no que se refere aos elementos de prova apresentados por um interveniente, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Fevereiro de 2004, Koubi/IHMI – Flabesa (CONFORFLEX), T‑10/03, ainda não publicado na Colectânea, n.° 52]. No que respeita aos elementos de direito, os intervenientes estão sujeitos às regras de admissibilidade que se aplicam aos recorrentes. Com efeito, o princípio da igualdade de armas exige que os recorrentes e os intervenientes que actuam perante o Tribunal disponham dos mesmos meios.

24
No caso vertente, há que notar que a recorrente não apresentou observações na Câmara de Recurso. O IHMI sustenta que o Tribunal não pode, por isso, examinar as questões não submetidas à Câmara de Recurso, relativas à identidade dos produtos em causa, aos territórios relativamente aos quais foi feita prova de um uso sério das marcas anteriores, à pertinência dos territórios escolhidos para a análise e à ausência de semelhança visual entre os sinais em conflito. Pelas razões expostas no n.° 18, supra, este argumento não pode ser acolhido.

25
Com efeito, há que declarar que estas questões faziam parte do quadro factual e jurídico apresentado à Câmara de Recurso. Todas estas questões foram tratadas pela Divisão de Oposição na sua decisão, em resposta aos argumentos das partes ou por sua própria iniciativa, uma vez que tais questões tinham de ser obrigatoriamente resolvidas para decidir a oposição. Deste modo, a Câmara de Recurso fundamentou necessariamente, ou deveria ter fundamentado, a sua decisão quanto a todos os elementos de facto e de direito que conduziram à decisão nela impugnada. O mérito de tais questões pode, portanto, ser discutido no Tribunal.

26
Em contrapartida, no que respeita ao forte carácter distintivo das marcas anteriores, tanto intrínseco como resultante da sua notoriedade, invocado pela recorrente, é forçoso constatar que, à vista dos autos do processo decorrido no IHMI, a recorrente nunca arguiu a intensidade deste carácter distintivo no IHMI, quer perante a Divisão de Oposição quer perante a Câmara de Recurso, neste último caso a fortiori, uma vez que a recorrente não compareceu em juízo perante esta Câmara.

27
A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou que o carácter distintivo da marca anterior, em especial a sua notoriedade, deve ser tomado em consideração para apreciar o risco de confusão (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 1998, Canon, C‑39/97, Colect., p. I‑5507, n.° 24 e parte decisória). Neste acórdão, o Tribunal de Justiça deu a interpretação exacta do artigo 4.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), cuja redacção é muito análoga à do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Além disso, o considerando 7 do Regulamento n.° 40/94 declara que a avaliação do risco de confusão depende, nomeadamente, do «conhecimento da marca no mercado».

28
Todavia, diferentemente do que sucedeu nessa directiva, o legislador inscreveu no Regulamento n.° 40/94 as regras destinadas a reger a actividade da administração encarregada das marcas, bem como os direitos e obrigações das pessoas que intervêm ao nível dessa administração. Assim, de acordo com o artigo 74.°, n.° 1, in fine, desse regulamento, o exame em matéria de motivos relativos de recusa está limitado às alegações de facto e aos pedidos apresentados pelas partes. De acordo com o artigo 74.°, n.° 2, do mesmo regulamento, o IHMI pode não tomar em consideração os factos que as partes não tenham alegado e as provas que não tenham produzido em tempo útil. Na medida em que a invocação do forte carácter distintivo constitui uma alegação mista de facto e de direito, há que fazer uma distinção consoante o IHMI esteja ou não em condições de se pronunciar sobre os pedidos das partes com base nos documentos que elas lhe apresentaram.

29
No que se refere, em primeiro lugar, ao carácter distintivo resultante da notoriedade das marcas anteriores, há que realçar que este carácter foi exclusivamente invocado pela recorrente no quadro da apreciação do risco de confusão a título do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

30
De acordo com o artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94, o IHMI deve examinar qualquer fundamento relativo ao carácter distintivo de uma marca em razão do seu renome. Em contrapartida, se não tiver havido invocação por uma parte tanto da notoriedade das marcas anteriores como das provas desse renome, o IHMI não pode ser acusado de não se ter pronunciado oficiosamente sobre este aspecto. Com efeito, por um lado, uma vez que o renome de uma marca é, a priori, puramente conjectural, as partes têm de precisar suficientemente o seu pedido para permitir que o IHMI se pronuncie plenamente sobre as suas pretensões. Por outro lado, a apreciação do renome assenta, em princípio, em elementos de facto que as partes têm o dever de fornecer. Quando a parte que deduz a oposição pretende prevalecer‑se do facto de a sua marca ser bastante conhecida, tem o ónus de apresentar os elementos de facto e, se for caso disso, de prova que permitam ao IHMI verificar a materialidade de tal asserção [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Junho de 2004, «Drie Mollen sinds 1818»/IHMI – Nabeiro Silveira (Galáxia), T‑66/03, ainda não publicado na Colectânea, n.° 32].

31
Há, pois, que entender que o IHMI não tinha o dever de examinar a notoriedade das marcas anteriores em causa. Com efeito, esta notoriedade não fazia parte da oposição que lhe fora submetida. O fundamento da recorrente relativo à notoriedade das suas marcas anteriores bem como os documentos a ele relativos devem pois ser considerados inadmissíveis.

32
No que se refere, em segundo lugar, ao carácter distintivo intrínseco de uma marca anterior, há, inversamente, que declarar que o IHMI tinha o dever de examinar, sendo caso disso, oficiosamente, esse elemento na sequência da dedução da oposição. Com efeito, diferentemente do que sucede com o renome, a apreciação do carácter distintivo intrínseco não pressupõe qualquer elemento de facto que deva ser apresentado pelas partes. Além disso, tal apreciação não está subordinada à apresentação pelas partes de fundamentos ou argumentos destinados a comprovar esse carácter distintivo intrínseco, uma vez que o IHMI pode, por si só, detectar e apreciar a sua existência com base no exame da marca anterior em que se baseou a oposição.

33
Daqui resulta, no caso vertente, que o carácter distintivo intrínseco das marcas anteriores da recorrente fazia parte, aquando da análise do risco de confusão, dos elementos de direito necessários para garantir a correcta aplicação do Regulamento n.° 40/94 no que respeita ao pedido e aos fundamentos apresentados pela recorrente no IHMI. Em consequência, a apreciação do argumento da recorrente relativo a esta matéria deve ser relegada para o exame de mérito.

34
No que respeita, finalmente, aos elementos de facto apresentados pela primeira vez neste Tribunal, o IHMI não identificou anexos da petição relativos a um aspecto diferente do da notoriedade das marcas anteriores, que já atrás foi afastado. Resulta, no entanto, dos autos que os anexos A 7 e A 8, destinados a comprovar que a evocação do conceito de holígane pelas marcas anteriores OLLY GAN já fora notada, se dedicam muito especialmente a demonstrar a natureza errónea da apreciação da Câmara de Recurso de que as marcas em causa são conceptualmente diferentes. Mesmo que se entenda que sustentam a crítica dos elementos de facto e de direito que se contêm na decisão impugnada, não foram submetidos ao IHMI. Deste modo, tais anexos não fazem parte do quadro factual submetido à Câmara de Recurso e são, portanto, inadmissíveis.

35
Do mesmo modo, há que afastar o elemento de facto novo apresentado pelos intervenientes, que consiste no resultado de uma busca no sítio Internet Google, uma vez que este elemento não foi produzido durante o processo administrativo decorrido no IHMI. Há ainda que rejeitar a afirmação dos intervenientes de que a marca requerida goza de um carácter distintivo elevado em razão do seu uso intensivo, uma vez que tal argumento não foi aduzido no IHMI.


Quanto ao mérito

Argumentos das partes

36
Segundo a recorrente, é pacífico que os produtos abrangidos pelas marcas em conflito são idênticos.

37
Considera que os sinais em conflito apresentam uma certa semelhança visual, uma vez que ambos contêm as letras «ol» e terminam pela sílaba «gan».

38
Sustenta que estes sinais são foneticamente idênticos ou muito similares. Contesta a pertinência das pronúncias dadas pelos dicionários francês e espanhol referidos pela Câmara de Recurso, por motivo, por um lado, de a palavra francesa ser «houligan» e, por outro, de a natureza académica destas pronúncias ser inapropriada para uma palavra comum, mesmo familiar. O público pertinente, constituído pelos consumidores médios, nomeadamente franceses, espanhóis e portugueses, não é, em grande parte, anglófono. Em consequência, não é evidente que saiba pronunciar e ortografar correctamente a palavra «hooligan». Além disso, aqueles dos referidos consumidores que falam inglês fazem‑no com um acento latino muito pronunciado que elimina as diferenças entre a pronúncia dos sinais nominativos em conflito no que respeita ao «h» aspirado, ao duplo «o» ou à pausa entre as palavras «Olly» e «Gan». Os dois sinais em conflito têm, portanto, uma pronúncia muito similar.

39
Acrescenta que os sinais em conflito são conceptualmente idênticos ou muito semelhantes. Em razão da sua semelhança fonética, tais sinais evocam necessariamente o mesmo conceito de holígane.

40
Considera que, de acordo com a jurisprudência e com os textos legais, o risco de confusão é tanto mais elevado quanto o carácter distintivo intrínseco da marca anterior se revela importante. Ora, as marcas anteriores em causa têm um forte carácter distintivo intrínseco.

41
Atendendo a que o consumidor médio só raramente tem a oportunidade de proceder à comparação directa das marcas em conflito, o risco de confusão deve ser declarado provado [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Janeiro de 2003, Mystery Drinks/IHMI – Karlsberg Brauerei (MYSTERY), T‑99/01, Colect., p. II‑43].

42
O IHMI considera, a título superabundante relativamente à alegada inadmissibilidade do argumento relativo à semelhança visual dos sinais em conflito, que tais sinais são diferentes, para além dos dois únicos elementos «ol» e «gan».

43
Os intervenientes aduzem que não há semelhança visual entre os sinais em causa. A marca requerida compõe‑se de uma só palavra e possui um duplo «o» como elemento dominante, enquanto as marcas anteriores se compõem de duas palavras e possuem o elemento «oll» como elemento dominante.

44
O IHMI acrescenta que os sinais em conflito são foneticamente diferentes. A palavra inglesa «hooligan» é entendida em toda a Comunidade e, em especial, em França, país no qual entrou na língua, principalmente em razão do seu emprego no domínio futebolístico. Tal palavra caracteriza‑se pela pronúncia inglesa ou, pelo menos, por uma pronúncia pouco diferente. Assim, existem claras diferenças auditivas entre os sinais em conflito, em especial no que se refere à pronúncia da primeira sílaba e à pausa entre as duas palavras que constituem as marcas anteriores.

45
Também os intervenientes consideram que não existe uma semelhança fonética. A palavra «hooligan» é conhecida e usual em França, mesmo com uma grafia ligeiramente diferente, bem como em Espanha, sendo pronunciada correctamente à inglesa. Assim, os termos «hooligan» e «Olly Gan» são constituídos por sequências vocálicas diferentes, a saber, respectivamente, [u‑i‑ä] e [o‑i‑a], e têm um acento tónico diferentemente situado, pois que incide, respectivamente, na primeira sílaba e na segunda palavra. Para mais, a pausa entre as duas palavras que compõem as marcas anteriores constitui uma diferença fonética suficiente.

46
Segundo o IHMI, uma vez que as marcas anteriores são desprovidas de significado, qualquer semelhança conceptual entre os sinais em conflito está excluída. Com efeito, por conhecer a palavra «hooligan», ou mesmo «holígane», e em razão das diferenças visuais e fonéticas entre as marcas em causa, o público pertinente não pode confundir a palavra «hooligan» com os termos «Olly Gan» [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Outubro de 2003, Phillips‑Van Heusen/IHMI – Pash Textilvertrieb und Einzelhandel (BASS), T‑292/01, ainda não publicado na Colectânea].

47
Segundo os intervenientes, não há semelhança conceptual entre as marcas em causa. A OLLY GAN é entendida como um nome masculino, sendo entendida como o nome de um «designer», prática corrente no domínio da moda, o que exclui outras associações. Em contrapartida, a palavra «hooligan» é amplamente utilizada nos textos franceses, italianos, portugueses e espanhóis. Assim, qualquer confusão conceptual está excluída.

48
O IHMI adianta que, uma vez que apenas há que ter em conta o carácter distintivo médio das marcas anteriores, as diferenças entre os sinais em conflito excluem qualquer risco de confusão (acórdão MYSTERY, n.° 41, supra).

49
Os intervenientes contestam a alegação de que as marcas anteriores são particularmente conhecidas.

Apreciação do Tribunal

50
Nos termos do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, o pedido de registo de uma marca será recusado, após oposição do titular de uma marca anterior, quando, devido à sua identidade ou semelhança com a marca anterior e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços designados pelas duas marcas, exista risco de confusão no espírito do público do território onde a marca anterior está protegida.

51
Segundo jurisprudência constante, o risco de confusão quanto à origem comercial dos produtos ou dos serviços deve ser apreciado globalmente segundo a percepção que o público pertinente tem dos sinais e dos produtos ou serviços em causa e tendo em conta todos os factores que caracterizam o caso específico, nomeadamente a interdependência entre a semelhança dos sinais e a dos produtos ou serviços designados [v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Julho de 2003, Laboratorios RTB/IHMI – Giorgio Beverly Hills (GIORGIO BEVERLY HILLS), T‑162/01, Colect., p. II‑2821, n.os 29 a 33, e a jurisprudência aí citada].

52
No que se refere à definição do público pertinente no caso vertente, todas as partes concordam em considerar que este é constituído, pelo menos, pelos consumidores médios franceses e portugueses.

53
Há que declarar seguidamente que a identidade dos produtos abrangidos pelas marcas em causa não é contestada no Tribunal.

54
No que se refere à semelhança dos sinais em conflito, resulta da jurisprudência que a apreciação global do risco de confusão deve, no que respeita à semelhança visual, auditiva ou conceptual das marcas em causa, basear‑se na impressão de conjunto produzida por estas, atendendo, em especial, aos seus elementos distintivos e dominantes (acórdãos do Tribunal de Justiça de 11 de Novembro de 1997, SABEL, C‑251/95, Colect., p. I‑6191, n.° 23, e de 22 de Junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C‑342/97, Colect., p. I‑3819, n.° 25). Há ainda lugar, aquando da determinação do seu grau de semelhança visual, auditiva e conceptual, a avaliar, se for caso disso, a importância que deve ser dada a estes diferentes elementos, tendo em conta a categoria de produtos ou serviços em causa e as condições em que são comercializados (acórdão Lloyd Schuhfabrik Meyer, já referido, n.° 27).

55
No caso vertente e no que respeita, para começar, à semelhança visual dos sinais em conflito, a Câmara de Recurso confirmou a apreciação da Divisão de Oposição de que tais sinais eram visualmente diferentes (n.° 20 da decisão impugnada). A recorrente limita‑se a declarar que os sinais em conflito têm em comum as letras «ol» e a sílaba final «gan».

56
Há que observar que a semelhança visual se limita aos elementos comuns referidos pela recorrente. Em contrapartida, os sinais em conflito apresentam diferenças visuais significativas. As marcas anteriores são constituídas por duas palavras, começando por um «o» e contendo um duplo «l» e um «y». A marca requerida é constituída por uma só palavra, começa por um «h» e contém um duplo «o» e um «i». É, pois, forçoso concluir que foi correctamente que a Câmara de Recurso considerou que os sinais em conflito eram visualmente diferentes.

57
No que respeita seguidamente à semelhança fonética dos sinais em conflito, a Câmara de Recurso considerou que a sua pronúncia era diferente segundo os dicionários espanhóis e franceses. Na audiência, o IHMI declarou que as Câmaras de Recurso tinham um conhecimento «interno» da pronúncia em diferentes línguas, atendendo às diferentes nacionalidades dos seus membros. A Câmara de Recurso considerou ainda que, uma vez que os consumidores médios franceses e portugueses conheciam o significado da palavra «hooligan», relacionada com o futebol, também conheciam a pronúncia dela. A pausa entre as palavras, presente na pronúncia das marcas anteriores e ausente na pronúncia da marca requerida, constitui também uma diferença fonética (n.os 21 e 22 da decisão impugnada).

58
Há que recordar que a pronúncia pelo consumidor médio de uma palavra de uma língua estrangeira na sua língua materna pode ser dificilmente determinada com precisão. Em primeiro lugar, não é certo que esta palavra seja reconhecida como estrangeira, sobretudo quando, como no caso vertente no que se refere ao consumidor francês, foi transformada de acordo com a grafia da língua de acolhimento. Assim, a palavra inglesa «hooligan» existe em francês sob a forma «houligan». Em segundo lugar, mesmo que a origem estrangeira da palavra em causa seja reconhecida, a sua pronúncia não é obrigatoriamente a da língua de origem. Com efeito, uma pronúncia correcta de acordo com a língua de origem supõe não apenas que se conheça essa pronúncia mas também que se esteja apto a pronunciar a palavra em causa com o acento correcto. Em terceiro lugar, no quadro da apreciação do risco de confusão, deveria ainda apurar‑se se uma fracção maioritária do público pertinente tem essa aptidão.

59
A este respeito, os dicionários da língua do público pertinente podem, em princípio, ser tidos em consideração tanto pela primeira instância do IHMI como pelas Câmaras de Recurso, mesmo sem terem sido submetidos às partes, uma vez que constituem, a priori, elementos notórios. Estes dicionários fornecem uma indicação pertinente da pronúncia correcta da palavra em causa na língua de acolhimento, mesmo que nada garanta que essa pronúncia correcta seja a realmente praticada na linguagem corrente. Além disso, o conhecimento que as diferentes instâncias do IHMI possuem, em razão das diversas nacionalidades dos seus agentes ou membros, pode eventualmente vir a confirmar os elementos destinados a definir a pronúncia do consumidor médio.

60
No que respeita ao conhecimento fonético da palavra «hooligan» pelo público pertinente, a Câmara de Recurso considerou com razão que esse público conhecia a palavra em razão do seu emprego usual no domínio futebolístico. Considerou ainda com razão que a primeira sílaba dessa palavra seria a priori pronunciada em francês «ou». A Câmara de Recurso podia validamente considerar que o consumidor francês conhecia quer o termo inglês «hooligan» e a pronúncia básica que lhe está associada quer o termo francês «houligan» tal como consta do dicionário francês a que se faz referência na decisão impugnada. Com efeito, a fracção do público pertinente francês que não conhece a palavra francesa e que pronuncia a palavra inglesa à maneira francesa apesar da sua origem manifestamente estrangeira é, inversamente, provavelmente pequena. Deste modo, mesmo que as vogais «ou» e «o» sejam vizinhas, provocam uma diferença fonética entre as marcas em conflito. No que se refere, em contrapartida, ao consumidor português, o raciocínio da Câmara de Recurso é prejudicado pelo facto de se ter erradamente apoiado num dicionário espanhol, sem pertinência no que se refere à língua falada por este consumidor. Além disso, a Câmara de Recurso sublinhou, com razão, que o facto de as marcas anteriores serem constituídas por duas palavras, enquanto a marca requerida é formada por uma só, constituía também uma diferença fonética pertinente entre as marcas em conflito.

61
Há no entanto que realçar que nada indica que as sílabas «li» da marca requerida e «ly» das marcas anteriores sejam pronunciadas de um modo diferente pelo público pertinente. Do mesmo modo, qualquer que seja o modo de a pronunciar, a sílaba «gan», comum às marcas em conflito, será entendida de modo idêntico pelo público pertinente. Também nada indica que a inicial «h» da marca requerida e a efectiva diferença de acento tónico quando as marcas em conflito são pronunciadas em língua inglesa permitam ao público pertinente, francês e português, diferenciar foneticamente as marcas em conflito, tal como pronunciadas por esse público.

62
Em conclusão, uma vez que as semelhanças fonéticas são mais importantes que as diferenças, as marcas HOOLIGAN e OLLY GAN apresentam uma semelhança fonética para o público pertinente. A Câmara de Recurso cometeu, portanto, um erro de apreciação ao considerar que os sinais em conflito são foneticamente diferentes para os consumidores médios francês e português.

63
No que respeita, finalmente, à semelhança conceptual dos sinais em conflito, a Câmara de Recurso considerou que, uma vez que tal semelhança se baseou, na decisão da Divisão de Oposição, apenas na semelhança fonética, a ausência desta última semelhança implicava o afastamento de qualquer semelhança conceptual.

64
Uma vez que este raciocínio parte de uma premissa que foi anteriormente considerada errada, há que declarar ainda que a decisão impugnada está errada neste ponto.

65
Todavia, a conclusão da Câmara de Recurso de que as marcas em conflito são conceptualmente diferentes está correcta.

66
É evidente, por um lado, que a marca requerida é intrinsecamente baseada no conceito de holígane. Além disso, não se contesta que este conceito é conhecido dos consumidores médios francês e português, nomeadamente em razão da sua utilização no domínio futebolístico. Deste modo, a marca requerida será certamente compreendida e assimilada neste sentido pelo público pertinente. Por outro lado, os termos das marcas anteriores não têm a priori qualquer significado e evocam em primeiro lugar um nome próprio e um nome de família. Este último conceito está amplamente espalhado no sector do vestuário e será, pois, plenamente assimilado pelo público pertinente, de modo que as marcas anteriores serão memorizadas nesse sentido. Só indirectamente, e estritamente de um ponto de vista fonético, poderá ser feita uma associação, no espírito do público pertinente, entre as marcas anteriores e o conceito de holígane. Esta associação assentaria no entanto numa confusão prévia das marcas em conflito, em razão da sua semelhança fonética. Ora, a percepção visual das marcas anteriores estabelecerá imediatamente uma distância entre o conceito de holígane e tais marcas. A este respeito, a Câmara de Recurso considerou correctamente que, em geral, a aquisição de uma peça de vestuário implica o exame visual das marcas (n.° 23 da decisão impugnada). O consumidor médio memorizará portanto as marcas anteriores de acordo com o conceito do nome de família e do nome próprio.

67
Nesta fase do raciocínio, há que examinar o argumento da recorrente de que as marcas anteriores são dotadas de um forte carácter distintivo intrínseco. Como já acima foi exposto, as marcas anteriores são construídas de um modo que será compreendido pelo público pertinente como a associação de um nome próprio com um nome de família. Este conceito é banal no sector do vestuário. Além disso, nada indica que o nome próprio e o nome de família escolhidos possam ser considerados particularmente significativos aos olhos do público pertinente. Não pode, portanto, afirmar‑se que as marcas anteriores tenham um forte carácter distintivo intrínseco.

68
Deste modo, no quadro da apreciação global da semelhança dos sinais em conflito, há que considerar que a Câmara de Recurso concluiu com razão, apesar do erro de apreciação no que respeita à ausência de semelhança fonética, que a diferença visual entre tais sinais e a ausência de semelhança conceptual implicam uma ausência de semelhança dos referidos sinais.

69
No quadro da apreciação global das marcas em conflito, a Câmara de Recurso concluiu pois correctamente, no n.° 23 da decisão impugnada, que o público pertinente não seria levado a confundir a marca requerida com as marcas anteriores, particularmente no domínio do vestuário.

70
Face a tudo o que precede, há que negar provimento ao recurso.


Quanto às despesas

71
Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, de acordo com o requerido pelo IHMI e pelos intervenientes.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

decide:

1)
É negado provimento ao recurso.

2)
A recorrente é condenada nas despesas.

Pirrung

Forwood

Papasavvas

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 1 de Fevereiro de 2005.

O secretário

O presidente

H. Jung

J. Pirrung


1
Língua do processo: alemão.

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