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Document 62002TO0338

    Despacho do Tribunal de Primeira Instância (Segunda Secção) de 7 de Junho de 2004.
    Segi e outros contra Conselho da União Europeia.
    Acção de indemnização - Justiça e assuntos internos - Posição comum do Conselho - Medidas relativas às pessoas, grupos ou entidades implicadas em actos de terrorismo - Incompetência manifesta - Recurso manifestamente infundado.
    Processo T-338/02.

    Colectânea de Jurisprudência 2004 II-01647

    ECLI identifier: ECLI:EU:T:2004:171

    Processo T‑338/02

    Segi e o.

    contra

    Conselho da União Europeia

    «Acção de indemnização – Justiça e assuntos internos – Posição comum do Conselho – Medidas relativas às pessoas, aos grupos e às entidades envolvidas em actos de terrorismo – Incompetência manifesta – Recurso manifestamente infundado»

    Despacho do Tribunal de Primeira Instância (Segunda Secção) de 7 de Junho de 2004 

    Sumário do despacho

    1.     Acção de indemnização – Objecto – Pedido de indemnização de um dano imputável a uma posição comum – Incompetência do tribunal comunitário – Inexistência de recurso jurisdicional efectivo – Declaração do Conselho relativa a um direito a reparação – Irrelevância – Competência do tribunal comunitário para conhecer de uma acção de indemnização baseada na inobservância, pelo Conselho, das competências da Comunidade

    (Artigos 5.° UE, 34.° UE e 46.° UE)

    2.     União Europeia – Cooperação policial e judiciária em matéria penal – Base jurídica – Artigo 34.° UE – Obrigação de respeitar as disposições comunitárias

    [Artigo 61.°, alínea e), CE; artigo 34.° UE; Posição comum 2001/931/PESC do Conselho, artigo 4.°]

    1.     O Tribunal é manifestamente incompetente para conhecer de uma acção de indemnização que visa a reparação do prejuízo eventualmente causado por uma posição comum, baseada no artigo 34.° EU, quando, por força do artigo 46.° UE, nenhuma via processual para obter indemnização está prevista no âmbito do título VI do Tratado UE.

    Mesmo sendo provável que daí resulte a inexistência de recurso jurisdicional efectivo, essa situação não pode fundamentar por si mesma um título de competência comunitária própria num sistema jurídico baseado no princípio das competências de atribuição, tal como resulta do artigo 5.° UE.

    É igualmente inoperante a declaração do Conselho, que figura na acta da reunião durante a qual foi adoptada uma posição comum relativa ao direito a reparação, na medida em que essa declaração não encontre qualquer expressão no texto em causa. Além do mais, a declaração não pode ter em vista um recurso para os órgãos jurisdicionais comunitários sem estar em contradição com o sistema jurisdicional organizado pelo Tratado UE.

    Em contrapartida, o Tribunal é competente para conhecer dessa acção de indemnização na medida em que as demandantes invoquem a inobservância das competências da Comunidade. Com efeito, os órgãos jurisdicionais comunitários são competentes para proceder ao exame do conteúdo de um acto adoptado no quadro do Tratado EU, a fim de verificar se esse acto não afecta as competências da Comunidade.

    (cf. n.os 33, 34, 36, 38, 41)

    2.     A adopção, pelo Conselho, de uma posição comum só pode ser ilegal por usurpação das competências da Comunidade se tiver ocorrido em substituição de um acto baseado numa disposição do Tratado CE cuja adopção teria sido obrigatória, alternativa ou concomitantemente.

    Não se pode considerar que uma posição comum que prevê a assistência policial e judiciária entre Estados‑Membros ao abrigo do artigo 34.° UE é incompatível com o regime de competências comunitárias organizadas pelo Tratado CE, uma vez que, independentemente da questão de saber se medidas dessa natureza podem ser baseadas no artigo 308.° CE, o artigo 61.°, alínea e), CE prevê explicitamente que o Conselho adopte medidas no domínio da cooperação policial e judiciária em matéria penal, em conformidade com as disposições do Tratado UE.

    (cf. n.os 45, 46)




    DESPACHO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

    7 de Junho de 2004 (*)

    «Acção de indemnização – Justiça e assuntos internos – Posição comum do Conselho – Medidas relativas às pessoas, aos grupos e às entidades envolvidas em actos de terrorismo – Incompetência manifesta – Recurso manifestamente infundado»

    No processo T‑338/02,

    Segi,

    Araitz Zubimendi Izaga, residente em Hernani (Espanha),

    Aritza Galarraga, residente em Saint Pée sur Nivelle (França),

    representados por D. Rouget, advogado,

    demandantes,

    contra

    Conselho da União Europeia, representado por M. Vitsentzatos e M. Bauer, na qualidade de agentes,

    demandado,

    apoiado pelo

    Reino de Espanha, representado pelo seu agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    e pelo

    Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, representado inicialmente por P. Ormond e, mais tarde, por C. Jackson, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

    intervenientes,

    que tem por objecto um pedido de indemnização com vista a obter a reparação do prejuízo alegadamente sofrido pelos demandantes devido à inclusão da Segi na lista das pessoas, grupos ou entidades referidos no artigo 1.° da Posição Comum 2001/931/PESC do Conselho, de 27 de Dezembro de 2001, relativa à aplicação de medidas específicas de combate ao terrorismo (JO L 344, p. 93), da Posição Comum 2002/340/PESC do Conselho, de 2 de Maio de 2002, que actualiza a Posição Comum 2001/931 (JO L 116, p. 75), e da Posição Comum 2002/462/PESC do Conselho, de 17 de Junho de 2002, que actualiza a Posição Comum 2001/931 e revoga a Posição Comum 2002/340 (JO L 160, p. 32),

    O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),

    composto por: J. Pirrung, presidente, A. W. H. Meij e N. J. Forwood, juízes,

    secretário: H. Jung,

    profere o presente

    Despacho

     Antecedentes do litígio

    1       Resulta dos autos que a Segi é uma organização que se deu por finalidade a defesa das reivindicações da juventude basca, da identidade, da cultura, da língua bascas. Segundo os demandantes, essa organização foi criada em 16 de Junho de 2001 e tem sede em Baiona (França) e em S. Sebastião (Espanha). Ela designara Araitz Zubimendi Izaga e Aritza Galarraga porta‑voz. Nenhuma documentação oficial a esse respeito foi aduzida.

    2       Em 28 de Setembro de 2001, o Conselho de Segurança das Nações Unidas adoptou a Resolução 1373 (2001), pela qual decidiu, nomeadamente, que todos os Estados se prestariam mutuamente a maior assistência nos inquéritos criminais e noutros processos relativos ao financiamento de actos de terrorismo ou relativos ao apoio de que esses actos tiverem beneficiado, incluindo a assistência com vista à obtenção dos elementos de prova que estejam na sua posse e que sejam necessários ao processo.

    3       Em 27 de Dezembro de 2001, considerando que uma acção da Comunidade era necessária a fim de pôr em prática a Resolução 1373 (2001) do Conselho de Segurança das Nações Unidas, o Conselho adoptou a Posição Comum 2001/931/PESC, relativa à aplicação de medidas específicas de combate ao terrorismo (JO L 344, p. 93). Essa posição comum foi adoptada com base no artigo 15.° UE, pertencente ao título V do Tratado UE intitulado «Disposições relativas à política externa e de segurança comum» (PESC), e do artigo 34.° UE, pertencente ao título VI do Tratado UE intitulado «Disposições relativas à cooperação policial e judiciária em matéria penal» (normalmente chamado justiça e assuntos internos) (JAI).

    4       Os artigos 1.° e 4.° da Posição Comum 2001/931 dispõem:

    «Artigo 1.°

    1.      A presente decisão é aplicável, nos termos dos artigos seguintes, às pessoas, grupos ou entidades envolvidos em actos terroristas e enunciados no anexo.

    [...]

    6.      Os nomes das pessoas e entidades constantes da lista devem ser regularmente revistos, pelo menos uma vez por semestre, a fim de assegurar que a sua presença na lista continua a justificar‑se.»

    «Artigo 4.°

    Os Estados‑Membros prestam‑se reciprocamente a maior assistência possível na prevenção e combate aos actos terroristas através da cooperação policial e judiciária em matéria penal, no âmbito do título VI do Tratado [UE]. Para tanto, e no que se refere às investigações e acções penais conduzidas pelas respectivas autoridades em relação a qualquer das pessoas, grupos e entidades enunciados no anexo, devem explorar plenamente, a pedido, as suas actuais competências nos termos de actos da União Europeia e de outros acordos, convénios e convenções internacionais vinculativos para os Estados‑Membros.»

    5       O anexo da Posição Comum 2001/931 indica no seu ponto 2, consagrado aos «grupos e entidades»:

    «*– Euskadi Ta Askatasuna/Tierra Vasca y Libertad/Pátria Basca e Liberdade (ETA)

    (As organizações seguintes fazem parte do grupo terrorista ETA: Kas, Xaki, Ekin, Jarrai‑Haika‑Segi, Gestoras pro‑amnistía).»

    6       A nota de pé de página do anexo indica que «[a]s pessoas marcadas com um * apenas serão objecto do artigo 4.°».

    7       Em 27 de Dezembro de 2001, o Conselho adoptou igualmente a Posição Comum 2001/930/PESC, sobre o combate ao terrorismo (JO L 344, p. 90), o Regulamento (CE) n.° 2580/2001, relativo a medidas restritivas específicas de combate ao terrorismo dirigidas contra determinadas pessoas e entidades (JO L 344, p. 70), e a Decisão 2001/927/CE que estabelece a lista prevista no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 (JO L 344, p. 83). Nenhum destes textos refere os requerentes.

    8       Nos termos da declaração do Conselho inscrita em anexo à acta na altura da adopção da Posição Comum 2001/931 e do Regulamento n.° 2580/2001 (a seguir «declaração do Conselho relativa ao direito a reparação»):

    «O Conselho recorda, a respeito do n.° 6 do artigo 1.° da posição comum [2001/931] que qualquer erro que ocorra relativamente às pessoas, aos grupos ou às entidades visadas habilita a parte lesada a pedir reparação em juízo.»

    9       Por despachos de 5 de Fevereiro e de 11 de Março de 2002, o juiz central de instrução n.° 5 da Audiencia Nacional sediada em Madrid (Espanha) declarou ilegais as actividades da Segi e ordenou a prisão de alguns dirigentes presumidos da Segi, com o fundamento de que essa organização fazia parte integrante da organização independentista basca ETA.

    10     Por decisão de 23 de Maio de 2002, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem julgou inadmissível o recurso interposto pelos demandantes contra os quinze Estados‑Membros, relativo à Posição Comum 2001/931, com o fundamento de que a situação denunciada não lhes conferia a qualidade de vítimas de violação da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (CEDH).

    11     Em 2 de Maio e 17 de Junho de 2002, o Conselho adoptou, de harmonia com os artigos 15.° UE e 34.° UE, as Posições Comuns 2002/340/PESC e 2002/462/PESC, que actualizam a Posição Comum 2001/931 (JO L 116, p. 75, e JO L 160, p. 32). Os anexos a essas duas posições comuns contêm o nome da Segi, inscrito nos mesmos termos que os que figuram na Posição Comum 2001/931.

     Tramitação do processo e pedidos das partes

    12     Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 13 de Novembro de 2002, os demandantes propuseram a presente acção.

    13     Por acto separado apresentado na Secretaria do Tribunal em 12 de Fevereiro de 2003, o Conselho suscitou a questão prévia de inadmissibilidade, de harmonia com o disposto no artigo 114.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, sobre a qual os demandantes apresentaram as suas observações.

    14     Por despacho de 5 de Junho de 2003, o presidente da Segunda Secção do Tribunal de Primeira Instância admitiu as intervenções do Reino de Espanha e do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte em apoio das conclusões do Conselho. O Reino Unido renunciou a apresentar as suas observações sobre a questão prévia de inadmissibilidade. O Reino de Espanha apresentou as suas observações sobre a questão prévia de inadmissibilidade nos prazos estabelecidos.

    15     Na sua questão prévia de inadmissibilidade, o Conselho, apoiado pelo Reino de Espanha, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

    –       julgar a acção manifestamente inadmissível;

    –       condenar a «demandante» nas despesas.

    16     Nas suas observações sobre essa questão prévia, os demandantes concluem pedindo que o Tribunal se digne:

    –       aceitar a admissibilidade da acção de indemnização;

    –       a título subsidiário, reconhecer a violação pelo Conselho dos princípios gerais do direito comunitário;

    –       de qualquer forma, condenar o Conselho nas despesas.

     Questão de direito

     Argumentos das partes

    17     O Conselho e o Reino de Espanha alegam, em primeiro lugar, que a Segi não tem a capacidade para agir em justiça. Acrescentam que a Sr.a Zubimendi Izaga e o Sr. A. Galarraga não têm nem o poder de representar a Segi nem, segundo o Reino de Espanha, interesse em agir perante o Tribunal.

    18     Em segundo lugar, o Conselho e o Reino de Espanha adiantam que o segundo parágrafo do artigo 288.° CE implica que o prejuízo invocado resulte de um acto da Comunidade (acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Novembro de 1975, Société des grands moulins des Antilles/Comissão, 99/74, Recueil, p. 1531, n.° 17, Colect., p. 527). Ora, dado que o Conselho agiu no exercício da sua competência em matéria da PESC e da JAI, seria necessário que existisse um acto comunitário.

    19     Em terceiro lugar, o Conselho e o Reino de Espanha alegam que a responsabilidade extracontratual da Comunidade supõe a prova da ilegalidade do comportamento imputado à instituição. Ora, o Tribunal, em conformidade com o disposto nos artigos 35.° UE e 46.° UE, não é competente para apreciar a legalidade de um acto abrangido pela PESC ou pela JAI.

    20     A título preliminar, os demandantes sublinham que é particularmente chocante que o Conselho negue a existência e a capacidade jurídica da associação demandante para efeitos de a impedir de contestar a sua inclusão no anexo da Posição Comum 2001/931 e de obter reparação. Isso constitui uma violação dos princípios gerais do direito comunitário tal como formulados, nomeadamente, pelos artigos 1.°, 6.°, n.° 1, e 13.° da CEDH.

    21     No tocante à associação demandante, os demandantes adiantam que os direitos dos Estados‑Membros, o direito comunitário e a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem admitem a capacidade de uma associação para ser parte em processo judicial, em particular quando age para defender os seus direitos (acórdãos do Tribunal de Justiça de 8 de Outubro de 1974, Syndicat général du personnel des organismes européens/Comissão, 18/74, Recueil, p. 933, Colect., p. 443, e de 28 de Outubro de 1982, Groupement des agences de voyages/Comissão, 135/81, Recueil, p. 3799, n.° 11; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Julho de 1996, Sinochem Heilongjiang/Conselho, T‑161/94, Colect., p. II‑695, n.° 34). Pela declaração do Conselho relativa ao direito a reparação, o Conselho reconhecera a capacidade para agir, com vista a obter reparação, aos «grupos» e às «entidades» referidos por essa posição comum. Além disso, ao incluí‑la na lista em causa, o Conselho tratara a associação demandante como uma entidade jurídica independente.

    22     No tocante às duas pessoas singulares compreendidas entre os demandantes, estes alegam que elas agem validamente a duplo título, enquanto demandantes individuais e enquanto representantes da associação.

    23     Adiantam que, numa Comunidade de direito, que aplica os direitos fundamentais, nomeadamente os da CEDH, devem dispor de um recurso efectivo a fim de fazer reconhecer o seu prejuízo e obter reparação. Caso contrário, encontram‑se em presença de uma denegação de justiça, que significa que as instituições, quando intervêm no quadro da União, agem na mais completa arbitrariedade.

    24     Os demandantes consideram que o Conselho escolheu fraudulentamente a base jurídica do acto em causa para evitar qualquer controlo democrático, jurisdicional ou não jurisdicional. Esse desvio de processo fora claramente condenado pelo Parlamento Europeu, nomeadamente na sua Resolução P5_TA(2002)0055 de 7 de Fevereiro de 2002. A escolha de bases jurídicas diferentes para os textos relativos ao terrorismo adoptados pelo Conselho em 27 de Dezembro de 2001 tivera por finalidade privar certas categorias de pessoas, em particular, as referidas pelo artigo 4.° da Posição Comum 2001/931, do direito a um recurso efectivo, contrariamente às referidas pelo Regulamento n.° 2580/2001. O Tribunal é competente para sancionar tal desvio de processo no quadro de uma acção de indemnização.

    25     No tocante à declaração do Conselho relativa ao direito à reparação, cabe ao Tribunal definir a sua interpretação e o seu alcance jurídico. A responsabilidade dos Estados‑Membros é, nesse aspecto, indivisível, em primeiro lugar, porque se trata de um acto do Conselho, em segundo lugar, porque os órgãos jurisdicionais nacionais são incompetentes para conhecer dos danos causados pelo Conselho e, em terceiro lugar, porque não é razoável impor à parte lesada ter de agir perante os quinze Estados‑Membros. Essa declaração dá competência ao Tribunal para decidir em relação à categoria de pessoas referidas no artigo 4.° da Posição Comum 2001/931, da mesma forma que em relação às pessoas referidas no Regulamento n.° 2580/2001 e no artigo 3.° dessa posição comum, que podem prevalecer‑se de uma acção da Comunidade. O erro invocado nessa declaração constitui um acto ilícito e consiste, no caso em apreço, em erros de facto, de qualificação jurídica, de direito e em desvio de poder.

    26     Se o Tribunal tiver de se declarar incompetente para conhecer da presente acção, os demandantes consideram que deverá, então, reconhecer‑se a violação pelo Conselho dos princípios gerais do direito comunitário, formulados, nomeadamente, pelos artigos 1.°, 6.°, n.° 1, e 13.° da CEDH.

    27     No tocante às despesas, os demandantes alegam que não é equitativo pô‑las a seu cargo, uma vez que eles tentam, num contexto jurídico complexo e difícil, obter reparação do dano alegado.

     Apreciação do Tribunal

    28     Nos termos do n.° 1 do artigo 114.° do Regulamento de Processo, se uma parte o pedir, o Tribunal pode pronunciar‑se sobre a inadmissibilidade, antes de conhecer do mérito da causa. Em conformidade com o disposto no n.° 3 do mesmo artigo, salvo decisão em contrário do Tribunal, a tramitação ulterior do processo é oral.

    29     Por força do artigo 111.° do Regulamento de Processo, se um recurso for manifestamente desprovido de todo o fundamento jurídico, o Tribunal pode decidir imediatamente, mediante despacho fundamentado.

    30     O Tribunal, no caso em apreço, julga estar suficientemente esclarecido pelos elementos dos autos e que não há que abrir a fase oral do processo.

    31     Deve recordar‑se, em primeiro lugar, que, no seu recurso, os demandantes têm em vista obter a reparação do prejuízo suportado devido à inclusão da Segi na lista anexada à Posição Comum 2001/931, actualizada pelas Posições Comuns 2002/340 e 2002/462.

    32     Deve salientar‑se, em seguida, que os actos que se sustenta estarem na origem do prejuízo alegadamente sofrido pelos demandantes são posições comuns adoptadas com base nos artigos 15.° UE, do título V do Tratado UE relativo à PESC, e 34.° UE, do título VI do Tratado UE relativo à JAI.

    33     Há que reconhecer, finalmente, que os demandantes só são afectados pelo artigo 4.° da Posição Comum 2001/931, como precisa expressamente a nota de pé de página do anexo a essa posição comum. Ora, esse artigo indica que os Estados‑Membros prestam‑se reciprocamente a maior assistência possível na prevenção e combate aos actos terroristas através da cooperação policial e judiciária em matéria penal, no âmbito do título VI do Tratado UE e não implica qualquer medida abrangida pela PESC. Por isso, o artigo 34.° UE é a única base jurídica pertinente no que respeita aos actos que se afirma estarem na origem do prejuízo alegado.

    34     Impõe‑se reconhecer que nenhuma via processual para obter indemnização está prevista no âmbito do título VI do Tratado UE.

    35     Com efeito, no quadro do Tratado UE, na versão resultante do Tratado de Amesterdão, as competências do Tribunal de Justiça são limitativamente enumeradas pelo artigo 46.° UE. No tocante às disposições pertinentes no caso em apreço, não alteradas pelo Tratado de Nice, esse artigo estabelece:

    «As disposições do Tratado que institui a Comunidade Europeia, do Tratado que institui a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço e do Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica relativas à competência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e ao exercício dessa competência apenas serão aplicáveis às seguintes disposições do presente Tratado:

    [...]

    b)      Disposições do título VI, nas condições previstas no artigo 35.° [UE];

    [...]

    d)      N.° 2 do artigo 6.° no que respeita à acção das instituições, na medida em que o Tribunal de Justiça seja competente nos termos dos Tratados que instituem as Comunidades Europeias e nos termos do presente Tratado;

    [...]»

    36     Resulta do artigo 46.° UE que, no quadro do título VI do Tratado UE, as únicas vias processuais previstas estão incluídas nos n.os 1, 6 e 7 do artigo 35.° UE e correspondem ao reenvio prejudicial, ao recurso de anulação e à resolução de litígios entre Estados‑Membros.

    37     Deve ainda salientar‑se que a garantia do respeito dos direitos fundamentais prevista pelo n.° 2 do artigo 6.° UE não é pertinente no caso em apreço, uma vez que a alínea d) do artigo 46.° UE não prevê qualquer título de competência suplementar ao Tribunal de Justiça.

    38     No tocante à inexistência de recurso efectivo invocada pelos demandantes, força é reconhecer que estes não dispõem provavelmente de qualquer recurso jurisdicional efectivo, quer perante os órgãos jurisdicionais comunitários quer perante os órgãos jurisdicionais nacionais contra a inclusão de Segi na lista das pessoas, grupos ou entidades implicadas em actos de terrorismo. Com efeito, contrariamente ao que sustenta o Conselho, de nada servirá aos demandantes invocar a responsabilidade individual de cada Estado‑Membro em relação aos actos nacionais adoptados em execução da Posição Comum 2001/931, uma vez que procuram obter uma eventual indemnização pelo prejuízo alegadamente decorrente da inscrição da Segi no anexo da referida posição comum. Quanto à invocação da responsabilidade individual de cada Estado‑Membro perante os órgãos jurisdicionais nacionais pela sua participação na adopção das posições comuns em causa, tal acção parece pouco efectiva. Além disso, toda a contestação da legalidade da inclusão da Segi nesse anexo, nomeadamente por meio de um reenvio prejudicial de validade, torna‑se impossível através da escolha de uma posição comum e não, por exemplo, através de uma decisão adoptada de harmonia com o disposto no artigo 34.° UE. Todavia, a falta de recurso jurisdicional não pode fundamentar por si mesma um título de competência comunitária própria num sistema jurídico baseado no princípio das competências de atribuição, tal como resulta do artigo 5.° UE (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de Julho de 2002, Unión de Pequeños Agricultores/Conselho, C‑50/00 P, Colect., p. I‑6677, n.os 44 e 45).

    39     Os demandantes invocam ainda a declaração do Conselho relativa ao direito a reparação, nos termos da qual «qualquer erro que ocorra relativamente às pessoas, aos grupos ou às entidades visadas habilita a parte lesada a pedir reparação em juízo». Segundo jurisprudência assente, as declarações que figuram numa acta têm um valor limitado, no sentido de que não podem ser tomadas em consideração para efeitos de interpretação de uma disposição de direito comunitário quando o conteúdo dessa declaração não encontre qualquer expressão no texto da disposição em causa e, por isso, não tenha relevância jurídica (acórdãos do Tribunal de Justiça de 26 de Fevereiro de 1991, Antonissen, C‑292/89, Colect., p. I‑745, n.° 18, e de 29 de Maio de 1997, VAG Sverige, C‑329/95, Colect., p. I‑2675, n.° 23). Força é reconhecer que a declaração em causa não especifica as vias processuais nem, a fortiori, as condições da sua abertura. De qualquer forma, não pode ter em vista um recurso para os órgãos jurisdicionais comunitários, pois estaria então em contradição com o sistema jurisdicional organizado pelo Tratado UE. Por isso, à falta de qualquer competência devolvida ao Tribunal pelo referido Tratado, tal declaração não poderá conduzir a examinar a presente acção.

    40     Resulta do que precede que o Tribunal é manifestamente incompetente para conhecer da presente acção de indemnização, na medida em que visa a reparação do prejuízo eventualmente causado pela inclusão da Segi na lista anexada à Posição Comum 2001/931, tal como actualizada pelas Posições Comuns 2002/340 e 2002/462.

    41     Em contrapartida, o Tribunal é competente para conhecer da presente acção de indemnização na medida em que os demandantes invoquem a inobservância das competências da Comunidade. Com efeito, os órgãos jurisdicionais comunitários são competentes para proceder ao exame do conteúdo de um acto adoptado no quadro do Tratado UE a fim de verificar se esse acto não afecta as competências da Comunidade (v., por analogia, acórdãos do Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 1997, Centro‑Com, C‑124/95, Colect., p. I‑81, n.° 25, e de 12 de Maio de 1998, Comissão/Conselho, C‑170/96, Colect., p. I‑2763, n.° 17).

    42     Na medida em que os demandantes invocam um desvio de processo cometido pelo Conselho agindo no domínio da JAI, consistente numa usurpação das competências da Comunidade que acabaram por privá‑los de qualquer protecção jurisdicional, a presente acção cabe, portanto, na competência dos órgãos jurisdicionais comunitários por força dos artigos 235.° CE e 288.°, segundo parágrafo, CE.

    43     O Tribunal considera oportuno pronunciar‑se, em primeiro lugar, quanto ao fundo da presente acção, somente na medida especificada no n.° 42, supra.

    44     Segundo jurisprudência constante, o envolvimento da responsabilidade das Comunidades supõe a reunião de um conjunto de condições respeitantes à ilegalidade do comportamento criticado, à realidade do dano alegado e à existência de nexo de causalidade entre o comportamento e o prejuízo invocado.

    45     No caso em apreço, falta manifestamente a ilegalidade invocada. Com efeito, tal como decorre do n.° 42, supra, o comportamento ilegal alegado não poderá consistir senão na falta de um acto baseado numa disposição do Tratado CE cuja adopção fosse obrigatória, alternativa ou concomitantemente com a Posição Comum 2001/931. Ora, tal como foi reconhecido no n.° 33, supra, só o artigo 4.° da Posição Comum 2001/931, tal como foi confirmada pelas Posições Comuns 2002/340 e 2002/462, diz respeito aos demandantes. Essa disposição constitui os Estados‑Membros na obrigação de explorar plenamente os actos da União Europeia e de outros acordos, convénios e convenções internacionais existentes, para os inquéritos e procedimentos penais respeitantes às pessoas, grupos ou entidades visados e, prestar‑se, no quadro da cooperação de harmonia com o disposto no título VI do Tratado UE, a maior assistência possível. O conteúdo dessa disposição é incluído no título VI do Tratado UE e a base jurídica pertinente para a sua adopção é o artigo 34.° UE.

    46     Os demandantes não citaram qualquer base jurídica no Tratado CE que tenha sido inobservada. Todavia, na medida em que evocam, a esse propósito, o facto de o Conselho ter adoptado, em 27 de Dezembro de 2001, diversos tipos de actos com vista a combater o terrorismo e, nomeadamente, o Regulamento n.° 2580/2001, baseado nos artigos 60.° CE, 301.° CE e 308.° CE, não se pode considerar que a assistência policial e judiciária entre Estados‑Membros prevista pelo artigo 4. ° da Posição Comum 2001/931 desrespeita essas disposições do Tratado CE. Com efeito, essas disposições visam claramente implementar, quando necessário, actos adoptados no domínio da PESC e não visam os adoptados no domínio da JAI. No tocante ao artigo 308.° CE, essa disposição permite, por certo, a adopção de disposições comunitárias adequadas quando uma acção se afigura necessária para realizar um dos objectivos da Comunidade sem que o Tratado CE tenha previsto os poderes de acção para esse efeito. Ora, se a alínea e) do artigo 61.° CE prevê a adopção de medidas no domínio da cooperação policial e judiciária em matéria penal, prevê expressamente que o Conselho adopte essas medidas em conformidade com as disposições do Tratado UE. Nestas condições, e independentemente da questão de saber se, tal sendo o caso, medidas dessa natureza poderão ser baseadas no artigo 308.° CE, a adopção do artigo 4.° da Posição Comum 2001/931 só na base do artigo 34.° UE não é incompatível com o regime das competências comunitárias organizado pelo Tratado CE. Quanto à Resolução do Parlamento de 7 de Fevereiro de 2002, em que este deplora a escolha da base jurídica incluída no domínio da JAI para a constituição da lista das organizações terroristas, deve reconhecer‑se que essa crítica incide sobre uma escolha política e não põe em causa, enquanto tal, a legalidade da base jurídica escolhida ou a inobservância das competências da Comunidade. Por isso, se bem que resulte da inserção na posição comum da lista das pessoas, grupos ou entidades implicados num acto de terrorismo que as pessoas visadas são privadas de um recurso jurisdicional perante o tribunal comunitário, tal resultado não constitui, enquanto tal, uma inobservância das competências da Comunidade.

    47     Na medida em que a acção se apoia na inobservância, pelo Conselho, agindo no domínio da JAI, das competências da Comunidade, deve, por isso, julgar‑se a acção manifestamente improcedente, sem que haja necessidade de decidir, nesse contexto, sobre a questão prévia de inadmissibilidade suscitada pelo Conselho (acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Fevereiro de 2002, Conselho/Boehringer, C‑23/00 P, Colect., p. I‑1873, n.° 52).

    48     O pedido subsidiário dos demandantes de reconhecimento, apesar do juízo de improcedência da sua acção, da violação, pelo Conselho, dos princípios gerais do direito comunitário deve igualmente ser indeferido. Com efeito, o contencioso comunitário não conhece via processual que permita ao juiz tomar posição, pelo expediente de declaração de carácter geral, sobre uma questão cujo objecto ultrapassa o quadro do litígio. Por isso, o Tribunal é também manifestamente incompetente para conhecer do presente pedido.

     Quanto às despesas

    49     Nos termos do n.° 3 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, se cada parte obtiver vencimento parcial, ou perante circunstâncias excepcionais, o Tribunal pode determinar que cada uma das partes suporte as suas despesas. No caso em apreço, deve recordar‑se que os demandantes pediram que o Conselho suporte a totalidade das despesas, mesmo em caso de indeferimento do seu pedido. A esse propósito, há que salientar, por um lado, que a declaração do Conselho relativa ao direito à reparação pôde induzir os demandantes em erro e, por outro, que era legítimo a estes procurar um órgão jurisdicional competente para conhecer dos motivos das suas críticas. Nestas circunstâncias, há que decidir que cada uma das partes suportará as suas despesas.

    50     Nos termos do n.° 4, primeiro parágrafo, do artigo 87.° do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros que intervieram no litígio devem suportar as respectivas despesas. Os intervenientes suportarão, portanto, as respectivas despesas.

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

    decide:

    1)      A acção é julgada improcedente.

    2)      Cada uma das partes suportará as suas despesas.

    Proferido no Luxemburgo, em 7 de Junho de 2004.

    O secretário

     

          O presidente

    H. Jung

     

          J. Pirrung


    * Língua de processo : francês.

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