Processo T-158/00
Arbeitsgemeinschaft der öffentlich-rechtlichen Rundfunkanstalten der Bundesrepublik Deutschland (ARD)
contra
Comissão das Comunidades Europeias
«Concorrência – Concentrações – Admissibilidade – Mercado da televisão por assinatura e mercado dos serviços de televisão interactiva digital – Sérias dúvidas quanto à compatibilidade com o mercado comum – Compromissos assumidos no decurso da fase I da apreciação – Prazos – Alteração dos compromissos – Insuficiência dos compromissos»
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Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção) de 30 de Setembro de 2003 |
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Sumário do acórdão
- 1..
- Recurso de anulação – Pessoas singulares ou colectivas – Actos que lhes dizem directa e individualmente respeito – Decisão que declara a compatibilidade de uma operação de concentração com o mercado comum – Empresa terceira que possui a qualidade de concorrente directo num mercado vizinho do mercado dominado e que participou activamente
no procedimento administrativo – Admissibilidade
(Artigo 230.°, quarto parágrafo, CE)
- 2..
- Processo – Petição inicial – Exigências de forma – Exposição sumária dos fundamentos invocados – Fundamentos de direito não expostos na petição – Remissão para os argumentos suscitados durante o procedimento administrativo – Inadmissibilidade
[Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigo 44.°, n.° 1, alínea c)]
- 3..
- Concorrência – Concentrações – Apreciação da compatibilidade com o mercado comum – Criação ou reforço de uma posição dominante – Inexistência de entrave significativo a uma concorrência efectiva – Admissibilidade
(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 2.°, n.° 2)
- 4..
- Concorrência – Concentrações – Exame pela Comissão – Exame em função do próprio impacto da operação em causa no mercado
(Artigo 81.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 2.°)
- 5..
- Concorrência – Concentrações – Exame pela Comissão – Compromissos das empresas em causa susceptíveis de tornarem a operação notificada compatível com o mercado comum – Compromissos comportamentais – Admissibilidade
(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigos 2.°, n.
os 2 e 3)
- 6..
- Concorrência – Concentrações – Exame pela Comissão – Adopção de uma decisão que declara a compatibilidade de uma operação de concentração com o mercado comum sem abertura da fase
II – Condição – Inexistência de dúvidas sérias – Compromissos das empresas em causa susceptíveis de dissiparem as dúvidas surgidas e de tornarem a operação notificada compatível
com o mercado comum – Apreciações de ordem económica – Margem de apreciação – Fiscalização jurisdicional – Objecto – Inexistência de erro manifesto de apreciação
(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 6.°, n.
os 1 e 2)
- 7..
- Concorrência – Concentrações – Exame pela Comissão – Compromissos das empresas em causa susceptíveis de tornarem a operação notificada compatível com o mercado comum – Compromissos que no essencial surgem como respeitando à adopção de um comportamento que não viola o artigo 82.° CE – Compromissos não totalmente desprovidos de interesse
(Artigo 82.° CE)
- 8..
- Concorrência – Concentrações – Procedimento administrativo – Compromissos das empresas em causa – Alterações comunicadas fora do prazo – Tomada em consideração pela Comissão dos compromissos alterados para declarar a compatibilidade da operação com o mercado
comum – Admissibilidade
(Regulamento n.° 447/98 da Comissão, artigo 18.°, n.° 1)
- 9..
- Concorrência – Concentrações – Exame pela Comissão – Obrigações da Comissão em relação a terceiros qualificados – Comunicação, para parecer prévio, da versão definitiva dos compromissos assumidos pelas empresas em causa – Inexistência
[Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigos 6.°, n.° 1, alínea c), e 18.°, n.° 4]
- 1.
Só pode considerar-se que uma decisão diz individualmente respeito a uma pessoa que não seja o seu destinatário se essa decisão
a atingir em razão de determinadas qualidades que lhe são específicas ou de uma situação de facto que a caracteriza em relação
a qualquer outra pessoa e, por isso, a individualiza de modo análogo ao do destinatário. No caso de uma decisão que declara a compatibilidade de uma operação de concentração com o mercado comum, e tratando-se de
uma empresa terceira, é em função da sua participação no procedimento administrativo da afectação da sua posição no mercado
que há que determinar se a mesma lhe diz individualmente respeito. Em primeiro lugar, embora a simples participação no processo não seja na verdade suficiente, só por si, para provar que a
decisão diz individualmente respeito a uma empresa terceira, em especial no domínio das concentrações, cuja apreciação minuciosa
exige contactos com numerosas empresas, a participação activa no referido processo constitui um elemento tomado em consideração,
inclusive no domínio mais específico do controlo das concentrações, para estabelecer, em conjunção com outras circunstâncias
específicas, a admissibilidade do recurso. É tanto mais assim quanto essa participação activa influenciou a tramitação do
processo e, pelo menos em parte, o conteúdo do acto impugnado, tanto no que se refere à determinação das sérias dúvidas colocadas
pela concentração como no que diz respeito aos compromissos necessários para as afastar. No que diz respeito em seguida à questão da afectação, a circunstância de a empresa terceira não poder ser considerada uma
concorrente, nem mesmo uma potencial concorrente no mercado em causa, não implica necessariamente que a decisão não lhe diga
individualmente respeito. Com efeito, do mesmo modo que os potenciais concorrentes das partes na concentração podem ter legitimidade
para pedir a anulação da decisão de aprovação no caso de mercados oligopolistas, quando, uma empresa em posição de monopólio
vê a sua posição reforçada por uma concentração, um recurso de anulação de um operador presente apenas nos mercados vizinhos
ou a montante ou a jusante pode, em determinadas circunstâncias, ser também admissível. cf. n.
os 62, 63, 76, 78
- 2.
Já que não compete ao Tribunal procurar e identificar, nos anexos de um recurso, os elementos que poderia considerar como
constituindo o fundamento do mesmo, uma vez que os anexos têm uma função puramente probatória e instrumental, não há que ter
em consideração argumentos suscitados por um recorrente durante o processo administrativo e não incluídos na petição. cf. n.° 97
- 3.
Nos termos do artigo 2.°, n.° 2, do Regulamento n.° 4064/89, devem ser declaradas compatíveis com o mercado comum as operações
de concentração que não criem ou não reforcem uma posição dominante de que resultem entraves significativos para a concorrência
efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste. Conclui-se que, quando uma concentração cria ou reforça uma posição
dominante, a Comissão deve, apesar disso, autorizar a operação se esta não tiver por consequência entravar a concorrência
efectiva de modo significativo. cf. n.° 130
- 4.
Qualquer operação de concentração deve ser examinada em função do seu próprio impacto no mercado. Assim, a mesma operação
de concentração notificada de novo depois de uma proibição podia, se for caso disso, ser autorizada se as condições do mercado
tivessem evoluído de tal modo que já não era incompatível com o mercado comum. Assim, a comparação entre diferentes casos
de concentração só pode, eventualmente, ser pertinente no caso de se demonstrar que se colocam os mesmos problemas de concorrência
e que são abrangidos mercados em que as condições não evoluíram e têm as mesmas características. cf. n.° 169
- 5.
No exercício da sua missão de controlo das operações de concentração entre empresas, a Comissão só tem competência para aceitar
compromissos susceptíveis de impedir o surgimento ou o reforço da posição dominante que identificou. Para verificar se esse
critério é respeitado, há que examinar os compromissos caso a caso, sem colocar a questão de saber se o compromisso pode ser
qualificado de compromisso de comportamento ou de compromisso estrutural. Embora os compromissos de carácter estrutural sejam,
em princípio, preferíveis aos compromissos de comportamento, na medida em que impedem definitivamente, ou pelo menos duravelmente,
a criação ou o reforço da posição dominante e não necessitam de medidas de vigilância a médio ou a longo prazo, no entanto,
não se pode excluir,
a priori, que compromissos à primeira vista de natureza comportamental, como o acesso a uma infra-estrutura essencial em condições não
discriminatórias, sejam igualmente de natureza a impedir a criação ou o reforço de uma posição dominante. cf. n.
os 193, 250
- 6.
Dadas as apreciações económicas complexas que a Comissão é levada a efectuar no exercício do poder de apreciação de que dispõe
por força do Regulamento n.° 4064/89 para avaliar os compromissos propostos pelas partes na concentração, compete a quem pretende,
pelo facto de os compromissos serem insuficientes para dissipar as sérias dúvidas e dispensar assim a Comissão de abrir a
fase II, a anulação de uma decisão que aprova uma concentração no termo da fase I, demonstrar a existência de um manifesto
erro de apreciação cometido pela Comissão. Conclui-se que não compete ao Tribunal substituir a apreciação da Comissão pela sua, devendo a sua fiscalização limitar-se
a verificar se a Comissão não cometeu um erro manifesto de apreciação, considerando que, vistos globalmente, os compromissos
assumidos podiam resolver os problemas de concorrência identificados resultantes da operação de concentração em causa. cf. n.
os 194, 245, 329
- 7.
Mesmo se são essencialmente de natureza comportamental e se podem analisar como correspondendo a obrigações que, eventualmente,
podem ser impostas nos termos do artigo 82.° CE, os compromissos assumidos para obter uma decisão de aprovação pela Comissão
de uma operação de concentração entre empresas não devem ser considerados como não trazendo uma mais-valia em relação ao controlo
geral dos abusos de posição dominante. Com efeito, no âmbito deste controlo, a prova de uma posição dominante no mercado em
causa e de um abuso dessa posição deve ser feita pela Comissão e pelos terceiros. Em contrapartida, os compromissos impostos
como condição de uma decisão de aprovação de uma concentração têm por efeito transferir o ónus da prova do seu cumprimento
para as empresas abrangidas pela operação em causa. Nessa medida, os mesmos ultrapassam o controlo geral previsto pelo artigo
82.° CE. cf. n.° 202
- 8.
O artigo 18.°, n.° 1, do Regulamento n.° 447/98, relativo às notificações, prazos e audições previstos no Regulamento n.° 4064/89,
deve ser interpretado no sentido de que, embora as partes numa concentração não possam obrigar a Comissão a tomar em consideração
compromissos e as respectivas alterações ocorridas depois do prazo de três semanas, em contrapartida, a Comissão, se considerar
ter o tempo necessário para os examinar, deve estar em condições de autorizar a concentração vistos os referidos compromissos,
mesmo que ocorram alterações depois do prazo de três semanas. Daqui resulta que a Comissão tem o direito de aceitar a versão alterada dos compromissos e a sua versão final para além do
prazo de três semanas previsto pelo artigo 18.°, n.° 1, do Regulamento n.° 447/98, não sendo o prazo para ela vinculativo.
O n.° 37 da comunicação sobre as soluções deve ser interpretado à luz do artigo 18.°, n.° 1, do Regulamento n.° 447/98. Conclui-se
que a Comissão, se considerar ter o tempo necessário para examinar as modificações feitas aos compromissos para além desse
prazo, deve estar em condições de autorizar a concentração vistos os compromissos alterados. cf. n.
os 386-390
- 9.
No quadro do controlo das concentrações, o interesse legítimo de os terceiros darem a conhecer o seu ponto de vista sobre
os efeitos prejudiciais da concentração sobre a concorrência ficou plenamente salvaguardado quando estes puderam, com base
no conjunto das informações que lhes foram transmitidas pela Comissão durante o processo iniciado nos termos do artigo 6.°,
n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 4064/89 e, nomeadamente, das propostas de compromissos apresentadas pelas empresas em
causa, dar a conhecer o seu ponto de vista sobre as modificações que se pretendia introduzir no projecto de concentração para
dissipar as sérias dúvidas existentes quanto à sua compatibilidade com o mercado comum. Com efeito, neste caso, há garantias
suficientes de que as considerações expostas pelas empresas terceiras concorrentes são susceptíveis, eventualmente, de ser
tomadas em conta pela Comissão para apreciar a regularidade da concentração com o direito comunitário e determinar, em especial,
se os compromissos propostos pelas empresas em causa lhe parecem suficientes para esse efeito. Além disso, não sendo a Comissão obrigada, na fase II, nos termos do artigo 18.°, n.° 4, do Regulamento n.° 4064/89, a comunicar
aos terceiros qualificados, para parecer prévio, a versão definitiva dos compromissos que foram assumidos pelas empresas em
causa com base nas objecções emitidas pela Comissão, na sequência, nomeadamente, das observações recolhidas junto de terceiros
sobre as propostas de compromissos formuladas pelas empresas em questão, também não o é
a fortiori no que diz respeito a uma decisão da Comissão tomada no termo da fase I. cf. n.
os 416, 422, 423