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Document 62000CC0185

Conclusões do advogado-geral Geelhoed apresentadas em 5 de Dezembro de 2003.
Comissão das Comunidades Europeias contra République de Finlande.
Incumprimento de Estado - Directivas 92/81/CEE e 92/82/CEE - Taxas do imposto especial sobre o consumo de óleos minerais - Controlo fiscal - Utilização do gasóleo como combustível.
Processo C-185/00.

Colectânea de Jurisprudência 2003 I-14189

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2003:654

62000C0185

Conclusões do advogado-geral Geelhoed apresentadas em 5de Dezembro de2003. - Comissão das Comunidades Europeias contra République de Finlande. - Incumprimento de Estado - Directivas 92/81/CEE e 92/82/CEE - Taxas do imposto especial sobre o consumo de óleos minerais - Controlo fiscal - Utilização do gasóleo como combustível. - Processo C-185/00.

Colectânea da Jurisprudência 2003 página 00000


Conclusões do Advogado-Geral


I - Introdução

1 No presente processo, a Comissão solicita ao Tribunal de Justiça que declare que a República da Finlândia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem, na qualidade de Estado-Membro, por força do artigo 8._, n.os 2 e 3, da Directiva 92/81/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, relativa à harmonização das estruturas do imposto especial sobre o consumo de óleos minerais (1), e do artigo 5._, n._ 1, da Directiva 92/82/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, relativa à aproximação das taxas do imposto especial sobre o consumo de óleos minerais, ao manter em vigor as suas disposições legislativas, regulamentares e administrativas em matéria de utilização do fuelóleo como carburante em veículos a motor (2).

II - Enquadramento Jurídico

A - Direito comunitário

2 O artigo 5._, n.os 1 e 2, da Directiva 92/82 dispõe:

«1. A partir de 1 de Janeiro de 1993, a taxa mínima do imposto especial sobre o consumo de gasóleo será fixada em 245 ecus por 1 000 litros, [...].

2. A partir de 1 de Janeiro de 1993, a taxa mínima do imposto especial sobre o consumo utilizado para os fins previstos no n._ 3 do artigo 8._ da Directiva 92/81/CEE será fixada em 18 ecus por 1 000 litros.»

3 O artigo 2._, n.os 2 e 3, da Directiva 92/81/CEE estipula o seguinte:

«2. Quando destinados a utilização, colocação à venda ou a serem consumidos como combustível de aquecimento ou como carburante, os óleos minerais, com excepção dos óleos cujo nível do imposto especial de consumo se encontra estabelecido na Directiva 92/82/CEE, ficam sujeitos ao imposto especial de consumo. A taxa do imposto especial é igual, segundo a utilização, à taxa aplicável ao combustível ou carburante equivalente.

3. Para além dos produtos tributáveis referidos no n._ 1, é tributado como carburante qualquer produto destinado a utilização, colocação à venda, a ser consumido como carburante ou aditivo ou a aumentar o volume final dos carburantes. [...]»

4 O artigo 8._ da directiva 92/81 prevê o seguinte:

«1. Para além das disposições gerais da Directiva 92/12/CEE relativas às utilizações isentas de produtos sujeitos ao imposto especial de consumo e sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentam os produtos a seguir referidos do imposto especial de consumo harmonizado nas condições por eles fixadas tendo em vista assegurar a aplicação correcta e simples destas isenções, bem como impedir as fraudes, a evasão fiscal ou as utilizações indevidas:

a) Óleos minerais utilizados para fins que não sejam os de combustíveis para motores ou combustíveis de aquecimento;

[...]

2. Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros podem aplicar isenções ou reduções totais ou parciais da taxa do imposto especial de consumo aos óleos minerais utilizados sob controlo fiscal:

[...]

f) Exclusivamente nas actividades agrícola e hortícola, na silvicultura e na piscicultura de água doce,

[...]

3. No que respeita à totalidade ou a parte das utilizações industriais e comerciais seguidamente mencionadas, os Estados-Membros também podem aplicar uma taxa reduzida ao gasóleo, ao GPL, ao metano e ao querosene utilizados sob controlo fiscal, desde que a taxa aplicada não seja inferior à taxa mínima fixada na Directiva 92/82/CEE:

a) Motores estacionários

b) Equipamento e maquinaria utilizados na construção, na engenharia civil e nas obras públicas,

c) Veículos que se destinam a ser utilizados fora da via pública, ou que não receberam autorização para serem preponderantemente utilizados na via pública.»

5 A Directiva 92/12/CEE do Conselho, de 25 de Fevereiro de 1992, relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo (3), que estabelece um regime para os produtos sujeitos a impostos especiais sobre o consumo e a outros impostos indirectos que incidam directa ou indirectamente no consumo desses produtos, dispõe, no artigo 3._, n._ 1, que é aplicável aos óleos minerais. Nos termos do artigo 6._, n._ 1, desta directiva, o imposto especial sobre o consumo é exigível no momento da introdução no consumo. Porém, caso os produtos sujeitos a impostos especiais sobre o consumo que tenham já sido introduzidos no consumo num Estado-Membro sejam detidos para fins comerciais noutro Estado-Membro, o imposto será cobrado, nos termos do artigo 7._, no Estado-Membro em que os produtos são detidos.

6 O artigo 8._ da Directiva 92/12 estipula:

«No que se refere aos produtos adquiridos por particulares, para satisfação das suas necessidades e transportados pelos próprios, o princípio que rege o mercado interno prevê que os impostos especiais de consumo sejam cobrados no Estado-Membro onde os produtos foram adquiridos.»

7 Nos termos do artigo 9._, n.os 1 e 3, da Directiva 92/12:

«1. Sem prejuízo dos artigos 6._, 7._ e 8._, o imposto especial de consumo torna-se exigível quando os produtos introduzidos no consumo num determinado Estado-Membro forem detidos para fins comerciais noutro Estado-Membro. Neste caso, o imposto especial de consumo é devido no Estado-Membro em cujo território se encontram os produtos e torna-se exigível ao detentor dos produtos.

[...]

3. Os Estados-Membros podem igualmente prever que o imposto especial de consumo se torne exigível no Estado-Membro de consumo no momento da aquisição de óleos minerais que já tenham sido introduzidos no consumo num outro Estado-Membro, se os produtos forem transportados por formas de transporte atípicas efectuadas por particulares ou por sua conta. É de considerar como forma de transporte atípica o transporte de combustível que não se encontre no reservatório de um veículo ou num recipiente de reserva apropriado, bem como o transporte de produtos líquidos para aquecimento que não seja efectuado em veículos pesados-cisterna utilizados por operadores profissionais.»

B - Direito nacional

8 Na Finlândia, os impostos especiais sobre o consumo aplicáveis ao gasóleo estão regulados na Lei 1472/1994, de 29 de Dezembro de 1994, relativa ao imposto especial sobre o consumo dos carburantes líquidos com a redacção que lhe foi dada pela Lei 509/1998 (a seguir Lei 1472/1994). Nos termos do artigo 2._ desta lei, entende-se por diesel o gasóleo que é fornecido a fim de ser utilizado como carburante em motores diesel. Entende-se por «fuelóleo doméstico», o gasóleo que é fornecido com vista à sua utilização no aquecimento e que é identificável de acordo com o disposto no artigo 7._ da lei e no decreto 1547/1995, que se baseia nessa lei.

9 Nos termos da Lei 1472/1994, o imposto especial sobre o consumo de diesel e de fuelóleo doméstico comporta um imposto base e um imposto adicional. Relativamente ao diesel, traduz-se num total de 325 euros por cada 1 000 litros, relativamente ao fuelóleo doméstico, 64 euros por cada 1 000 litros. Se o gasóleo for utilizado como carburante, é tributado pela taxa de imposto especial sobre o consumo aplicável ao diesel.

10 A Lei 722/1966 relativa ao imposto sobre veículos a motor dispõe, nos artigos 14._ a 22._, que é aplicável uma sobretaxa a todos os veículos utilizados na Finlândia, aí registados ou não, cujo depósito de combustível contenha fuelóleo doméstico em vez de diesel. Nos termos do artigo 16._ desta lei, o montante da sobretaxa é calculado através da multiplicação por 20 do montante do imposto sobre os veículos a motor que é aplicável a esse veículo.

11 Nos termos dos artigos 17._ e 17a desta lei, os tractores e máquinas para obras públicas estão igualmente sujeitos ao pagamento da sobretaxa. Esta regra geral sofre uma excepção relativamente aos tractores que sejam utilizados na agricultura ou na silvicultura ou em actividades conexas e às máquinas para obras públicas que não sejam utilizadas em actividades não relacionadas com a sua utilização normal e executadas no estaleiro ou no local das obras, no transporte do respectivo combustível e lubrificantes ou nas deslocações de um estaleiro para outro. Se, não obstante, os tractores agrícolas ou máquinas para obras públicas forem utilizados para o transporte de mercadorias, é obrigatória a utilização de diesel.

12 Nos termos do artigo 25._ da Lei 722/1966, o cumprimento destas disposições é controlado pelas entidades policiais e aduaneiras. De acordo com o artigo 28._, estas autoridades são competentes para efectuarem as necessárias inspecções dos depósitos de combustível e dos veículos a motor, a fim de verificarem a qualidade do combustível utilizado nos veículos. Ao abrigo desta disposição, as referidas entidades também podem apreender veículos no decurso das inspecções. Se se constatar a presença de fuelóleo doméstico no reservatório, devem as mesmas entidades, de acordo com o disposto no artigo 27._ da referida lei, retirar o veículo de circulação até serem aplicadas as devidas sanções.

13 A Lei 337/1993 relativa à tributação do combustível, com a redacção que lhe foi dada pela Lei 234/1998, que alargou o seu âmbito de aplicação aos veículos a motor de turismo, prevê a aplicação de uma taxa sobre o combustível por cada dia em que um veículo tenha utilizado fuelóleo doméstico, até ao máximo de 60 dias consecutivos. O montante da taxa diária é de 1 000 FIM (168,19 euros) para veículos ligeiros de passageiros, de 1 500 FIM (252,28 euros) para veículos comerciais ligeiros, de 2 000 FIMS (336,38 euros) para autocarros e 3 000 FIM (504,56 euros) para veículos pesados. A taxa triplica quando a utilização do fuelóleo doméstico não é previamente declarada junto das autoridades finlandesas competentes de acordo com o disposto no artigo 3._ A taxa sobre o combustível é devida em relação ao número de dias em que o veículo esteve em circulação na Finlândia até ao dia em que foi constatada a utilização de fuelóleo doméstico. Se a data de entrada não puder ser determinada, é devida pelo menos a taxa correspondente a dez dias. Por outro lado, a utilização ilegal do fuelóleo doméstico, isto é, não previamente declarada junto das autoridades finlandesas, dá origem a um inquérito e a um eventual procedimento penal por fraude fiscal. Neste caso, o órgão jurisdicional pode condenar o transgressor no pagamento de uma indemnização correspondente à diferença entre os impostos aplicáveis aos diferentes tipos de gasóleo.

14 O artigo 8._ da Lei 337/1993, por analogia com as disposições previstas no artigo 28._ da Lei 722/1966, fixa as competências de controlo das entidades policiais e aduaneiras. O artigo 11._ da Lei 337/1993 proíbe a saída da Finlândia de um veículo com matrícula estrangeira que seja devedor da taxa sobre o combustível pela utilização de fuelóleo doméstico em vez de diesel.

III - Tramitação processual

15 Por cartas de 16 de Julho de 1996 e de 3 de Abril de 1997, a Comissão pediu à Representação Permanente da Finlândia na União Europeia informações sobre a tributação dos óleos minerais. A segunda carta esclarecia que a questão se referia, mais especificamente, à aplicação da Directiva 92/81 e da Directiva 92/82. O Governo finlandês respondeu a estas questões por cartas de 3 de Outubro de 1996 e de 5 de Junho de 1997.

16 Em 3 de Dezembro de 1997, a Comissão notificou para cumprimento a República da Finlândia. A Finlândia reagiu a esta notificação por cartas de 26 de Janeiro de 1998 e de 4 de Maio de 1998. Nesta última carta, a Representação Permanente da Finlândia referiu que a Lei 337/1993 fora alterada. Posteriormente, em 6 de Agosto de 1998, a Comissão emitiu um parecer fundamentado, que reproduzia os argumentos da notificação para cumprimento e acrescentava que as alterações à Lei 337/1993 não diziam respeito à possibilidade de utilização do fuelóleo doméstico como carburante. O Governo finlandês reagiu ao parecer fundamentado por carta de 22 de Setembro de 1998. Nessa carta, reiterou a sua anterior posição de que a legislação finlandesa está em conformidade com a regulamentação comunitária em causa.

17 Uma vez que não partilhava a posição do Governo finlandês, a Comissão instaurou neste Tribunal de Justiça, em 17 de Maio de 2000, a presente acção por incumprimento contra a República da Finlândia. O Reino da Suécia interveio em apoio da Comissão. Na audiência no Tribunal de Justiça de 26 de Setembro de 2002, a Comissão e os Governos finlandês e sueco expuseram os seus pontos de vista.

IV - Fundamentos e principais argumentos

18 No essencial, a Comissão critica o facto de, aquando da sua adesão à União Europeia, a Finlândia não ter introduzido uma proibição à utilização do fuelóleo doméstico como carburante, tendo antes mantido o regime até então em vigor na Finlândia, ainda que com algumas adaptações. Segundo a Comissão, o artigo 5._ da Directiva 92/82 opõe-se a que o fuelóleo destinado a aquecimento, sobre o qual incide um imposto especial sobre o consumo mais baixo, seja utilizado como carburante em veículos equipados com motores diesel, mediante o pagamento de uma sobretaxa e/ou de uma taxa sobre o combustível. Estas taxas adicionais não podem ser consideradas impostos especiais sobre o consumo. Na réplica, a Comissão observa que, mesmo que teoricamente se pudesse sustentar que para a execução do disposto no artigo 5._, n._ 1, da Directiva 92/82 não é necessária, em bom rigor, uma proibição legal, na prática é isso que acontece. Já assim não seria caso a Finlândia pudesse garantir, em quaisquer circunstâncias, que o fuelóleo utilizado como carburante é tributado com uma tarifa de, pelo menos, 245 euros por 1 000 litros. No entanto, a Comissão entende que isso não se verifica.

19 A Comissão recorda ainda que, nos termos do artigo 8._, n.os 2 e 3, da Directiva 92/81, é possível aplicar uma taxa reduzida do imposto especial sobre o consumo, desde que tudo isto se faça sob controlo fiscal. A Comissão constata, no entanto, que o fuelóleo doméstico se encontra em venda livre, sobretudo nas regiões menos povoadas da Finlândia, onde os postos de abastecimento de gasolina o podem vender sem qualquer controlo fiscal. Segundo a Comissão, não existe pois controlo ao nível da distribuição do fuelóleo doméstico, enquanto ao nível do consumidor final o número de controlos anuais da circulação é insuficiente em relação ao número de veículos equipados com motores diesel para poder ser considerado adequado e eficaz (4). A Comissão conclui, assim, que a República da Finlândia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 8._ da Directiva 92/81.

20 A Comissão chama a atenção para o facto de que as disposições de excepção previstas nos artigos 17._, n._ 2, alínea a), e 17a da lei finlandesa relativa ao imposto sobre os veículos a motor permitem a utilização do fuelóleo doméstico nas actividades agrícolas e silvícolas, bem como em máquinas utilizadas em obras públicas. Para a Comissão não ficou claro, no entanto, o modo como o respectivo controlo fiscal foi estruturado.

21 Conforme referiu a Finlândia na fase pré-contenciosa, a Comissão tão-pouco está convencida de que um sistema de sanções fiscais constitua para a Finlândia a única opção eficaz.

22 A Comissão chama igualmente a atenção para os problemas suscitados em torno da dedução do IVA e para os problemas encontrados pela Suécia na legislação finlandesa.

23 O Governo sueco também entende que o regime legal finlandês é deficiente. Alega que este regime torna possível a utilização quer legal quer ilegal do fuelóleo doméstico em veículos equipados com um motor diesel. No primeiro caso, é pago um imposto especial sobre o consumo demasiado baixo - a saber, o imposto que vigora para o fuelóleo doméstico. No segundo caso, em que a utilização é legal porquanto precedida de uma declaração, é aplicada uma sobretaxa especial correspondente a 20 vezes o montante anual do imposto sobre veículos a motor e/ou uma multa fiscal por cada dia em que é utilizado fuelóleo doméstico num veículo a motor, mas estas imposições não constituem impostos especiais sobre o consumo. Com efeito, não estão relacionadas com a quantidade de diesel utilizado, mas com determinados períodos de tempo. A legislação finlandesa ignora assim a disposição do artigo 5._, n._ 1, da Directiva 92/82, que prescreve uma determinada taxa mínima de imposto especial sobre o consumo.

24 O Governo sueco refere, em seguida, que a inexistência de uma proibição legal da utilização do fuelóleo doméstico como carburante já constitui, por si só, uma violação do direito comunitário. Mesmo que o regime existente na Finlândia levasse a que, na prática, ninguém utilizasse fuelóleo doméstico como carburante na Finlândia, a inexistência de uma proibição legal cria um problema de aplicação na circulação transfronteiras e acarreta, por conseguinte, distorções da concorrência noutras zonas do mercado interno. O Governo sueco observa que na Suécia é proibido utilizar como carburante o fuelóleo, tributado com um imposto especial sobre o consumo mais baixo. O artigo 8._ da Directiva 92/12 prescreve, no entanto, que, em relação aos produtos sujeitos a imposto especial adquiridos por particulares para satisfação das suas necessidades e transportados pelos próprios, o imposto especial sobre o consumo deve ser cobrado no Estado-Membro onde os produtos foram adquiridos. Isto significa que a Suécia não pode aplicar nenhum imposto especial sobre o consumo a um particular sueco que tenha obtido o fuelóleo doméstico na Finlândia de forma legal. O Governo sueco esclarece que em 1996 alargou a proibição a todo o fuelóleo doméstico obtido na Finlândia. No entanto, acabou por revogar esta medida unilateral de proibição, por a mesma violar o artigo 8._ e o artigo 9._, n._ 3, da Directiva 92/12. O Governo sueco afirma que, depois disso, o contrabando de fuelóleo doméstico finlandês voltou a adquirir enormes proporções. Segundo a legislação sueca em vigor, é permitido possuir fuelóleo doméstico finlandês, de cor vermelha, no depósito de combustível ou num reservatório de no máximo 10 litros, desde que este combustível tenha sido importado pelo próprio para uso privado. Contudo, é difícil demonstrar que não foi o próprio que encheu o depósito de combustível na Finlândia. Já não seria assim se a Finlândia também conhecesse uma proibição legal de utilização do fuelóleo doméstico como carburante.

25 O Governo finlandês sustenta que a Directiva 92/82 não obriga os Estados-Membros a introduzirem na legislação nacional uma proibição de utilização do fuelóleo doméstico como carburante. A directiva visa a aplicação de uma taxa de imposto especial sobre o consumo correcta. O Governo finlandês afirma que a legislação finlandesa não permite, em termos gerais, que o fuelóleo doméstico seja utilizado como carburante. Esta utilização é fiscalmente «penalizada» com uma sobretaxa, nos termos da Lei 722/1966, e/ou uma taxa sobre o combustível, nos termos da Lei 337/1993.

26 Estas imposições adicionais não podem ser consideradas uma contrapartida pelo direito de utilizar como carburante fuelóleo doméstico em vez de diesel. Têm a natureza de uma multa fiscal destinada a prevenir as utilizações indevidas. O montante elevado desta multa torna economicamente não rentável a utilização do fuelóleo doméstico em vez de diesel como carburante no transporte rodoviário. Um veículo ligeiro de passageiros comum teria de fazer cerca de 5000 km por dia e um veículo pesado cerca de 3000 km por dia para compensar os encargos adicionais. Daí que, segundo o Governo finlandês, a utilização como carburante do fuelóleo doméstico em vez de diesel não se verifique, ou praticamente não se verifique na Finlândia. A esse propósito, refere ainda que a simples constatação pelas entidades policiais ou aduaneiras de que um depósito de combustível contém fuelóleo doméstico - de cor vermelha -, mesmo em quantidade mínima, é suficiente para que se apliquem as multas fiscais.

27 Em resposta à acusação da Comissão de que Finlândia não prevê um controlo fiscal na fase de distribuição, violando assim o disposto no artigo 8._ da Directiva 92/81, o Governo finlandês observa que a legislação comunitária não contém quaisquer normas específicas sobre as modalidades do controlo fiscal. A legislação comunitária não permite determinar o conteúdo exacto desse controlo, nem impõe que a venda ou a distribuição de fuelóleo doméstico sejam sujeitas, duma ou doutra forma, à fiscalização especial de uma autoridade ou que as sanções se reportem à venda a retalho. O Governo finlandês chama a atenção para o facto de 80% dos 2,7 milhões de toneladas de fuelóleo doméstico anualmente consumidos na Finlândia serem utilizados no aquecimento de habitações e edifícios. Os restantes 20% são consumidos na agricultura e na silvicultura, bem como na realização de obras públicas. Segundo o Governo finlandês, as longas distâncias e as condições climatéricas extremas, sobretudo no Norte menos povoado do país, obrigam a que o fuelóleo doméstico também possa ser adquirido nos postos de abastecimento de gasolina. Alega que a imposição de - mais - restrições à infra-estrutura de distribuição, já de si dispersa, poderia dar origem a problemas de abastecimento. Isso poderia ter consequências fatais na altura do Inverno, às vezes com temperaturas extremamente baixas, no Norte do país escassamente povoado. O que interessa é que o consumidor final não utilize como carburante o fuelóleo doméstico, tributado com uma taxa mais reduzida. É essa a finalidade do regime legal finlandês. É também esse o objectivo dos controlos efectuados, controlos estes que o Governo finlandês considera adequados.

V - Apreciação

A - Admissibilidade

28 O Governo finlandês observou que os argumentos da Comissão sobre a existência de contrabando de fuelóleo doméstico entre a Finlândia e a Suécia, a alegada inexistência de um controlo fiscal satisfatório do combustível utilizado nos tractores e as receitas de IVA perdidas não foram referidos pela Comissão na fase pré-contenciosa e, por conseguinte, não podem ser tomados em consideração por serem inadmissíveis.

29 Segundo jurisprudência assente, o objecto do litígio submetido ao Tribunal de Justiça está circunscrito pelo parecer fundamentado, dado que a acção judicial se deve basear nos argumentos e fundamentos já apresentados nesse parecer (5). No caso em apreço, a Finlândia é acusada de não ter cumprido ou de ter cumprido de forma insuficiente as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 5._, n._ 1, da Directiva 91/82 e do artigo 8._, n.os 2 e 3, da Directiva 92/81, pelo facto de a legislação finlandesa não assegurar a aplicação da taxa do imposto especial sobre o consumo de gasóleo mais correcta em função da natureza do consumo e pelo facto de o controlo fiscal da utilização do fuelóleo doméstico ser insuficientemente assegurado nos sectores ditos isentos.

30 Resulta do parecer fundamentado que as críticas da Comissão se dirigem expressamente - também - contra a falta do controlo fiscal referido no artigo 8._ da Directiva 92/81. De acordo com os n.os 2 e 3 do referido artigo, esse controlo deve incidir igualmente na utilização do fuelóleo doméstico na agricultura e na silvicultura e na realização de obras públicas. Com base no exposto, considero que tendo a Comissão, na fase pré-contenciosa, formulado objecções relativamente à falta de controlo fiscal do consumo de fuelóleo doméstico em geral, também pode, no processo contencioso, referir o controlo fiscal do consumo em sectores determinados.

31 O mesmo já não acontece, no meu entender, em relação aos argumentos apresentados pela Comissão sobre as consequências do regime finlandês para a matéria colectável do IVA. A Comissão alegou na petição que, nos casos em que a aplicação do regime finlandês tenha como consequência a não tributação segundo o direito comunitário do fuelóleo doméstico utilizado nos veículos a motor, a matéria colectável dos recursos próprios do IVA é esvaziada. Com efeito, nos termos da Sexta Directiva IVA, a sobretaxa relativa ao imposto sobre os veículos a motor e a taxa especial sobre o combustível não fazem parte da matéria colectável do IVA descrita na directiva. No entanto, a Comissão nada alegou ou observou sobre esta matéria na fase pré-contenciosa que antecedeu a presente acção. Na réplica, a Comissão observa que esta crítica não faz parte do presente processo. Além disso, resulta da defesa do Governo finlandês que este aspecto já foi referido noutro contexto. Com base no exposto, considero que os argumentos da Comissão respeitantes à matéria colectável do IVA não podem ser apreciados no presente processo.

32 A minha conclusão é idêntica no que respeita às observações da Comissão sobre o contrabando de fuelóleo doméstico entre a Suécia e a Finlândia. Quer a notificação para cumprimento quer o parecer fundamentado nada referem sobre esta matéria. A própria Comissão admitiu na réplica que se trata aqui de uma constatação de consequências de facto e não de um - novo - fundamento ou pedido.

33 Os argumentos utilizados pelo Governo finlandês para contestar a admissibilidade da intervenção do Governo sueco não são, na minha opinião, convincentes.

34 O Governo sueco alegou, em resumo, (1) que a Finlândia não cumpre de forma adequada as normas comunitárias sobre a taxa mínima do imposto especial sobre o consumo relativo ao gasóleo utilizado como carburante e (2) que a ausência de uma proibição expressa da utilização do fuelóleo doméstico no transporte rodoviário «comum» dificulta a aplicação eficaz noutros Estados-Membros da legislação que transpõe as normas comunitárias. Segundo o Governo sueco, este último aspecto já constitui, por si só, uma violação do direito comunitário.

35 O primeiro argumento do Governo finlandês é rebuscado e factualmente incorrecto. O Governo finlandês tenta demonstrar que a posição sueca de que a Finlândia não cumpre devidamente as normas comunitárias é contrária ao entendimento da Comissão.

36 De facto, tal como alega o Governo finlandês, a Comissão afirmou na petição que o imposto especial finlandês sobre o consumo de gasóleo utilizado como carburante é superior à taxa mínima do imposto especial sobre o consumo prescrita no artigo 5._ da Directiva 92/82; contudo, a Comissão baseia nesta afirmação a sua principal crítica ao regime finlandês, a saber, que este não garante de forma suficiente que o produto sujeito a um imposto especial sobre o consumo mais baixo é utilizado enquanto fuelóleo doméstico, de acordo com a sua finalidade. Por conseguinte, as posições da Comissão e do Governo sueco sobre o regime legal finlandês são congruentes.

37 O segundo argumento também não procede. É certo que o Governo sueco alegou que a inexistência de uma proibição legal no regime finlandês dificulta a aplicação das normas relativas ao imposto especial sobre o consumo noutras zonas do mercado interno e que este aspecto já constitui, por si só uma violação; todavia o Governo sueco não apresentou esta posição como se se tratasse de um novo fundamento, divergente das conclusões da Comissão. O Governo sueco pretendeu, deste modo, ilustrar as consequências do regime finlandês.

38 Segundo a jurisprudência, o artigo 37._, n._ 4, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça não se opõe a que um interveniente apresente argumentos diferentes dos da parte que apoia, desde que vise apoiar os pedidos dessa parte (6). É manifestamente o caso da argumentação do Governo sueco sobre as consequências do regime finlandês para o comércio transfronteiras.

B - Quanto ao mérito

39 No presente processo, o mais importante é saber se o regime legal finlandês está em conformidade com os requisitos que decorrem do artigo 5._ da Directiva 92/82 e do artigo 8._, n.os 2 e 3, da Directiva 92/81.

40 O artigo 5._, n._ 1, da Directiva 92/82 prescreve que a taxa mínima do imposto especial sobre o consumo de gasóleo deve ser fixada em 245 ecus por 1 000 litros. Decorre desta norma a obrigação dos Estados-Membros assegurarem que o gasóleo efectivamente utilizado como carburante fica sujeito a esta taxa mínima do imposto especial sobre o consumo.

41 No entanto, as coisas complicam-se pelo facto de o gasóleo também poder ser utilizado para outros fins para além da utilização como carburante na circulação rodoviária, tais como o aquecimento de espaços, aplicações industriais (servomotores), navegação, agricultura e silvicultura e obras públicas. Relativamente a estas outras aplicações, o regime das directivas 92/81 e 92/82 prevê isenções ou taxas mínimas mais baixas - por vezes consideravelmente mais baixas - do imposto especial sobre o consumo de gasóleo do que as aplicáveis à sua utilização como carburante.

42 As grandes disparidades entre as taxas do imposto especial sobre o consumo, que se reflectem no preço do gasóleo no consumidor final, tornam os impostos especiais sobre o consumo de combustível destinado a veículos a motor - os mais elevados - particularmente vulneráveis à evasão e à fraude. Para prevenir tais situações, o artigo 8._, n.os 1, 2 e 3, da Directiva 92/81 estipula que a utilização de gasóleo isento ou sujeito a um imposto especial sobre o consumo mais leve nas actividades aí descritas deve ser objecto de controlo fiscal, a fim de impedir «as fraudes, a evasão fiscal ou as utilizações indevidas».

43 Um controlo fiscal adequado da utilização do gasóleo sujeito a um imposto especial sobre o consumo mais leve faz parte integrante da obrigação de resultado decorrente do artigo 5._, n._ 1, da Directiva 92/82, segundo o qual o gasóleo utilizado como carburante deve ser tributado, no mínimo, com uma taxa de 245 euros por 1 000 litros.

44 As grandes disparidades de preços entre o gasóleo utilizado como carburante, sujeito a uma tributação mais elevada, e o gasóleo para outras utilizações, sujeito a uma tributação mais baixa, levam a que o consumo de gasóleo como carburante, em rápida expansão, seja por excelência vulnerável à fraude. Um critério importante para determinar se a obrigação de resultado acima descrita foi cumprida é, por conseguinte, o de saber se a legislação nacional em causa, tal como é executada e aplicada, pode prevenir o consumo como carburante do gasóleo não destinado a esse fim.

45 O litígio entre a Comissão e a Finlândia deve ser apreciado a esta luz: o regime legal finlandês, tal como é executado e aplicado, impede de forma satisfatória a utilização como carburante do gasóleo destinado a outros fins - sobretudo enquanto fuelóleo doméstico? Para o efeito, é necessário analisar o funcionamento do regime finlandês na sua totalidade. Entendo, assim, que a resposta à questão de saber se esta legislação contém ou não uma proibição formal e se exclui ou não determinados elementos da cadeia de distribuição - os postos de abastecimento de gasolina -, reveste pouca importância.

46 O regime finlandês tem em comum com os regimes do imposto especial sobre o consumo existentes noutros Estados-Membros o facto de o gasóleo destinado a ser utilizado como carburante e o gasóleo destinado a outros fins se poderem distinguir através da cor vermelha do gasóleo destinado ao aquecimento e a outras utilizações especiais. A presença deste «fuelóleo doméstico», ainda que muito diluído, nos depósitos de combustível de veículos a motor pode, conforme a Comissão também reconhece, ser facilmente detectado pelo controlo.

47 O consumo de fuelóleo doméstico vermelho para fins não permitidos não é expressamente proibido no regime finlandês, com as inerentes sanções penais ou administrativas, mas está sujeito a imposições fiscais específicas descritas supra nos n.os 8 a 14. O consumo não é, enquanto tal, expressamente proibido, mas é proibido o consumo sem declaração prévia.

48 Decorre deste regime que a utilização do fuelóleo doméstico como carburante em veículos a motor registados na Finlândia sujeita o proprietário ou detentor do veículo em causa ao pagamento de um imposto de circulação 20 vezes superior à tarifa anual (Lei 722/1966) e de uma taxa sobre o combustível por cada dia em que o veículo tiver utilizado fuelóleo doméstico como carburante (até o máximo de 60 dias). Esta taxa especial sobre o combustível triplica se a utilização do fuelóleo doméstico como carburante não tiver sido tempestivamente declarada (Lei 337/1993).

49 Aos veículos não registados na Finlândia - quer veículos pesados, quer, actualmente também, veículos ligeiros de passageiros - que consumam fuelóleo doméstico só é aplicável a Lei 337/1993. De acordo com os seus antecedentes, esta lei foi adoptada para impedir a evasão ao imposto especial sobre o consumo de combustível comum pelos veículos pesados estrangeiros. Com efeito, esses veículos não podiam ser sujeitos à tarifa especial do imposto de circulação finlandês. O seu âmbito de aplicação foi, posteriormente, alargado por duas vezes. A primeira vez, foi alargado aos veículos registados na Finlândia, de modo a evitar discriminações; posteriormente, foi alargado aos veículos ligeiros de passageiros estrangeiros (veículos de turismo).

50 Conforme referido pelo Governo finlandês, e não contestado pela Comissão, o regime sumariamente reproduzido, que combina o imposto especial de circulação e as taxas sobre o combustível, possui um carácter economicamente proibitivo. Assim, ao contrário do que o Governo sueco parece pressupor, não visa permitir o consumo na circulação rodoviária do fuelóleo doméstico tributado com um imposto especial sobre o consumo mais baixo, mas antes impedi-lo.

51 A natureza penal destas tributações fiscais especiais está bem patente na disposição que determina que o consumo não declarado do fuelóleo doméstico como carburante faz legalmente triplicar a taxa especial sobre o combustível já por si proibitiva.

52 Desde logo por razões económicas, não é razoável supor que o detentor de um veículo a motor optará «legalmente» pela utilização do fuelóleo doméstico como carburante. É pois natural que, nos casos em que é constatada a presença de fuelóleo doméstico nos veículos a motor, se trate sempre de consumo não declarado. A este consumo anda associada a consequência excepcionalmente pesada de uma multa fiscal que pode ascender a 504 euros (para veículos ligeiros de passageiros) ou 1 512 euros (para veículos pesados) por cada dia em que o fuelóleo doméstico seja consumido «ilegalmente». A disposição da Lei 337/1993 que determina que, se o número de dias de consumo «ilegal» não puder ser determinado com certeza, se presume um período mínimo de 10 dias, acentua o carácter sancionatório desta tributação especial.

53 O resultado imposto pela directiva, a saber, que o gasóleo utilizado como carburante fique efectivamente sujeito a um imposto especial sobre o consumo de pelo menos o montante referido no artigo 5._, n._ 1, da Directiva 92/82, ou seja de 245 euros por 1 000 litros, também é, em princípio, alcançado pelo regime legal finlandês, desde que adequadamente executado e aplicado.

54 Os argumentos em sentido contrário aduzidos pela Comissão e pelo Governo sueco, nomeadamente de que o regime não contém uma disposição de proibição que o complemente e que, em determinadas circunstâncias, permite a utilização do fuelóleo doméstico como carburante sem pagamento da taxa mínima do imposto especial sobre o consumo de 245 euros por 1 000 litros, não me convencem.

55 Conforme já referi supra no n._ 40, o artigo 5._, n._ 1, da Directiva 92/82, em conjugação com o artigo 8._ da Directiva 92/81, não obriga implícita ou explicitamente à adopção de uma norma de proibição na transposição destas disposições. Só é determinante o resultado, ou seja, o pagamento efectivo da taxa mínima do imposto especial sobre o consumo relativo ao gasóleo utilizado como carburante. O regime legal finlandês que prevê um regime de multas fiscais (de natureza penal) proibitivas é, em princípio, pelo menos tão eficaz como qualquer outro regime que se baseie numa proibição formal.

56 Cumpre salientar ainda que um sistema de execução baseado num regime de proibição de natureza penal ou administrativa, enquanto tal, não exclui o comportamento fraudulento. O montante das sanções, a intensidade dos controlos e a diligência com que se actua contra as transgressões detectadas também são determinantes para a eficácia de tais regimes. É precisamente o montante elevado das multas fiscais existentes no regime finlandês e o facto de as mesmas serem legalmente devidas sempre que se detecta a utilização ilícita do fuelóleo doméstico como carburante que permitem ao regime combinar eficácia e dissuasão.

57 O Governo sueco apresenta ainda um argumento baseado no artigo 3._ da Directiva 95/60 (7). Segundo o Governo sueco, essa disposição codifica o sistema de proibição instaurado pelo artigo 5._ da Directiva 92/82. Observo, a esse propósito, que no presente processo não estão em causa as eventuais obrigações resultantes da Directiva 95/60. De resto, a interpretação que faço da disposição não me permite concluir que a legislação finlandesa a viola, uma vez que o sistema de imposições fiscais especiais aí contido pune, de forma satisfatória, a utilização de gasóleo vermelho marcado contrária à Directiva 92/82.

58 Em bom rigor, os problemas referidos pelo Governo sueco de circulação transfronteiras de gasóleo vermelho marcado também não extravasam o âmbito do presente processo, conforme a própria Comissão já reconheceu na sua réplica. A fim de ser exaustivo, gostaria ainda de referir que estes problemas são, em princípio, fáceis de resolver através da cooperação administrativa entre as administrações finlandesa e sueca. Com efeito, um automobilista sueco que circule na Suécia com fuelóleo doméstico finlandês marcado ou pagou a taxa especial finlandesa sobre o combustível, o que deve resultar de uma declaração efectuada para o efeito, ou agiu ilegalmente, não cumprindo esta imposição. Neste último caso, é ainda obrigado a pagar uma multa fiscal (de natureza penal) bastante elevada. Dado o carácter proibitivo dessa multa, o consumo do fuelóleo doméstico marcado finlandês pode ser combatido de forma adequada pelas autoridades suecas em cooperação com as autoridades finlandesas.

59 O segundo argumento da Comissão e do Governo sueco, de que o regime finlandês conduz a que o fuelóleo doméstico possa ser «legalmente» consumido como carburante sem que o respectivo imposto seja pago, baseia-se, conforme já referi anteriormente, numa leitura - demasiado - formalista da legislação finlandesa em causa. De acordo com o seu conteúdo e alcance, esta legislação visa precisamente o contrário.

60 Face ao exposto, entendo que a Comissão não conseguiu demonstrar que o regime legal finlandês constitui uma transposição do direito comunitário contrária ao artigo 5._, n._ 1, da Directiva 92/81.

61 Esta conclusão dispensa-me de analisar os argumentos especiais relacionados com a ordem jurídica nacional que o Governo finlandês apresentou a favor da manutenção do regime sancionatório fiscal administrativo existente.

62 O cumprimento adequado do direito comunitário aplicável não é determinado apenas pelo regime legal nacional que lhe dá execução. O modo como é aplicado este regime, em si mesmo compatível com o direito comunitário, também é determinante para a questão de saber se a Finlândia cumpre as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 5._, n._ 1, da Directiva 92/82 e do artigo 8._ da Directiva 92/81.

63 A Comissão acusa o Governo finlandês de falta do controlo fiscal previsto no artigo 8._, n.os 2 e 3, da Directiva 92/81, nomeadamente ao nível da distribuição. A circunstância de o fuelóleo doméstico poder ser livremente obtido nos postos de abastecimento de gasolina gera utilizações indevidas. Por último, a Comissão entende que o controlo de veículos a motor realizado pelas autoridades finlandesas é - demasiado - ocasional.

64 O Governo finlandês refuta a primeira acusação, alegando que o artigo 8._ da Directiva 92/81 não especifica em que deve consistir o controlo fiscal. Uma vez que o controlo fiscal do sistema de distribuição, extremamente ramificado, existente na Finlândia seria oneroso e ineficaz, o Governo finlandês optou por concentrar o controlo fiscal ao nível do consumidor final. Este governo chama a atenção para o facto de que um controlo fiscal ao nível da distribuição não pode ser conclusivo, uma vez que o fuelóleo doméstico pode muito simplesmente ser retirado dos reservatórios destinados à alimentação de caldeiras de aquecimento. O mesmo risco existe em relação ao aprovisionamento que é feito para consumo na agricultura e silvicultura e na realização de obras públicas.

65 Uma vez que a Directiva 92/81 não concretiza o conceito de controlo fiscal no artigo 8._, n.os 2 e 3, por exemplo no sentido de que este deve abranger de forma expressa a fase da distribuição, a obrigação de efectuar um controlo deve ser interpretada de modo a que os Estados-Membros sejam obrigados a realizar um controlo fiscal eficaz. Neste contexto, são convincentes os argumentos do Governo finlandês de que o controlo fiscal da utilização indevida do fuelóleo doméstico como carburante é mais conclusivo na fase do consumidor final. Com efeito, um controlo na fase da distribuição não é suficiente para afastar definitivamente as muitas possibilidades de fraude e de utilização indevida na fase do consumidor final. Além disso, nas alegações da Comissão faltam argumentos que indiquem de forma convincente por que razão um controlo fiscal na fase da distribuição constitui um complemento necessário ao controlo fiscal na fase do consumidor final. Entendo, por conseguinte, que a Comissão não conseguiu fundamentar suficientemente o conteúdo desta acusação.

66 A segunda acusação da Comissão também não parece ter sido fundamentada de forma convincente. O Governo finlandês apresentou fortes argumentos a favor da possibilidade de obter o fuelóleo doméstico nos postos de abastecimento de gasolina no Norte do país, pouco povoado e caracterizado por condições climatéricas extremas. A vulnerabilidade da infra-estrutura de distribuição aí existente justifica que os consumidores finais que o necessitem possam contar com os postos de abastecimento de gasolina para satisfazerem as suas necessidades em fuelóleo doméstico. Resulta claramente dos dados apresentados pelo Governo finlandês, e não contestados pela Comissão, que se trata de um canal de abastecimento complementar. Só 4% da quantidade total do fuelóleo doméstico é adquirida através dos postos de abastecimento de gasolina.

67 Os argumentos que a Comissão apresentou sobre este aspecto contra a Finlândia são pouco precisos. Por um lado, critica, em termos gerais, a distribuição do fuelóleo doméstico nos postos de abastecimento de gasolina; por outro lado, faz apenas algumas observações contra o controlo realizado pelas autoridades finlandesas, que considera ser insuficiente.

68 As críticas gerais à inclusão dos postos de abastecimento de gasolina na cadeia de distribuição do fuelóleo doméstico não me parecem determinantes, à luz da justificação apresentada pelo Governo finlandês. Refira-se, à margem, que os postos de abastecimento de gasolina também são incluídos na cadeia de distribuição noutros países da Comunidade, como a Áustria. A existência dos postos de abastecimento de gasolina enquanto elo na cadeia de distribuição acarreta, efectivamente, alguns riscos de utilização indevida, que reclamam um controlo fiscal adequado. A Comissão devia ter demonstrado que as autoridades finlandesas falharam no seu controlo específico. Todavia, as críticas que dirigiu, em termos gerais, ao controlo fiscal finlandês, a discutir adiante, não são suficientemente específicas.

69 A terceira acusação da Comissão refere-se ao nível geral do controlo na fase do consumidor final na Finlândia. A Comissão considera que uma frequência de controlo de 3 000 a 5 000 casos por ano é demasiado baixa.

70 Também em relação a este aspecto, os argumentos factuais da Comissão carecem da necessária precisão. Uma decisão sobre se o nível de controlo é ou não suficiente não pode basear-se apenas no número de controlos realizados anualmente. Será necessário demonstrar também, pelo menos, que os resultados desses controlos apontam para um amplo consumo ilegal do fuelóleo doméstico como carburante. A Comissão parece não conseguir fazê-lo, à luz dos dados apresentados pelo Governo finlandês.

71 Resulta destes dados não contestados, nomeadamente, que em 1999 foram efectuados 3 943 controlos. Em 141 casos verificou-se haver motivo para colher uma amostra. Das amostras colhidas, 125 resultaram positivas. Uma vez que estes controlos fiscais não foram manifestamente realizados ao acaso, mas incidiram sobretudo em sectores e zonas com um risco elevado de utilização indevida, os números não apontam para um consumo ilegal do fuelóleo doméstico importante em matéria de circulação rodoviária. Isto parece ser confirmado pelos resultados de uma acção geral de fiscalização da circulação rodoviária efectuada em 22 de Setembro de 1999 em oito Estados-Membros. Nesta acção, foram detectadas infracções fiscais em 283 veículos controlados. Três destas infracções foram detectadas na Finlândia, duas das quais relacionadas com tractores agrícolas que seguiam na via pública com mercadoria.

72 A Comissão não contrapôs a isto quaisquer factos ou dados dos quais pudesse resultar que o controlo fiscal na Finlândia é de tal modo insuficiente, em termos qualitativos e quantitativos, que não assegura o resultado visado pelo artigo 5._, n._ 1, da Directiva 92/82, a saber, a aplicação de uma taxa mínima do imposto especial sobre o consumo de 245 euros por 1 000 litros de gasóleo utilizado como carburante.

73 Concluo, assim, que a Comissão não conseguiu fazer valer os seus fundamentos e argumentos e que a acção por si instaurada deve, por conseguinte, ser julgada improcedente.

74 Nos termos do artigo 69._, n._ 2, e do artigo 69._, n._ 4, primeiro parágrafo do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, a Comissão deve ser condenada nas despesas do processo e o Reino da Suécia deve suportar as suas próprias despesas.

VI - Conclusão

Tendo em conta o que acima se disse, proponho ao Tribunal de Justiça que:

1. Julgue improcedente a acção por incumprimento instaurada pela Comissão contra a República da Finlândia.

2. Condene a Comissão nas despesas.

3. Determine que o Reino da Suécia suportará as suas próprias despesas.

(1) - JO L 316, p. 12.

(2) - JO L 316, p. 19.

(3) - JO L 76, p. 1.

(4) - Segundo os dados constantes dos autos, na Finlândia existem 2 328 990 veículos, dos quais 434 534 automóveis com motores diesel, 327 792 tractores, dos quais 320 843 tractores diesel. O número de controlos anuais é de 3 500 a 5 000.

(5) - V., por exemplo, acórdão de 18 de Junho de 1998, Comissão/Itália (C-35/96, Colect., p. I-3851, n._ 28 e jurisprudência aí referida).

(6) - V., por exemplo, acórdão de 19 de Novembro de 1998, Reino Unido/Conselho, (C-150/94, Colect., p. I-7235, n._ 36 e jurisprudência aí referida).

(7) - Directiva 95/60/CE do Conselho, de 27 de Novembro de 1995, relativa à marcação para efeitos fiscais do gasóleo e do querosene (JO L 291, p. 46). O artigo 3._ dispõe que os Estados-Membros devem adoptar as medidas necessárias para evitar a utilização abusiva dos produtos marcados, nomeadamente para que os óleos minerais em questão não possam ser utilizados como combustível nos motores de veículos destinados a circular na via pública nem ser conservados nos seus reservatórios, a menos que essa utilização seja autorizada em casos específicos determinados pelas autoridades competentes dos Estados-Membros. Os Estados-Membros devem dispor que a utilização dos referidos óleos minerais nos casos indicados no primeiro parágrafo é considerada uma infracção do respectivo direito nacional. Cada Estado-Membro deve adoptar as medidas necessárias para assegurar a plena aplicação de todas as disposições da presente directiva, nomeadamente determinando as sanções a aplicar em caso de violação dessas medidas; estas sanções devem ser proporcionais ao objectivo a atingir e ter um carácter dissuasor.

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