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Document 62003CC0134

Conclusões da advogada-geral Kokott apresentadas em 28 de Outubro de 2004.
Viacom Outdoor Srl contra Giotto Immobilier SARL.
Pedido de decisão prejudicial: Giudice di pace di Genova-Voltri - Itália.
Livre prestação de serviços - Concorrência - Serviços de afixação de mensagens publicitárias - Legislação nacional que institui um imposto municipal sobre a publicidade - Fornecimento pelos municípios de um serviço de afixação pública - Competência dos municípios para regulamentar a prestação de serviços de afixação de mensagens publicitárias - Imposição interna não discriminatória.
Processo C-134/03.

Colectânea de Jurisprudência 2005 I-01167

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2004:676

Conclusions

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL
JULIANE KOKOTT
apresentadas em 28 de Outubro de 2004(1)



Processo C‑134/03



Viacom Outdoor Srl
contra
Giotto Immobilier SARL



[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Giudice di pace de Genova‑Voltri (Itália)]

«Imposto municipal sobre a publicidade por afixação de cartazes – Empresas públicas (artigo 86.º CE) – Abuso de posição dominante no mercado (artigo 82.º CE) – Auxílios estatais (artigos 87.º CE e 88.º CE) – Livre prestação de serviços (artigos 49.º CE e 50.º CE) – Admissibilidade de um pedido prejudicial (artigo 234.º CE)»






I – Introdução

1.        No caso em apreço, está em causa uma regulamentação italiana com base na qual os municípios cobram impostos municipais sobre a publicidade, estabelecem determinadas regras para a difusão de mensagens publicitárias no seu território (entre outras, regras relativas ao número e localização dos suportes publicitários disponíveis) e também prestam um serviço próprio municipal de afixação de cartazes. No essencial, os municípios são acusados de exercerem actividade comercial num mercado cujas regras são simultaneamente por eles fixadas.

2.        Neste contexto, o Giudice di pace de Genova‑Voltri (a seguir «órgão jurisdicional de reenvio») submete ao Tribunal de Justiça questões relativas à interpretação das regras de concorrência do Tratado (artigos 82.° CE, 86.° CE, 87.° CE e 88.° CE) e da livre prestação de serviços (artigo 49.° CE). Com as suas questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio apela pela segunda vez ao Tribunal de Justiça, depois de este, por despacho de 8 de Outubro de 2002, ter declarado um primeiro pedido prejudicial sobre a mesma matéria como (manifestamente) inadmissível  (2) .

II – Enquadramento jurídico

A – Direito comunitário

3.        Os artigos 49.° CE, 50.° CE, 82.° CE, 86.° CE, 87.° CE e 88.° CE constituem o quadro jurídico de direito comunitário deste caso.

B – Direito nacional

Introdução

4.        Pode retirar‑se das observações que foram apresentadas ao Tribunal de Justiça que, fundamentalmente, a publicidade em suportes publicitários, nomeadamente, em cartazes, nos municípios italianos, pode fazer‑se de três modos diferentes. Em primeiro lugar, os particulares podem colocar os seus suportes publicitários em instalações particulares. Em segundo lugar, os particulares têm a possibilidade de utilizar o espaço público (por exemplo, ruas ou paredes de edifícios públicos) para montar os seus suportes publicitários (particulares). E, em terceiro lugar, podem afixar‑se mensagens publicitárias em instalações do município, tais como paredes para cartazes que são colocadas à disposição pelo respectivo município: neste caso, os cartazes podem ser afixados pelos próprios particulares, ou, então, por um serviço do município (a seguir «serviço municipal de afixação»).

5.        Em todos os casos incide um imposto municipal sobre a publicidade ; contudo, quando é utilizado o serviço municipal de afixação, o direito a pagar pela afixação já inclui este imposto.

As disposições de direito nacional em pormenor

6.        Do direito nacional italiano, há que chamar a atenção, em primeiro lugar, para o Decreto legislativo n.° 446, de 15 de Dezembro de 1997  (3) (a seguir «Decreto legislativo n.° 446/97»), cujo artigo 52.° atribui competência às províncias e aos municípios para, dentro de limites definidos pormenorizadamente, regulamentarem as suas receitas através de regulamentos.

7.        Além disso, o Decreto legislativo n.° 507  (4) , do Presidente da República, de 15 de Novembro de 1993, relativo à revisão e harmonização dos impostos municipais sobre a publicidade e do direito sobre a afixação em locais públicos  (5) (a seguir «Decreto legislativo n.° 507/93») é aplicável à publicidade em locais públicos.

8.        O artigo 1.° do Decreto legislativo n.° 507/93 dispõe:

«A publicidade exterior e a afixação pública estão sujeitas [...] respectivamente a um imposto ou à cobrança de um direito a favor do município em cujo território são realizadas.»

9.        O artigo 5.°, n.° 1, do Decreto legislativo n.° 507/93 prevê o seguinte:

«A difusão de mensagens publicitárias em locais públicos ou abertos ao público ou que sejam perceptíveis a partir desses locais, efectuada através de formas de comunicação visuais ou acústicas, diferentes das sujeitas ao direito de afixação, está sujeita ao imposto sobre a publicidade [...]»

Segundo informação prestada pelo órgão jurisdicional de reenvio, o imposto onera qualquer mensagem publicitária (particular) efectuada no território do município em que é feita.

10.      O sujeito passivo do imposto é, segundo o artigo 6.°, n.° 1, do Decreto legislativo n.° 507/93 «quem dispuser [...] do meio através do qual a mensagem publicitária é difundida».

11.      Segundo o artigo 9.°, n.° 7, do Decreto legislativo n.° 507/93, podem ainda ser cobrados, adicionalmente ao imposto municipal sobre a publicidade, direitos especiais de utilização, bem como determinadas remunerações (por exemplo, rendas), nos casos em que são utilizadas instalações públicas para a publicidade.

12.      Os artigos 18.° e seguintes do Decreto legislativo n.° 507/93 contêm disposições especiais sobre o serviço municipal de afixação que deve obrigatoriamente ser instituído em todos os municípios com mais de 3 000 habitantes. O artigo 18.°, n.° 1, daquele diploma dispõe, em resumo:

«O serviço de afixação pública visa garantir especificamente a afixação, pelo município, em suportes apropriados destinados a esse fim, de cartazes de qualquer tipo [...].»

13.      Acresce que o artigo 19.°, n.° 1, do Decreto legislativo n.° 507/93 determina o seguinte:

«A prestação do serviço de afixação pública de cartazes está sujeita ao pagamento, solidariamente, por parte de quem requer o serviço e da pessoa em cujo interesse o serviço é solicitado, de um direito que inclui o imposto sobre a publicidade, a favor do município que procede à sua execução.»

14.      Os artigos 3.° e 22.°, n.° 1, do Decreto legislativo n.° 507/93 obrigam os municípios, por um lado a regulamentar mais pormenorizadamente, nos termos legais, as taxas de imposto e as particularidades da cobrança do imposto municipal sobre a publicidade e, por outro, a emitir disposições sobre o seu serviço de afixação pública. Têm ainda de regulamentar a realização de publicidade, podendo limitar ou proibir determinadas formas de publicidade, por razões de interesse geral. Devem ainda prever disposições sobre os encargos, estabelecer disposições relativas à atribuição de licenças e elaborar um plano geral de instalações para publicidade. Além disso, devem determinar em que proporção as superfícies públicas podem ser utilizadas para publicidade de natureza não comercial e para publicidade de natureza comercial, e ainda a quantidade de superfície publicitária que fica disponível para a afixação directa de cartazes por parte de particulares.

15.      No município de Génova foi publicado, em 21 de Dezembro de 1998, um regulamento municipal para execução do Decreto legislativo n.° 507/93 (a seguir «regulamento municipal de 1998»)  (6) . Conforme resulta dos autos, o regulamento inclui, nomeadamente, a regulamentação das licenças (artigo 6.°), disposições relativas à segurança nas ruas e caminhos públicos (artigo 14.°), proibições relativas à protecção da natureza e dos monumentos (artigos 18.° e 19.°), assim como pormenores relativos ao pagamento do imposto municipal sobre a publicidade (artigos 29.° e seguintes).

16.      O regulamento municipal de 1998 foi revogado com efeitos a 1 de Janeiro de 2001 e, a partir daquela data, foi substituído por uma nova regulamentação  (7) .

III – Matéria de facto e processo principal

17.      No Giudice di pace de Genova‑Voltri está pendente um litígio entre a sociedade Viacom Outdoor Srl  (8) , com sede em Milão, Itália (a seguir «Viacom») e a sociedade Giotto Immobilier SARL, com sede em Menton, França (a seguir «Giotto»). A Giotto dedica‑se à venda de imóveis na Côte d’Azur francesa, a Viacom presta, a pedido dos seus clientes, serviços no sector da publicidade.

18.      A Viacom facturou à Giotto os serviços de afixação de cartazes publicitários que prestou à Giotto no mês de Outubro de 2000, na área do município de Génova. No âmbito desta facturação, a Viacom também reclama o pagamento de um valor de 439 385 ITL, ou seja, 226,92 euros, a título de reembolso do imposto municipal sobre a publicidade que foi pago ao município de Génova. Apenas esta parte da facturação está em litígio entre as partes.

19.      A Viacom fundamenta o seu pedido de pagamento num contrato celebrado entre as partes em 9 de Setembro de 2000. Nos termos desse contrato, a Giotto obrigou‑se a pagar à Viacom uma remuneração pela afixação de cartazes publicitários, em que se inclui, para além do preço da prestação de serviços, o reembolso de «encargos específicos e documentados» (em italiano «oneri specifice e documentati»).

20.      Contudo, a Giotto recusa‑se a reembolsar os respectivos encargos, afirmando que o imposto municipal sobre a publicidade é incompatível com o direito comunitário. O órgão jurisdicional de reenvio considera que se o imposto municipal sobre a publicidade for incompatível com o direito comunitário, o pedido da Viacom é improcedente.

IV – Pedido de decisão prejudicial e processo perante o Tribunal de Justiça

21.      Por essa razão, o Giudice di pace de Genova‑Voltri, por decisão de 10 de Março de 2003, suspendeu a instância e submeteu as seguintes questões ao Tribunal de Justiça para decisão prejudicial:

«1)
A atribuição a uma empresa pública (municípios) da gestão de um imposto e dos direitos como os examinados e relativos a um mercado que constitui uma parte substancial do mercado comum e no qual essa empresa pública actua em posição dominante é contrária:

a)
à aplicação do artigo 86.° CE em conjugação com o disposto no artigo 82.° CE;

b)
à aplicação do artigo 86.° CE em conjugação com o disposto no artigo 49.° CE?

2)
A atribuição à referida empresa pública do produto dos impostos e dos direitos em questão é contrária:

a)
à aplicação do artigo 86.° CE em conjugação com o disposto no artigo 82.° CE;

b)
à aplicação dos artigos 87.° CE e 88.° CE, na medida em que constitui um auxílio de Estado ilegal (não notificado), também incompatível com o mercado comum?»

22.      No processo perante o Tribunal de Justiça, a Viacom e a Comissão apresentaram observações escritas e orais, a Giotto e o Governo italiano, apenas apresentaram observações escritas. A Viacom, a Giotto e o Governo italiano responderam ainda por escrito a questões colocadas pelo Tribunal de Justiça.

V – Apreciação

A – Admissibilidade das questões prejudiciais

23.      A decisão proferida no processo Viacom I  (9) , na qual foi declarada a (manifesta) inadmissibilidade do primeiro pedido de decisão prejudicial não impede que o Giudice di pace de Genova‑Voltri possa novamente interpelar o Tribunal de Justiça. De facto, segundo a jurisprudência, o efeito vinculativo de um acórdão (ou despacho) num processo de decisão prejudicial não obsta a que o órgão jurisdicional nacional destinatário daquele acórdão (ou daquele despacho) possa julgar necessário voltar a apelar ao Tribunal de Justiça antes da decisão do processo principal  (10) . Contudo, fica ainda por esclarecer se as questões prejudiciais ora submetidas são admissíveis.

24.      Segundo jurisprudência constante, compete apenas ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão, como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, se as questões colocadas pelo juiz nacional forem relativas à interpretação do direito comunitário, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a decidir  (11) . A recusa de decisão quanto a uma questão prejudicial submetida pelo órgão jurisdicional nacional só é possível quando é manifesto que a interpretação ou a apreciação da validade de uma regra comunitária solicitada não têm qualquer relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, quando o problema é hipotético ou ainda quando o Tribunal não dispõe dos elementos de facto ou de direito necessários para responder utilmente às questões que lhe são colocadas  (12) .

25.      As dúvidas quanto à admissibilidade destas questões prejudiciais surgem em duas vertentes: por um lado, tendo em consideração a sua relevância para a decisão do processo principal e, por outro, no que diz respeito à definição do quadro factual e jurídico do processo principal.

1. Relevância das questões prejudiciais para a decisão

26.      No caso em apreço, colocam‑se essencialmente dois problemas respeitantes à relevância das questões prejudiciais para a decisão.

27.      Por um lado, a Comissão levantou a questão sobre se a decisão do litígio no processo principal depende mesmo de uma avaliação de todo o sistema que tem por base o Decreto legislativo n.° 507/93. Na opinião da Comissão, o objecto deste processo de decisão prejudicial deve limitar‑se aos elementos da regulamentação italiana que concretamente dizem respeito ao imposto municipal sobre a publicidade.

28.      De facto, no contexto da livre prestação de serviços (artigo 49.° CE) pode ser suficiente concentrarmo‑nos apenas nos efeitos do imposto municipal sobre a publicidade no comércio internacional. Contudo, uma decisão útil do Tribunal de Justiça sobre as regras da concorrência (artigos 82.° CE, 87.° CE e 88.° CE) pressupõe uma avaliação geral mais abrangente de todas as circunstâncias em que as mensagens publicitárias são difundidas nos municípios italianos. Isto porque só assim é que é possível analisar convenientemente se os municípios abusam eventualmente de uma posição dominante no mercado quando actuam no sector da publicidade em cartazes, simultaneamente, como empresas e como reguladores. Só assim é que se pode aferir se a cobrança do imposto municipal sobre a publicidade que incumbe a entidades municipais que também actuam, elas próprias, comercialmente no sector da publicidade através de afixação de cartazes representa um auxílio estatal proibido, na acepção do artigo 87.° CE.

29.      Por outro lado, as questões prejudiciais deixam de ter relevância para a decisão, se a Gioto, estiver, em qualquer caso , contratualmente obrigada a reembolsar o imposto municipal sobre a publicidade liquidado, ou seja, independentemente da legalidade ou da ilegalidade deste imposto. Neste caso, a resolução do litígio principal não depende da conformidade deste imposto com o direito comunitário.

30.      No entanto, a questão sobre a existência de uma obrigação por parte da Giotto que deva ser compreendida naquela acepção é unicamente uma questão de interpretação do contrato de 9 de Setembro de 2000  (13) , bem como do direito nacional aplicável e, em consequência, é da competência exclusiva do órgão jurisdicional de reenvio e não do Tribunal de Justiça  (14) .

31.      O Giudice di pace, na sua decisão de reenvio, toma claramente uma posição relativamente a este problema. Conforme salienta, em caso de ilegalidade do imposto municipal sobre a publicidade, os pedidos da autora não teriam fundamento legal e a sua acção teria de ser julgada improcedente  (15) . O Tribunal de Justiça, por seu turno, não pode deixar de partir deste princípio.

32.      Neste contexto, não se verifica no caso em apreço que as questões prejudiciais possam ser destituídas de relevância para a decisão. Elas estão relacionadas com a realidade e com o objecto do litígio principal e o problema apresentado pelo órgão jurisdicional de reenvio também não tem natureza meramente hipotética.

33.      Finalmente, deve ainda referir‑se que no presente caso também nada aponta para uma declaração de inadmissibilidade em razão da existência de um litígio artificial (fictício).

34.      Tanto quanto se pode verificar, o Tribunal de Justiça só rejeitou uma única vez um pedido de decisão prejudicial por assentar num litígio artificial. No entanto, na altura, resultou do procedimento perante o Tribunal de Justiça que as partes, por intermédio de uma «construção artificial», introduziram uma determinada cláusula no seu contrato, de modo a levar o órgão jurisdicional nacional a adoptar uma posição relativamente a uma determinada questão jurídica  (16) .

35.      No presente caso, não há indícios suficientes para uma tal conclusão. Em particular, e segundo a jurisprudência, o facto de as partes estarem de acordo quanto à interpretação do direito comunitário, ou seja, quanto ao resultado do processo de decisão prejudicial pretendido por ambas as partes, em nada altera a efectiva existência de um litígio entre elas  (17) . No entanto, quando dos elementos de facto indicados pelo órgão jurisdicional de reenvio não resulte de forma manifesta que na realidade se trata de um litígio fictício, as questões prejudiciais são – quanto a este ponto – admissíveis  (18) .

2. Apresentação do quadro factual e jurídico

36.      Acresce que, segundo jurisprudência constante, a necessidade de se chegar a uma interpretação do direito comunitário que seja útil ao órgão jurisdicional nacional exige que a decisão prejudicial defina o quadro factual e legal em que se inscrevem as questões que coloca ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que assentam essas questões  (19) . Estas exigências de exposição precisa do quadro factual e jurídico são particularmente válidas no domínio da concorrência, frequentemente caracterizado por uma grande complexidade  (20) . Esta exposição destina‑se ainda a dar a possibilidade aos governos dos Estados‑Membros, bem como às demais partes interessadas a possibilidade de apresentarem observações nos termos do artigo 23.° do Estatuto CE do Tribunal de Justiça  (21) . Além disso, há que ter em consideração que apenas as decisões de reenvio são notificadas aos interessados  (22) .

a) Quadro jurídico

37.      No que concerne ao quadro jurídico do seu pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio remete para o Decreto legislativo n.° 507/93 e esclarece, ainda que resumidamente, o seu conteúdo essencial. O texto deste diploma, bem como o do Decreto legislativo n.° 446/97 encontra‑se anexo à decisão de reenvio. Nesta são fornecidas, em especial, as indicações necessárias relativamente ao imposto municipal sobre a publicidade  (23) e esclarecidas as diferenças relativamente ao direito devido pela utilização do serviço de afixação pública de cartazes. Além disso, refere os pontos relativamente aos quais os municípios têm poderes para adoptar disposições regulamentares (por exemplo, exigência de licenciamento, limitações à publicidade por razões de interesse geral, definição de superfícies para afixação de cartazes, disposições sobre o serviço municipal de afixação). Deste modo, as disposições jurídicas italianas aplicáveis a nível nacional e as informações necessárias para a sua compreensão resultam com suficiente clareza da decisão de reenvio, bem como dos autos do processo principal.

38.      O mesmo não se passa com as disposições regulamentares aplicáveis a nível municipal. Nas suas respostas por escrito a uma questão do Tribunal de Justiça, a Viacom e a Giotto esclareceram, em consonância, que em Génova, no ano relevante para este efeito, 2000, era aplicável o regulamento municipal de 1998  (24) . Em contrapartida, o órgão jurisdicional de reenvio refere‑se, na sua decisão de reenvio, a duas novas deliberações do município de Génova que substituíram o regulamento municipal de 1998  (25) . Contudo, uma vez que estas novas deliberações só foram adoptadas pelo conselho municipal em 26 de Março de 2001 e apenas foram aplicadas a partir de 1 de Janeiro de 2001, não parece que sejam relevantes para a presente matéria de facto, que diz respeito ao ano de 2000  (26) . A decisão de reenvio não contém mais esclarecimentos a este respeito.

39.      Sem prejuízo desta lacuna em relação às disposições regulamentares do município de Génova, a exposição do quadro jurídico pode ser considerada suficiente para efeitos deste processo de decisão prejudicial. Isto porque os respectivos regulamentos municipais se destinam apenas ao aperfeiçoamento de um quadro jurídico que já se encontra fixado, nos seus elementos essenciais, a nível nacional, através do Decreto legislativo n.° 507/93. Por seu turno, estes elementos encontram‑se descritos e resumidos de um modo suficientemente claro na decisão de reenvio  (27) .

b) Quadro factual

40.      No que concerne à descrição do quadro factual, há que distinguir, na sua apreciação, as exigências respectivas que decorrem para um pedido de decisão prejudicial, por um lado, da livre prestação de serviços (artigo 49.° CE) e, por outro, das regras de concorrência do Tratado (artigos 82.° CE, 86.° CE, 87.° CE e 88.° CE).

41.      Para a resposta à questão 1, alínea b), relativa à livre prestação de serviços, a decisão de reenvio contém uma exposição sucinta, mas suficiente, dos elementos essenciais da matéria de facto. No essencial, dela pode retirar‑se que uma empresa italiana, no ano de 2000, prestou serviços em Génova a uma empresa francesa, no sector da publicidade em cartazes, e teve, para tanto, de pagar um imposto municipal.

42.      No entanto, persistem dúvidas relativamente às normas de concorrência do Tratado (artigos 82.° CE, 86.° CE, 87.° CE e 88.° CE). De facto, o Tribunal de Justiça também não deve, e logo neste âmbito, impor requisitos muito exigentes aos órgãos jurisdicionais nacionais na formulação de pedidos de decisão prejudicial, para, na prática, não lhes impossibilitar a apresentação de eventuais pedidos de decisão prejudicial. Até porque, com a entrada em vigor do Regulamento n.° 1/2003  (28) , a importância da colaboração judicial entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça aumentou ao invés de ter diminuído. No entanto, tal colaboração exige, ao mesmo tempo, dos órgãos jurisdicionais nacionais um especial cuidado na elaboração das suas decisões de reenvio no âmbito do direito da concorrência.

43.      No caso em apreço, a decisão de reenvio carece, muito relevantemente, de informações essenciais quanto à matéria de facto, para cuja falta, de resto, o Tribunal de Justiça já tinha chamado a atenção no processo Viacom I  (29) .

44.      Deste modo, a decisão de reenvio, para possibilitar ao Tribunal de Justiça dar uma resposta útil às questões de direito da concorrência, devia conter indícios suficientes para a delimitação dos mercados material e territorialmente relevantes, que constituem o ponto de partida de todas as decisões de direito da concorrência, também, e precisamente, para o cálculo das quotas de mercado. Porém, as informações da decisão de reenvio não apresentam um quadro claro, nem do ponto de vista material, nem do ponto de vista territorial.

45.     É certo que o mercado materialmente relevante é, ainda assim, resumidamente descrito: trata‑se de «serviços de afixação de cartazes (disponibilização de superfícies publicitárias) prestados pelos municípios em instalações municipais e por empresas privadas em instalações públicas ou particulares»; as prestações de serviços feitas pelos particulares e as do município são «perfeitamente intermutáveis». Contudo, não é esclarecido de modo mais preciso se o tipo de publicidade que é difundida através de empresas privadas e pelo serviço municipal de afixação de cartazes e se, em última análise, também os respectivos clientes, são, de facto, comparáveis. Designadamente, se o serviço municipal de afixação de cartazes estiver, em primeira linha, vocacionado para publicidade oficial, para comunicações de instituições e organizações sociais  (30) , enquanto os comerciantes, como, por exemplo, a Giotto, utilizam para as suas mensagens publicitárias sobretudo serviços de fornecedores particulares, tais como a Viacom, tal falaria a favor de uma delimitação de mercados materialmente distintos.

46.      No que respeita à delimitação geográfica do mercado, a decisão de reenvio apenas afirma que deve ser considerado como mercado territorialmente relevante «a totalidade do território municipal», uma vez que é esta a área em que se exerce a concorrência entre os municípios e as empresas de afixação. Em contrapartida, faltam, por exemplo, indicações sobre se – conforme é de esperar – as condições jurídicas básicas nos outros municípios italianos são iguais às de Génova, se os prestadores de serviços que actuam no sector da publicidade em cartazes como a Viacom, actuam regularmente em vários municípios ou apenas em Génova, e se as campanhas publicitárias dos seus clientes abrangem sobretudo apenas um município ou se têm carácter regional ou supra‑regional  (31) . A título de exemplo, não parece de modo nenhum despropositado que campanhas como a da Giotto a imóveis na Côte d’Azur sejam difundidas a nível supra‑regional e não se limitem apenas ao território municipal de Génova.

47.      Além disso, uma compreensão exacta das questões prejudiciais exigiria que a decisão prejudicial contivesse, pelo menos, indicações quanto ao número de prestadores de serviços, à sua posição no mercado relevante, nomeadamente, quanto às suas quotas de mercado aproximadas, também quanto às dos próprios municípios, na medida em que actuem nesse mercado. Do mesmo modo, seriam também necessárias indicações, pelo menos sumárias, relativamente ao número e à ordem de grandeza dos clientes que encomendam publicidade em cartazes. O pedido de decisão prejudicial do Giudice di pace de Genova‑Voltri não contém nenhum desses dois elementos. Por isso, é impossível reconhecer com segurança suficiente se numa matéria de facto tal como a do processo principal se pode sequer partir de uma posição dominante no mercado do serviço municipal de afixação (artigo 82.° CE)  (32) .

48.      O Giudice di pace também não expõe mais pormenorizadamente de onde poderia resultar uma eventual posição dominante no mercado por parte dos municípios italianos no sector da publicidade em cartazes. Limita‑se a alegar que é «manifestamente evidente que as disposições legislativas controvertidas colocaram os municípios numa situação tal que os conduz inevitavelmente a influenciar o mercado de acordo com a sua vontade, violando o artigo 82.° [CE]».

49.      Acresce que não se retira do pedido de decisão prejudicial se e em que medida a regulamentação italiana afecta o comércio entre Estados‑Membros. Estas indicações são indispensáveis para a compreensão e a resposta às questões que dizem respeito aos artigos 82.° CE e 87.° CE. Com base na descrição do órgão jurisdicional de reenvio não é, em particular, possível reconhecer em que medida a regulamentação italiana dificulta ou torna menos atractiva a operação no mercado italiano para os prestadores de serviços estrangeiros ou a utilização de serviços de prestadores particulares italianos por parte de clientes estrangeiros.

50.      Finalmente, também não se retira da decisão de reenvio o modo como os municípios italianos, e nomeadamente o município de Génova, organizam em particular o seu serviço municipal de afixação  (33) . Trata‑se de um serviço municipal com autonomia jurídica, dotado de personalidade jurídica própria, ou de um serviço da administração do município sem autonomia considerável? O serviço municipal de afixação tem um orçamento próprio ou é financiado pelo orçamento geral do município?  (34) . As receitas provenientes das cobranças do imposto municipal sobre a publicidade e do direito devido pela utilização do serviço municipal de afixação são exclusivamente imputados a este serviço de afixação ou revertem, sem nenhuma afectação especial, para o orçamento geral do município? A interpretação e a resposta às questões prejudiciais relativas aos artigos 86.° CE, bem como 87.° CE e 88.° CE depende decisivamente de indicações fiáveis quanto àqueles aspectos.

3. Conclusão provisória

51.      Considero a questão 1, alínea a), e a questão 2 do pedido de decisão prejudicial como inadmissíveis, em virtude da insuficiente exposição do quadro factual em que assentam as questões prejudiciais relativas à concorrência. Em contrapartida, a questão 1, alínea b), é admissível.

B – Apreciação do conteúdo das questões prejudiciais

52.      A seguir serão debatidos os problemas jurídicos relativos à livre prestação de serviços (artigos 49.° CE, 50.° CE) [questão 1, alínea b)]. Para o caso de o Tribunal de Justiça vir, além destes, a considerar admissíveis as questões respeitantes às regras da concorrência do Tratado, será ainda subsidiariamente tomada posição quanto à questão 1, alínea a), e à questão 2.

1. Quanto à questão 1, alínea b): livre prestação de serviços (artigos 49.° CE e 50.° CE)

53.      Com a sua questão 1, alínea b), o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, essencialmente, se a liberdade de prestação de serviços (artigo 49.° CE) se opõe a uma disposição jurídica nacional que estabelece um imposto municipal sobre a publicidade, devido pela realização de publicidade através da afixação de cartazes em locais públicos, a favor de municípios que, por seu turno, prestam um serviço municipal de afixação.

54.      Previamente, deve ser esclarecido que, no quadro da livre prestação de serviços, é indiferente que entidade e a favor de quem é cobrado um imposto indirecto. Por consequência, o facto de o imposto municipal sobre a publicidade ser cobrado pelos municípios italianos, que simultaneamente também têm um serviço municipal de afixação, é, em todo o caso, relevante no quadro das normas de concorrência do Tratado mas, no quadro da livre prestação de serviços.

55.      A liberdade de prestação de serviços beneficia tanto o prestador como o beneficiário dos serviços  (35) . Uma empresa como a Giotto que, contra o pagamento de uma remuneração, difunde publicidade em cartazes noutro Estado‑Membro, através de uma empresa aí estabelecida, como a Viacom, utiliza uma prestação de serviços na acepção dos artigos 49.° CE e 50.° CE  (36) .

a) A proibição de discriminação

56.      O artigo 49.° CE contém uma concretização especial do princípio geral da não discriminação  (37) . Em consequência, se a oneração com uma taxa for – sem justificação – maior para situações internacionais do que para situações puramente internas  (38) , não há dúvida que só por esse motivo existe uma violação da livre prestação de serviços.

57.      No entanto, no presente caso, não se vê que o imposto municipal sobre a publicidade possa – ainda que indirectamente – conduzir a uma discriminação, ainda que indirecta, das prestações de serviços transfronteiriças. O imposto municipal sobre a publicidade recai de igual forma sobre a publicidade através de afixação de cartazes feita para clientes nacionais e estrangeiros, ou por prestadores de serviços nacionais ou estrangeiros. Além disso, não incide apenas sobre as prestações de serviços realizadas por particulares, mas incide igualmente, e com igual montante, sobre eventuais prestações de serviços realizadas pelos próprios municípios através do seu serviço municipal de afixação  (39) . Desta forma, o imposto municipal sobre a publicidade surge como parte de um sistema geral tributário nacional que está ligado a critérios objectivos, não discriminatórios e que não se aplica diferenciadamente a actividades nacionais e transfronteiriças  (40) .

b) A proibição de restrições

58.      Além disso, o artigo 49.° CE exige, desde logo, de acordo com a sua letra, a supressão de qualquer restrição – ainda que indistintamente aplicada a prestadores nacionais e de outros Estados‑Membros –, quando seja susceptível de impedir, entravar ou tornar menos atractivas as actividades do prestador estabelecido noutro Estado‑Membro, onde presta legalmente serviços análogos  (41) .

59.      Se um prestador de serviços ou um destinatário da prestação de serviços for onerado com uma taxa, trata‑se em qualquer caso, sem dúvida, de uma restrição à livre prestação de serviços, se esse encargo financeiro fizer parte integrante de medidas específicas a que o prestador de serviços ou o destinatário da prestação tem de se sujeitar (por exemplo, controlos estatais sujeitos a taxas obrigatórias, processos de licenciamento mediante o pagamento de taxas obrigatórias, mas também a obrigação de utilização onerosa de determinadas instalações ou serviços, designadamente em portos)  (42) . De facto, uma taxa dessa natureza reforça o efeito de medidas que, por seu turno, são susceptíveis de impedir, entravar ou tornar menos atractivas as prestações de serviços ou a sua utilização.

60.      Em contrapartida, saber se a oneração com um imposto aplicável indiferenciadamente, a saber, com um imposto indirecto, também pode, por si só, levar a uma restrição não tem até agora obtido resposta inequívoca na jurisprudência  (43) . Duas soluções são possíveis.

i) A solução da justificação: um imposto nacional não discriminatório pode representar uma restrição e a sua justificação deve ser objecto de análise

61.     É pacífico que uma oneração com um imposto, ainda que mínima, pode encarecer uma actividade comercial e, como tal, torná‑la menos atractiva. Em todo o caso, o acórdão De Coster pode ser interpretado no sentido de que um imposto nacional deve ser sujeito a uma avaliação semelhante à que é normalmente aplicada às restrições  (44) .

62.      Se se tomar por base essa perspectiva, e se se considerarem os impostos nacionais como restrições às liberdades fundamentais, então todos os impostos, independentemente da sua natureza, estariam, em última instância, sujeitos à fiscalização do direito comunitário; os Estados‑Membros teriam então potencialmente de provar em cada caso concreto que os seus impostos se justificam por razões imperiosas de interesse geral, ou seja, que são adequados, necessários e proporcionais relativamente aos objectivos prosseguidos. Nessa altura, haveria, em todo o caso, que ter em consideração que a obtenção de verbas orçamentais é um pressuposto obrigatório da actuação do Estado, que, em consequência, constitui em princípio um fim legítimo e a cobrança de impostos – também por essa razão – é até pressuposta em muitos pontos do Tratado CE (v., eventualmente, os artigos 90.° CE, 93.° CE e 175.°, n.° 2, primeiro travessão, CE). Tem de ser deixada aos Estados‑Membros uma larga margem de discricionariedade no que respeita às suas decisões gerais de política orçamental  (45) , bem como quanto ao tipo e à forma dos impostos a cobrar. Não pode incumbir ao Tribunal de Justiça pôr em causa as decisões de política orçamental dos Estados‑Membros.

63.      Com efeito, verifica‑se sempre uma restrição inadmissível da livre prestação de serviços através de um imposto não discriminatório, quando esse imposto produz um efeito proibitivo, ou seja, quando, pela sua natureza, seja igual a uma proibição de actividade.

ii) A solução ao nível da previsão da norma: um imposto nacional não discriminatório está, à partida, excluído do âmbito de aplicação das liberdades fundamentais

64.      Pelo contrário, o Tribunal de Justiça apontou recentemente num caso –relativo à livre circulação de trabalhadores (artigo 39.° CE) – para outro caminho. A restrição através de um imposto nacional não discriminatório não foi sujeita à avaliação da sua justificação por razões imperiosas do interesse comum, conforme era habitual no caso das restrições; a formulação adoptada no acórdão Weigel  (46) aponta antes para que uma restrição daquela natureza deva ser completamente excluída do âmbito de aplicação das liberdades fundamentais:

«Todavia, o Tratado não garante a um trabalhador que a transferência das suas actividades para um Estado‑Membro diferente daquele em que residia até então seja neutra em termos de imposições. Tendo em conta as disparidades entre as legislações dos Estados‑Membros na matéria, essa transferência pode, conforme o caso, ser mais ou menos vantajosa ou desvantajosa para o trabalhador no plano das imposições indirectas. Daí resulta que, em princípio, uma eventual desvantagem em relação à situação em que esse trabalhador exercia as suas actividades antes da referida transferência não é contrária ao artigo 39.° CE, [...]» 47  –Acórdão Weigel (já referido na nota 40, n.° 55; o carácter não discriminatório do imposto naquele caso é estabelecido no n.° 53 do acórdão), v., ainda, n.° 36 das conclusões do advogado‑geral A. Tizzano, de 3 de Julho de 2003, no mesmo processo..

65.      A favor desta solução está o facto de as restrições de liberdades fundamentais se caracterizarem, de acordo com o entendimento clássico, por serem, em princípio, proibidas e apenas se poderem justificar em casos excepcionais – designadamente, por razões imperiosas de interesse geral. Em contrapartida, o Tratado CE, conforme já referido, pressupõe precisamente, numa série de disposições, que os Estados‑Membros cobrem impostos indirectos com base na sua soberania fiscal (v., designadamente, os artigos 90.° CE, 93.° CE e 175.°, n.° 2, primeiro travessão, CE), e isto, de modo nenhum apenas em casos excepcionais de interpretação restritiva. Estas disposições têm, portanto, em comum, a presunção de que a cobrança de impostos, que constituem uma parte de um sistema geral tributário nacional e que estão ligados a critérios objectivos e não discriminatórios e de que também não produzem efeitos diferenciados sobre as actividades nacionais e as transfronteiriças, não é proibida, mas, em princípio, admitida e não tem de ser justificada em cada caso concreto; são admitidas diferenças na tributação indirecta dos Estados‑Membros que podem eventualmente ser eliminadas pela via da harmonização, na medida em que tal seja necessário, por exemplo, para o funcionamento do mercado interno (artigo 93.° CE).

iii) Transposição para o caso em apreço: o imposto municipal sobre a publicidade

66.      No que diz respeito ao imposto municipal sobre a publicidade do direito italiano, aqui em causa, ambas as soluções conduzem ao mesmo resultado:

Se se adoptar a solução da previsão da norma, então um imposto indirecto que faz parte de um sistema tributário geral nacional, que está ligado a critérios objectivos e não discriminatórios, e que também não produz efeitos diferentes sobre as actividades nacionais e as transfronteiriças, não cai, desde logo, no âmbito de aplicação do artigo 49.° CE. Segundo as indicações disponíveis, o imposto municipal sobre a publicidade obedece a estes critérios 48  –Quanto à inexistência de discriminação, v., também, n.° 57 destas conclusões..

Em contrapartida, se se adoptar a solução da justificação , então o imposto municipal sobre a publicidade é, de facto, uma restrição à livre prestação de serviços, mas, simultaneamente, justificável sem qualquer problema: segundo todas as informações disponibilizadas, este imposto – de valor modesto – nem tem um efeito proibitivo, nem se consegue ver em que medida o legislador nacional e municipal possa ter ultrapassado a sua larga margem de discricionariedade em matéria de política orçamental, na fixação do imposto 49  –Por remissão para a jurisprudência dos tribunais administrativos italianos (Tribunale Amministrativo Regionale per la Toscana – TAR Toscana‑Firenze, acórdão n.° 456 de 11 de Março de 2002), a Comissão alega nas suas observações escritas que este imposto é de montante muito modesto («di ammontare molto modesto»)..

67.      Em suma, por essa razão, aplica‑se o seguinte: se a cobrança de um imposto indirecto tal como o imposto municipal sobre a publicidade, na Itália, fizer parte do sistema tributário geral nacional, se estiver ligada a critérios objectivos, não discriminatórios e se também não produzir efeitos sobre as actividades nacionais e as transfronteiriças, então o artigo 49.° CE não se lhe opõe.

2. Proibição de abuso de uma posição dominante no mercado (artigo 82.° CE, conjugado com o artigo 86.° CE)

68.      Relativamente ao artigo 82.° CE, em conjugação com o artigo 86.° CE), o órgão jurisdicional de reenvio coloca, ao todo, duas questões a que a seguir se responde subsidiariamente  (50) : a questão 1, alínea a), diz respeito aos poderes do município para fixar e cobrar impostos municipais, enquanto a questão 2, alínea a), diz respeito à atribuição ao município do produto desses impostos. Ambas as questões têm por tópico, no essencial, a possível existência de uma distorção da concorrência a favor do serviço municipal de afixação em prejuízo dos prestadores particulares.

a) Quanto à questão 1, alínea a): a conjugação de poderes regulamentares com a actividade empresarial (artigo 82.° CE, em conjugação com o artigo 86.° CE)

69.      Com a sua questão 1, alínea a), o órgão jurisdicional de reenvio pretende essencialmente saber se o artigo 82.° CE, em conjugação com o artigo 86.° CE, se opõe a uma disposição de direito nacional que atribui aos municípios, que prestam, eles próprios, um serviço municipal de afixação de cartazes, simultaneamente, a fixação e a cobrança («gestão») de impostos como o imposto municipal sobre a publicidade e os direitos pela prestação do serviço municipal de afixação.

70.      Desde logo, se se avaliar este poder dos municípios de fixação e cobrança de determinados impostos municipais pelas normas do direito comunitário da concorrência, resulta o seguinte.

71.      Pressuposto básico da aplicação do artigo 82.° CE (eventualmente, conjugado com o artigo 86.°, n.° 1, CE e com o artigo 10.° CE) é que um serviço municipal, no quadro da fixação e cobrança de tais impostos, possa ser considerado como uma empresa . No âmbito do direito da concorrência, o conceito de empresa abrange qualquer entidade que exerça uma actividade económica, independentemente do seu estatuto jurídico e do seu modo de financiamento  (51) .

72.      Uma actividade económica («empresarial») consiste na oferta de bens ou de serviços no mercado; desta distingue‑se a actuação do Estado no exercício da «autoridade pública». Para esta distinção é determinante a natureza da actividade respectivamente exercida. Para esse efeito, é necessário proceder, em cada caso, ao exame das actividades exercidas e determinar a que categoria pertencem  (52) .

73.      A fixação e cobrança de impostos , pela sua natureza, não é uma actividade económica, mas o exercício da autoridade pública. Os impostos, tais como o imposto municipal sobre a publicidade não são, contraprestações pela utilização de serviços concretos, usuais no mercado, mas destinam‑se, muito em geral, ao financiamento das entidades municipais  (53) ; a remuneração pela utilização do espaço público por mensagens publicitárias de particulares pode ser um eventual fim acessório do imposto  (54) , contudo, um tal fim acessório em nada altera a sua característica de imposto e não transforma esta colecta na contrapartida de um serviço. O carácter de acto de soberania da cobrança de impostos tem como consequência, que, nesta medida, as regras da concorrência não são aplicáveis aos municípios em causa  (55) .

74.      No que concerne ao direito devido pela utilização do serviço municipal de afixação, há que distinguir entre os seus dois elementos constitutivos.

Por um lado, este direito tem um elemento fiscal , uma vez que inclui o imposto municipal sobre a publicidade (artigo 19.°, n.° 1 do Decreto legislativo n.° 507/93); nesta parte, só o imposto municipal sobre a publicidade é pago através do direito, e relativamente à fixação e cobrança deste direito deve aplicar‑se o mesmo que para a fixação e cobrança do próprio imposto: os municípios actuam no exercício da autoridade pública, e não comercialmente.

Mas, por outro lado, este prémio contém também um elemento que ultrapassa o imposto municipal sobre a publicidade e que se destina a compensar a actividade do serviço municipal de afixação ( elemento remuneratório ); nesta parte , os municípios determinam a contrapartida pela prestação do seu serviço municipal de afixação 56  –O termo «serviço» (em italiano: «servizio») é expressamente empregue no artigo 19.°, n.° 1, do Decreto legislativo n.° 507/93. e, como tal, agem como empresas que actuam no mercado, ou seja, comercialmente 57  –Conforme resulta das observações apresentadas ao Tribunal de Justiça, o serviço público de afixação também está à disposição de associações e instituições sociais para as suas comunicações ao público. Desse modo, é fácil concluir que a actividade do serviço municipal de afixação consiste – em todo o caso, parcialmente – em serviços de interesse económico geral. Contudo, tal não altera em nada o carácter económico desta actividade, na acepção das regras da concorrência e, como tal, na confirmação do conceito de empresa. A natureza dos serviços pode, em todo o caso, ter alguma importância, num segundo momento, no âmbito dos artigos 16.° CE e 86.°, n.° 2, CE..

75.      Em consequência, um município ou um serviço municipal só actua comercialmente e só pode também ser considerado empresa, na acepção do direito comunitário da concorrência, na medida em que determina o elemento remuneratório do direito , nos termos do artigo 19.°, n.° 1, do Decreto legislativo n.° 507/93, ou seja, o elemento do direito pelo qual são remunerados os serviços prestados pelo seu serviço municipal de afixação.

76.      Em todo o caso, poderia constituir um abuso, na acepção do artigo 82.° CE, conjugado com o artigo 86.°, n.° 1, CE, se um município – admitida a posição dominante no mercado do seu serviço de afixação – fixar o elemento remuneratório do prémio, nos termos do artigo 19.°, n.° 1, do Decreto legislativo n.° 507/93, e em violação das regras da concorrência, de forma excessivamente elevada ou excessivamente baixa  (58) . No entanto, no caso em apreço não existem indícios suficientes para se poder concluir pela existência de tal abuso, cuja verificação exige uma apreciação de todas as circunstâncias do caso concreto  (59) .

77.      Em contrapartida, a mera competência para fixar e cobrar o imposto municipal sobre a publicidade – independentemente da já analisada falta de qualidade de empresa por parte do município – não constitui, à partida, razão para recear que o município possa estar a agir abusivamente, na acepção do artigo 82.° CE, conjugado com o artigo 86.°, n.° 1, CE. Este imposto é – independentemente da sua forma e do seu montante – neutro do ponto de vista da concorrência , uma vez que é cobrado tanto na utilização de serviços de prestadores de serviços privados, como na utilização do serviço municipal de afixação (neste último caso, como é sabido, o imposto já está incluído no direito, nos termos do artigo 19.°, n.° 1, do Decreto legislativo n.° 507/93)  (60) .

78.      A Viacom e a Giotto acusam os municípios italianos de exercerem outros poderes de autoridade, além da fixação e cobrança de impostos, com os quais regulamentam a difusão de publicidade no seu território, podendo, desse modo, influenciar o mercado a favor do seu próprio serviço municipal de afixação, designadamente, através da definição da localização e da área dos suportes disponíveis para afixação, bem como através de determinadas restrições à publicidade por razões de interesse público  (61) . Esta acusação é, basicamente, a de que os municípios actuam empresarialmente num mercado (através do seu serviço municipal de afixação) cujas regras de funcionamento eles próprios determinam (no exercício dos referidos poderes de autoridade)  (62) . Este conflito de interesses indicia desde logo, na opinião das partes, um abuso proibido de uma posição dominante no mercado  (63) .

79.      Quanto a este aspecto, aplica‑se desde logo o que já foi referido em relação ao imposto municipal sobre a publicidade: quando um município regulamenta a difusão de mensagens publicitárias, designadamente, proibindo ou restringindo determinadas formas de publicidade por razões de interesse público e, além disso, define as superfícies utilizáveis para afixação de publicidade, não actua como uma empresa, mas exerce funções de autoridade pública. O direito da concorrência não lhe é aplicável neste aspecto.

80.      Também corresponde a exigências legítimas do interesse público que os municípios regulamentem a difusão de mensagens publicitárias. Deste modo, pode ser exigível, do ponto de vista urbanístico, proibir publicidade em determinados locais do território do município, reduzir as áreas de afixação disponibilizadas ou proibir determinadas formas de publicidade. Do mesmo modo, as exigências da protecção do ambiente ou da segurança rodoviária podem justificar restrições. Na definição e realização dos seus objectivos urbanísticos e de outras exigências de interesse público, os municípios devem dispor de uma margem de discricionariedade suficiente.

81.      De resto, uma violação do artigo 86.°, n.° 1, CE, em conjugação com o artigo 82.° CE e eventualmente com o artigo 10.° CE, apenas pode estar em causa quando um município ultrapassa as fronteiras da margem de discricionariedade que lhe é concedida e, ao exercer poderes de autoridade, distorcer a concorrência a favor da sua própria empresa municipal, ou seja, quando o município, ao cumprir as suas funções de autoridade, favorecer o serviço municipal de afixação por ele gerido – seja a sua posição dominante no mercado – em detrimento dos prestadores de serviços privados que actuam no mesmo mercado  (64) . Tal seria, designadamente, o caso, se o município se atribuísse a parte de leão das superfícies disponíveis para afixação ou, invocando o interesse público, sujeitasse a actividade dos prestadores de serviços privados a condições mais exigentes do que as aplicáveis aos seus próprios serviços municipais de afixação.

82.      Contudo, só com base numa apreciação abrangente de todas as circunstâncias do caso concreto é que se pode avaliar se tudo isto se verifica no presente caso. Em particular, não é suficiente proceder a uma consideração meramente aritmética das superfícies atribuídas para afixação  (65) e contabilizar simplesmente quanto está reservado aos prestadores de serviços privados e quanto está reservado ao serviço municipal de afixação. Como correctamente alegou a Comissão na audiência, a qualidade e a localização das respectivas superfícies de afixação são determinantes. Além disso, deve ser tomado em consideração se e em que medida eventuais restrições do município também se aplicam à utilização de superfícies privadas. Com base nas informações de que o Tribunal de Justiça dispõe, não existem, em qualquer caso, indícios suficientes de um favorecimento do serviço municipal de afixação por parte do município do Génova.

83.      Em circunstâncias tais como as que resultam do processo principal, os artigos 82.° CE e 86.°, n.° 1, CE não se opõem a uma legislação nacional que estabelece um imposto municipal sobre a publicidade ou um direito devido pela publicidade através de afixação de cartazes em locais públicos, a favor dos municípios que, simultaneamente, também prestam um serviço municipal de afixação.

b) Quanto à questão 2, alínea a): atribuição ao serviço de afixação do produto do imposto sobre a publicidade (artigo 82.° CE, em conjugação com o artigo 86.° CE)

84.      Com a sua questão 2, alínea a), o órgão jurisdicional de reenvio pretende essencialmente saber se, uma disposição jurídica nacional que atribui aos municípios que também prestam um serviço de afixação o produto de impostos tais como o imposto municipal sobre a publicidade e o direito pelo serviço municipal de afixação, é contrária ao artigo 82.° CE, em conjugação com o artigo 86.° CE.

85.      O artigo 86.°, n.° 1, CE proíbe os municípios, como detentores de autoridade pública, de levar empresas públicas a adoptar um comportamento que, por seu turno, seja contrário ao artigo 82.° CE  (66) . Por conseguinte, se o município colocasse meios provenientes do imposto municipal sobre a publicidade à disposição do seu serviço de afixação, não se poderia excluir que isso tivesse como efeito uma distorção da concorrência em detrimento dos prestadores de serviços privados e a favor do serviço público de afixação  (67) .

86.      No entanto, o serviço municipal de afixação faz parte do município e não existem indícios de que possua uma autonomia organizativa relevante e, em particular, um orçamento próprio, ou uma contabilidade independente. Pelo contrário, de partir‑se do princípio de que o serviço municipal de afixação é directamente financiado pelo orçamento do município e que tanto os rendimentos como as despesas deste serviço são nele directamente inscritos sob as respectivas rubricas  (68) . Contudo, sem um mínimo de separação organizativa e de transparência  (69) não se pode simplesmente apurar se e em que medida o produto dos impostos, em particular, o produto do imposto municipal sobre a publicidade, reverte a favor do serviço municipal de afixação.

87.      Ainda que se admitisse que o serviço municipal de afixação goza de suficiente autonomia organizativa, as informações disponíveis não permitem concluir com segurança que o município de Génova dê causa a comportamento abusivo, contrário à concorrência.

88.      Até agora, tanto quanto se sabe, o Tribunal de Justiça só admitiu que se criou uma situação que permitiu a uma empresa abusar da sua posição dominante no mercado, nos casos em que o Estado concedeu direitos especiais a essa empresa – geralmente, uma posição de monopólio – e o tipo de concessão ou o comportamento subsequente do Estado «sugere» à empresa uma utilização abusiva da sua posição  (70) . Em todos os casos foi sempre exigido um nexo de causalidade específico entre os direitos atribuídos, a situação criada e o abuso da posição dominante no mercado por parte da empresa.

89.      Uma vez que, de facto, o artigo 86.°, n.° 1, CE proíbe os Estados‑Membros de tomarem ou adoptarem medidas daquela natureza, não apenas no que respeita às empresas a que concedam direitos especiais ou exclusivos , mas também no que respeita às empresas públicas , podem, evidentemente, tirar‑se conclusões semelhantes para este sector  (71) . Não é apenas a concessão de determinados direitos ou monopólios, mas também a disponibilização de meios financeiros que pode colocar uma empresa pública numa situação em que é evidente que irá abusar da sua – alegada – posição dominante no mercado  (72) .

90.      Neste contexto, devia analisar‑se, mediante a apreciação de todas as circunstâncias do caso concreto, se a natureza e a dimensão de uma eventual atribuição do produto do imposto municipal sobre a publicidade ao serviço municipal de afixação são aptos a produzir junto deste um comportamento contrário à concorrência. No entanto, no caso em apreço, não existem nenhumas indicações concretas, desde logo, no que respeita a uma tal atribuição de meios.

91.      Em circunstâncias tais como as que resultam do processo principal, os artigos 82.° CE e 86.°, n.° 1, CE não se opõem a uma legislação nacional que estabelece um imposto municipal sobre a publicidade ou um direito pela afixação de cartazes em locais públicos, cobrado a favor dos municípios que, simultaneamente, também prestam eles próprios um serviço municipal de afixação.

3. Quanto à questão 2, alínea b): proibição de auxílios concedidos pelos Estados (artigos 87.° CE e 88.° CE)

92.      Com a sua questão 2, alínea b), à qual a seguir respondo subsidiariamente  (73) , o órgão jurisdicional de reenvio pretende essencialmente saber se estamos perante um auxílio estatal (eventualmente proibido), na acepção do artigo 87.° CE, que, além disso, está sujeito à obrigação de comunicação, bem como à proibição de execução, nos termos do artigo 88.°, n.° 3, CE, quando o produto de impostos tais como o imposto municipal sobre a publicidade e o direito devido pelo serviço municipal de afixação é atribuído a municípios que também prestam, eles próprios, serviços de afixação.

93.      A Viacom e a Giotto, mas também o órgão jurisdicional de reenvio, consideram que a atribuição do produto do imposto municipal sobre a publicidade, bem como do direito pago pelo serviço municipal de afixação aos municípios, constitui um auxílio estatal ilícito. Uma vez que o imposto municipal sobre a publicidade infringe o direito comunitário, consideram que não existe a obrigação de o pagar. Assim, a questão controvertida entre as partes e o cerne do pedido prejudicial são quer a utilização quer a cobrança do imposto municipal sobre a publicidade, e ainda do direito pela utilização do serviço municipal de afixação.

a) O imposto municipal sobre a publicidade

94.      No que respeita ao imposto municipal sobre a publicidade, há várias razões que – com base nos elementos de que o Tribunal de Justiça dispõe – são contra a aplicação das disposições do Tratado CE relativas a auxílios estatais.

95.      Mesmo que se admita , com o órgão jurisdicional de reenvio e as partes no processo principal, que o município deve, em geral, ser considerado uma empresa, isso não conduziria à aplicabilidade das disposições relativas aos auxílios estatais. Isto porque na fundamentação dessa conclusão, faltaria a proveniência estatal dos meios se o imposto municipal sobre a publicidade devesse ser considerado como uma prestação em dinheiro de uma empresa privada (o anunciante, por exemplo, a Viacom) a outra empresa (o município). Na falta de uma transferência de recursos estatais não haveria, por consequência, nenhum auxílio; o facto de a obrigação de pagamento do imposto municipal sobre a publicidade resultar de disposições jurídicas imperativas em nada altera esta situação  (74) .

96.      Por conseguinte, o único cenário no qual se pode colocar a questão da qualidade de auxílio estatal do imposto municipal sobre a publicidade é o de uma relação triangular, na qual, em primeiro lugar, o município cobra o imposto com os seus poderes de autoridade e depois concede a um serviço municipal de afixação suficientemente autónomo um auxílio proveniente do produto daquele imposto. No entanto, conforme já ficou exposto, nem a decisão de reenvio nem as observações das partes contêm indícios suficientes de que o serviço municipal de afixação tem autonomia organizativa e, em particular, orçamental ou contabilística bastante  (75) . No entanto, se faltar uma «relação externa» que permita fundamentar a conclusão de que existe uma afectação especial das receitas provenientes dos impostos, falta um destinatário independente do auxílio: um município não se pode subvencionar a si próprio.

97.      Contudo, ainda que se admitisse a necessária autonomia organizativa do serviço municipal de afixação, nem por isso a cobrança do imposto municipal sobre a publicidade ficaria desde logo abrangida pela proibição dos auxílios estatais do artigo 87.° CE, pela obrigação de comunicação e pela proibição de execução do artigo 88.°, n.° 3, CE. Para tanto, tinham de estar preenchidas condições complementares  (76) , em particular, teria de haver uma relação indirecta e incindível entre a cobrança do imposto municipal sobre a publicidade e uma subvenção concreta, eventualmente, do município ao seu serviço de afixação  (77) . Só existindo tal relação directa é que a eventual ilicitude de um auxílio pode afectar a cobrança de impostos e o direito dos auxílios abranger também a cobrança de impostos.

98.      No caso em apreço, não existem indícios nem de um auxílio (ilícito), cuja existência seria em todo o caso um pressuposto, nem da necessária relação directa e incindível entre o auxílio e a cobrança do imposto. Com base nos elementos disponíveis, deve, nomeadamente, presumir‑se que o imposto municipal sobre a publicidade é afectado a uma utilização geral no orçamento do município e não a um fundo especial especificamente para o financiamento do serviço municipal de afixação.

b) O direito devido pela utilização do serviço municipal de afixação

99.      No que diz respeito ao direito pela utilização do serviço municipal de afixação, este é constituído, conforme já referido, por um elemento fiscal e por um elemento de remuneração pela prestação do serviço de afixação  (78) .

100.    No que concerne ao elemento fiscal , aplica‑se, mutatis mutandis , o acima exposto  (79) .

101.    No que respeita ao elemento remuneratório , não pode, desde logo, tratar‑se de nenhum auxílio: o seu pagamento não é proveniente de recursos estatais, mas de recursos privados de clientes do serviço municipal de afixação  (80) e é contrapartida dessas prestações; não se trata de uma vantagem económica que o serviço público de afixação não pudesse alcançar, em condições normais de mercado  (81) .

c) Conclusão provisória

102.    Nas circunstâncias tais como as que resultam do processo principal, os artigos 87.° CE e 88.° CE não se opõem a uma legislação nacional que estabelece um imposto municipal sobre a publicidade ou um direito devido pela publicidade através de afixação de cartazes em locais públicos a favor dos municípios que, simultaneamente, prestam eles próprios um serviço municipal de afixação.

VI – Conclusão

103.    Com base nas considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda do seguinte modo às questões prejudiciais:

«1)
O artigo 49.° CE não se opõe à cobrança de um imposto indirecto como o imposto municipal sobre a publicidade, em Itália, se ele fizer parte de um sistema tributário geral nacional, se estiver ligado a critérios objectivos, não discriminatórios e se também não produzir efeitos diferentes sobre actividades nacionais e transfronteiriças.

2)
Quanto ao restante, o pedido de decisão prejudicial deve ser julgado inadmissível.

Subsidiariamente, proponho ao Tribunal de Justiça que responda do seguinte modo às questões 1, alínea a) e 2:

Em circunstâncias tais como as que resultam do processo principal, o artigo 82.° CE e os artigos 87.° CE e 88.° CE, eventualmente em conjugação com o artigo 86.°, n.° 1, CE, não se opõem a uma legislação nacional que estabelece um imposto municipal sobre a publicidade ou um direito devido pela publicidade através de afixação de cartazes em locais públicos a favor dos municípios que, além disso, prestam eles próprios um serviço municipal de afixação e estão, simultaneamente, incumbidos de fixar e cobrar o referido imposto.»


1
Língua original: alemão.


2
Despacho de 8 de Outubro de 2002, proferido no processo Viacom I (C‑190/02, Colect., p. I‑8287).


3
GURI n.° 298, de 23 de Dezembro de 1997, suplemento ordinário.


4
Regulamento com força de lei.


5
Este Decreto legislativo tem como título «Revisione ed armonizzazione dell’imposta comunale sulla pubblicità e del diritto sulle pubbliche affissioni», e está publicado em GURI n.° 288, de 9 de Dezembro de 1993, suplemento ordinário. Ao caso em apreço aplica‑se a redacção do Decreto del Presidente della Repubblica n.° 43, de 28 de Janeiro de 1998 e do Decreto legislativo n.° 112, de 13 de Abril de 1999.


6
Novo regulamento relativo à aplicação do imposto sobre a publicidade e à prestação do serviço de afixação pública ( Nuovo regolamento per l’applicazione dell’imposta sulla pubblicità e per l’effettuazione del servizio delle pubbliche affissioni ). Este regulamento municipal sofreu alterações nos anos de 1999 e 2000.


7
Artigo 39.° do regulamento municipal de 26 de Março de 2001 (Deliberação n.° 36/2001 do município de Génova).


8
Anteriormente: Società Manifesti Affissioni SpA.


9
Já referido na nota 2.


10
Acórdão de 5 de Março de 1986, Wünsche III (69/85, Colect., p. 947, n.° 15).


11
V., por todos, acórdãos de 15 de Dezembro de 1995, Bosman (C‑415/93, Colect., p. I‑4921, n.° 59); de 13 de Março de 2001, PreussenElektra (C‑379/98, Colect., p. I‑2099, n.° 38); de 10 de Dezembro de 2002, Der Weduwe (C‑153/00, Colect., p. I‑11319, n.° 31); de 4 de Dezembro de 2003, EVN AG e Wienstrom (C‑448/01, Colect., p. I‑0000, n.° 74); e de 25 de Março de 2004, Ribaldi (C‑480/00, C‑481/00, C‑482/00, C‑484/00, C‑489/00, C‑490/00, C‑491/00, C‑497/00, C‑498/00 e C‑499/00, Colect., p. I‑0000, n.° 72).


12
Acórdãos Bosman (n.° 61), PreussenElektra (n.° 39) e Ribaldi (n.° 72), tal como os acórdãos EVN AG e Wienstrom (n.° 76) e Der Weduwe (n.° 33), respectivamente já referidos na nota 11.


13
Conforme referido, a Giotto está contratualmente obrigada ao reembolso de «encargos específicos e documentados» (em italiano: «oneri specifici e documentati»).


14
Num procedimento ao abrigo do artigo 234.° CE, que assenta numa clara repartição de competências entre os tribunais nacionais e o Tribunal de Justiça, é apenas ao órgão jurisdicional de reenvio que incumbe a apreciação do contexto factual em concreto e a interpretação do direito nacional. V., neste sentido, por todos, acórdãos de 16 de Setembro de 2004, Baldinger (C‑386/02, Colect., p. I‑0000, n.° 14); de 25 de Outubro de 2001, Ambulanz Glöckner (C‑475/99, Colect., p. I‑8089, n.° 10); e de 16 de Julho de 1998, Dumon e Froment (C‑235/95, Colect., p. I‑4531, n.° 25), com várias remissões.


15
P. 3 da decisão de reenvio, parágrafo B (II). A interpretação de um contrato de direito civil segundo as normas aplicáveis do direito nacional é tarefa própria do órgão jurisdicional nacional. Neste ponto, o caso em apreço distingue‑se do acórdão Der Weduwe, no qual um tribunal belga assentou o seu pedido de decisão prejudicial, sem maior fundamentação, numa presunção meramente hipotética, nomeadamente, numa interpretação insegura do direito luxemburguês, ou seja, de um direito estrangeiro, que não era o seu (acórdão referido na nota 11, n. os  37 a 39).


16
Acórdão de 11 de Março de 1980, Foglia (104/79, Recueil, p. 745, n.° 10).


17
Acórdão de 9 de Fevereiro de 1995, Leclerc‑Siplec (C‑412/93, Colect., p. I‑179, n.° 14).


18
Neste sentido, v., também, acórdão de 21 de Setembro de 1988, Van Eycke (267/86, Colect., p. 4769, n.° 12).


19
Acórdãos de 26 de Janeiro de 1993, Telemarsicabruzzo e o. (C‑320/90 a C‑322/90, Colect., p. I‑393, n.° 6), e de 13 de Abril de 2000, Lehtonen e Castors Braine (C‑176/96, Colect., p. I‑2681, n.° 22), bem como despachos de 19 de Março de 1993, Banchero (C‑157/92, Colect., p. I‑1085, n.° 4), de 30 de Junho de 1997, Banco de Fomento e Exterior (C‑66/97, Colect., p. I‑3757, n.° 7), de 28 de Junho de 2000, Laguillaumie (C‑116/00, Colect., p. I‑4979, n.° 15), e Viacom I (já referido na nota 2, n.° 15).


20
Acórdão Lehtonen e Castors Braine (já referido na nota 19, n.° 22), bem como despachos Banchero (já referido na nota 19, n.° 5), Laguillaumie (já referido na nota 19, n.° 19) e Viacom I (já referido na nota 2, n.° 22).


21
Acórdão Ribaldi (já referido na nota 11, n.° 73); despacho de 11 de Fevereiro de 2004, Cannito e o. (C‑438/03, C‑439/03, C‑509/03 e C‑2/04, Colect., p. I‑0000, n. os  6 a 8, com várias remissões); acórdão Telemarsicabruzzo (já referido na nota 19, n.° 6); e acórdão Viacom I (já referido na nota 2, n.° 14).


22
Acórdão de 1 de Abril de 1982, Holdjik e o. (141/81 a 143/81, Recueil, p. 1299, n.° 6); despacho Banco de Fomento e Exterior (já referido na nota 19, n.° 7); acórdão Lehtonen e Castors Braine (já referido na nota 19, n.° 23); despacho Laguillaumie (já referido na nota 19, n.° 14); e despacho Viacom I (já referido na nota 2, n.° 14).


23
Quanto às indicações, v., em particular, n. os  19 e 20 do despacho Viacom I (já referido na nota 2).


24
A este respeito, v. n. os  15 e 16 destas conclusões.


25
Trata‑se da Deliberação n.° 35/2001, com um regulamento relativo à aplicação do direito devido pela instalação de suportes publicitários ( Regolamento per l’applicazione del canone per l’installazione di mezzi pubblicitari ), bem como da Deliberação n.° 36/2001, com um regulamento relativo à aplicação do direito e à prestação do serviço de afixação pública ( Regolamento per l’applicazione del diritto e per l’effettuazione del servizio delle pubbliche affissioni ).


26
O regulamento junto à Deliberação n.° 36/2001 do município de Génova, de 26 de Março de 2001, determina, no artigo 39.°, o dia 1 de Janeiro de 2001 como data da sua entrada em vigor e prevê para a mesma data a revogação do regulamento de 1998. No entanto, as relações jurídicas de direito fiscal anteriores a 1 de Janeiro de 2001 são expressamente salvaguardadas dos efeitos da revogação. Do mesmo modo, o regulamento junto à Deliberação n.° 35/2001 do município de Génova fixa, no seu artigo 19.°, o dia 1 de Janeiro de 2001 como data da sua entrada em vigor.


27
V. n.° 37 destas conclusões. Além disso, as partes no processo principal, bem como a Comissão, prestaram algumas informações complementares nas suas observações escritas e orais.


28
Regulamento (CE) n.° 1/2003, do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado (JO 2003, L 1, p. 1).


29
Despacho Viacom I (já referido na nota 2, n. os  21 e 22).


30
Tal é sugerido pela Comissão nas suas observações escritas. Ao fazê‑lo, a Comissão também remete para a jurisprudência dos tribunais administrativos italianos, em particular, para o acórdão n.° 1490 do Tribunale Amministrativo Regionale per la Lombardia (TAR Lombardia‑Milano), de 17 de Abril de 2002, do qual resulta que o espírito e o objectivo do serviço municipal de afixação de cartazes é assegurar o exercício efectivo do direito fundamental da liberdade de expressão garantido pelo direito constitucional.


31
V., além de muitos, as alegações da Comissão na sua Decisão de 14 de Setembro de 2001 no processo de fiscalização de uma operação de concentração COMP/M.2529 – JCD/RCS/Publitransport/IGP (n.° 10).


32
Muito pelo contrário, a Comissão remete, nas suas observações escritas e orais, para várias decisões de serviços da concorrência das quais se pode retirar que no sector da publicidade em cartazes em Itália vigora uma concorrência eficaz. Trata‑se da já referida decisão da Comissão, de 14 de Setembro de 2001 (v. nota 31, em particular, n.° 15), bem como de decisões da Autorità Garante della Concorrenza e del Mercato italiana n.° 7781 (C3738), de 2 de Dezembro de 1999; n.° 80119 (C3843), de 10 de Fevereiro de 2000; n.° 8463 (C4047), de 6 de Julho de 2000; n.° 11442 (C5428), de 27 de Novembro de 2002; e n.° 12561 (I583), de 30 de Outubro de 2003.


33
A este respeito, apenas se pode retirar da decisão de reenvio que o município de Génova dispõe, para o seu serviço de afixação, entre outros, de «responsáveis do serviço, serviços técnicos, mão‑de‑obra de trabalhadores assalariados e suportes técnicos, isto é, dispõe de uma organização muito semelhante à das empresas privadas concorrentes no mesmo sector». O serviço municipal de afixação é exercido pelo município no quadro de uma disponibilização específica de meios financeiros e materiais, que nada têm que ver com as suas atribuições institucionais, mas com o exercício de uma actividade empresarial que visa a obtenção de lucros.


34
Na opinião da Viacom, como decorre das suas observações escritas e orais, trata‑se de um serviço sem autonomia considerável e sem orçamento próprio.


35
Acórdãos de 13 de Julho de 2004, Comissão/República Francesa (C‑262/02, Colect., p. I‑0000, n.° 22) e Bacardi France (C‑429/02, Colect., p. I‑0000, n.° 31).


36
Analogicamente, por exemplo, acórdão de 24 de Outubro de 1978, Koestler (15/78, Colect., p. 665, n.° 3, relativo a prestações de serviços bancários).


37
V. acórdãos de 28 de Outubro de 1999, Vestergaard (C‑55/98, Colect., p. I‑7641, n. os  16 e 17), e de 11 de Dezembro de 2003, AMOK (C‑289/02, Colect., p. I‑0000, n. os  25 e 26).


38
Tal sucedeu, por exemplo, nos acórdãos de 13 de Dezembro de 1989, Corsica Ferries France (C‑49/89, Colect., p. 4441, n.° 7); de 5 de Outubro de 1994, Comissão/República Francesa (C‑381/93, Colect., p. I‑5145, n. os  17 a 21); de 29 de Novembro de 2001, De Coster (C‑17/00, Colect., p. I‑9445, n. os  30 a 35); e de 21 de Março de 2002, Cura Anlagen (C‑451/99, Colect., p. I‑3193, n. os  65 a 69).


39
De facto, segundo o artigo 19.°, n.° 1, do Decreto legislativo n.° 507/93, pela utilização do serviço municipal de afixação «é devido o pagamento [...] de um direito que inclui o imposto sobre a publicidade , a favor do município que procede à sua execução». (O sublinhado é meu).


40
Quanto ao problema semelhante da tributação de mercadorias (artigo 90.° CE), v. acórdãos de 7 de Maio de 1987, Co‑Frutta (193/85, Colect., p. 2085, n. os  10 e segs.), e de 9 de Setembro de 2004, Carbonati Apuani (C‑72/03, Colect., p. I‑0000, n.° 17). V., também, acórdão de 29 de Abril de 2004, Weigel (C‑387/01, Colect., p. I‑0000, n.° 55, in fine ).


41
V., também, acórdãos de 18 de Junho de 1998, Corsica Ferries France (C‑266/96, Colect., p. I‑3949, n.° 56); de 20 de Fevereiro de 2001, Analir e o. (C‑205/99, Colect., p. I‑1271, n.° 21); de 13 de Junho de 2002, Sea‑Land Service (C‑430/99 e C‑431/99, Colect., p. I‑5235, n.° 32). V., também, acórdãos Comissão/República Francesa (n.° 22) e Bacardi France (n.° 31), já referidos na nota 35.


42
V., neste sentido, entre muitos, acórdãos Corsica Ferries France (n. os  3, 4 e 60) e Sea‑Land Service (n. os  38 e 42), já referidos na nota 41, bem como o n.° 25 das minhas conclusões de 22 de Junho de 2004 no processo Comissão/Países Baixos (C‑189/03, Colect., p. I‑0000).


43
Os acórdãos referidos na nota 38 dizem todos respeito a taxas discriminatórias.


44
Acórdão de 29 de Novembro de 2001, De Coster (C‑17/00, Colect., p. I‑9445, n. os  26, 29, 37 e 38). Mas, neste processo, o imposto era, além do mais, discriminatório (v. n. os  31 a 35 do acórdão).


45
Evidentemente que tal se aplica apenas dentro dos limites que resultam do título VII do Tratado CE, relativo à política económica e monetária.


46
Acórdão já referido na nota 40.


47
Acórdão Weigel (já referido na nota 40, n.° 55; o carácter não discriminatório do imposto naquele caso é estabelecido no n.° 53 do acórdão), v., ainda, n.° 36 das conclusões do advogado‑geral A. Tizzano, de 3 de Julho de 2003, no mesmo processo.


48
Quanto à inexistência de discriminação, v., também, n.° 57 destas conclusões.


49
Por remissão para a jurisprudência dos tribunais administrativos italianos (Tribunale Amministrativo Regionale per la Toscana – TAR Toscana‑Firenze, acórdão n.° 456 de 11 de Março de 2002), a Comissão alega nas suas observações escritas que este imposto é de montante muito modesto («di ammontare molto modesto»).


50
V. n. os  51 e 52 destas conclusões.


51
Acórdãos de 16 de Março de 2004, AOK Bundesverband e o. (C‑264/01, C‑306/01, C‑354/01 e C‑355/01, Colect., p. I‑0000, n.° 46); de 22 de Janeiro de 2002, Cisal (C‑218/00, Colect., p. I‑691, n.° 22); e de 23 de Abril de 1991, Höfner e Elser (C‑41/90, Colect., p. I‑1979, n.° 21).


52
Acórdãos de 16 de Junho de 1987, Comissão/Itália (118/85, Colect., p. 2599, n.° 7), e de 18 de Março de 1997, Calì (C‑343/95, Colect., p. I‑1547, n. os  16 e 18). O acórdão de 4 de Maio de 1988, Bodson (30/87, Colect., p. 2479, n.° 18), também esclarece uma distinção semelhante entre a actividade empresarial comercial e a actividade de municípios no exercício da autoridade pública.


53
Ao contrário do acórdão de 17 de Maio de 2001, TNT Traco (C‑340/99, Colect., p. I‑4109, v., em particular, n.° 47), no caso do imposto municipal sobre a publicidade, não se trata de uma remuneração a favor do município por serviços que ele próprio não prestou.


54
Assim o entendeu a Comissão, no seu articulado, por remissão para a jurisprudência dos tribunais administrativos italianos (Tribunale Amministrativo Regionale per la Toscana – TAR Toscana‑Firenze, acórdãos n. os  456 e 457, de 11 de Março de 2002).


55
Acórdão Calì (já referido na nota 52, n. os  16, 18 e 23).


56
O termo «serviço» (em italiano: «servizio») é expressamente empregue no artigo 19.°, n.° 1, do Decreto legislativo n.° 507/93.


57
Conforme resulta das observações apresentadas ao Tribunal de Justiça, o serviço público de afixação também está à disposição de associações e instituições sociais para as suas comunicações ao público. Desse modo, é fácil concluir que a actividade do serviço municipal de afixação consiste – em todo o caso, parcialmente – em serviços de interesse económico geral . Contudo, tal não altera em nada o carácter económico desta actividade, na acepção das regras da concorrência e, como tal, na confirmação do conceito de empresa. A natureza dos serviços pode, em todo o caso, ter alguma importância, num segundo momento, no âmbito dos artigos 16.° CE e 86.°, n.° 2, CE.


58
Tanto um direito excessivamente elevado como um direito excessivamente baixo poderiam ter, em determinadas circunstâncias, efeitos prejudiciais para os clientes. No primeiro caso, os clientes teriam de pagar aos municípios preços inflacionados, no segundo, isso poderia conduzir a uma distorção da concorrência e à eliminação do mercado de concorrentes privados e, com isso, em última instância, a uma menor variedade da oferta.


59
O pedido de decisão prejudicial não contém quaisquer indicações quanto ao montante do direito devido pela utilização do serviço municipal de afixação do município de Génova. As partes também não prestaram informações complementares a este respeito – apesar de um pedido expresso do Tribunal de Justiça nesse sentido.


60
Neste aspecto, o presente caso distingue‑se do do acórdão de 17 de Julho de 1997, GT‑Link (C‑242/95, Colect., p. I‑4449, n. os  14 e 41), em que, nomeadamente, era discutida a isenção fiscal de empresas públicas relativamente a impostos que as outras empresas tinham de pagar.


61
Semelhante foi, de resto, também a opinião da Viacom e da Giotto, no que respeita à livre prestação de serviços (artigo 49.° CE).


62
Desta forma, as partes acabam por traçar um paralelismo com a matéria subjacente ao acórdão de 13 de Dezembro de 1991, RTT/GB‑Inno‑BM (C‑18/88, Colect., p. I‑5941, n. os  25 e 26).


63
Na audiência perante o Tribunal de Justiça, o representante da Viacom fez ainda referência à matéria dos acórdãos TNT Traco (já referido na nota 53), e de 18 de Junho de 1991, ERT (C‑260/89, Colect., p. I‑2925).


64
V. acórdãos de 10 de Janeiro de 1985, Leclerc/Thouars (229/83, Recueil, p. 1, n.° 14); de 29 de Janeiro de 1985, Cullet/Leclerc (231/83, Recueil, p. 305, n.° 16); de 5 de Outubro de 1995, Centro Servizi Spediporto Srl (C‑96/94, Colect., p. I‑2883. n.° 20); e acórdão Höfner e Elser (já referido na nota 51, n. os  26 a 29).


65
No processo perante o Tribunal de Justiça, a Viacom e a Giotto alegaram que o município de Génova previu cerca de 17 000 m 2 de área de afixação, para prestadores de serviços particulares e, em contrapartida, previu 24 000 m 2 para o seu próprio serviço de afixação. No entanto, conforme foi admitido pelo próprio representante da Viacom na audiência, uma parte das superfícies de afixação destinadas ao serviço municipal de afixação são reservadas para editais administrativos ou para editais de interesse público.


66
V. acórdãos Leclerc/Thouars (já referido na nota 64, n.° 14), Cullet/Leclerc (já referido na nota 64, n.° 16) e Höffner e Elser (já referido na nota 51, n. os  26 a 29).


67
V. acórdão de 27 de Novembro de 2003, Enirisorse e o. (C‑34/01 a C‑38/01, Colect., p. I‑0000, n. os  48 a 52) e n. os  72 a 84 das conclusões da advogada‑geral C. Stix‑Hackl, de 7 de Novembro de 2002, no mesmo processo.


68
Neste sentido, pronunciou‑se, na audiência, o próprio representante da Viacom.


69
Da Directiva 80/723/CEE da Comissão, de 25 de Junho de 1980, relativa à transparência das relações financeiras entre os Estados‑Membros e as empresas públicas (JO L 195, p. 35; alterado pela última vez pela Directiva 2000/52/CE da Comissão, de 26 de Julho de 2000, JO L 193, p. 75), pode resultar uma obrigação de garantia da transparência nas relações financeiras entre o município e o seu serviço municipal de afixação, porém, sem prejuízo das excepções contidas no seu artigo 4.°, n.° 1.


70
V. acórdãos ERT (já referido na nota 63, n. os  35 a 37); Höffner e Elser (já referido na nota 51, n. os  27 a 31); GT‑Link (já referido na nota 60, n. os  33 a 35); de 10 de Dezembro de 1991, Merci Convenzionali Porto di Genova (C‑179/90, Colect., p. I‑5889, n. os  17 a 19); de 11 de Dezembro de 1997, Job Centre (C‑55/96, Colect., p. I‑7119, n. os  28 a 31); de 12 de Fevereiro de 1998, Raso e o. (C‑163/96, Colect., p. I‑533, n. os  27 a 31); de 25 de Junho de 1998, Dusseldorp e o. (C‑203/96, Colect., p. I‑4075, n. os  61 e 62); de 12 de Setembro de 2000, Pavel Pavlov e o. (C‑180/98 a C‑184/98, Colect., p. I‑6451, n. os  127 e 128); TNT Traco (já referido na nota 53, n.° 44); Ambulanz Glöckner (já referido na nota 14, n. os  39 e 40); e de 22 de Maio de 2003, Connect Austria (C‑462/99, Colect., p. I‑5197, n. os  80 a 84).


71
No mesmo sentido também se pronuncia a advogada‑geral C. Stix‑Hackl, nos n. os  72 a 84 das suas conclusões relativas ao processo Enirisorse (já referido na nota 67).


72
V., também, acórdão Enirisorse (já referido na nota 67, n. os  48 a 52) e as conclusões da advogada‑geral C. Stix‑Hackl naquele processo (já referidas na nota 67, n. os  72 a 84).


73
V. n. os  51 e 52 destas conclusões.


74
Acórdão PreussenElektra (já referido na nota 11, n. os  58, 59 e 61).


75
V., também a este respeito, n.° 86 e a nota 69 destas conclusões.


76
V., em particular, acórdão de 21 de Outubro de 2003, Van Calster e Cleeren (C‑261/01 e C‑262/01, Colect., p. I‑12249, n.° 49) e acórdão Enirisorse (já referido na nota 67, n. os  43 a 45). Pode encontrar‑se um estudo exaustivo desta problemática nos n. os  32 e segs. das conclusões do advogado‑geral L. A. Geelhoed, de 4 de Março de 2004, apresentadas no processo Streekgewest Westelijk Noord‑Brabant e o. (C‑174/02 e C‑175/02, Colect., p. I‑0000).


77
V., também, n. os  34 e segs. das conclusões do advogado‑geral L. A. Geelhoed no processo Streekgewest Westelijk Noord‑Brabant (já referido na nota 76).


78
V. n.° 74 destas conclusões.


79
V. n. os  94 a 98 destas conclusões.


80
V., neste sentido, acórdão PreussenElektra (já referido na nota 11, n. os  58, 59 e 61).


81
Essencialmente, o acórdão de 24 de Julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg (C‑280/00, Colect., p. I‑7747, n. os  84 e segs.) também nega – ainda que num contexto ligeiramente diferente – a existência de um auxílio, quando uma prestação se encontra perante uma respectiva contrapartida.

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