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Document 62001CJ0044

Acórdão do Tribunal de 8 de Abril de 2003.
Pippig Augenoptik GmbH & Co. KG contra Hartlauer Handelsgesellschaft mbH e Verlassenschaft nach dem verstorbenen Franz Josef Hartlauer.
Pedido de decisão prejudicial: Oberster Gerichtshof - Áustria.
Aproximação das legislações - Directivas 84/450/CEE e 97/55/CE - Publicidade enganosa - Condições de licitude da publicidade comparativa.
Processo C-44/01.

Colectânea de Jurisprudência 2003 I-03095

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2003:205

62001J0044

Acórdão do Tribunal de 8 de Abril de 2003. - Pippig Augenoptik GmbH & Co. KG contra Hartlauer Handelsgesellschaft mbH e Verlassenschaft nach dem verstorbenen Franz Josef Hartlauer. - Pedido de decisão prejudicial: Oberster Gerichtshof - Áustria. - Aproximação das legislações - Directivas 84/450/CEE e 97/55/CE - Publicidade enganosa - Condições de licitude da publicidade comparativa. - Processo C-44/01.

Colectânea da Jurisprudência 2003 página I-03095


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1. Aproximação das legislações - Publicidade enganosa e publicidade comparativa - Directiva 84/450 - Publicidade comparativa - Conceito - Aplicação das mesmas regras aos diferentes elementos da comparação

(Directiva 84/450 do Conselho, artigo 2.° , ponto 2)

2. Aproximação das legislações - Publicidade enganosa e publicidade comparativa - Directiva 84/450 - Publicidade comparativa - Disposições nacionais mais rigorosas em matéria de publicidade enganosa - Não aplicabilidade à publicidade comparativa

(Directiva 84/450 do Conselho, artigos 3.° -A e 7.° )

3. Aproximação das legislações - Publicidade enganosa e publicidade comparativa - Directiva 84/450 - Publicidade comparativa - Indicação da marca de um concorrente - Possibilidade dada ao anunciante - Limites

(Directiva 84/450 do Conselho, artigo 3.° -A, n.° 1)

4. Aproximação das legislações - Publicidade enganosa e publicidade comparativa - Directiva 84/450 - Publicidade comparativa - Compra dos produtos comparados através de canais de distribuição diferentes - Admissibilidade

(Directiva 84/450 do Conselho, artigo 3.° -A, n.° 1)

5. Aproximação das legislações - Publicidade enganosa e publicidade comparativa - Directiva 84/450 - Publicidade comparativa - Aquisição para teste a um concorrente antes do lançamento da sua oferta - Admissibilidade

(Directiva 84/450 do Conselho, artigo 3.° -A)

6. Aproximação das legislações - Publicidade enganosa e publicidade comparativa - Directiva 84/450 - Publicidade comparativa - Reprodução na mensagem publicitária do nome, da sigla e de uma imagem da fachada do estabelecimento do concorrente - Admissibilidade

[Directiva 84/450 do Conselho, artigo 3.° -A n.° 1, alínea e)]

7. Aproximação das legislações - Publicidade enganosa e publicidade comparativa - Directiva 84/450 - Publicidade comparativa - Comparação dos preços - Inexistência de descrédito de um concorrente mesmo no caso de ser demonstrada uma diferença de preços entre um produto superior à diferença média entre um conjunto de produtos

[Directiva 84/450 do Conselho, artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e)]

Sumário


1. A definição de publicidade comparativa constante do artigo 2.° , ponto 2, da Directiva 84/450, relativa à publicidade enganosa e comparativa, na redacção dada pela Directiva 97/55, permite abranger todas as formas de publicidade comparativa, de forma que, para que exista publicidade comparativa, basta que exista uma comunicação que faça, ainda que implicitamente, referência a um concorrente ou aos bens e serviços por ele oferecidos. Por conseguinte, no âmbito da Directiva 84/450, não há que distinguir na regulamentação os diferentes elementos da comparação, ou seja, as indicações relativas à oferta do anunciante, as indicações relativas à oferta do concorrente e a relação entre essas duas ofertas.

( cf. n.os 35, 37 )

2. O artigo 7.° , n.° 2, da Directiva 84/450, relativa à publicidade enganosa e comparativa, na redacção dada pela Directiva 97/55, opõe-se à aplicação à publicidade comparativa de disposições nacionais mais rigorosas em matéria de protecção contra a publicidade enganosa no que diz respeito à forma e ao conteúdo da comparação, não cabendo distinguir os diferentes elementos da comparação, ou seja, as indicações relativas à oferta do anunciante, as indicações relativas à oferta do concorrente e a relação entre essas ofertas.

Com efeito, a directiva procedeu a uma harmonização exaustiva das condições de licitude da publicidade comparativa nos Estados-Membros, de modo que esta licitude deve ser apreciada exclusivamente à luz dos critérios fixados pelo legislador comunitário.

( cf. n.os 42, 44, disp. 1 )

3. No quadro de uma publicidade comparativa, quando sejam respeitadas as condições enunciadas no artigo 3.° -A, n.° 1, da Directiva 84/450, relativa à publicidade enganosa e comparativa, na redacção dada pela Directiva 97/55, ou seja, que a referida publicidade não gere confusão no mercado entre as marcas do anunciante e as de um concorrente, que não desacredite ou deprecie as marcas de um concorrente e que não retire partido indevido do renome de uma marca de um concorrente, é dada ao anunciante a possibilidade de indicar a marca dos produtos de um concorrente. Há, no entanto, casos em que a marca dos produtos pode condicionar de forma sensível a escolha do comprador e em que a comparação diz respeito a produtos concorrentes cujas marcas possuem uma importância diferente em termos de renome e o facto de omitir a marca mais conhecida contraria o artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450, que define uma das condições de licitude da publicidade comparativa. Incumbe, em cada caso, ao órgão jurisdicional nacional competente verificar, tendo em conta todos os elementos pertinentes do processo que lhe foi submetido, se estão reunidas as condições da licitude da publicidade comparativa, atendendo à presumível expectativa de um consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado.

( cf. n.os 47, 49, 53, 55, disp. 2 )

4. O artigo 3.° -A, n.° 1, da Directiva 84/450, relativa à publicidade enganosa e comparativa, na redacção dada pela Directiva 97/55, não se opõe a que os produtos comparados sejam comprados através de canais de distribuição diferentes. Com efeito, por um lado, entre as condições de licitude da publicidade comparativa enumeradas no referido artigo não figura a exigência de que os produtos comparados sejam obtidos através dos mesmos canais de distribuição. Por outro lado, tal condição seria contrária tanto aos objectivos do mercado interno como aos da Directiva 84/450.

( cf. n.os 61-62, disp. 3 )

5. O artigo 3.° -A da Directiva 84/450, relativa à publicidade enganosa e comparativa, na redacção dada pela Directiva 97/55, não se opõe à realização, pelo anunciante, de uma aquisição para teste num concorrente, mesmo antes de iniciar a sua própria oferta, desde que estejam preenchidas as condições de licitude da publicidade comparativa aí previstas. Cabe ao juiz nacional verificar se a mensagem publicitária respeita tais condições.

( cf. n.os 70-71, disp. 4 )

6. O artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e), da Directiva 84/450, relativa à publicidade enganosa e comparativa, na redacção dada pela Directiva 97/55, não se opõe a que uma publicidade comparativa reproduza, para além do nome do concorrente, a sua sigla e uma imagem da fachada do seu estabelecimento, se essa publicidade respeitar as condições de licitude definidas pelo direito comunitário.

( cf. n.os 83-84, disp. 5 )

7. Uma comparação de preços não desacredita um concorrente, na acepção do artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e), da Directiva 84/450, relativa à publicidade enganosa e comparativa, na redacção dada pela Directiva 97/55, nem pelo facto de a diferença de preços entre os produtos comparados ser superior à diferença média de preços, nem devido ao número de comparações efectuadas.

( cf. n.os 84, disp. 5 )

Partes


No processo C-44/01,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 234.° CE, pelo Oberster Gerichtshof (Áustria), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Pippig Augenoptik GmbH & Co. KG

e

Hartlauer Handelsgesellschaft mbH,

Verlassenschaft nach dem verstorbenen Franz Josef Hartlauer,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação da Directiva 84/450/CEE do Conselho, de 10 de Setembro de 1984, relativa à publicidade enganosa e comparativa (JO L 250, p. 17; EE 15 F5 p. 55), na redacção dada pela Directiva 97/55/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Outubro de 1997 (JO L 290, p. 18),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, J.-P. Puissochet, M. Wathelet e C. W. A. Timmermans, presidentes de secção, D. A. O. Edward, V. Skouris, F. Macken, N. Colneric, S. von Bahr, J. N. Cunha Rodrigues (relator) e A. Rosas, juízes,

advogado-geral: A. Tizzano,

secretário: M.-F. Contet, administradora principal,

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação da Pippig Augenoptik GmbH & Co. KG, por F. Hitzenbichler, Rechtsanwalt,

- em representação da Hartlauer Handelsgesellschaft mbH e da Verlassenschaft nach dem verstorbenen Franz Josef Hartlauer, por A. Haslinger, H. Mück, P. Wagner, W. Müller e W. Graziani-Weis, Rechtsanwälte,

- em representação do Governo austríaco, por C. Pesendorfer, na qualidade de agente,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por J. Sack e M. França, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Pippig Augenoptik GmbH & Co. KG, da Hartlauer Handelsgesellschaft mbH e da Verlassenschaft nach dem verstorbenen Franz Josef Hartlauer, bem como da Comissão, na audiência de 23 de Abril de 2002,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 12 de Setembro de 2002,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 19 de Dezembro de 2000, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 2 de Fevereiro de 2001, o Oberster Gerichtshof submeteu, nos termos do artigo 234.° CE, quatro questões prejudiciais relativas à interpretação da Directiva 84/450/CEE do Conselho, de 10 de Setembro de 1984, relativa à publicidade enganosa e comparativa (JO L 250, p. 17; EE 15 F5 p. 55), na redacção dada pela Directiva 97/55/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Outubro de 1997 (JO L 290, p. 18, a seguir «Directiva 84/450»).

2 Essas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio entre a sociedade austríaca Pippig Augenoptik GmbH & Co. KG (a seguir «Pippig») e a sociedade austríaca Hartlauer Handelsgesellschaft mbH (a seguir «Hartlauer») e os herdeiros de Franz Josef Hartlauer, antigo administrador da Hartlauer, a respeito da publicidade que a Hartlauer faz para promover a venda dos seus produtos ópticos, comparando-os com os óculos vendidos pela Pippig.

Enquadramento jurídico

A regulamentação comunitária

3 A Directiva 84/450, que, na sua versão inicial, apenas tinha por objecto a publicidade enganosa, foi alterada pela Directiva 97/55 para abranger também a publicidade comparativa. O título da Directiva 84/450 foi, em consequência, adaptado pelo n.° 1 do artigo 1.° da Directiva 97/55.

4 O sétimo considerando da Directiva 84/450 enuncia:

«considerando que é necessário, para este fim, fixar critérios mínimos e objectivos, com base nos quais seja possível determinar se uma publicidade é enganosa».

5 O artigo 1.° da Directiva 84/450 dispõe:

«A presente directiva tem por objectivo proteger os consumidores e as pessoas que exercem uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, bem como os interesses do público em geral, contra a publicidade enganosa e suas consequências desleais, e estabelecer as condições em que a publicidade comparativa é considerada lícita.»

6 Em conformidade com o artigo 2.° , ponto 2, da Directiva 84/450, deve considerar-se publicidade enganosa, na acepção da directiva, «a publicidade que, por qualquer forma, incluindo a sua apresentação, induz em erro ou é susceptível de induzir em erro as pessoas a quem se dirige ou que afecta e cujo comportamento económico pode afectar, em virtude do seu carácter enganador ou que, por estas razões, prejudica ou pode prejudicar um concorrente».

7 Segundo o artigo 2.° , ponto 2-A, da Directiva 84/450, entende-se por «publicidade comparativa», para efeitos desta directiva, «a publicidade que identifica, explícita ou implicitamente, um concorrente ou os bens ou serviços oferecidos por um concorrente».

8 O artigo 3.° -A, n.° 1, da Directiva 84/450 prevê:

«A publicidade comparativa é autorizada, no que se refere exclusivamente à comparação, quando se reúnam as seguintes condições:

a) Não ser enganosa nos termos do n.° 2 do artigo 2.° , do artigo 3.° e do n.° 1 do artigo 7.° ;

b) Comparar bens ou serviços que respondem às mesmas necessidades ou têm os mesmos objectivos;

c) Comparar objectivamente uma ou mais características essenciais, pertinentes, comprováveis e representativas desses bens e serviços, entre as quais se pode incluir o preço;

d) Não gerar confusão no mercado entre o anunciante e um concorrente ou entre as marcas, designações comerciais, outros sinais distintivos, bens ou serviços do anunciante e do concorrente;

e) Não desacreditar ou depreciar marcas, designações comerciais, outros sinais distintivos, bens, serviços, actividades ou situação de um concorrente;

f) Referir-se, em todos os casos de produtos com denominação de origem, a produtos com a mesma denominação;

g) Não retirar partido indevido do renome de uma marca, designação comercial ou outro sinal distintivo de um concorrente ou da denominação de origem de produtos concorrentes;

h) Não apresentar um bem ou serviço como sendo imitação ou reprodução de um bem ou serviço cuja marca ou designação comercial seja protegida.»

9 Nos termos do artigo 7.° , n.os 1 e 2, da Directiva 84/450:

«1. A presente directiva não prejudica a manutenção ou adopção, pelos Estados-Membros, de disposições que assegurem uma protecção mais ampla dos consumidores, das pessoas que exercem uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal e do público em geral em matéria de publicidade enganosa.

2. O n.° 1 não é aplicável à publicidade comparativa, no que se refere exclusivamente à comparação.»

10 Os considerandos 2, 3, 14, 15 e 18 da Directiva 97/55 têm a seguinte redacção:

«(2) Considerando que, com a realização do mercado interno, aumentará cada vez mais a variedade da oferta; que os consumidores podem e devem tirar o máximo partido do mercado interno, e que a publicidade constitui um meio muito importante de criar em toda a Comunidade oportunidades reais de mercado para todos os bens e serviços; que as disposições essenciais que regem a forma e o conteúdo da publicidade comparativa nos Estados-Membros devem ser uniformes e que as condições da utilização da publicidade comparativa nos Estados-Membros devem ser harmonizadas; que, se essas condições forem respeitadas, tal contribuirá para demonstrar objectivamente as vantagens dos diferentes produtos comparáveis; que a publicidade comparativa pode estimular a concorrência entre fornecedores de bens e serviços no interesse dos consumidores;

[...]

(3) [Considerando] [...] que o facto de as legislações nacionais permitirem ou proibirem a publicidade comparativa pode constituir um obstáculo à livre circulação de bens e serviços e criar distorções de concorrência [...];

[...]

(14) Considerando [...] que pode ser indispensável, para uma efectiva publicidade comparativa, identificar os produtos ou serviços de um concorrente, através de referências à sua designação comercial ou a uma marca de que seja titular;

(15) Considerando que a utilização da marca, da designação comercial ou de qualquer outra marca distintiva de outrem não infringe o direito exclusivo do titular, na medida em que cumpra as condições estabelecidas na presente directiva, já que o objectivo consiste unicamente em acentuar objectivamente as respectivas diferenças;

[...]

(18) Considerando que o artigo 7.° da Directiva 84/450/CEE, que autoriza os Estados-Membros a manterem ou adoptarem disposições para assegurar uma protecção mais ampla dos consumidores, das pessoas que exercem uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal e do público em geral, não pode ser aplicado à publicidade comparativa, já que o objectivo da alteração desta directiva é estabelecer as condições em que é permitida a publicidade comparativa.»

A regulamentação nacional

11 A República da Áustria transpôs a Directiva 97/55, modificando, com efeitos a partir de 1 de Abril de 2000, a Bundesgesetz gegen den unlauteren Wettbewerb (lei federal contra a concorrência desleal), de 16 de Novembro de 1984 (BGBl, 1984/448, a seguir «UWG»). Todavia, decorre do despacho de reenvio que a jurisprudência austríaca teve em conta a referida directiva antes mesmo do termo do prazo de transposição na interpretação do artigo 2.° da UWG.

12 Segundo o artigo 2.° , n.° 1, da UWG:

«O comerciante que, com objectivos concorrenciais, forneça indicações sobre relações comerciais susceptíveis de induzir em erro pode ser condenado a abster-se de adoptar tal comportamento. [...]»

O litígio no processo principal e as questões prejudiciais

13 A Pippig explora três estabelecimentos especializados no ramo da óptica oftalmológica, situados em Linz (Áustria), nos quais comercializa óculos. Abastece-se junto de cerca de sessenta fabricantes diferentes e dispõe de um conjunto representativo de cada um dos seus fornecedores.

14 A Hartlauer é uma sociedade comercial cujas filiais, implantadas em toda a Áustria, possuem secções de óptica nas quais os óculos comercializados são, na sua grande maioria, de marcas pouco conhecidas e são vendidos a preços baixos. Quanto aos óculos de marcas mais conhecidas, a Hartlauer não se abastece directamente junto dos mesmos fornecedores dos oculistas, procurando-os antes fora dos canais de distribuição normais, nomeadamente através de importações paralelas.

15 No início do mês de Setembro de 1997, a Hartlauer colocou em distribuição em toda a Áustria um desdobrável publicitário no qual afirmava que 52 comparações de preços de óculos efectuadas ao longo de seis anos tinham revelado uma diferença de preço total de 204 777 ATS, ou seja, 3 900 ATS em média por cada par de óculos, entre os preços praticados por si e os cobrados pelos oculistas tradicionais. O desdobrável afirmava, nomeadamente, que, relativamente a uma lente clara da marca Zeiss, os oculistas obtinham uma margem de lucro de 717%.

16 O desdobrável publicitário continha igualmente uma comparação directa entre o preço de 5 785 ATS pedido pela Pippig por óculos Titanflex Eschenbach com lentes da marca Zeiss e o preço de 2 000 ATS proposto pela Hartlauer para óculos do mesmo modelo, mas com lentes da marca Optimed.

17 Esta comparação de preços foi igualmente anunciada em mensagens publicitárias difundidas através de certas cadeias de radiodifusão e de televisão austríacas, nas quais, ao contrário do desdobrável publicitário, não se precisava que os óculos comparados tinham lentes de marcas diferentes. Nos anúncios televisivos aparecia a fachada do estabelecimento da demandante no processo principal, com a sigla «Pippig».

18 A preparação desta publicidade comparativa incluiu a realização de uma aquisição para teste: um empregado da Hartlauer dirigiu-se a um estabelecimento da Pippig, em 8 de Julho de 1997, e encomendou óculos Titanflex Eschenbach e lentes Zeiss. Estes óculos foram, em seguida, fotografados, tendo a fotografia sido utilizada duas vezes no desdobrável publicitário distribuído pela Hartlauer, uma para ilustrar a oferta da Pippig relativamente a esse óculos e outra para ilustrar a oferta da Hartlauer relativamente a óculos do mesmo modelo com lentes Optimed, uma vez que, quando da compra para teste, a armação Titanflex Eschenbach ainda não era comercializada nos estabelecimentos Hartlauer.

19 A Pippig propôs uma acção judicial contra a Hartlauer e os herdeiros de Franz Josef Hartlauer, pedindo que a Hartlauer se abstivesse de qualquer publicidade comparativa quanto aos preços na forma descrita nos n.os 15 a 18 do presente acórdão, pelo facto de essa publicidade ser enganosa e de a desacreditar. Pediu igualmente a condenação dos demandados no pagamento de uma indemnização, bem como na publicação do acórdão a expensas da Hartlauer.

20 Os órgãos jurisdicionais de primeira instância e de recurso julgaram procedentes a maior parte dos pedidos da Pippig, mas não todos, pelo que tanto a demandante como os demandados interpuseram recursos de revista no Oberster Gerichtshof.

21 Considerando que a interpretação da Directiva 84/450 é necessária para resolver o litígio nele pendente, o Oberster Gerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1) O artigo 7.° , n.° 2, da Directiva 97/55/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Outubro de 1997, que altera a Directiva 84/450/CEE relativa à publicidade enganosa para incluir a publicidade comparativa (a seguir directiva), deve ser interpretado no sentido de que a expressão publicidade comparativa no que se refere exclusivamente à comparação tem em vista as afirmações relativas à oferta do próprio anunciante, as relativas à oferta do concorrente e as relativas à relação entre as duas ofertas (o resultado da comparação) ou de que, ao invés, apenas existe comparação, na acepção do artigo 7.° , n.° 2, quando são feitas afirmações sobre o resultado da comparação, de modo que indicações enganosas sobre outras características dos bens ou serviços comparados podem ser analisadas à luz de uma disposição nacional em matéria de publicidade enganosa eventualmente mais rigorosa?

A remissão feita no artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da directiva para o seu artigo 7.° , n.° 1, constitui lex specialis relativamente ao artigo 7.° , n.° 2, da directiva, de modo que uma disposição nacional em matéria de publicidade enganosa eventualmente mais rigorosa pode ser aplicada a todos os termos da comparação?

O artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da directiva deve ser interpretado no sentido de que a comparação do preço de um produto de marca com o preço de um produto sem marca, de qualidade idêntica, é proibida se não forem indicados os nomes dos produtores, ou o artigo 3.° -A, n.° 1, alíneas c) e g), da directiva obstam à indicação dos produtores? A imagem de um produto (de marca) é uma característica essencial dos bens ou serviços na acepção do artigo 3.° -A, n.° 1, alínea c), da directiva? A (eventual) resposta negativa a tais questões implica a ilicitude de qualquer comparação (baseada no preço) entre um produto de marca e um produto sem marca de qualidade idêntica?

2) O artigo 7.° , n.° 2, da directiva deve ser interpretado no sentido de que mesmo as diferenças em termos de fornecimento dos bens ou serviços cujas características são comparadas com as dos bens ou serviços do anunciante apenas devem ser analisadas à luz do artigo 3.° -A da directiva?

Caso seja dada resposta afirmativa a esta questão:

O artigo 3.° -A da directiva deve ser interpretado no sentido de que uma comparação (baseada no preço) apenas é autorizada se os bens comparados forem fornecidos através dos mesmos canais de distribuição e, consequentemente, se tanto o anunciante como a concorrência oferecerem uma gama de produtos idêntica?

3) Também se deve considerar comparação, na acepção do artigo 7.° , n.° 2, da directiva, a criação das bases da comparação mediante uma aquisição para teste?

Caso seja dada resposta afirmativa a esta questão:

O artigo 3.° -A da directiva deve ser interpretado no sentido de que não é permitido utilizar intencionalmente uma comparação (baseada no preço) favorável ao anunciante, mediante uma aquisição para teste efectuada antes do início da oferta de tal operador e deliberadamente realizada com esse objectivo?

4) Uma comparação desacredita uma marca, na acepção do artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e), da directiva, quando o anunciante escolhe o bem adquirido ao concorrente de modo a existir uma diferença de preço superior à diferença média e/ou quando as comparações baseadas no preço são efectuadas frequentemente, de modo a suscitar a impressão que os preços da concorrência são, em geral, excessivos?

O artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e), da directiva deve ser interpretado no sentido de que as indicações relativas à identidade do concorrente se devem limitar ao estritamente necessário, pelo que não é permitido mostrar, além do nome, o (eventual) logotipo e o estabelecimento do concorrente?»

Quanto à primeira questão

22 Pela sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em primeiro lugar, se o artigo 7.° , n.° 2, da Directiva 84/450 se aplica a todos os elementos da comparação, ou seja, às indicações relativas à oferta do anunciante, às indicações relativas à oferta do concorrente e às relações entre estas ofertas, ou apenas a este último elemento. Pergunta, em segundo lugar, se o artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450 deve ser interpretado no sentido de que autoriza a aplicação à publicidade comparativa de disposições nacionais mais rigorosas em matéria de protecção contra a publicidade enganosa. Pergunta, em terceiro lugar, se o artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450 deve ser interpretado no sentido de que autoriza a comparação de produtos de marca com produtos sem marca quando os nomes dos fabricantes não são indicados.

Observações apresentadas ao Tribunal

23 A Pippig alega que o artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450 é uma disposição crucial, na medida em que prevê que a publicidade comparativa não deve ser enganosa na acepção dos artigos 2.° , ponto 2, 3.° e 7.° , n.° 1, dessa directiva. A referida disposição não se referia ao n.° 2 do artigo 7.° , mas ao seu n.° 1, de forma que, no que diz respeito à publicidade comparativa enganosa, era lícito aplicar critérios nacionais mais rigorosos a todos os elementos da comparação.

24 Segundo a Pippig, a fim de que o artigo 7.° , n.° 2, da Directiva 84/450 não fique privado de todo o seu efeito útil, essa disposição deve ser interpretada no sentido de que, salvo no caso da publicidade enganosa, a comparação não pode, em si, ser restringida.

25 A Pippig considera que o artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450 deve ser interpretado no sentido de que a comparação entre o preço de um produto de marca e o preço de um produto sem marca de qualidade equivalente é ilícita quando não se indique o nome do fabricante do produto de marca. Isso decorreria da exigência de uma comparação objectiva, enunciada nos considerandos 7 e 15 da Directiva 97/55.

26 Os demandados no processo principal defendem que o artigo 7.° , n.° 2, da Directiva 84/450 estabeleceu uma «norma fixa», ao excluir explicitamente a aplicação pelos Estados-Membros de critérios nacionais mais rigorosos em matéria de publicidade enganosa no que diz respeito a todos os elementos da publicidade comparativa. Uma interpretação contrária levaria a que uma campanha publicitária contendo publicidade comparativa, concebida para ser lançada em todos os Estados-Membros, pudesse ser autorizada em certos Estados e proibida noutros.

27 Por outro lado, os demandados no processo principal alegam que, dado que as lentes Optimed, como as lentes Zeiss, são de marca, a publicidade comparativa em causa no processo principal é lícita. Uma outra interpretação conduziria a que a publicidade comparativa apenas seria possível relativamente a produtos idênticos, o que não faria qualquer sentido à luz do artigo 3.° -A, n.° 1, alíneas b), d), e), g) e h), da Directiva 84/450.

28 Além disso, a indicação do nome do concorrente visado pela comparação não é obrigatória. Com efeito, o carácter facultativo dessa designação resulta quer do artigo 3.° -A da Directiva 84/450, quer do considerando 15 da Directiva 97/55.

29 O Governo austríaco considera que se deve admitir a licitude de um critério nacional de publicidade enganosa mais rigoroso quanto ao risco de publicidade enganosa a que se refere o artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450, mas não quanto à definição de publicidade comparativa nem quanto às condições previstas no referido artigo 3.° -A, n.° 1, alíneas b) a h). Uma interpretação contrária não permitiria conferir sentido ao artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450. Seria igualmente difícil explicar por que razão a publicidade enganosa podia, a nível nacional, ser tratada de forma mais rigorosa fora de uma comparação do que no âmbito de uma comparação.

30 O Governo austríaco defende que, apesar de a comparação de um produto sem marca com um produto de marca resultar frequentemente numa situação quer de publicidade enganosa, quer de descrédito, uma comparação como essa não devia, com base nisso, ser sistematicamente considerada ilícita.

31 Segundo a Comissão, a Directiva 84/450 contém, em matéria de publicidade comparativa, uma regulamentação exaustiva que cobre todos os elementos da comparação de bens ou de serviços para fins publicitários. Por conseguinte, não deixa margem para uma regulamentação ou uma jurisprudência nacionais mais rigorosas quanto à licitude dessa publicidade.

32 Nestas condições, a remissão para o artigo 7.° , n.° 1, feita no artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450, apenas pode significar que a publicidade comparativa, que, como tal, é lícita segundo o disposto na referida directiva, seria, contudo, ilícita se, a outro nível que não o da comparação propriamente dita, contivesse indicações enganosas.

33 A Comissão observa igualmente que nenhuma disposição da Directiva 84/450 proíbe a comparação de produtos de marca com produtos sem marca. Contudo, no caso dos óculos, o facto de estes terem lentes de uma marca famosa pode ser uma característica que aumenta a sua qualidade e, por conseguinte, o preço, de forma que seria necessário mencionar a existência ou inexistência dessas lentes nos óculos que são objecto de uma comparação de preços para que esta não seja enganosa.

Apreciação do Tribunal

34 Quanto à primeira parte da questão, a respeito da aplicação do artigo 7.° , n.° 2, da Directiva 84/450 a todos os elementos da comparação, importa recordar que, segundo o artigo 2.° , ponto 2-A, dessa directiva, entende-se por publicidade comparativa a publicidade que identifica, explícita ou implicitamente, um concorrente ou os bens ou serviços oferecidos por um concorrente.

35 Como o Tribunal de Justiça já declarou, trata-se de uma definição ampla, susceptível de abranger todas as formas de publicidade comparativa, de forma que, para que exista publicidade comparativa, basta que exista uma comunicação que faça, ainda que implicitamente, referência a um concorrente ou aos bens e serviços por ele oferecidos (v. acórdão de 25 de Outubro de 2001, Toshiba Europe, C-112/99, Colect., p. I-7945, n.os 30 e 31).

36 A publicidade comparativa destina-se a demonstrar as vantagens dos bens ou dos serviços oferecidos pelo anunciante relativamente aos de um concorrente. Para esse fim, a mensagem deve necessariamente sublinhar as diferenças entre os bens ou os serviços comparados através da descrição das suas principais características. A comparação efectuada pelo anunciante resultará necessariamente de uma descrição como essa.

37 Por conseguinte, no âmbito da Directiva 84/450, não há que distinguir na regulamentação os diferentes elementos da comparação, ou seja, as indicações relativas à oferta do anunciante, as indicações relativas à oferta do concorrente e a relação entre essas duas ofertas.

38 Quanto à segunda parte da questão, a respeito da aplicação à publicidade comparativa de disposições nacionais mais rigorosas em matéria de protecção contra a publicidade enganosa, importa observar que o objectivo da Directiva 84/450 é a definição das condições em que a publicidade comparativa deve ser considerada lícita no âmbito do mercado interno.

39 Para este fim, o artigo 3.° -A da Directiva 84/450 enumera as condições a preencher, entre as quais a exigência de que a publicidade comparativa não seja enganosa na acepção dos artigos 2.° , ponto 2, 3.° e 7.° , n.° 1, da mesma directiva [v. artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450].

40 Uma vez que o legislador comunitário apenas procedeu, em matéria de publicidade enganosa, a uma harmonização mínima dos regimes nacionais, o artigo 7.° , n.° 1, da Directiva 84/450 permite que os Estados-Membros apliquem, nesta matéria, disposições nacionais mais rigorosas que assegurem uma protecção mais ampla, nomeadamente, dos consumidores.

41 Todavia, o artigo 7.° , n.° 2, da Directiva 84/450 prevê expressamente que o n.° 1 do mesmo artigo não é aplicável à publicidade comparativa, no que se refere exclusivamente à comparação.

42 Assim, as disposições da Directiva 84/450 relativas às condições em que é permitida a publicidade comparativa, por um lado, remetem para o artigo 7.° , n.° 1, no que diz respeito à definição de publicidade enganosa [artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a)] e, por outro lado, afastam a aplicação desta mesma disposição (artigo 7.° , n.° 2). Face a esta aparente contradição textual, impõe-se uma interpretação dessas disposições, que deve ter em conta os objectivos da Directiva 84/450 e a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual as condições exigidas para a publicidade comparativa devem ser interpretadas no sentido mais favorável a esta (acórdão Toshiba Europe, já referido, n.° 37).

43 De acordo com o considerando 2 da Directiva 97/55, as disposições essenciais que regem a forma e o conteúdo da publicidade comparativa nos Estados-Membros devem ser uniformes e as condições da sua utilização nos Estados-Membros devem ser harmonizadas. Nos termos do considerando 3 da mesma directiva, o facto de as legislações nacionais permitirem ou proibirem a publicidade comparativa pode constituir um obstáculo à livre circulação de bens e de serviços e criar distorções de concorrência. O considerando 18 da referida directiva exclui a aplicação à publicidade comparativa de disposições nacionais mais rigorosas em matéria de publicidade enganosa, dado que o objectivo prosseguido pelo legislador comunitário, ao adoptar a Directiva 97/55, foi o de estabelecer as condições em que é permitida a publicidade comparativa em toda a Comunidade.

44 Em consequência, a Directiva 84/450 procedeu a uma harmonização exaustiva das condições de licitude da publicidade comparativa nos Estados-Membros. Essa harmonização implica, por natureza, que a licitude da publicidade comparativa em toda a Comunidade deva ser apreciada exclusivamente à luz dos critérios fixados pelo legislador comunitário. Por conseguinte, as disposições nacionais mais rigorosas em matéria de protecção contra a publicidade enganosa não podem aplicar-se à publicidade comparativa no que diz respeito à forma e ao conteúdo da comparação.

45 Quanto à terceira parte da questão, a respeito da licitude da comparação de produtos de marca com produtos sem marca, cabe observar que, no processo principal, os produtos em causa são todos produtos de marca.

46 Nestas condições, deve entender-se que a questão suscitada diz respeito à licitude da comparação entre produtos de marcas diferentes quando os nomes dos fabricantes não são indicados.

47 A este respeito, importa referir, em primeiro lugar, que a Directiva 84/450 permite que, em certas condições, um anunciante indique numa publicidade comparativa a marca dos produtos de um concorrente.

48 Isso decorre, por um lado, do considerando 14 da Directiva 97/55, segundo o qual pode ser indispensável, para uma efectiva publicidade comparativa, identificar os produtos ou serviços de um concorrente através de referências a uma marca de que seja titular.

49 Isso resulta, por outro lado, do artigo 3.° -A, n.° 1, alíneas d), e) e g), da Directiva 84/450. Com efeito, estas disposições enunciam três condições de licitude da publicidade comparativa, exigindo que esta, nomeadamente, não gere confusão no mercado entre as marcas do anunciante e as de um concorrente, que não desacredite ou deprecie as marcas de um concorrente e que não retire partido indevido do renome de uma marca de um concorrente. Daí decorre que, desde que a comparação não tenha por objecto ou efeito criar essas situações de concorrência desleal, a utilização da marca de um concorrente é permitida pelo direito comunitário.

50 Por outro lado, cabe recordar que o Tribunal de Justiça já declarou que o uso da marca de outrem pode ser legítimo quando for necessário para informar o público da natureza dos produtos ou do destino dos serviços oferecidos (acórdão Toshiba Europe, já referido, n.° 34).

51 Assim, é dada ao anunciante a possibilidade de indicar a marca de um concorrente no âmbito da publicidade comparativa.

52 É possível que, em circunstâncias particulares, a omissão dessa indicação numa mensagem publicitária que contenha uma comparação induza ou, pelo menos, seja susceptível de induzir em erro as pessoas a quem se dirige, tornado-a, por isso, enganosa, na acepção do artigo 2.° , ponto 2, da Directiva 84/450.

53 Nos casos em que a marca dos produtos possa condicionar de forma sensível a escolha do comprador e em que a comparação diga respeito a produtos concorrentes cujas marcas possuem uma importância diferente em termos de renome, o facto de omitir a marca mais conhecida contraria o artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450, que define uma das condições de licitude da publicidade comparativa.

54 Atendendo ao carácter cumulativo das exigências previstas no artigo 3.° -A, n.° 1, da Directiva 84/450, esse tipo de publicidade comparativa é proibido pelo direito comunitário.

55 Compete, no entanto, em cada caso, ao órgão jurisdicional nacional competente verificar, tendo em conta todos os elementos pertinentes do processo que lhe foi submetido, se estão reunidas as condições enunciadas no n.° 53 do presente acórdão, atendendo à presumível expectativa de um consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado (acórdão de 13 de Janeiro de 2000, Estée Lauder, C-220/98, Colect., p. I-117, n.os 27 e 30).

56 Por conseguinte, há que responder à primeira questão que:

- o artigo 7.° , n.° 2, da Directiva 84/450 opõe-se à aplicação à publicidade comparativa de disposições nacionais mais rigorosas em matéria de protecção contra a publicidade enganosa no que diz respeito à forma e ao conteúdo da comparação, não cabendo distinguir os diferentes elementos da comparação, ou seja, as indicações relativas à oferta do anunciante, as indicações relativas à oferta do concorrente e a relação entre essas ofertas;

- o artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450 deve ser interpretado no sentido de que, embora o anunciante, em princípio, seja livre de indicar ou não numa publicidade comparativa a marca dos produtos concorrentes, compete, no entanto, ao órgão jurisdicional nacional verificar se, em circunstâncias determinadas, caracterizadas pela importância da marca na escolha do comprador e pela diferença importante, em termos de renome, entre as marcas dos produtos comparados, a omissão da marca mais conhecida é susceptível de se revelar enganosa.

Quanto à segunda questão

57 Pela sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, essencialmente, se as diferenças no modo de abastecimento de produtos cujas qualidades são comparadas podem reflectir-se na licitude da publicidade comparativa.

Observações apresentadas ao Tribunal

58 A Pippig sustenta que, quando as diferenças no modo de aquisição de bens ou de serviços são determinantes para a publicidade, e que a origem do produto pode ser importante para o consumidor e, por essa razão, para o cálculo do preço, essas diferenças devem também ser apreciadas à luz do artigo 3.° -A da Directiva 84/450. Esta interpretação é conforme ao objectivo desta directiva, dado que o seu artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), remete expressamente para as disposições dos seus artigos 3.° e 7.° , n.° 1. Ora, o artigo 3.° , alínea a), da mesma directiva prevê que a indicação numa publicidade da origem comercial dos bens ou dos serviços constitui um elemento determinante para apreciar se esta é enganosa.

59 Segundo os demandados no processo principal, as diferenças na forma de obter um produto nada alteram quanto às características deste. Assim, os óculos de uma determinada marca continuam a ser o mesmo produto de marca, quer sejam adquiridos num distribuidor oficial ou através do circuito das importações paralelas. A publicidade comparativa a respeito dos produtos da mesma marca apenas pode, de resto, ocorrer entre um importador paralelo e um distribuidor oficial, já que os distribuidores oficiais respeitam habitualmente os preços de venda recomendados pelos fabricantes, eliminando, assim, a concorrência quanto aos preços.

60 O Governo austríaco alega que o artigo 3.° -A da Directiva 84/450 não se opõe à comparação de produtos que o anunciante e os seus concorrentes adquirem através de canais de distribuição diferentes. A Comissão defende igualmente esta interpretação, uma vez que não há qualquer circunstância particular que a contrarie, como, por exemplo, a intenção do consumidor de comprar regularmente um produto.

Apreciação do Tribunal

61 Como foi referido no n.° 44 do presente acórdão, a Directiva 84/450 procedeu a uma harmonização exaustiva das condições de licitude da publicidade comparativa nos Estados-Membros. Entre essas condições, enumeradas no artigo 3.° -A, n.° 1, dessa directiva, não figura a exigência de que os produtos comparados sejam obtidos através dos mesmos canais de distribuição.

62 De resto, tal condição seria contrária tanto aos objectivos do mercado interno como aos da Directiva 84/450.

63 Com efeito, por um lado, no âmbito da realização do mercado interno, enquanto espaço sem fronteiras internas no qual deve ser assegurada a livre concorrência, as importações paralelas desempenham um papel importante para impedir a compartimentação dos mercados nacionais.

64 Por outro lado, decorre do considerando 2 da Directiva 97/55 que a publicidade comparativa tem por fim dar aos consumidores a possibilidade de tirar o máximo partido do mercado interno, uma vez que a publicidade constitui um meio muito importante para criar em toda a Comunidade oportunidades reais de mercado para todos os bens e serviços.

65 Cabe, por conseguinte, responder à segunda questão que o artigo 3.° -A, n.° 1, da Directiva 84/450 não se opõe a que os produtos comparados sejam comprados através de canais de distribuição diferentes.

Quanto à terceira questão

66 Pela sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 3.° -A da Directiva 84/450 se opõe à realização pelo anunciante de uma aquisição para teste num concorrente antes mesmo do início da sua própria oferta.

Observações submetidas ao Tribunal

67 A Pippig alega que o artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450 remete expressamente para as condições de licitude da publicidade comparativa enumeradas no artigo 3.° da mesma directiva. Esta última disposição determina que «os resultados e as características essenciais dos testes ou controlos efectuados sobre os bens ou serviços» podem servir para determinar se uma publicidade é enganosa. Por conseguinte, o facto de um anunciante provocar deliberadamente uma comparação de preços que lhe é favorável, efectuando, antes mesmo do começo da sua própria oferta, uma aquisição para teste planeada para esse fim, torna ilícita a comparação.

68 Em contrapartida, os demandados no processo principal e a Comissão consideram que o artigo 3.° -A da Directiva 84/450 não exige que, no momento da aquisição para teste num concorrente, o anunciante tenha já à venda o produto que será posteriormente comparado com aquele que foi objecto da aquisição para teste. Segundo os demandados no processo principal, é inevitável que a aquisição para teste preceda a publicidade e seja, por isso, anterior à fase em que o próprio anunciante oferece o produto comparado a um preço mais baixo.

69 O Governo austríaco sublinha que as condições exigidas para que uma comparação de preços seja lícita estão exaustivamente previstas no artigo 3.° -A da Directiva 84/450. Compete, portanto, ao órgão jurisdicional nacional determinar se o facto de fazer conscientemente uma comparação de preços vantajosa para o anunciante, procedendo a uma aquisição para teste mesmo antes de iniciar a sua própria oferta, pode constituir publicidade enganosa.

Apreciação do Tribunal

70 Uma vez que uma aquisição para teste feita pelo anunciante a um concorrente não é proibida pela Directiva 84/450, a mensagem publicitária que compara a oferta desse anunciante com a do referido concorrente apenas será ilícita se não respeitar uma das condições previstas no artigo 3.° -A, n.° 1, dessa directiva, o que compete ao órgão jurisdicional nacional verificar.

71 Importa, assim, responder à terceira questão que o artigo 3.° -A da Directiva 84/450 não se opõe à realização pelo anunciante de uma aquisição para teste num concorrente mesmo antes de iniciar a sua própria oferta, desde que estejam preenchidas as condições de licitude da publicidade comparativa aí previstas.

Quanto à quarta questão

72 Pela sua quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em primeiro lugar, se uma comparação de preços desacredita o concorrente e é, assim, ilícita na acepção do artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e), da Directiva 84/450 quando os produtos são escolhidos de forma a obter uma diferença de preços superior à diferença de preços média e/ou quando as comparações são repetidas de forma contínua, criando a impressão de que os preços do concorrente são excessivos. Pergunta, em segundo lugar, se a mesma disposição deve ser interpretada no sentido de que uma publicidade comparativa é ilícita quando reproduz, para além do nome do concorrente, a sua sigla e uma imagem do seu estabelecimento.

Observações apresentadas ao Tribunal

73 A Pippig alega que uma comparação desacredita, na acepção do artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e), da Directiva 84/450, quando o anunciante escolhe a mercadoria comprada no concorrente de forma a obter uma diferença de preços superior à diferença de preço normal e quando efectua continuamente tais comparações de preços, de forma que cria a impressão de que os preços praticados pelo concorrente são, em geral, excessivos. A exigência de objectividade implica que o anunciante não tem o direito de criar essa impressão.

74 Por outro lado, decorre do considerando 15 da Directiva 97/55 que a utilização da marca, da designação comercial, do logotipo da firma ou de uma imagem da fachada do estabelecimento de um concorrente não infringe o direito exclusivo do titular desde que cumpra as condições estabelecidas na Directiva 84/450, já que o objectivo consiste unicamente em distinguir os produtos ou serviços de um concorrente e, por conseguinte, em acentuar objectivamente as respectivas diferenças. A Pippig considera, todavia, que, no processo principal, não era indispensável que o anunciante se apresentasse de uma forma «triunfal» em frente do estabelecimento do concorrente cujos produtos são objecto de comparação.

75 Os demandados no processo principal defendem que o artigo 3.° -A da Directiva 84/450 não exige que a publicidade comparativa se reduza a indicar a eventual diferença de preços média entre as ofertas das empresas comparadas. Com efeito, não existe qualquer restrição quanto ao número de comparações de preços que podem ser validamente efectuadas. Se esta exigência, que não figura no referido artigo 3.° -A, fosse introduzida, estariam excluídas as comparações de preços relativas a certos produtos, entre empresas que praticam, em média, os mesmos preços.

76 A referência na publicidade aos estabelecimentos comerciais ou aos endereços dos estabelecimentos de um concorrente constitui um meio válido de identificação do concorrente admitido pelo considerando 14 da Directiva 97/55.

77 Segundo o Governo austríaco, compete ao órgão jurisdicional nacional verificar, com base nos critérios do artigo 3.° -A, n.° 1, da Directiva 84/450, em particular em conjugação com o artigo 2.° , ponto 2, desta, se a publicidade comparativa com base no preço desacredita o concorrente e se é lícito mostrar, para além do nome deste último, a sua sigla e o seu estabelecimento.

78 A Comissão considera que a indicação de preços mais elevados praticados por um concorrente não pode, por si só, desacreditar ou depreciar este último. Por conseguinte, para saber se uma comparação de preços é objectiva e não enganosa, basta aplicar o artigo 3.° -A, n.° 1, alíneas a) a c), da Directiva 84/450. A Comissão sustenta que, uma vez que não está fixado nenhum nível de preços, a afirmação segundo a qual um concorrente pratica constantemente preços «excessivos» não pode, em princípio, constituir um descrédito ou uma depreciação, a menos que se sugira que os preços são usurários.

79 Por último, a Comissão observa que a simples reprodução do logotipo e do estabelecimento de um concorrente também não constitui um descrédito ou uma depreciação, desde que não seja acompanhada de uma alegação falsa ou difamatória. Essa reprodução pode aumentar a eficácia e a credibilidade de uma publicidade comparativa.

Apreciação do Tribunal

80 Quanto à primeira parte da questão, cabe observar que o confronto entre as ofertas concorrentes, nomeadamente no que diz respeito aos preços, resulta da própria natureza da publicidade comparativa. Por conseguinte, a comparação dos preços não pode, em si mesma, desacreditar ou depreciar um concorrente que pratica preços mais elevados, na acepção do artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e), da Directiva 84/450.

81 Importa precisar que a escolha do número de comparações que o anunciante pretende fazer entre os produtos que oferece e aqueles que são oferecidos pelos seus concorrentes resulta do exercício da sua liberdade económica. Uma eventual obrigação de circunscrever cada comparação de preços aos preços médios dos produtos oferecidos pelo anunciante e dos produtos concorrentes seria contrária aos objectivos do legislador comunitário.

82 Com efeito, nos termos do considerando 2 da Directiva 97/55, a publicidade comparativa deve contribuir para demonstrar objectivamente as vantagens dos diferentes produtos comparáveis. Essa objectividade implica que as pessoas a quem se dirige a publicidade possam conhecer as reais diferenças de preço dos produtos comparados e não apenas a diferença média entre os preços praticados pelo anunciante e os praticados pelos concorrentes.

83 Quanto à segunda parte da questão, a respeito da reprodução, na mensagem publicitária, da sigla e da imagem da fachada do estabelecimento do concorrente, importa referir que, segundo o considerando 15 da Directiva 97/55, a utilização da marca, da designação comercial ou de qualquer outra marca distintiva de outrem não infringe o direito exclusivo do titular, na medida em que cumpra as condições estabelecidas nessa directiva.

84 Tendo em conta as considerações que precedem, cabe responder à quarta questão, em primeiro lugar, que uma comparação de preços não desacredita um concorrente, na acepção do artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e), da Directiva 84/450, nem pelo facto de a diferença de preços entre os produtos comparados ser superior à diferença média de preços, nem devido ao número de comparações efectuadas. Em segundo lugar, o artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e), da Directiva 84/450 não se opõe a que uma publicidade comparativa reproduza, para além do nome do concorrente, a sua sigla e uma imagem da fachada do seu estabelecimento, se essa publicidade respeitar as condições de licitude definidas pelo direito comunitário.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

85 As despesas efectuadas pelo Governo austríaco e pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Oberster Gerichtshof, por despacho de 19 de Dezembro de 2000, declara:

1) O artigo 7.° , n.° 2, da Directiva 84/450/CEE do Conselho, de 10 de Setembro de 1984, relativa à publicidade enganosa e comparativa, na redacção dada pela Directiva 97/55/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Outubro de 1997, opõe-se à aplicação à publicidade comparativa de disposições nacionais mais rigorosas em matéria de protecção contra a publicidade enganosa no que diz respeito à forma e ao conteúdo da comparação, não cabendo distinguir os diferentes elementos da comparação, ou seja, as indicações relativas à oferta do anunciante, as indicações relativas à oferta do concorrente e a relação entre essas ofertas.

2) O artigo 3.° -A, n.° 1, alínea a), da Directiva 84/450, alterada, deve ser interpretado no sentido de que, embora o anunciante, em princípio, seja livre de indicar ou não numa publicidade comparativa a marca dos produtos concorrentes, compete, no entanto, ao órgão jurisdicional nacional verificar se, em circunstâncias determinadas, caracterizadas pela importância da marca na escolha do comprador e pela diferença importante, em termos de renome, entre as marcas dos produtos comparados, a omissão da marca mais conhecida é susceptível de se revelar enganosa.

3) O artigo 3.° -A, n.° 1, da Directiva 84/450, alterada, não se opõe a que os produtos comparados sejam comprados através de canais de distribuição diferentes.

4) O artigo 3.° -A da Directiva 84/450, alterada, não se opõe à realização pelo anunciante de uma aquisição para teste num concorrente mesmo antes de iniciar a sua própria oferta, desde que estejam preenchidas as condições de licitude da publicidade comparativa aí previstas.

5) Uma comparação de preços não desacredita um concorrente, na acepção do artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e), da Directiva 84/450, alterada, nem pelo facto de a diferença de preços entre os produtos comparados ser superior à diferença média de preços, nem devido ao número de comparações efectuadas. O artigo 3.° -A, n.° 1, alínea e), da Directiva 84/450, alterada, não se opõe a que uma publicidade comparativa reproduza, para além do nome do concorrente, a sua sigla e uma imagem da fachada do seu estabelecimento, se essa publicidade respeitar as condições de licitude definidas pelo direito comunitário.

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